TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

ACÓRDÃO

AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL ELEITORAL Nº 0600227-88.2020.6.13.0156 – JAPARAÍBA – MINAS GERAIS

Relator: Ministro Edson Fachin

Agravante: Rogério Ribeiro Lacerda
Advogados: Acácio Wilde Emílio dos Santos – OAB: 81810/MG e outros
Agravado: Ministério Público Eleitoral

 

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PEDIDO DE REGISTRO DE CANDIDATURA INDEFERIDO. PREFEITO. CONDENAÇÃO CRIMINAL. INELEGIBILIDADE PREVISTA NO ART. 1º, I, e, DA LC Nº 64/1990 CONFIGURADA. REVISÃO CRIMINAL. LIMINAR INDEFERIDA. JULGAMENTO FAVORÁVEL ATÉ A DIPLOMAÇÃO. INOCORRÊNCIA. ACÓRDÃO EM HARMONIA COM O ENTENDIMENTO DESTA CORTE SUPERIOR. SÚMULA Nº 30/TSE. MANUTENÇÃO DA DECISÃO IMPUGNADA. DESPROVIMENTO.

1. Consoante explicitado na decisão agravada, tem-se que na hipótese incide o óbice da Súmula nº 30/TSE, haja vista que o entendimento adotado pelo Tribunal de origem – de que as alterações previstas no art. 11, § 10, da Lei nº 9.504/97 têm limite temporal para serem conhecidas – está em consonância com a jurisprudência consolidada desta Corte Superior segundo a qual, consideradas a observância ao princípio da segurança jurídica e as especificidades do processo eleitoral, a data de diplomação constitui termo final para que sejam conhecidas as modificações supervenientes ao registro aptas a fulminar os efeitos decorrentes da inelegibilidade.

2. Inexiste falar em obstaculização do acesso à prestação jurisdicional e falta de fundamentação a partir de uma visão ultrapassada e divorciada de análise sistemática do princípio da legalidade, já que no pronunciamento impugnado prestigiou-se o sistema de precedentes, no qual se adotam soluções uniformes para situações análogas.

3. Na espécie, não consta dos autos notícia sobre obtenção de liminar ou julgamento favorável ao agravante da revisão criminal a que se referiu, nem até a data da diplomação nem até o presente momento, de maneira que permanece hígida a inelegibilidade, ante a incidência da causa prevista no art. 1º, I, e, da Lei nº 9.504/1997.

4. Agravo interno a que se nega provimento.

 

Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, em negar provimento ao agravo interno, nos termos do voto do relator.

 

Brasília, 19 de agosto de 2021.

 

MINISTRO EDSON FACHIN – RELATOR

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN: Senhor Presidente, trata-se de agravo interno formalizado contra a rejeição dos embargos declaratórios opostos à negativa de seguimento a recurso especial no qual se objetivava o deferimento do pedido de registro de candidatura do ora agravante ao cargo de prefeito.

O pronunciamento foi assim sintetizado (ID 136572738):

ELEIÇÕES 2020. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. PEDIDO DE REGISTRO DE CANDIDATURA INDEFERIDO. PREFEITO. CONDENAÇÃO CRIMINAL. CONFIGURAÇÃO DA HIPÓTESE PREVISTA NO ART. 1º, I, e, DA LC Nº 64/1990. INOVAÇÃO RECURSAL. IMPOSSIBILIDADE. REVISÃO CRIMINAL. LIMINAR INDEFERIDA. JULGAMENTO FAVORÁVEL ATÉ A DIPLOMAÇÃO OU ATÉ O PRESENTE MOMENTO. INEXISTÊNCIA DE ALTERAÇÃO SUPERVENIENTE AO REGISTRO QUE AFASTE A INELEGIBILIDADE. ALEGADA OMISSÃO. INOCORRÊNCIA NO CASO. INCONFORMISMO QUANTO À DECISÃO QUE NEGOU SEGUIMENTO AO RECURSO. EMBARGOS REJEITADOS.

Reitera o agravante que se encontra pendente de julgamento a REVISÃO CRIMINAL interposta [...] junto ao Eg. Tribunal de Justiça de Minas Gerais, tombada sob a numeração única 5524275-33.2020.8.13.0000 (ID 137287738, p. 4), em relação à qual não existiria dúvidas quanto ao êxito.

Sustenta que as provas novas supervenientes à sua condenação criminal, consubstanciadas em ata notarial e em justificação criminal, devem ser consideradas na espécie, reafirmando que o § 10 do art. 11 [...] não limita e nem impõe um prazo fatal para a ocorrência do fato superveniente, muito menos dispõe que o mesmo deve ocorrer até a data da diplomação (18.12.2020), como restou consignado (ID 137287738, p. 5 – grifo no original).

Aduz novamente que o fato de haver precedentes contrários à [sua] pretensão [...] não deve ser empecilho para que [...] tenha pleno acesso ao judiciário e a uma prestação jurisdicional plena; sob pena de violação frontal dos artigos 5º, XXXV, LV e 93, IX, da Constituição Federal c/c art. 489 do CPC, que ficam arguidos (ID 137287738, p. 5). Repete terem sido ofendidos os princípios do devido processo legal e da legalidade.

Pleiteia o provimento do agravo interno para o especial ser provido, deferindo-se o respectivo pedido de registro de candidatura.

A contraminuta foi registrada sob o ID 139292038. 

É o relatório.

VOTO

O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (relator): Senhor Presidente, o agravo interno não merece prosperar.

O agravante pretende a reforma da decisão mediante a qual rejeitei os embargos de declaração com apoio nos seguintes fundamentos (ID 136572738):

Inicialmente, a alegação relativa à ofensa aos princípios da ampla defesa e do devido processo legal constitui indevida inovação recursal, o que torna inviável seu conhecimento em sede de declaratórios.

Na sequência, observa-se que não consta dos autos notícia sobre obtenção de liminar ou julgamento favorável ao embargante da revisão criminal a que se referiu, nem até a data da diplomação nem até o presente momento, de maneira que permanece inelegível, ante a incidência da causa prevista no art. 1º, I, e, da Lei nº 9.504/1997.

Tal como consignado na decisão embargada, a simples formalização de revisão criminal, sem a obtenção de medida liminar que suspenda os efeitos da condenação criminal, não basta para fundamentar deferimento de pedido de registro de candidatura, na linha do decidido no RO nº 0604373-61/RJ, Rel. Min. Og Fernandes, PSESS de 3.10.2018.

Desse modo, não houve nenhuma alteração fática superveniente ao registro que afaste a inelegibilidade, inexistindo falar em omissão no pronunciamento impugnado.

Diversamente do alegado, a referência, na decisão embargada, à jurisprudência consolidada deste Tribunal demonstra que a necessidade de observância ao princípio da segurança jurídica e às especificidades do processo eleitoral fundamenta o entendimento segundo o qual a data da diplomação – etapa que encerra o processo eleitoral – consubstancia o termo final para que sejam conhecidas as alterações supervenientes ao registro aptas a fulminar os efeitos decorrentes da restrição à capacidade eleitoral passiva. Nessa esteira, confiram-se, além dos já mencionados no pronunciamento atacado, os seguintes precedentes:

ELEIÇÕES 2018. REGISTRO DE CANDIDATO. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO. DEPUTADO FEDERAL. ART. 1º, I, G, DA LC Nº 64/90. FATO SUPERVENIENTE. DOCUMENTO NOVO. ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO. APROVAÇÃO DAS CONTAS COM RESSALVAS. NÃO CARACTERIZAÇÃO DA CAUSA DE INELEGIBILIDADE. DESPROVIMENTO.

[...]

3. A candidata, em 22.10.2018, postulou a juntada de certidão na qual consta que o Tribunal de Contas do Estado do Pará (TCE/PA), em sede de pedido de rescisão, reformou o acórdão condenatório proferido em seu desfavor, o que consubstancia fato superveniente apto a afastar a inelegibilidade prevista no art. 1º, I, g, da LC nº 64/90.

4. Nos termos da jurisprudência pacífica desta Corte Especial, em processo de registro de candidatura, as circunstâncias fáticas e jurídicas supervenientes ao registro de candidatura que afastem a inelegibilidade, com fundamento no que preceitua o art. 11, § 10, da Lei nº 9.504/97, podem ser conhecidas em qualquer grau de jurisdição, inclusive nas instâncias extraordinárias, até a data da diplomação, última fase do processo eleitoral, já que em algum momento as relações jurídicas devem se estabilizar, sob pena de eterna litigância ao longo do mandato (RO nº 96-71/GO, Rel. Min. Luciana Lóssio, PSESS em 23.11.2016). Na mesma linha: AgR-REspe nº 1840-28/SP, Rel. Min. Henrique Neves, DJe de 25.9.2014, e REspe nº 384-55/AM, Rel. Min. Luciana Lóssio, PSESS em 4.9.2014.

[...]

8. A decisão que considerou as contas regulares constitui alteração jurídica superveniente ao julgamento do registro apta a afastar a inelegibilidade aplicada nestes autos, nos moldes do art. 11, § 10, da Lei nº 9.504/97, razão pela qual o deferimento do registro de candidatura em análise é medida que se impõe.

9. Agravo regimental desprovido.

(AgR-RO nº 0600427-28/AP, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, PSESS de 13.11.2018);

ELEIÇÕES 2016. RECURSO ORDINÁRIO. RECEBIMENTO. RECURSO ESPECIAL. FUNGIBILIDADE. REGISTRO DE CANDIDATURA. VEREADOR. DEFERIMENTO. FATO SUPERVENIENTE. APROVAÇÃO DAS CONTAS COM RESSALVAS. EXAME DE DOCUMENTO NOVO NA INSTÂNCIA ESPECIAL. MUDANÇA DE JURISPRUDÊNCIA. PROVIMENTO.

[...]

2. As circunstâncias fáticas e jurídicas supervenientes ao registro de candidatura que afastem a inelegibilidade, com fundamento no que preceitua o art. 11, § 10, da Lei nº 9.504/97, podem ser conhecidas em qualquer grau de jurisdição, inclusive nas instâncias extraordinárias, até a data da diplomação, última fase do processo eleitoral, já que em algum momento as relações jurídicas devem se estabilizar, sob pena de eterna litigância ao longo do mandato. Deve-se conferir máxima efetividade à norma específica dos processos judiciais eleitorais, em prol de valores como a segurança jurídica, a prestação jurisdicional uniforme e a prevalência da vontade popular por meio do voto.

3. Tal sistemática se harmoniza com o disposto no art. 493 do Código de Processo Civil, in verbisSe, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão

4. In casu, o TRE/GO indeferiu o registro de candidatura do recorrente ao cargo de vereador, em razão de desaprovação das contas da Câmara Municipal de Itarumã/GO, relativas ao exercício financeiro de 2009, pelo Tribunal de Contas dos Municípios de Goiás (TCM/GO), à época em que o candidato foi seu presidente. Após a interposição do recurso e antes da eleição, o recorrente juntou aos autos acórdão proferido pelo TCM/GO, no qual foram acolhidos embargos de declaração para aprovar as contas com ressalvas, circunstância que afasta a incidência da cláusula de inelegibilidade prevista no art. 1º, I, g, da LC nº 64/90.

5. [...] Com muito mais razão, o provimento desse recurso, ainda que em sede de embargos de declaração, tem o condão de afastar a inelegibilidade, sob pena de indevida supressão do poder inerente às Cortes de Contas de julgar a matéria em todas as instâncias previstas na legislação de regência.

6.  Recurso provido para deferir o registro de candidatura.

(RO nº 96-71/GO, Rel. Min. Luciana Lóssio, PSESS de 23.11.2016)

Como se nota, o entendimento desta Corte Superior apoia-se na análise sistemática do ordenamento jurídico, sendo irrelevante para o deslinde da controvérsia a análise do argumento pertinente ao exame da literalidade do disposto no art. 11, § 10, da Lei nº 9.504/1997, em alusão a uma visão ultrapassada do princípio da legalidade.

Ainda que assim não fosse, não se considera faltar fundamentação a decisão na qual não é expressamente enfrentado argumento incapaz de infirmar a conclusão adotada pelo julgador.

Diante disso, em desabono à pretensão do embargante, vê-se que não há nenhum vício a ser sanado no pronunciamento impugnado.

De proêmio, distanciado do princípio da dialeticidade, o agravante repete a alegação relativa à ofensa ao princípio do devido processo legal sem impugnar o argumento segundo o qual constitui indevida inovação recursal.

No mais, consoante explicitado na decisão agravada, tem-se que na hipótese incide o óbice da Súmula nº 30/TSE, haja vista que o entendimento adotado pelo Tribunal de origem – de que as alterações previstas no art. 11, § 10, da Lei nº 9.504/97 têm limite temporal para serem conhecidas –  está em consonância com a jurisprudência consolidada desta Corte Superior segundo a qual, consideradas a observância ao princípio da segurança jurídica e as especificidades do processo eleitoral, a data de diplomação constitui termo final para que sejam conhecidas as modificações supervenientes ao registro aptas a fulminar os efeitos decorrentes da inelegibilidade.

Outrossim, inexiste falar em obstaculização do acesso à prestação jurisdicional e falta de fundamentação a partir de uma visão ultrapassada e divorciada de análise sistemática do princípio da legalidade, já que no pronunciamento impugnado prestigiou-se o sistema de precedentes, no qual se adotam soluções uniformes para situações análogas. Nessa esteira, confira-se trecho da manifestação da Procuradoria-Geral Eleitoral (ID 139292038, p. 11):

Vale lembrar que o julgamento contrário aos interesses da parte não significa negativa de prestação jurisdicional, desde que o acórdão se apresente fundamentado e analise todas as questões suscitadas, como ocorreu no caso em exame.

Cumpre reiterar que, na espécie, não consta dos autos notícia sobre obtenção de liminar ou julgamento favorável ao agravante da revisão criminal a que se referiu, nem até a data da diplomação nem até o presente momento, de maneira que permanece inelegível, ante a incidência da causa prevista no art. 1º, I, e, da Lei nº 9.504/1997.

Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno.

É como voto.

EXTRATO DA ATA

AgR-ED-REspEl nº 0600227-88.2020.6.13.0156/MG. Relator: Ministro Edson Fachin. Agravante: Rogério Ribeiro Lacerda (Advogados: Acácio Wilde Emílio dos Santos – OAB: 81810/MG e outros). Agravado: Ministério Público Eleitoral.

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, negou provimento ao agravo interno, nos termos do voto do relator.

Composição: Ministros Luís Roberto Barroso (presidente), Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell Marques, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.

Vice-Procurador-Geral Eleitoral: Paulo Gustavo Gonet Branco.

 

SESSÃO DE 19.8.2021.