RA 14

 

Brasão da República
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

TUTELA CAUTELAR ANTECEDENTE (12134) Nº 0601142-15.2022.6.00.0000

 (PJe) – PORTO VELHO – RONDÔNIA

 

Relator: Ministro Raul Araújo

Requerente: Jair de Figueiredo Monte

Advogados: Fernando Neves da Silva – OAB/DF 2030 e outros

 

DECISÃO

 

Eleições 2022. Tutela cautelar antecedente. Requerimento de Registro de Candidatura. Impugnação. Inelegibilidade. Condenação criminal (art. 1º, I, e, item 2, da LC nº 64/1990). Procedência. Indeferimento do registro. Restrição ao acesso de recursos públicos e ao uso do horário eleitoral gratuito em rádio e televisão. Alegada a ofensa ao art. 16-A da Lei nº 9.504/1997. Candidato sub judice. Competência do TSE para deliberar acerca da cessação dos efeitos do referido dispositivo. Presença concomitante dos requisitos autorizadores da medida pretendida. Tutela deferida para a prática de atos de campanha, inclusive no rádio e na televisão, bem como o acesso aos fundos públicos, até ulterior deliberação deste Tribunal Superior a respeito do recurso ordinário.

 

Jair de Figueiredo Monte apresenta pedido de tutela de urgência, em caráter liminar (ID 158081100), com vistas a atribuir efeito suspensivo ativo ao recurso ordinário interposto do acórdão do Tribunal Regional Eleitoral de Rondônia que, nos autos do Requerimento de Registro de Candidatura (RRC) nº 0600704.2022.6.22.0000/RO, julgou procedente a Ação de Impugnação de Registro de Candidatura (AIRC) ajuizada pelo Ministério Público Eleitoral e, por conseguinte, indeferiu seu requerimento de registro de candidatura ao cargo de deputado estadual, pelo partido AVANTE, nas Eleições 2022, e confirmou a tutela de urgência anteriormente concedida para impor a proibição do uso de recursos públicos em campanha e vedar o repasse dessas verbas pela agremiação, além de proibir a utilização do horário eleitoral gratuito pelo candidato.

O acórdão ficou assim ementado (ID 158081104, fls. 464-465):

Eleições 2022. Pedido de registro. Candidato. RRC. Deputado estadual. Ação de Impugnação ao Registro de Candidatura. Crime de associação ao tráfico de entorpecentes. Condenação por órgão colegiado. Presente. Inelegibilidade. Indeferimento.

I – A causa restritiva à capacidade eleitoral passiva, insculpida no item 7 da alínea “e” do inciso I do art. 1º da LC n. 64/90, se aperfeiçoa sempre que se verificar, in concreto, a prática de crimes que comprometem o bem jurídico tutelado pela categoria de crimes de tráfico de entorpecentes e drogas afins.

II – A inviabilidade da candidatura, mormente diante do indeferimento do pedido registro, impõe a suspensão do recebimento de recursos públicos (Fundo Partidário e Fundo Especial de Financiamento de Campanha) e utilização de horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão, visando salvaguardar o erário do evidente prejuízo à sociedade.

III – Ação de impugnação julgada procedente e registro indeferido.

Na petição inicial da presente tutela, Acir Marcos Gurgacz alega estarem presentes os requisitos para a concessão da medida pretendida. Para tanto, argumenta o que se segue:

a) “[...] a lei expressamente prevê que os candidatos cujos registros de candidatura tenham sido indeferidos podem continuar a praticar todos os atos de campanha até o pronunciamento da instância superior, nos exatos termos previstos no art. 16-A da Lei 9.504/97” (ID 158081100, fl. 7);

b) “[...] esta Egrégia Corte Superior tem jurisprudência firme no sentido de que, ‘[...] a cessação dos efeitos do art. 16- A, da Lei das Eleições, é providência que somente se revela possível no exercício da competência do Tribunal Superior Eleitoral’ (PetCiv nº 0601747-29/AL, Rel. Min. Edson Fachin, PSESS de 12.11.2020)” (ID 158081100, fl. 9);

c) o regramento e a jurisprudência aplicáveis asseguram ao candidato cujo registro esteja sub judice a realização de todos os atos relativos à campanha eleitoral, o que compreende o acesso aos recursos públicos e a participação no horário eleitoral gratuito;

d) “[...] o prejuízo sofrido pelo candidato é diário e irreversível, seja porque as receitas de financiamento das campanhas eleitorais somente podem ser captadas até a data do pleito, seja porque a exibição da propaganda no rádio e na televisão se encerram na antevéspera das eleições, não sendo possível ressarcir ou repor o tempo não utilizado pelos candidatos em razão de ilegal ordem judicial proferida contra expressa disposição legal” (ID 158081100, fl. 13);

Ao final, pede (ID 158081100, fl. 14):

a) Que sejam liminarmente suspensas as proibições impostas pelo acórdão recorrido ao autor, seja por meio da concessão de efeito suspensivo ao recurso por ele já interposto, seja pelo reconhecimento da invasão da competência do Tribunal Superior Eleitoral, assegurando-se, de qualquer forma, o expresso direito de o autor participar da propaganda eleitoral gratuita no Rádio e na Televisão e de ter acesso ao Fundo Eleitoral de Financiamento de Campanha e ao Fundo Partidário, se disponibilidade para tanto houver, nos exatos termos do art. 16-A da Lei 9.504/97, até que o seu pedido de registro de candidatura seja examinado pelo Tribunal Superior Eleitoral;

b) A imediata comunicação da liminar ao Tribunal Regional Eleitoral de Rondônia, independentemente de publicação;

c) Que o Ministério Público Eleitoral seja ouvido;

d) Que, ao final, a liminar seja confirmada, a fim de suspender a tutela incidental deferida no acórdão proferido pelo TRE/RO nos autos do RCand nº 0600704-74.2022.6.22.0000, até que o registro venha a ser examinado e decidido pelo Plenário do Tribunal Superior Eleitoral.

É o relatório. Decido.

A petição inicial encontra-se subscrita por advogados habilitados nos autos e acompanhada dos documentos necessários à análise dos fatos narrados (ID 158081099).

A jurisprudência desta Corte já assentou que a concessão de tutela provisória pressupõe que estejam presentes cumulativamente a fumaça do bom direito e o perigo na demora. Este, consubstanciado na ocorrência de situação que o configure, e, aquela, na viabilidade processual e na probabilidade do direito deduzido em Juízo (AC nº 0600760-27/BA, rel. Min. Luís Roberto Barroso, julgada em 2.4.2020, DJe de 22.4.2020).

Neste momento processual, restringe-se a análise do pedido, considerando a plausibilidade da alegação de ofensa ao art. 16-A da Lei nº 9.504/1997.

Como relatado, o requerente teve seu registro de candidatura indeferido, tendo sido proibido de ter acesso aos recursos públicos oriundos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) e Fundo Partidário, bem como de utilizar o horário eleitoral gratuito. 

O requerente, em suma, argumenta que

[...] seja pela norma expressa do art. 16-A, da Lei 9.504/97, seja pela fixação de tese pelo TSE, seja pela reiterada jurisprudência do TSE, inclusive para as eleições de 2022, seja pela previsão na própria Resolução que regulamenta a matéria, não restam dúvidas de que as tutelas deferidas por tribunais regionais que impedem a realização das campanhas eleitorais, ainda que parcialmente, com a vedação da utilização de recursos públicos ou com impedimento ao acesso às rádios e televisões de propagandas eleitorais gratuitas, violam a competência exclusiva do Plenário do Tribunal Superior Eleitoral e afrontam diretamente os dispositivos legais indicados (ID 158081100, fl. 12).

Verifica-se que a Corte regional não poderia deliberar sobre as matérias objeto do art. 16-A, visto que

O ordenamento jurídico conferiu a esta Corte Superior a competência para, em última instância – à exceção das questões passíveis de apreciação pelo STF –, chancelar os pedidos de registro de candidatura apresentados pelos candidatos em quaisquer dos pleitos, conforme prevê o art. 16-A da Lei nº 9.504/1997, sendo certo que a competência para deliberação dos comandos normativos lá previstos é "[...] privativa e exclusiva do Tribunal Superior Eleitoral [...]" (PetCiv nº 0601747-29/AL, rel. Min. Edson Fachin, PSESS de 12.11.2020).

(REspEl nº 0600491-34/RJ, rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 3.8.2021, DJe de 8.9.2021)

A legislação eleitoral garante ao postulante a cargo eletivo a possibilidade de efetuar todos os atos relativos à campanha enquanto o seu registro se encontrar sub judice. É o que dispõe o art. 16-A da Lei nº 9.504/1997, 

Art. 16-A.  O candidato cujo registro esteja sub judice poderá efetuar todos os atos relativos à campanha eleitoral, inclusive utilizar o horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão e ter seu nome mantido na urna eletrônica enquanto estiver sob essa condição, ficando a validade dos votos a ele atribuídos condicionada ao deferimento de seu registro por instância superior. (grifos acrescidos)

Acerca da matéria, esta Corte entendeu que são permitidos a todo candidato, ainda que esteja com seu registro indeferido sub judice, a realização de campanha eleitoral, inclusive no rádio e na televisão, e o acesso aos fundos públicos, até decisão do Tribunal Superior Eleitoral ou o trânsito em julgado.

Confiram-se os seguintes precedentes:

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO FEDERAL. INELEGIBILIDADE CHAPADA. CANDIDATURA NATIMORTA. ART. 16-A DA LEI Nº 9.504/1997. POSSIBILIDADE. REALIZAÇÃO. ATOS DE CAMPANHA. UTILIZAÇÃO DOS FUNDOS PÚBLICOS. LIMITE. JULGAMENTO DO PEDIDO DE REGISTRO PELO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. REGULARIDADE DOS GASTOS. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ART. 82, § 1º, DA RES.-TSE Nº 23.553/2017. AGRAVO DESPROVIDO. 

1. O termo inelegibilidade chapada não encontra respaldo na legislação eleitoral, segundo a qual a postulação de candidatura é livre a todo cidadão, inexistindo indeferimento de registro de ofício. 

2. É assegurado a todos os concorrentes o devido processo legal do registro de candidatura, respeitando-se o contraditório e a ampla defesa. 

3. Nessa ordem de ideias, são permitidos a todo candidato, ainda que esteja com seu registro indeferido sub judice, a realização de campanha eleitoral, inclusive no rádio e televisão, e o acesso aos fundos públicos, até decisão do Tribunal Superior Eleitoral ou o trânsito em julgado. Precedentes. 

4. Comprovada a regularidade dos gastos do candidato, não há falar em violação ao art. 82, § 1º, da Res.-TSE nº 23.553/2017, sob o fundamento de utilização indevida de recursos do FEFC. 

5. Agravo regimental a que se nega provimento

(AgR-AI nº 0601177-78/MS, rel. Min. Edson Fachin, julgado em 1º.10.2020, DJe de 7.10.2020 – grifos acrescidos)

 

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO INTERNO EM AGRAVO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATA AO CARGO DE DEPUTADO ESTADUAL. CANDIDATA COM REGISTRO INDEFERIDO. INELEGIBILIDADE POR REJEIÇÃO DE CONTAS NA QUALIDADE DE SECRETÁRIA MUNICIPAL. REALIZAÇÃO DE CAMPANHA COM BASE NO ART. 16-A DA LEI Nº 9.504/1997. UTILIZAÇÃO DE RECURSOS PÚBLICOS DO FUNDO PARTIDÁRIO E DO FEFC NA CAMPANHA. APROVAÇÃO PELO TRE DAS CONTAS. DESNECESSIDADE DE DEVOLUÇÃO DOS RECURSOS PÚBLICOS UTILIZADOS. DISCUSSÃO SOBRE A EXISTÊNCIA DE MÁ-FÉ. APLICAÇÃO DO ENUNCIADO Nº 24 DO TSE. NEGADO PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO. 

1. O candidato cujo registro esteja sub judice poderá efetuar todos os atos relativos à campanha eleitoral e, inclusive, utilizar recursos públicos provenientes do FEFC e do Fundo Partidário. 

[...] 

(AgR-AI nº 0601292-02/MS, rel. Min. Og Fernandes, julgado em 1º.7.2020, DJe de 1º.9.2020)

No mesmo sentido é o acórdão desta Corte no RO nº 0600919-68/MS, da relatoria do Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho Neto (DJe de 9.10.2028), quando ficou assentado que a condição de candidato sub judice, para fins da incidência do art. 16-A da Lei nº 9.504/1997, nas eleições gerais, cessa (a) com o trânsito em julgado da decisão de indeferimento do registro ou (b) com a decisão de indeferimento do registro proferida pelo TSE.

Assim, esta Corte Superior entende que somente com a decisão proferida nesta instância é que cessam os efeitos do art. 16-A da Lei das Eleições (PetCiv nº 0601747-29/AL, rel. Min. Edson Fachin, PSESS de 12.11.2020).

Tal compreensão, aliás, também é extraída da Res.-TSE nº 23.609/2019 – que dispõe sobre a escolha e o registro de candidatas e candidatos para as eleições. Veja-se: 

Art. 51. A candidata ou o candidato cujo registro esteja sub judice pode efetuar todos os atos relativos à campanha eleitoral, inclusive utilizar o horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão e ter seu nome mantido na urna eletrônica enquanto estiver sob essa condição.

§ 1º Cessa a situação sub judice:

I - com o trânsito em julgado; ou

II - independentemente do julgamento de eventuais embargos de declaração, a partir da decisão colegiada do Tribunal Superior Eleitoral, salvo se obtida decisão que:

a) afaste ou suspenda a inelegibilidade (LC nº 64/1990, arts. 26-A e 26-C) ;

b) anule ou suspenda o ato ou decisão do qual derivou a causa de inelegibilidade;

c) conceda efeito suspensivo ao recurso interposto no processo de registro de candidatura. (grifos acrescidos)

Entendimento similar também se extrai da Res.-TSE nº 23.610/2019 – que dispõe sobre a propaganda eleitoral, utilização e geração do horário gratuito e condutas ilícitas em campanha eleitoral –, conforme se verifica em seu art. 58, caput e parágrafo único, assim redigidos:

Art. 58. A candidata ou o candidato cujo pedido de registro esteja sub judice ou que, protocolado no prazo legal, ainda não tenha sido apreciado pela Justiça Eleitoral, poderá participar do horário eleitoral gratuito (Lei nº 9.504/1997, arts. 16-A e 16-B) .

Parágrafo único. A cessação da condição sub judice se dará na forma estipulada pela resolução que dispõe sobre a escolha e o registro de candidatas e candidatos para as eleições.

Nesse contexto, considerando que a determinação pela Corte regional – de proibição de repasse de recursos públicos para a campanha do requerente e do uso do horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão – ainda não foi objeto de deliberação pelo Plenário deste Tribunal Superior, faz-se imperioso assegurar a escorreita aplicação do multicitado art. 16-A da Lei das Eleições – que abrange, por certo, o acesso aos recursos públicos destinados ao financiamento de campanha eleitoral –, sob pena de danos irreversíveis à campanha do requerente, devido à privação da principal fonte de financiamento atualmente disponível.

Quanto ao perigo na demora, evidencia-se sua presença, haja vista o curto período de campanha eleitoral e o fato de que a Corte regional concluiu pela mitigação do art. 16-A da Lei nº 9.504/1997, proibindo o ora requerente de utilizar recursos públicos em campanha e de fazer uso do horário eleitoral gratuito.

Ante o exposto, defiro o pedido de concessão de medida de urgência para, nos termos do art. 16-A da Lei nº 9.504/1997, assegurar ao requerente a prática de atos de campanha, inclusive no rádio e na televisão, e o acesso aos fundos públicos, até ulterior deliberação desta Corte Superior sobre o recurso ordinário.

Comunique-se, com a devida urgência, ao Tribunal Regional Eleitoral de Rondônia.

Após, retornem os autos a este gabinete, para fins do cumprimento do art. 3º da Res.-TSE nº 23.598/2019.

Publique-se no mural eletrônico.

Brasília,  19   de setembro de 2022.

 

 

Ministro Raul Araújo

Relator