TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DE MATO GROSSO DO SUL
JUÍZO DA 019ª ZONA ELEITORAL DE PONTA PORÃ MS

 

AÇÃO PENAL ELEITORAL nº  0600189-92.2021.6.12.0019
PROCEDÊNCIA: PONTA PORÃ - MATO GROSSO DO SUL
AUTOR: PROMOTOR ELEITORAL DO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL
REU: ANA DURE DA SILVA
ADVOGADO: ADRIAN DYEGO SILVEIRA PEREIRA - OAB/MS20673
REU: CLAUDIA FERREIRA MACIEL
ADVOGADO: UDIESLLEY FRANKLIN DE ASSIS XIMENES - OAB/MS15396
REU: JOAO BATISTA DE ANDRADE
ADVOGADO: UDIESLLEY FRANKLIN DE ASSIS XIMENES - OAB/MS15396
TERCEIRA INTERESSADA: CRISTINA CORDOBA PAEZ
ADVOGADO: FLAVIO ALVES DE JESUZ - OAB/MS11502


Juíza Eleitoral: THIELLY DIAS DE ALENCAR PITTHAN

 

SENTENÇA

 

 

Vistos.

O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL denunciou ANA DURÉ DA SILVA, CLÁUDIA FERREIRA MACIEL e JOÃO BATISTA DE ANDRADE qualificados nos autos, como incursos no art. 326-A da Lei 4.737/65, porque nos dias 26 de novembro de 2020 e 02 de dezembro de 2020, nesta Comarca, eles deram causa a processos judiciais (AIJES 0600457-81.2020.6.12.0052 e 0600592-95.2020.6.12.0019), atribuindo a Rudi Paetzold a prática de crimes de que o sabem inocente, com finalidade eleitoral.

Consta da peça acusatória que: 'nos dias 26 de novembro de 2020 e 02 de dezembro de 2020, nesta Comarca, os denunciados Ana Duré da Silva, Cláudia Ferreira Maciel e João Batista de Andrade deram causa a processos judiciais (AIJEs 0600457-81.2020.6.12.0052 e 0600592 95.2020.6.12.0019), atribuindo a Rudi Paetzold a prática de crime de que o sabem inocente, com finalidade eleitoral. Segundo restou apurado, Cláudia Ferreira Maciel e João Batista de Andrade procuraram a denunciada Ana Duré, e também o seu pai José Geraldo da Silva1 e Cristina Córdoba Paez2, pedindo que prestassem declaração falsa em cartório extrajudicial, dizendo que receberam dinheiro de Rudi Paetzold em troca de voto, pois, assim, Rudi Paetzold perderia o mandato e eles assumiriam. Em troca, Cláudia Ferreira Maciel e João Batista de Andrade prometeram a José Geraldo um salário e uma casa, a Cristina Cordoba Paez um emprego e a Ana Duré da Silva um terreno e um emprego. Ato contínuo, José Geraldo, Cristina Córdoba e a denunciada Ana Duré da Silva compareceram ao Serviço Notarial e Tabelionato de Protesto de Títulos da Comarca de Amambai para declarar que o Prefeito Rudi ofereceu dinheiro a eles em troca de voto. José Geraldo da Silva declarou que há aproximadamente cinco dias antes da eleição o Prefeito Rudi compareceu em sua residência pedindo voto. Na oportunidade, o acusado disse que votaria nele. Segundo ele, Rudi foi até o carro e voltou com R$ 300,00, do qual entregou R$ 100,00 para ele e R$ 100,00 para cada uma de suas filhas. Rudi ainda disse que, após a votação, o denunciado tinha que ir ao galpão, localizado no Paraguai, para pegar mais R$ 100,00. Que todo mundo que votou em Rudi passava no referido barracão para receber o dinheiro prometido por ele. Cristina Cordoba Paez declarou que Rudi foi até a casa de sua mãe entregar santinho e pedir voto. Na ocasião, ela disse que não votaria nele. Posteriormente, Cristina compareceu à Prefeitura e Rude lhe ofereceu em torno de R$ 300,00, pedindo sua "ajuda". Depois de oito dias, aproximadamente, ela encontrou novamente com Rudi, que enrolou uma nota de R$ 100,00 em um santinho e lhe entregou, dizendo "eu conheço bem você". Ana Duré da Silva declarou que há três dias da eleição estava na chácara de sua irmã quando o candidato Rudi e Sebastiana chegaram e começaram a conversar. Rudi foi ao carro e voltou com R$ 300,00, do qual entregou R$ 100,00 para ela, R$ 100,00 para seu genitor e R$ 100,00 para sua irmã. Na oportunidade, Sebastiana solicitou o título de eleitor alegando que estava fazendo um cadastro. Rude orientou a acusada a votar bem cedo e depois ir até o galpão, localizado no Paraguai, apresentar o comprovante de votação e pegar mais R$ 100,00. Em juízo (AIJEs 0600457-81.2020.6.12.0052 e 0600592 95.2020.6.12.0019), José Geraldo da Silva e Cristina Cordoba Paez declararam que não é verdade que Rudi ofereceu-lhes dinheiro em troca de voto. Ambos disseram que a candidata ao cargo de Prefeita, Claudinha, e seu vice, João Batista de Andrade, pediram para eles prestarem declarações no cartório extrajudicial, argumentando que dessa forma assumiriam a Prefeitura da cidade e, com isso, eles seriam beneficiados. A testemunha Vandelcleia Duré da Silva disse na Delegacia de Polícia que Claudinha e seu vice pediram para sua irmã Ana e seu genitor, ora denunciados, comparecerem ao cartório para declarar falsamente que tinham recebido dinheiro do candidato Rudi em troca de votos.'

Recebida a denúncia (f. 26), os réus João e Cláudia foram citados pessoalmente (f. 34 e 75-6) e apresentaram resposta à acusação às f.40-3 e 79-82, respectivamente; enquanto a ré Ana, por hora certa (f. 63-5), sendo-lhe nomeado advogado dativo à f. 68 e apresentada defesa preliminar às f. 71-3. Posteriormente, a ré Ana constituiu advogado e se manifestou às f.84-7. Por fim, diante da renúncia do advogado constituído, o dativo reassumiu sua defesa (f. 111).

Os requerimentos apresentados nas manifestações defensivas foram indeferidos, nos termos da decisão de f. 93.

Na instrução, foi colhido o depoimento de duas informantes e uma testemunha, e interrogados os réus (f. 162 e 177).

Em alegações finais, o Ministério Público requereu a condenação, nos termos da denúncia (f. 180-6); a Defesa dos réus Ana, Cláudia e João, a absolvição, respectivamente, às f. 187-92 e f. 193-9.

É o relatório. Decido.

A materialidade está provada pela cópia das escrituras públicas de falso teor (ID 101535542 – f. 09/11, ID 101547780 – f. 74), pela cópia das AIJEs nº 0600457-81.2020.6.12.0052 e nº 0600592-95.2020.6.12.0019 (ID 101546796) instauradas em desfavor da vítima e pela prova oral. E, a autoria é certa e recai sobre os réus.

A vítima disse que, após as eleições, teve conhecimento de que os réus compareceram ao cartório de Coronel Sapucaia e de Amambai para firmarem declaração de conteúdo falso em seu prejuízo, mas não se recorda de detalhes do ocorrido. É adversário político de Cláudia e de João, que, à época, foram candidatos aos cargos de prefeita e de vice-prefeito. Não ofereceu qualquer benefício a Ana e não a conhecia pessoalmente.

A informante Valdelcleia Duré da Silva disse que a ré Cláudia foi até a casa de sua irmã Ana, também ré, e a levou, assim com a seu pai, José, ao cartório de Coronel Sapucaia para fazerem o documento, mas somente conseguiram registrá-lo em Amambai. Cláudia e João prometeram dinheiro e uma casa, se ganhassem a eleição. Induzidos por Cláudia e por João, Ana e seu pai prestaram declaração falsa, no sentido de que Rudi os teria procurado e oferecido dinheiro em troca de voto. Na época, Cláudia era candidata à prefeita e, João, a vice. Não ouviu comentários sobre compra de votos em Coronel Sapucaia, na época.

A informante Cristina Cordoba Paes disse que foi procurada por Cláudia para prestar declaração falsa, no sentido de que Rudi teria lhe oferecido dinheiro em troca de voto. Lavrou a declaração no cartório de Amambai. Cláudia lhe prometeu um emprego e uma casa, se ganhasse as eleições. Não sabe se Cláudia fez a mesma proposta para Ana e para José. Não chegou a ter contato com Rudi no período eleitoral e a declaração que prestou é falsa. Não chegou a receber os benefícios. Não teve contato com Rudi nem com pessoas ligadas a ele. Trabalhou como fiscal na escola Coronel no dia das eleições. Ouviu comentários sobre compra de votos nas eleições de Coronel Sapucaia. Cláudia a levou ao cartório.

A ré Ana confessou ter declarado falsamente que Rudi teria tentado comprar seu voto, porque o réu João lhe ofereceu uma casa e um trabalho em troca disso. A ré Cláudia a levou até o cartório de Amambai para prestar a declaração. Alugava uma casa de João e ele a procurou com essa proposta, dizendo que ele e Cláudia ganhariam a eleição se ela aceitasse acusar falsamente Rudi e então lhe dariam a casa e o emprego prometidos. Seu ex-marido, sua irmã e seu pai, José Geraldo, tiveram conhecimento do ocorrido. Seu pai também recebeu a mesma proposta e lhe foi prometido um salário mensal e uma casa. Não chegaram a receber os benefícios. O réu João Batista levou seu pai até o cartório de Amambai. Cláudia a levou até Amambai por três vezes e somente na última conseguiu registrar a declaração. Em todas as oportunidades, havia outras pessoas no carro e, ao longo do trajeto, Cláudia dava instruções sobre o que deveriam fazer. Cláudia era candidata à prefeita e, João, a vice-prefeito. Conhecia João e Cláudia há bastante tempo. Depois do ocorrido, romperam o contato. Não mora mais na casa de João Batista, porque tiveram um desentendimento alheio às eleições. Não é filiada a partido político e nunca trabalhou nas eleições. Não é verdade que recebeu dinheiro de Rudi em troca de seu voto.

A ré Cláudia nega o fato que lhe é imputado. Na época, era candidata à prefeita, João era seu vice e, Rudi, um dos candidatos da oposição. Não incentivou os envolvidos a prestarem qualquer declaração. Acredita que o objetivo deles é somente o de prejudicá-la. As pesquisas eleitorais apontavam sua vitória e, com a derrota nas urnas, passou a ser cobrada por seus apoiadores para a adoção de providências a fim de reverter esse resultado. Orientou-se com advogados e então explicou a seus apoiadores que isso somente seria possível com a produção de provas concretas de eventual fraude por parte da chapa vencedora, mediante lavratura de ata notarial. Estava ciente de que a reversão do resultado não seria possível, porque nunca aconteceu em Coronel Sapucaia. Não se recorda para quantas pessoas repassou essa informação. A ré Ana, Cristina e José Geraldo são parentes do réu João Batista e trabalharam como cabo eleitoral, por isso se recorda deles. Não os transportou em seu carro até Amambai para que realizassem a declaração em cartório, mas transporta diversas pessoas, com frequência, porque Coronel Sapucaia ainda depende muito de Amambai. Não se recorda de tê-los transportado em qualquer oportunidade, mas nunca esteve no cartório para essa finalidade. Somente orientou as pessoas, mas não as incentivava a registrar ata notarial. Em Coronel Sapucaia, há grande movimentação de pessoas durante o pleito eleitoral, para possível compra de voto, em um galpão que fica no Paraguai e que, na eleição de 2020, pertencia a pessoas ligadas a candidato de oposição. Ouviu pela cidade que os envolvidos mudaram a versão inicialmente apresentada porque receberam benefícios para isso. Alguns trabalharam na Prefeitura, outros abriram estabelecimentos comerciais.

O réu João nega o fato que lhe é imputado. Disse que a ré Cláudia comentou sobre as reivindicações de seus eleitores para a adoção de providências quanto à compra de votos, que influenciou no resultado das eleições, e sugeriu a ela que procurasse um advogado. Cristina, Ana e José Geraldo estavam entre as pessoas que o procuraram. Não orientou as pessoas sobre a declaração em cartório, porque não tinha conhecimento a esse respeito. É casado com a madrinha da ré Ana Duré e era concunhado de José Geraldo. Afastou-se de Ana. Depois dos fatos, não teve mais contato com José Geraldo, porque ele fora para fazenda. Havia cedido uma casa para Ana morar, para que ela pagasse água e luz, mas ela não pagou. Na época dos fatos, era candidato a vice-prefeito. Nunca levou Ana nem José Geraldo ao cartório em Amambai. Sua chapa perdeu a eleição por pouco mais de cem votos. Acredita que Ana, Cristina e José Geraldo voltaram atrás quanto às declarações inicialmente prestadas, porque foram pagos pelo candidato adversário. Não pagou qualquer valor para eles fossem ao cartório prestar as declarações sobre a suposta compra de voto. Há compra de votos em um galpão que fica no Paraguai.

A ré Ana é confessa. Por outro lado, os réus Cláudia e João negaram a prática dos fatos. Mas, a negativa não se sustenta, especialmente diante das declarações prestadas pelas informantes e também pela ré Ana, que narraram o ocorrido com riqueza de detalhes, demonstrando de forma cabal que eles, em concurso, deram causa à ação de investigação judicial eleitoral em desfavor dos adversários políticos, os quais sabiam serem inocentes, com o fim de cassar a chapa contrária e lograrem assumir a administração municipal. Inclusive, Cristina também foi investigada pelo mesmo fato, confessou e firmou acordo de não persecução penal. Além disso, o suposto benefício auferido por Ana, por Cristina e por José Geraldo para mudarem a versão inicialmente apresentada não foi comprovado.

Assim, provadas autoria e materialidade, e não existindo causa que exclua o crime ou isente os réus de pena, a condenação é medida de rigor.

Ante o exposto, julgo PROCEDENTE a pretensão punitiva constante da denúncia para condenar ANA DURÉ DA SILVA, brasileira, nascida em 19/09/1990, filha de Simone Dure e José Geraldo da Silva, portadora do RG nº 2069981 SSP/MS, inscrita no CPF 060.008.091-90, residente e domiciliada na Rua João Basílio de Oliveira, nº 200, Bairro Jardim Brasília, em Coronel Sapucaia/MS; CLÁUDIA FERREIRA MACIEL, brasileira, nascida em 19/01/1978, filha de Cleonice Ferreira Maciel e Jose Maciel, inscrita no CPF nº 849.342.391-20, residente e domiciliado na Rua Fortunado de Oliveira, nº 435, Bairro Centro, em Coronel Sapucaia/MS; e JOÃO BATISTA DE ANDRADE, brasileiro, nascido em 04/04/1983, filho de Maria Margarida Pereira de Andrade e Antonio Eufrazino de Andrade Filho, portador do RG nº 1472926 SSP/MS, residente e domiciliado na Rua João Pance de Arruda, nº 142, Bairro Centro, em Coronel Sapucaia/MS; na sanção do art. 326-A, do Código Eleitoral.

À dosimetria unificada, em razão da similitude das circunstâncias.

Atentando-se, pois, para as diretrizes do art. 59 do Código Penal, todas favoráveis, fixo a pena-base em 2 anos de reclusão e 1 dia-multa. As circunstâncias são neutras uma vez que a culpabilidade foi normal ao tipo; os réus não registram antecedentes; sem elementos para valoração negativa de sua conduta social; não há nos autos elementos técnicos para aferição de sua personalidade; os motivos são próprios da espécie; as circunstâncias são comuns; as consequências, próprias dos delitos; e o comportamento da vítima não tem aptidão para influir na exasperação da pena.

Em relação à ré Ana Duré da Silva, deixo de reduzir a pena pela atenuante da confissão espontânea, porque aplicada no mínimo legal. Quanto aos réus Cláudia Ferreira Maciel e João Batista de Andrade, não há atenuantes. Não há agravantes.

Não há causas de diminuição e de aumento de pena.

À míngua de outra circunstância, genérica ou especial, de aumento ou de diminuição, a pena fica definitivamente fixada em 2 anos de reclusão e 1 dia-multa, em regime inicial aberto (art. 33, §2º, 'c', CP), que não é alterado pela detração por ser o regime mais brando.

Para a pena de multa, fixo o valor do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, a ser corrigido monetariamente até o dia do pagamento (artigo 286, §1º, do Código Eleitoral).

Preenchidos os requisitos legais (art. 44, CP), substituo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direito, a serem fixadas na fase de execução.

Prejudicado o "sursis".

Em razão do regime inicial e da conversão em restritiva de direitos, deixo de decretar prisão preventiva (art. 387, §1º, CPP).

Após o trânsito em julgado, lance-lhes o nome no rol dos culpados; façam-se às comunicações necessárias; encaminhem-se eventuais objetos apreendidos; e expeça-se guia de recolhimento.

Condeno os réus no pagamento de custas processuais.

Oportunamente, arquivem-se, com as cautelas de praxe.

P. R. I.

Ponta Porã (MS), 14 de fevereiro de 2025.

 

THIELLY DIAS DE ALENCAR PITTHAN

 Juiz(a) da 019ª ZONA ELEITORAL DE PONTA PORÃ MS