PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO AMAZONAS

Gabinete do Desembargador Eleitoral FABRÍCIO FROTA MARQUES


REGISTRO DE CANDIDATURA  - DRAP nº. 0600203-24.2022.6.04.0000

REQUERENTE: PARTIDO NOVO - MANAUS - AM - ESTADUAL

Advogados do(a) REQUERENTE: PAULO AUGUSTO FERNANDES FORTES - MG131667, LUCAS BESSONI COUTINHO DE MAGALHÃES - MG139537

RELATOR: Desembargador Eleitoral FABRÍCIO FROTA MARQUES

 

 

 

DECISÃO

 

 

Vistos e examinados.

Trata-se de Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários - DRAP do Partido NOVO, relativo ao cargo de Deputado Federal, nas eleições gerais de 2022.  

Em atenção ao que dispõe a mencionada resolução de regência, foi publicado Edital com o pedido de registro no DJEAM, transcorrendo in albis o prazo para impugnação.

A Secretaria Judiciária anotou a regularidade dos diversos requisitos formais (ID 11350327), salvo a obediência à cota de gênero, razão pela qual intimou, de ofício, a agremiação (ID 11352278).

O partido argumentou que o fato de haver apresentado apenas um candidato a cota de gênero deveria ser mitigada, conforme entendimento de outros regionais. Destacou também que a Consulta n. 0600251-91.2022.6.00.0000 apreciada pelo TSE, que impossibilitou a candidatura singular, aplica-se apenas ao caso da federação e não para o caso de partidos isolados (ID 11353732).

O Ministério Público Eleitoral ofertou parecer escrito, opinando pelo indeferimento do pedido com base na ausência da cota de gênero (ID 11366177).

É o breve relatório. 

Decido.

De acordo com a Res. TSE n. 23.609/2019, o relator poderá decidir monocraticamente os pedidos de registro de candidatura nos quais não tenha havido impugnação e/ou notícia de inelegibilidade (art. 62)[1].

Passo a analisar do único ponto controvertido no DRAP, qual seja, a obrigatoriedade da cota de gênero no caso de o partido apresentar candidatura singular ao cargo proporcional.

Acerca do tema, dispõe a Resolução de regência:

Art. 17. Cada partido político ou federação poderá registrar candidatas e candidatos para a Câmara dos Deputados, a Câmara Legislativa, as Assembleias Legislativas e as Câmaras Municipais no total de até 100% (cem por cento) do número de lugares a preencher mais 1 (um) ( Lei nº 9.504/1997, art. 10, caput ). (Redação dada pela Resolução nº 23.675/2021)

§ 2º Do número de vagas resultante das regras previstas neste artigo, cada partido político ou federação preencherá o mínimo de 30% (trinta por cento) e o máximo de 70% (setenta por cento) para candidaturas de cada gênero ( Lei nº 9.504/1997, art. 10, § 3º ). (Redação dada pela Resolução nº 23.675/2021)

(...)

§4º-A No caso de federações, o disposto nos §§ 2º a 4º deste artigo se aplica tanto à lista de candidaturas proporcionais globalmente considerada quanto às indicações feitas por cada partido para compor a lista. (Incluído pela Resolução nº 23.675/2021)

De um lado, respeitada voz nas quadras eleitoralistas, o professor Rodrigo Lopes Zílio, deduz que “no caso de um partido lançar apenas um único candidato ao pleito proporcional - hipótese excepcional em que esse candidato singular pode ser de qualquer do gêneros sem a possibilidade de se oferecer óbice ao deferimento do DRAP”   (2022, p. 378).

No entanto, recentemente, precisamente em 30/06/2022, o Tribunal Superior Eleitoral apreciou questão análoga. Para melhor compreensão, importante se faz destacar alguns trechos do voto condutor, sob a Relatoria de Sua Excelência o Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES:

Observo que os questionamentos – que versam sobre os critérios de preenchimento de candidaturas de gênero – partem da premissa de que a agremiação integrante da federação indicaria apenas 1 (uma) candidatura.

Especificamente quanto ao mérito da presente consulta, entendo que – notadamente após a constitucionalização da ação afirmativa que determinou aos partidos que recebem recursos públicos a destinação mínima de 30% do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) e do Fundo Partidário, bem como o tempo de propaganda gratuita no rádio e na televisão às candidaturas femininas (EC nº 117/2022) – o ordenamento jurídico vigente não permite qualquer interpretação que possibilite ao partido político esvaziar a determinação constitucional que visa diminuir a disparidade de gênero no cenário político-eleitoral brasileiro.

(...)

A indicação de 1 única candidatura pelo partido político desnaturará a mens legis que norteou a edição das normas que obrigam as agremiações a fomentar as candidaturas de gênero.

(Consulta n. 0600251-91.2022.6.00.0000, julgada em 30/06/2022, voto disponível em 16/08/2020).

Observa-se, pois, que o TSE, por via reflexa, inadmite, em qualquer hipótese, a candidatura única, isso porque não haveria condições aritméticas de respeitar a citada ação afirmativa.

Nada obstante, o partido argumenta que o mencionado precedente seria aplicável apenas para o caso das federações, tendo em vista que este complexo ideológico deve respeitar a cota de gênero tanto no interior dos partidos que a compõe, bem como no âmbito de toda a federação, a teor do que dispõe o art. 17, § 4º-A da citada resolução de regência.

O argumento não merece prosperar. Para melhor compreensão, transcrevo novamente trechos do voto do precedente em análise:

Os consulentes indagam, ainda, se o atendimento do percentual mínimo de candidaturas por gênero, previsto no inciso I do parágrafo único do art. 12 da Res.-TSE nº 23.670/2021, poderia ser considerado somente na lista da federação de partidos.

(...)

A partir da leitura da mencionada regra, cada partido integrante da federação deverá apresentar, para a composição da lista global, candidaturas por gênero correspondentes ao mínimo de 30%.

Como se vê, a Excelsa Corte Eleitoral afastou a possibilidade de a federação respeitar a cota de gênero globalmente e deixar de cumprir o mandamento nos partidos que a compõe.

Entretanto, para o caso de partidos isolados, o precedente apresenta-se de forma mais estrita, tendo em vista que a agremiação não teria qualquer possibilidade global de respeito ao sistema de ações afirmativas.

E nem se alegue surpresa. O TSE, a cada eleição, caminha no sentido de cada vez menos flexibilizar o cumprimento dessas ações afirmativas, ainda que o caso apresente questões peculiares. Nesse sentido, cito diversos precedentes: Respe n. 19392, DJe 04/10/2019, n. 2939, DJe n. 06/11/2012 e n. 78432, DJe 12/08/2010.

Desses precedentes, destaco o importante aresto em que a Excelsa Corte rechaçou o argumento de ausência de mulheres “disponíveis” em lançar suas candidaturas. Confira-se:

REGISTRO DE CANDIDATURAS. PERCENTUAIS POR SEXO.

1.  Conforme decidido pelo TSE nas eleições de 2010, o § 3º do art. 10 da Lei nº 9.504/97, na redação dada pela Lei nº 12.034/2009, estabelece a observância obrigatória dos percentuais mínimo e máximo de cada sexo, o que é aferido de acordo com o número de candidatos efetivamente registrados.

 2.  Não cabe a partido ou coligação pretender o preenchimento de vagas destinadas a um sexo por candidatos do outro sexo, a pretexto de ausência de candidatas do sexo feminino na circunscrição eleitoral, pois se tornaria inócua a previsão legal de reforço da participação feminina nas eleições, com reiterado descumprimento da lei.

 3.  Sendo eventualmente impossível o registro de candidaturas femininas com o percentual mínimo de 30%, a única alternativa que o partido ou a coligação dispõe é a de reduzir o número de candidatos masculinos para adequar os respectivos percentuais, cuja providência, caso não atendida, ensejará o indeferimento do demonstrativo de regularidade dos atos partidários (DRAP).

(Recurso Especial Eleitoral nº 2939, Acórdão de 06/11/2012, Relator(a) Min. ARNALDO VERSIANI LEITE SOARES, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 06/11/2012 RJTSE - Revista de jurisprudência do TSE, Volume 24, Tomo 1, Data 06/11/2012, Página 298 )

Nesse particular, anoto que o partido dispõe de 234 (duzentos e trinta e quatro) filiados no estado, conforme consulta no portal de estatística do TSE[2], sendo improvável que a agremiação não disponha em suas fileiras de, no mínimo, uma dupla de candidatos de gêneros distintos, a fim de obedecer a cota mínima de 30% (trinta por cento).

Essa evolução jurisprudencial obedece às mudanças legislativas. Nesse passo, o §3º do art. 10 da Lei nº 9.504/97, à partir da redação dada pela Lei nº 12.034/2009, passou a dispor o termo imperativo “preencherá” no lugar da locução anterior "deverá reservar". Confira-se o comparativo, in verbis:

Redação originária

§ 3º Do número de vagas resultante das regras previstas neste artigo, cada partido ou coligação deverá reservar o mínimo de trinta por cento e o máximo de setenta por cento para candidaturas de cada sexo.

Redação dada pela Lei 12.034/2009

§ 3º  Do número de vagas resultante das regras previstas neste artigo, cada partido ou coligação preencherá o mínimo de 30% (trinta por cento) e o máximo de 70% (setenta por cento) para candidaturas de cada sexo.

Portanto, é indubitável que, tanto o legislador, quanto à partir do histórico dos entendimentos do TSE, esta ação afirmativa de gênero não pode ser relativizada, sob pena de se esvaziar a política de igualdade de gêneros nas eleições.

Ante o exposto, em harmonia com o parecer ministerial, INDEFIRO o Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários - DRAP do Partido NOVO, relativo ao cargo de Deputado Federal, nas eleições gerais de 2022.  

À SJD para as providências de seu ofício.

Publicação e intimações necessárias.

Cumpra-se

Manaus/AM, 19 de agosto de 2022.

 

 

Desembargador Eleitoral FABRÍCIO FROTA MARQUES

 Relator

 

 


[1] Res. TSE n. 23.609/2019

Art. 62. A relatora ou o relator poderá decidir monocraticamente os pedidos de registro de candidatura nos quais não tenha havido impugnação e/ou notícia de inelegibilidade.