index: RECURSO ESPECIAL ELEITORAL (11549)-0600222-82.2020.6.15.0068-[Inelegibilidade - Terceiro Mandato, Impugnação ao Registro de Candidatura, Cargo - Prefeito, Eleições - Eleição Majoritária]-PARAÍBA-CACHOEIRA DOS ÍNDIOS

Brasão da República
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

 

RECURSO ESPECIAL ELEITORAL (11549)  Nº 0600222-82.2020.6.15.0068 (PJe) - CACHOEIRA DOS ÍNDIOS - PARAÍBA

RELATOR: MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
RECORRENTE: ALLAN SEIXAS DE SOUSA
Advogados do(a) RECORRENTE: HERBERT VIANA ROCHA - PB0026442, JOSE AUGUSTO DA SILVA NOBRE NETO - PB0011147, GABRIELA ROLLEMBERG DE ALENCAR - DF0025157, RODRIGO DA SILVA PEDREIRA - DF0029627, JANAINA ROLEMBERG FRAGA - DF0052708
RECORRIDO: COLIGAÇÃO CACHOEIRA PODE MAIS
Advogados do(a) RECORRIDO: MAYARA DE SA PEDROSA - DF0040281, LUIS GUSTAVO MOTTA SEVERO DA SILVA - PR0044980, ADISSON TAVEIRA ROCHA LEAL - PB0014131, EUGENIO GONCALVES DA NOBREGA - PB8028

 

DECISÃO:

Ementa: Direito Eleitoral. Recurso extraordinário em Recurso Especial Eleitoral.  Eleições 2020. Registro de candidatura. 3º mandato caracterizado. Assunção do cargo nos 6 (seis) meses anteriores ao pleito. Período curto. Admissão.
1. Recurso extraordinário contra acórdão do TSE, que manteve decisão de negativa de seguimento a recurso especial eleitoral.
2. Na origem, o Tribunal Regional da Paraíba concluiu pelo indeferimento de pedido de registro de candidatura referente às Eleições 2020, ao fundamento de que caracterizado 3º mandato consecutivo, porque o candidato assumiu o cargo de prefeito no período de 31.08.2016 a 08.09.2016, ou seja, por 8 (oito) dias, em decorrência de decisão judicial, dentro do período crítico referente aos 6 (seis) meses que antecederam o pleito de 2016, e foi eleito para o mesmo cargo para o mandato 2017-2020.
3. Hipótese em que o recorrente alega diversas ofensas à Constituição Federal, notadamente aos seus arts. 1o, caput, e parágrafo único, 14, §§ 5o e 6o, 16 e 79, ao argumento de que a interpretação dada pelo TSE no caso concreto não está alinhada à sua jurisprudência e à do STF de que não caracteriza exercício de mandato a assunção precária do cargo, por tempo ínfimo.
4. Inexistência de óbices à admissão do recurso.
5. Recurso extraordinário admitido.

 

1. Trata-se de recurso extraordinário interposto por Allan Seixas de Sousa, candidato eleito ao cargo de prefeito do município de Cachoeira dos Índios/PB, nas Eleições 2020, contra acórdão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que negou provimento a agravo interno, mantendo decisão monocrática que negou seguimento a recurso especial eleitoral.

 

2. Na origem, o Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba (TRE/PB) concluiu pelo indeferimento do pedido de registro de candidatura do ora recorrente ao fundamento de que caracterizado o terceiro mandato vedado pela Constituição Federal, nos termos do seu art. 14, §§ 5º e 6o. O acórdão ora recorrido contou com a seguinte ementa (ID 141844038):


“AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2020. REGISTRO DE CANDIDATURA. PREFEITO. INDEFERIMENTO. INELEGIBILIDADE. ART. 14, §§ 5º E 6°, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. VICE-PREFEITO. SUBSTITUIÇÃO NO SEMESTRE ANTERIOR À ELEIÇÃO. REELEIÇÃO. TERCEIRO MANDATO. NEGATIVA DE PROVIMENTO.
1. No decisum monocrático, mantiveram-se sentença e aresto do TRE/PB quanto ao indeferimento do registro de candidatura do agravante ao cargo de prefeito de Cachoeira dos Índios/PB nas Eleições 2020 por se entender configurada a inelegibilidade decorrente de vedação ao exercício de terceiro mandato consecutivo (art. 14, § 5º, da CF/88).
2. A decisão agravada foi proferida monocraticamente, nos termos do art. 36, § 6º, do RI-TSE, explicitando-se que o aresto a quo estava em consonância com a jurisprudência mais recente deste Tribunal, confirmada para as Eleições 2020, de modo que não há falar em nulidade.
3. Rejeitadas as preliminares de cerceamento de defesa e de negativa de prestação jurisdicional por parte da Corte a quo, notadamente porque, como se verá adiante, discute-se inelegibilidade cuja incidência é de natureza objetiva.
4. No mérito, de acordo com o disposto no art. 14, § 5º, da CF/88, “[o] Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido, ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único período subsequente”.
5. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e desta Corte firmou-se no sentido de que “[o] vice que assume o mandato por sucessão ou substituição do titular dentro dos seis meses anteriores ao pleito pode se candidatar ao cargo titular, mas, se for eleito, não poderá ser candidato à reeleição no período seguinte” (REspe 222-32/SC, Rel. Min. Henrique Neves da Silva, publicado em sessão de 16/11/2016). Para as Eleições 2020, em hipótese bastante similar ao caso dos autos: REspe 0600147-24/GO, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, sessão virtual de 16 a 18/12/2020, com embargos declaratórios julgados na sessão virtual de 5 a 12/3/2021. No mesmo sentido, REspe 0600162-96/RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, sessão de 15/12/2020.
6. Não é possível afastar a inelegibilidade para um terceiro mandato consecutivo quando há exercício do cargo de prefeito, ainda que por período curto e a título provisório, nos seis meses anteriores ao pleito, impedimento que possui natureza objetiva. Ressalva de entendimento deste Relator.
7. Na espécie, o agravante, então vice-prefeito do Município de Cachoeira dos Índios/PB, assumira a prefeitura no período de 31/8/2016 a 8/9/2016, elegeu-se prefeito nas Eleições 2016 e pretende disputar novamente a chefia do Executivo nas Eleições 2020.
8. Agravo interno a que se nega provimento”.     

3. O recurso extraordinário fundamenta-se no art. 102, III, a, da Constituição Federal. A parte recorrente alega, em síntese: (i) violação aos princípios da segurança jurídica, da anterioridade eleitoral, do devido processo eleitoral, e da isonomia (arts. 5o, caput, e XXXVI e 16 da CF), pois não foi observada a orientação jurisprudencial do TSE e do STF de que não caracteriza exercício de mandato a assunção precária do cargo, por tempo ínfimo, o que representa indevida mudança jurisprudencial; (ii) ofensa ao art. 14, §§ 5o e 6o, da Constituição Federal, pois a) o substituto não é investido no cargo quando exerce a atribuição em caráter provisório; e b) não foi comprovada a prática de atos de gestão relevantes a fim de se concluir ter havido efetivo exercício do cargo; (iii) mácula aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade e à Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), porque seus direitos políticos foram limitados, desconsiderando-se a particularidade do caso concreto de o recorrente ter exercido a titularidade do mandato por apenas 8 (oito) dias; (iv) contrariedade ao art. 79 da CF, ante a necessidade de diferenciação entre substituição e sucessão no cargo para fins de compreensão do regime de reelegibilidade do vice e de exigência de desincompatibilização; (v) ofensa ao art. 1o, caput, e parágrafo único, da Constituição Federal e ao princípio republicano, tendo em vista que se considerou, por ficção, como exercício de mandato eletivo, amera substituição pelo período de 8 (oito) dias, o que viola diretamente a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana e o pluralismo político.

 

4. Requer, por fim, que seja provido o recurso, para que seja deferido seu pedido de registro de candidatura, ante as violações apontadas e que seja dada interpretação conforme a Constituição ao art. 1o, §§1o, 2o e 3o, da LC no 64/1990, para reduzir o alcance do texto quando se tratar de mera substituição do titular do Poder Executivo por seu respectivo vice (ID 151916388).

 

5. Contrarrazões ID 153170788.

 

6. É o relatório. Decido.

 

7. De início, verifico que o recurso é tempestivo, tendo em vista a observância do prazo de 3 (três) dias –- publicação do acórdão em 17.08.2021, terça-feira (ID 149613388), e interposição do recurso em 20.08.2021, sexta-feira (ID 151916388). Ademais, a parte está devidamente representada nos autos (procuração ID 56323138; substabelecimentos IDs 56325288 e 56326338), há interesse recursal e a preliminar de repercussão geral foi formulada nos termos do art. 102, § 3º, da Constituição Federal; e do art. 1.035, § 2º, do CPC. 

 

8. Além disso, as questões aduzidas no recurso extraordinário foram devidamente prequestionadas.

 

9. Consta dos autos que o recorrente, durante o mandato de vice-prefeito do município de Cachoeira dos Índios/PB, assumiu a prefeitura no período de 31.08.2016 a 08.09.2016 e, em seguida, elegeu-se prefeito nas Eleições 2016. Em razão disso, concluiu-se não ser possível sua candidatura no pleito de 2020, por estar caracterizar terceiro mandato consecutivo.

 

10. O acórdão do TSE, ora impugnado, assim assentou (ID 141844038):


“[...] a jurisprudência desta Corte Superior e do Supremo Tribunal Federal caminha no sentido de que “a substituição do Presidente da República, do Governador ou do Prefeito pelo Vice respectivo – ou por outro dignitário integrante da ordem de substituição na Chefia do Poder Executivo – só geram inelegibilidade para concorrer à sucessão do titular, se ocorrer a menos de seis meses da eleição” (trecho do voto do e. Ministro Sepúlveda Pertence na resposta do TSE à CTA 689/DF, Rel. Min. Fernando Neves, DJ de 14/12/2001).
Isto posto, a contrario sensu, aquele que substituir o titular nos seis meses anteriores ao pleito poderá concorrer a esse cargo por uma única vez consecutiva, não podendo, após esta última eleição, concorrer novamente ao mesmo mandato”.      

 

11. Tendo em vista que as questões suscitadas se referem à matéria constitucional e não havendo, em análise preliminar, óbice ao conhecimento do recurso, submeto-o à apreciação do Supremo Tribunal Federal. 

 

12. Ressalto, por fim, que (i) a questão é também tema de outros recursos extraordinários admitidos por esta Corte e conhecidos pelo STF (RE 1329079 e RE 1337788); e (ii) é inviável o sobrestamento deste feito pela sistemática de recursos repetitivos, por se tratar de registro de candidatura, nos termos do que dispõe o art. 20 da Res.-TSE no 23.478/20161, que estabelece diretrizes para a aplicação do Código de Processo Civil no âmbito da Justiça Eleitoral.

 

13. Diante do exposto, com fundamento no art. 1.030, V, do CPC, admito o recurso extraordinário. E diante da relevância da matéria debatida nos autos, entendo ser o caso de remessa dos autos na qualidade de representativo da controvérsia, nos termos do art. 1.036, § 1º, do CPC. Encaminhem-se ao Supremo Tribunal Federal.

 

Publique-se. 

 

Brasília, 6 de outubro de 2021.

 

 

Ministro Luís Roberto Barroso
                  Presidente

 


______________________________
1 Art. 20.  A sistemática dos recursos repetitivos prevista nos arts. 1.036 a 1.042 do Novo Código de Processo Civil não se aplica aos feitos que versem ou possam ter reflexo sobre inelegibilidade, registro de candidatura,
diplomação e resultado ou anulação de eleições.