index: REPRESENTAÇÃO (11541)-0600851-15.2022.6.00.0000-[Propaganda Política - Propaganda Eleitoral - Divulgação de Notícia Sabidamente Falsa]-DISTRITO FEDERAL-BRASÍLIA

Brasão da República
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

 

REPRESENTAÇÃO (11541)  Nº 0600851-15.2022.6.00.0000 (PJe) - BRASÍLIA - DISTRITO FEDERAL

RELATOR: MINISTRO RAUL ARAÚJO
REPRESENTANTE: COLIGAÇÃO BRASIL DA ESPERANÇA
Advogados da REPRESENTANTE: CRISTIANO ZANIN MARTINS E OUTROS
REPRESENTADOS: EDUARDO NANTES BOLSONARO E OUTRO 
 

 

DECISÃO
 

Trata-se de representação, com pedido de tutela de urgência, ajuizada pela Coligação Brasil da Esperança em desfavor de Eduardo Nantes Bolsonaro, Floriano Barbosa de Amorim Neto e outro, por suposta veiculação de desinformação nas redes sociais, consubstanciada na divulgação de vídeos referentes à distribuição de materiais denominados “Kit Gay”.

 

Na petição inicial, a representante alega em síntese (ID 157955677):

 

a) “no dia 16/8/2022, publicação conjunta realizada pelos representados no Instagram (@bolsonarosp e @florianoagora) fez ressurgir na internet informação falsa que já desafiou os esforços das agências de checagem de fatos, da Justiça Eleitoral” (p. 3);

 

b) na aludida postagem, divulga-se vídeo sobre o “livro denominado ‘Aparelho Sexual e Cia’, que supostamente compunha o que se passou a denominar ‘Kit Gay’, termo cunhado pelo atual Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, candidato à reeleição apoiado pelos representados, para atingir adversários petistas durante o pleito eleitoral de 2018” (p. 3) e utiliza-se a expressão ‘Método PT’, a sugerir que seria o Partido dos Trabalhadores responsável pelo material e sua distribuição nas escolas brasileiras” (p. 5);

 

c) a referida postagem conjunta foi tarjada pelo Instagram como “Informação Falsa”;

 

d) na rede social TikTok, o perfil @jhonpresidente publicou vídeo que reproduz trecho de entrevista na qual Jair Messias Bolsonaro alude a existência do cognominado “Kit Gay”.

 

Com base nos fatos narrados, aduz que os representados trouxeram novamente para o embate eleitoral notícia sabidamente inverídica, que, inclusive, fora apreciada nos autos da Representação nº 0601699-41.2018.6.00.0000, na qual “se examinou e rechaçou justamente a (falsa) associação do material do vídeo com gestões petistas no Ministério da Educação” (p. 12).

 

Argumenta que as publicações desbordam o direito à liberdade de expressão, configurando desinformação, em descumprimento aos art. 9º-A e 27 da Res.-TSE nº 23.610/2019.

 

Nesse contexto, visando à concessão de medida liminar, alega que “a probabilidade do direito no presente caso é a manifesta violação às normas e princípios que regem a propaganda eleitoral, sobretudo a Resolução nº 23.610/2019 deste c. TSE, de modo a ferir a lisura do processo eleitoral” (p. 17) e que o perigo de dano se afigura na perpetuação da desinformação, a qual macula a lisura do processo eleitoral, haja vista a velocidade e o alcance das publicações.

 

Assinala que, no caso, “os dois primeiros representados, juntos, ostentam mais de 4 milhões de seguidores apenas no Instagram, sem mencionar os 700 mil seguidores e 11 milhões de curtidas do 3º representado(p. 18).

 

Nessa toada, assevera que “os impactos negativos das publicações impugnadas restam evidenciados, uma vez que possuem conteúdo eleitoreiro e foram compartilhadas na internet, alcançando um número inestimável de eleitores brasileiros de modo a influenciar diretamente na sua escolha, violando o direito de voto livre e automaticamente a democracia, o que torna urgente medida judicial para cessar os danos” (p. 18).

Ao final, requer:

 

(i) liminarmente, sejam determinadas aos representados Eduardo Nantes Bolsonaro e Floriano Barbosa de Amorim Neto a remoção do conteúdo contido na URL https://www.instagram.com/p/ChXAzTCLNy1/ e a abstenção de veicular novas postagens de conteúdo semelhante, sob pena de multa a ser arbitrada por esta Corte Superior;

 

(ii) sejam determinadas diligências para identificação do responsável pelo https://www.tiktok.com/@jhonpresidente;

 

(iii) seja expedido ofício à empresa TikTok, determinando a imediata remoção da publicação contida na URL https://www.tiktok.com/@jhonpresidente/video/7060803064684383494?_r=1&_t=8V4iPUQkMb7&is_from_webapp=v1&item_id=7060803064684383494, de autoria do perfil supracitado;

 

(iv) no mérito, seja confirmada a medida liminar e sejam cada um dos representados condenados ao pagamento de multa no valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), por divulgação de propaganda eleitoral irregular, nos termos do art. 36 da Lei nº 9.504/1997.

 

Por meio dos IDs 15795580, 157955685 e 157955681, junta aos autos arquivos contendo o teor das publicações mencionadas e as capturas de telas respectivas.

 

É o relatório. Decido.

 

A representante pretende a concessão de medida liminar para que sejam imediatamente removidas as publicações veiculadas nos perfis dos representados Eduardo Nantes Bolsonaro, Floriano Barbosa de Amorim Neto no Instagram e no perfil @jhonpresidente no TikTok, por suposta veiculação de desinformação. Visa, ainda, à determinação de diligências para identificação do responsável pelo perfil @jhonpresidente (https://www.tiktok.com/@jhonpresidente).

 

De início, registre-se que a concessão de liminar é medida excepcional que pressupõe o preenchimento dos requisitos especificados no art. 300, caput, do CPC, fazendo-se necessária a demonstração da plausibilidade do direito invocado e da existência de risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação. No caso, não se observam os pressupostos indicados.

 

No tocante à publicação conjunta veiculada na URL https://www.instagram.com/p/ChXAzTCLNy1/, percebe-se que o conteúdo não se encontra mais disponível, porquanto fora devidamente removido pelo próprio provedor de aplicação. Dessa forma, não subsiste a necessidade de determinação de remoção da postagem impugnada, acarretando o indeferimento do pedido.

 

Quanto à pretensão de remoção da postagem realizada na URL https://www.tiktok.com/@jhonpresidente/video/7060803064684383494?_r=1&_t=8V4iPUQkMb7&is_from_webapp=v1&item_id=7060803064684383494, verifica-se que o vídeo publicado consiste em trecho de entrevista concedida por Jair Messias Bolsonaro a programa de televisão, na qual apresenta opinião crítica à distribuição de materiais que denomina “Kit Gay”.

 

A reprodução de trecho de entrevista anteriormente divulgada em programa de televisão encontra amparo na liberdade de expressão, de informação e de imprensa, à luz dos arts. 5º, IV, e 220 da Constituição Federal. Nesse sentido, em exame perfunctório, observa-se que o vídeo publicado não apresenta fato evidentemente falso ou gravemente descontextualizado, nem ofensivo à honra de candidato ou à higidez do processo eleitoral, a caracterizar conteúdo desinformativo que autorize a interferência desta Justiça Especializada.

 

Destaca-se o preceito normativo previsto no art. 38 da Res.-TSE nº 23.610/2019, de que “a atuação da Justiça Eleitoral em relação a conteúdos divulgados na internet deve ser realizada com a menor interferência possível no debate democrático”.

 

Ademais, convém salientar a seguinte compreensão firmada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI n° 4451/DF, segundo a qual “o direito fundamental à liberdade de expressão não se direciona somente a proteger as opiniões supostamente verdadeiras, admiráveis ou convencionais, mas também aquelas que são duvidosas, exageradas, condenáveis, satíricas, humorísticas, bem como as não compartilhadas pelas maiorias. Ressalte-se que, mesmo as declarações errôneas, estão sob a guarda dessa garantia constitucional” (ADI/STF no 4451/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 6.3.2019 – destaquei). 

 

Não se verifica, portanto, a alegada plausibilidade jurídica em relação à questionada postagem na rede social TikTok. A ausência desse requisito essencial para concessão do provimento vindicado desautoriza seu deferimento.

 

O pedido de diligências relativo à identificação do responsável pelo perfil https://www.tiktok.com/@jhonpresidente tampouco merece deferimento. Isso porque as representações possuem rito célere, a prova é pré-constituída, e a identificação do usuário ofensor é matéria destinada ao momento da propositura da ação. Nesse sentido: Rp nº 0601686-42/DF, rel. Min. Edson Fachin, DJe de 3.11.2020; AgR-AC nº 1384-43/DF, rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJe de 17.8.2010).

 

Ademais, o pedido de diligências para identificação de usuário responsável deve conter fundados indícios da ocorrência do ilícito de natureza eleitoral; justificativa motivada da utilidade dos dados solicitados; bem como período ao qual se referem os registros (art. 40, § 1º, da Res.-TSE nº 23.610/2019). Na hipótese dos autos, esses requisitos, que são indispensáveis, não foram cumpridos pela representante.

 

Ante o exposto, indefiro o pedido de tutela de urgência.

 

Proceda-se à citação dos representados Eduardo Nantes Bolsonaro e Floriano Barbosa de Amorim Neto, para que apresentem resposta, no prazo de 2 (dois) dias, nos termos do art. 18 da Res.-TSE nº 23.608/2019.

 

Determina-se à Secretaria Judiciária a exclusão das seguintes informações constantes do polo passivo desta representação no sistema PJe: ‘responsável pelo perfil @jhonpresidente’, haja vista que responsável por perfil de rede social – sem a identificação adequada previamente fornecida pelo representante – não é parte na relação jurídica processual.

 

Apresentada a defesa ou decorrido o prazo respectivo, intime-se o representante do Ministério Público Eleitoral para que se manifeste na forma do art. 19 da mencionada resolução.

 

Publique-se.

 

Brasília, 29 de agosto de 2022.

 
Ministro RAUL ARAÚJO
Relator