PODER JUDICIÁRIO FEDERAL

JUSTIÇA ELEITORAL

TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DE RONDÔNIA

NOTÍCIA DE IRREGULARIDADE EM PROPAGANDA ELEITORAL (12561) - Processo nº 0600615-51.2022.6.22.0000 - Porto Velho - RONDÔNIA

NOTICIADO: CAIRO TEIXEIRA DA SILVA – CNPJ nº CNPJ -47.528.543/0001-40

CARGO: DEPUTADO FEDERAL 

 

DECISÃO

 

Trata-se de Notícia de Irregularidade em Propaganda Eleitoral contra Cairo Teixeira da Silva (Cabo Cairo), candidato ao cargo de Deputado Federal pelo Partido Republicano da Ordem Social - PROS, materializada no Termo de Constatação (id. 7937575) e no Relatório do Núcleo de Inteligência em Fontes Abertas (NIFA) da Coordenação de Segurança das Eleições (COSE) deste Tribunal (id. 7940260).

No termo de constatação lavrado nesta Corregedoria e no  relatório do NIFA constam a indicação de propaganda eleitoral antecipada, consoante divulgação de vídeo de 6 minutos e 31 segundos (URL: https://www.instagram.com/reel/ChBfQPuD0uo/?igshid=MDJmNzVkMjY=) no perfil Instagram Cairo Silva (@cairo.08 – URL: https://instagram.com/cairo.08?igshid=YmMyMTA2M2Y=), no qual o noticiado se apresenta aos garimpeiros como candidato a Deputado Federal e cabo da policial militar do Estado de Rondônia portando arma de fogo de uso restrito (Fuzil) e uma pistola.

O conteúdo do vídeo e os dados da postagem foram preservados como prova pela rede social Instagram por meio da solicitação nº 7152015 com referência a este processo, conforme recibo constante do relatório NIFA (id. 7940260).

Na sequência, juntou-se aos presentes autos o Ofício n. 70.960/2022 subscrito pelo Comandante do 1º Batalhão da Polícia Militar – Porto Velho, Tenente Coronel Wilton Nascimento Amorim, no qual apresentam-se fatos para que sejam apurados acerca da conduta do candidato ao cargo de deputado federal CAIRO TEIXEIRA DA SILVA no âmbito da legislação eleitoral vigente.

Visando à melhor instrução e coleta de mais elementos indicativos de irregularidades ou abusos eleitorais, foram anexadas ao presente processo novo Informativo n. 1/2022 do Núcleo de Inteligência em Fontes Abertas (id. 7965757), a Decisão Homologatória de Prisão em Flagrante – Plantão Judicial VEPEMA (id. 796558) e o Termo de Audiência de Custódia constante dos autos PJe n. 7060652-03.2022.8.22.0001 (id. 7965759).

Após as providências administrativas e levantamentos realizados pela Coordenação de Segurança das Eleições deste Regional, os presentes autos vieram conclusos para decisão em sede de poder de polícia na propaganda eleitoral e poder geral de cautela.

É o relatório. Decido.

 

FUNDAMENTAÇÃO

Inicialmente, destaco que a propaganda eleitoral passou a ser permitida somente a partir de 16 de agosto deste ano de eleições, nos termos do art. 36, da Lei nº 9.504/1997 e do art. 2º da Resolução TSE nº 23.610/2019.

No caso em evidência, uma das irregularidades constatadas diz respeito à veiculação de propaganda eleitoral antecipada com utilização de armamento de grosso calibre[1], bem como a incitação contra operações dos órgãos ambientais e policiais no combate ao garimpo ilegal, além do  estímulo contundente ao uso de armas pelos garimpeiros em Rondônia.

Analisando o conteúdo encartado nos autos, verifica-se que o candidato alega com veemência que a polícia e o Ibama só estão em atividade nas operações para “sacanear” os garimpeiros.

No vídeo inicial preservado, o candidato, Cabo Cairo, também faz promessas futuras de atividade legislativa como voz dos garimpeiros no parlamento federal brasileiro. Promete apresentar propostas de criminalização das ações ambientais contra o garimpo ilegal e a legalização do porte de fuzil e pistola à categoria dos garimpeiros, para defesa pessoal, familiar e do ouro extraído. 

Importante destacar, neste ponto, que a liberdade de manifestação do pensamento deve ser interpretada da forma mais ampla possível, garantindo a expressão de ideias favoráveis ou contrárias, mas jamais conteúdo ilícito eleitoral, caluniador, difamatório, injurioso ou desinformador, balizas necessárias ao convívio social pacífico, democrático, harmônico, civilizado e respeitoso.

Nesta senda, a atuação da Justiça Eleitoral em relação a conteúdos divulgados na Internet deve ser realizada com a menor interferência possível, tal como dispõe o art. 38 da Resolução TSE n. 23.610/2019, in verbis:

 

Art. 38. A atuação da Justiça Eleitoral em relação a conteúdos divulgados na internet deve ser realizada com a menor interferência possível no debate democrático (Lei nº 9.504/1997, art. 57-J).

§ 1º Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, as ordens judiciais de remoção de conteúdo divulgado na internet serão limitadas às hipóteses em que, mediante decisão fundamentada, sejam constatadas violações às regras eleitorais ou ofensas a direitos de pessoas que participam do processo eleitoral. (grifou-se)

 

Com efeito, após assistir ao vídeo noticiado, à primeira vista, em juízo de cognição sumária, é possível verificar fortes elementos que indicam uma distorção da realidade, com incitação à atividade de garimpo ilegal, com palavras difamatórias contra os órgãos legitimamente constituídos para o exercício da atividade fiscalizatória ambiental e, também, com estímulo ao uso de armas de fogo pelos garimpeiros.

É de se notar que, de fato, o direito à manifestação do pensamento está sendo exercido com um forte apelo negativo à imagem das instituições policiais e de fiscalização ambiental, o que, por si só, causa prejuízo direto à reputação social desses órgãos e estímulo injustificado à resistência contra a atuação legítima da fiscalização ambiental contra a atividade do garimpo ilegal, que está prevista como crime na Lei nº 9.605/1998 (Lei de Crimes Ambientais), art. 55, nos seguintes termos:

 

Art. 55. Executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem a competente autorização, permissão, concessão ou licença, ou em desacordo com a obtida:

Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa. (grifou-se)

 

Nesse mesmo sentido, destaco que as ações de destruição ou inutilização de instrumentos e equipamentos utilizados para a prática de crimes ambientais tem albergue jurídico no Decreto n. 6.514/2008, perfeitamente vigente na atualidade.

Portanto, o que se denota é que o candidato tenta convencer a população a se insurgir contra a ordem jurídica, fato que sem dúvida pode gerar uma instabilidade social.

Neste ponto, faço a transcrição das falas do candidato ao cargo de Deputado Federal - Cabo Cairo:

 

Olá meu amigo garimpeiro, hoje o meu recado é para você, então fica comigo. O meu nome é Cairo e sou candidato a deputado federal pelo estado de Rondônia. E eu quero, quero e vou lutar por todos os garimpeiros sabe por quê? O garimpeiro não é bandido não amigo. O garimpeiro não aguenta mais ser sacaneado, sacaneado em operações policiais. Meu amigo, está errado esse negócio de chegar na draga do garimpeiro e meter fogo, cara, isso não existe, isso não existe. Colocar fogo em um bem de alguém é crime tipificado no Código Penal, por que o estado pode? Garimpeiro não é bandido não... passa cinco, seis meses longe da família para vir ser sacaneado na p... de uma operação como aconteceu que fiquei sabendo anteontem...

A polícia chega, não é só a polícia, esses órgãos que estão aí só para sacanear Ibama, essas p... dessas ONGs que estão para sacanear financiadas por gringos para vir querer tomar o nosso ouro... O ouro é do garimpeiro, o ouro é nosso, o ouro é do Brasil. Pessoal, e chegando lá em Brasília, eu conto com a ajuda de vocês, vou brigar pro garimpeiro ter Fuzil T4, pistola para poder transitar, porque vocês são alvos de quadrilhas especializadas...

A gente vai trabalhar para facilitar o acesso às armas, o porte, a posse pra vocês, outra coisa, isso só muda lá em Brasília, pessoal... Vou trabalhar também para regularizar, você pega uma guia, você vai ter sua carteirinha de garimpeiro que vai facilitar seu acesso a armas para você se defender, você, o ouro e a sua família. Então a gente tem que criminalizar, vou trabalhar pra quando chegar essas operações, esses órgãos que não servem pra nada, pra não chegar e tocar fogo na sua draga, pra não chegar e tomar o seu ouro, negativo, amigo, ninguém vai tomar não...

Eu vou ser a voz dos garimpeiros, porque eu quero trabalhar no meu mandato de deputado federal, que eu vou chegar lá e conto com a ajuda de você, garimpeiro, de você e de toda a sua família. Eu vou trabalhar em prol do garimpeiro, do agronegócio, do camelô, do cabeleireiro, do cara que vende hambúrguer, do dono do carrinho de pipoca...

Tô falando aqui pra vocês proposta real e chegando lá, conto com a ajuda de vocês, pessoal. Vamos criminalizar, o estado não vai fazer mais e se fizer vai ser crime, e vamos começar a dar nome aos bois... Pessoal, acordem, acordem, votem, vamos pra cima, conto com a ajuda de vocês pra mim chegar lá e mudar essa situação, abraço pessoal. (grifou-se)                 

 

De acordo com os trechos transcritos, é nítido o teor de propaganda eleitoral, assim como o intuito de convencimento dos eleitores no sentido de que ele, se eleito, atuará como parlamentar na condição de “voz dos garimpeiros”. Ainda nesse contexto, destaco que o discurso do candidato contém aquilo que a doutrina e jurisprudência consagraram como “magic words” (palavras mágicas). Dentre elas, faço os seguintes destaques:

1) “conto com a ajuda de você, garimpeiro, de você e de toda a sua família”;

2) “votem”;

3) “conto com a ajuda de vocês pra mim chegar lá e mudar essa situação...”. (grifou-se)

 

Fica caracterizado, assim, o pedido explicito de votos fora do período permitido pelo calendário eleitoral, quando o então pré-candidato faz vídeo direcionado a determinada categoria e solicita o voto e a ajuda para conseguir chegar ao cargo eletivo.

Os autos revelam, ainda, que Cabo Cairo utiliza imagens exemplificativas em seu vídeo, conforme consta do Informativo 1/2022 – NIFA (id. 7965757):

 

 

 

Fica evidenciado o objetivo ilícito de atingir a reputação dos órgãos ou entidades que exercem autoridade pública na esfera ambiental, tudo em desacordo com art. 243, do Código Eleitoral.

No vídeo 2, divulgado em 12 de agosto de 2022 (data anterior à permitida para o início da propaganda eleitoral), em continuidade e atrelado à primeira publicação, também com nítido intuito eleitoreiro  (URL https://www.instagram.com/tv/ChK0Hf0girW/?igshid=MDJmNzVkMjY=), gravado na frente do 1º Batalhão da PM de Rondônia, no endereço Rua Major Amarante, nº 571, Centro, Porto Velho/RO, o noticiado Cabo Cairo cometeu os crimes militares previstos nos arts. 166 e 298 do Código Penal Militar, sendo preso em flagrante pela Corregedoria da Polícia Militar do Estado de Rondônia, prisão esta que fora homologada pelo Poder Judiciário (id.  ).

 Colaciono abaixo os dispositivos legais dos delitos cometidos pelo noticiado:

 

Publicação ou crítica indevida

Art. 166. Publicar o militar ou assemelhado, sem licença, ato ou documento oficial, ou criticar públicamente ato de seu superior ou assunto atinente à disciplina militar, ou a qualquer resolução do Govêrno:

Pena - detenção, de dois meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave.

Desacato a superior

Art. 298. Desacatar superior, ofendendo-lhe a dignidade ou o decôro, ou procurando deprimir-lhe a autoridade:

Pena - reclusão, até quatro anos, se o fato não constitui crime mais grave. (grifou-se)

 

Em audiência de custódia pela prisão em flagrante dos crimes militares, restaram consignadas pelo Juízo as seguintes condições:

[...]

4. DELIBERAÇÃO:

Pelo MM. JUIZ foi proferida a fundamentação da DECISÃO através do sistema de gravação digital, fazendo constar em ata apenas a parte dispositiva, conforme Provimento n. 001/2012-PR-CG: “Vistos. Diante do exposto, considerando os tipos penais e dos antecedentes do custodiado, concedo LIBERDADE PROVISÓRIA a CAIRO TEIXEIRA DA SILVA mediante as seguintes medidas cautelares diversas da prisão: I) comparecer em Juízo a todos os atos processuais a que for intimado; II) não se ausentar da Comarca por mais de 05 (cinco) dias sem a devida autorização judicial; III) na obrigação de abster-se de publicação de temas relacionados à instituição Policial Militar e/ou a seus integrantes nas redes sociais. Neste ato o investigado foi devidamente cientificado sobre toda(s) a(s) imposição(ões) imposta(s), bem como advertido que o não cumprimento dessa(s) obrigação(ões) ensejará na aplicação da prisão cautelar. Serve a presente decisão como ÁLVARA DE SOLTURA e coloque-se o(a) custodiado(a) em liberdade, se por outro motivo não estiver preso(a). Serve, ainda, como TERMO DE COMPROMISSO do investigado, o qual deverá ser devolvido após a lavratura/soltura.

[...]

(assinatura digital) MM. Juiz de Direito Sérgio William Domingues Teixeira – Plantonista (grifou-se)

Nessa mesma trilha da prisão em flagrante por crimes militares, o comando do 1º Batalhão da Polícia Militar em Porto Velho encaminhou o Ofício n. 70.960/2022/PM-1BPMP6, com o seguinte teor:

 

[...]

 

Senhor Corregedor,

Ao tempo que cumprimento Vossa Senhoria, e analisando o vídeo postado em rede social pelo pré-candidato a deputado federal, CB PM RE 100095244 CAIRO TEIXEIRA DA SILVA, da ativa, lotado no 1° BPM e,

Considerando que o vídeo faz duras críticas as operações policiais realizadas contra crimes ambientais praticados por garimpeiros nos rios do estado de Rondônia;

Considerando que a publicação enfatiza e incita a violência dos garimpeiros contra as forças policiais que atuam no combate ao garimpo ilegal nos rios do estado de Rondônia;

Considerando que a postagem incita os garimpeiros que atuam na atividade de garimpo ilegal a não respeitarem a legislação vigente e enfrentarem as forças policiais inclusive com uso de armas de fogo;

Considerando que o vídeo também trouxe críticas a outros órgãos que também atuam na fiscalização da atividade de garimpo ilegal;

Considerando que o teor do vídeo coloca em xeque e descrédito a imagem da Polícia Militar de Rondônia perante as outras forças policiais que também atuam no combate ao garimpo ilegal;

Considerando que o pré-candidato a deputado federal CB PM CAIRO deve se pautar pelos ditames e regulamentos da Polícia Militar de Rondônia, a qual reprova veemente esse tipo de conduta e exposição que macula a imagem da PMRO;

Considerando que o fato foi informando à Corregedoria da PMRO;

Considerando que o pré-candidato a deputado federal CB PM CAIRO estava afastado de suas atividades em decorrência de dispensa médica, entre o período de 14/03/2022 a 01/07/2022, somente retornando apto, em grupo, ao serviço em 02/08/2022, para logo em seguida se afastar por ocasião da descompatibilização eleitoral.

Diante do exposto, apresento o fato para que seja apurado a conduta do pré-candidato a deputado federal CAIRO TEIXEIRA DA SILVA no âmbito da legislação eleitoral vigente.

Sendo o que por ora nos limita, remeto-vos o documento e aguardo a deliberação de Vossa Senhoria, para adoção das medidas que se fizerem necessárias.

 

WILTON NASCIMENTO AMORIM - TEN CEL QOPM

Comandante do 1° BPM

[...] (grifou-se)

 

Na trilha do expediente encaminhado pela Polícia Militar acima transcrito, registra-se que o Código Penal brasileiro tipifica como delito contra a paz pública a incitação ao crime, nos seguintes termos:

 

Incitação ao crime

Art. 286 - Incitar, publicamente, a prática de crime:

Pena - detenção, de três a seis meses, ou multa. (grifou-se)

 

Noutro giro, não bastasse esses graves fatos anteriores, praticados por candidato em período de campanha eleitoral, nos dias 6 e 7 de setembro do corrente ano, durante as manifestações políticas alusivas ao dia da Independência Nacional, o candidato Cabo Cairo apresentou-se portando armamento ou réplica de armamento de grosso calibre (fuzil) durante os atos de cunho eleitoral, conforme fotografias constante de seu perfil Instagram (URL:  https://www.instagram.com/cairo.08/).

Verifica-se que nas imagens e fotografias no ato político de 7 de setembro, constam crianças sendo fotografadas próximas armamento ou réplica de armamento de grosso calibre (fuzil).

Essas imagens foram amplamente divulgadas pelo site Rondonia Ao Vivo (fonte: https://rondoniaovivo.com/noticia/eleicoes2022/2022/09/08/verde-amarelo-candidato-a-deputado-federal-leva-fuzil-para-manifestacao-pro-bolsonaro.html), consoante manchete e destaques abaixo:


De forma complementar ao conteúdo colacionado, o Núcleo de Inteligência em Fontes Abertas da COSE, realizou novas coletas no perfil do candidato Cabo Cairo, as quais constam materializadas no extrato do perfil Instagram   (id. 7981475), cujos links (URLs) das postagem seguem abaixo relacionados:

 

https://www.instagram.com/p/CiOAXJSpmeE/?utm_source=ig_web_copy_link

https://www.instagram.com/reel/CiNDdFlgFyq/?utm_source=ig_web_copy_link

https://www.instagram.com/p/CiOBJK9pRh9/?utm_source=ig_web_copy_link

https://www.instagram.com/p/CiN__NQpLsL/?utm_source=ig_web_copy_link

https://www.instagram.com/p/CiOOuMBJN2O/?utm_source=ig_web_copy_link

https://www.instagram.com/p/CiXJcTVtF_U/?utm_source=ig_web_copy_link

 

Além da gravidade de utilização de arma ou réplica da arma (fuzil) publicamente nos atos de 7 de setembro de 2022, causando um clamor público, destaco também que o Estatuto da Criança e Adolescente (Lei n. 8.069/1990) prescreve que:

 

[...]

Art. 79. As revistas e publicações destinadas ao público infanto-juvenil não poderão conter ilustrações, fotografias, legendas, crônicas ou anúncios de bebidas alcoólicas, tabaco, armas e munições, e deverão respeitar os valores éticos e sociais da pessoa e da família.

[...]

Art. 81. É proibida a venda à criança ou ao adolescente de:

I - armas, munições e explosivos;

[...]

Art. 242. Vender, fornecer ainda que gratuitamente ou entregar, de qualquer forma, a criança ou adolescente arma, munição ou explosivo:

Pena - detenção de seis meses a dois anos, e multa.

Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos. (Redação dada pela Lei nº 10.764, de 12.11.2003)

 

Ainda no que diz respeito à data de 7 de setembro, rememoro, por oportuno, que recentemente o Tribunal Superior Eleitoral, à unanimidade, referendou a decisão monocrática proferida pelo Ministro Benedito Gonçalves, no sentido de que os eventos de comemoração ao dia da independência não podem ser utilizados como palco de realização de atos típicos de campanha eleitoral, já que a finalidade comemorativa não se confunde com atos de cunho meramente políticos ou de promoção pessoal (Processo TSE n. 0601002-78.2022.6.00.0000).

Nessa mesma esteira de raciocínio, também destaco decisão do TRE-SP na qual ficou consignado o dever de dissociação entre a figura do candidato e a figura do militar, proibindo-se, inclusive, a veiculação de propaganda eleitoral com a utilização de fardamento militar (Processo TRE-SP n. 0604311-84.2022.6.26.0000).

Nesse rumo, percebe-se nitidamente o intuito do candidato Cabo Cairo em cometer excessos, desrespeito aos limites legais e sucessivos abusos em atos durante sua campanha eleitoral na internet e nas vias públicas, com fim de obter destaque eleitoral e impulsionar sua candidatura.

O intuito eleitoral das publicações em seu perfil do Instagram fica reforçado nas postagens dos atos de 7 de setembro de 2022, onde o candidato Cabo Cairo utiliza a Hastag #cabocairo9090 em todas as publicações. Além disso, no vídeo de convocação para caminhada da independência o candidato também utiliza a logo de sua candidatura Cabo Cairo 9090 – Deputado Federal e as Hastags #cabocairo9090 #7desetembro #liberdade #independenciadobrasil.

Nesse ponto, destaco que o Código Civil, no art. 186, preceitua que “também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”. 

Importante enfatizar que mesmo sendo titular do direito a manifestação, a liberdade de expressão e a realização de atos de propaganda eleitoral, o candidato Cabo Cairo não pode abusar desse direito, sob pena de praticar ato ilícito, como se demonstra no caso em análise.

Muito importante esclarecer que, no Brasil, não há, no sistema constitucional, direitos ou garantias que se revistam de caráter absoluto, estando todos os cidadãos limitados pela lei. Aplica-se, nesse caso, o brocardo latino “dura lex sed lex”, que traduzido para a língua portuguesa significa “a lei é dura, mas é a lei”, ou seja, em território nacional, a lei é para todos os cidadãos e as cidadãs, em especial, os candidatos e as candidatas.   

Com seus excessos, o postulante ao cargo de deputado federal está ferindo gravemente vários diplomas legais nas áreas ambiental, penal militar, penal comum, civil e eleitoral, como apresentado acima, assim como deverá incidir em infração disciplinar administrativa, pois é militar da ativa da PMRO.

Nesse sentido a jurisprudência do TSE é firme ao assegurar a possibilidade da repressão dos abusivos cometidos em propaganda ou no período eleitoral (Ac. de 17.11.98 no REspe nº 15637, rel. Min. Eduardo Alckmin).

Nesta senda, a Justiça Eleitoral deve garantir o modo civilizado de vida em sociedade, a afirmação da democracia e a vivência dos valores constitucionais, exigindo que a ocupação dos postos político-governamentais se dê de forma lícita, honesta e autêntica, com dever de reprimir os excessos e abusos praticados pelos postulantes aos cargos públicos.  

Importa frisar que, se a responsabilização e a consequente imposição de sanção visam proteger os bens juridicamente tutelados pelo Direito Eleitoral, também têm o sentido de prevenção geral, notadamente no que se refere à defesa da ordem jurídico-eleitoral e à intimidação social, de sorte a se desestimular a prática de condutas ilícitas.

No mesmo sentido caminha a Resolução TSE n. 23.610/2019, que assim estabelece:

 

Art. 22. Não será tolerada propaganda, respondendo a pessoa infratora pelo emprego de processo de propaganda vedada e, se for o caso, pelo abuso de poder ( Código Eleitoral, arts. 222 , 237 e 243, I a X ; Lei nº 5.700/1971 ; e Lei Complementar nº 64/1990, art. 22 ): (Redação dada pela Resolução nº 23.671/2021)

IV - de incitamento de atentado contra pessoa ou bens;

X - que caluniar, difamar ou injuriar qualquer pessoa, bem como atingir órgãos ou entidades que exerçam autoridade pública;

[...]

Art. 38. A atuação da Justiça Eleitoral em relação a conteúdos divulgados na internet deve ser realizada com a menor interferência possível no debate democrático (Lei nº 9.504/1997, art. 57-J).

§ 1º Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, as ordens judiciais de remoção de conteúdo divulgado na internet serão limitadas às hipóteses em que, mediante decisão fundamentada, sejam constatadas violações às regras eleitorais ou ofensas a direitos de pessoas que participam do processo eleitoral.

[...]

§ 4º A ordem judicial que determinar a remoção de conteúdo divulgado na internet fixará prazo razoável para o cumprimento, não inferior a 24 (vinte e quatro) horas, e deverá conter, sob pena de nulidade, a URL e, caso inexistente esta, a URI ou a URN do conteúdo específico, observados, nos termos do art. 19 da Lei nº 12.965/2014 , o âmbito e os limites técnicos de cada provedor de aplicação de internet.

 

Por derradeiro, em relação ao poder de polícia eleitoral, trago a colação os parágrafos do art. 41 da Lei n. 9504/97:

 

§ 1º O poder de polícia sobre a propaganda eleitoral será exercido pelos juízes eleitorais e pelos juízes designados pelos Tribunais Regionais Eleitorais.            (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

 

§ 2º O poder de polícia se restringe às providências necessárias para inibir práticas ilegais, vedada a censura prévia sobre o teor dos programas a serem exibidos na televisão, no rádio ou na internet. (grifou-se)            

Diferentemente da proibição incondicional de ingerência na opinião, o artigo 19(3) do Pacto [Internacional dos Direitos Civis e Políticos] impõe três condições segundo as quais o exercício do direito à liberdade de expressão pode estar sujeito a restrições por parte dos Estados. Essas condições devem ser levadas a efeito de maneira estrita (cf. a Observação Geral nº 34 do Comitê de Direitos Humanos, parágrafos 21 a 36). O art. 19(3) dispõe que o exercício do direito à liberdade de expressão envolve deveres e responsabilidades especiais e pode estar sujeito a certas restrições, que deverão, contudo, estar expressamente fixadas em lei e ser necessárias para: a) assegurar a proteção aos direitos ou à reputação de outrem; a proteção da segurança nacional, a ordem pública ou à saúde e moral públicas. O art. 20 do Pacto também estabelece que toda propaganda em favor da guerra e toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitação à discriminação, à hostilidade ou à violência estarão proibidos por lei (Report of the Special Rapporteur on the promotion and protection of the right to freedom of opinion and expression. Organização das Nações Unidas: A/71/373, 2016).
As liberdades públicas não são incondicionais, por isso devem ser exercidas de maneira harmônica, observados os limites definidos na própria Constituição Federal (CF, artigo 5º, § 2º, primeira parte). O preceito fundamental de liberdade de expressão não consagra o "direito à incitação ao crime", dado que um direito individual não pode constituir-se em salvaguarda de condutas ilícitas, como sucede com os delitos mencionados.

Assim, examinada a questão à luz dos elementos de prova constantes dos autos, entendo presentes os requisitos para atuação desta Justiça Especializada no uso do poder de polícia eleitoral e do poder geral de cautela estabelecidos pela legislação de regência.

 

DISPOSITIVO

Ante o exposto e com fundamento nos §§ 1º e 2º do art. 41, da Lei n. 9.504/97, nos arts. 297 e 301 do Código de processo Civil combinados com art. 243, III e IX, do Código Eleitoral, DETERMINO a intimação do candidato CAIRO TEIXEIRA DA SILVA – CNPJ nº CNPJ -47.528.543/0001-40 - CARGO: DEPUTADO FEDERAL, com urgência, para que promova, no prazo de 24h (vinte e quatro horas) a contar da notificação, a remoção das postagens em desacordo com a legislação eleitoral, constantes dos endereços URLs (Uniform Resource Locator) abaixo indicados:

 

https://www.instagram.com/reel/ChBfQPuD0uo/?igshid=MDJmNzVkMjY

https://instagram.com/cairo.08?igshid=YmMyMTA2M2Y

https://www.instagram.com/p/CiOAXJSpmeE/?utm_source=ig_web_copy_link

https://www.instagram.com/reel/CiNDdFlgFyq/?utm_source=ig_web_copy_link

https://www.instagram.com/p/CiOBJK9pRh9/?utm_source=ig_web_copy_link

https://www.instagram.com/p/CiN__NQpLsL/?utm_source=ig_web_copy_link

https://www.instagram.com/p/CiOOuMBJN2O/?utm_source=ig_web_copy_link

https://www.instagram.com/p/CiXJcTVtF_U/?utm_source=ig_web_copy_link

 

I) Determino a intimação do candidato noticiado, com urgência, para que se abstenha de realizar novas postagens com o conteúdo reprimido nesta decisão, bem como se abstenha de utilizar ostensivamente arma de fogo ou réplica de armamento em atos de propaganda ou campanha eleitoral, sob pena do crime de desobediência previsto no art. 347, do Código Eleitoral, busca e apreensão da(s) arma(s) ou réplica(s) de armamento(s) (CPP, art. 240, §1º, “d” e “h”)  e remoção do conteúdo irregular ou bloqueio judicial dos seus perfis na rede social Instagram, em observância à legislação eleitoral. 

II) Considerando a gravidade dos fatos narrados para normalidade das eleições e as disposições dos arts. 127, caput, e 129, III e VIII, da CF/88 e do art. 22, da LC nº 64/90 combinados com art. 6º, § 3º e art. 7º, § 2º, da Resolução TSE n. 23.610/2019, intime-se o Excelentíssimo Procurador Regional Eleitoral de Rondônia (MPE), para ciência desta decisão e adoção das providências que considerar pertinentes.

III) Com fundamento nos arts. 1º, 3º e 6º, da Res. TSE 23.640/2021 combinados com o art. 5º, II e §3º, do Código de Processo Penal, DETERMINO o imediato encaminhamento das peças constantes destes autos à Polícia Federal em Porto Velho para realização das diligências e providências legais cabíveis.

IV) Determino a remessa todas as peças deste processo à Promotoria da Infância e Juventude de Porto Velho, para conhecimento e adoção da medida que entender cabível.

V) Comunique-se à Vara da Auditoria Militar de Porto Velho acerca da presente decisão, fazendo referência ao Processo PJe n. 7060652-03.2022.8.22.0001.

VI) Oficie-se à Corregedoria Geral e ao Comando do 1º Batalhão da Polícia Militar do Estado de Rondônia, comunicando da presente decisão e das medidas adotadas nestes autos.

Providencie-se o necessário para efetivação desta decisão.

Após as providências, retornem-me conclusos.

Publique-se. Intimem-se.

Cumpra-se.   

 

Porto Velho, 23 de setembro de 2022.

 

 

Assinado digitalmente por:

Desembargador Miguel Monico Neto

Corregedor Regional Eleitoral

 

 

[1] (Fuzil T4 Calibre 5.56 - https://taurusarmas.com.br/pt/produtos/armas-longas/fuzilt4-polimero-115)