TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DE MATO GROSSO DO SUL
CARTÓRIO DA 36ª ZONA ELEITORAL DE CAMPO GRANDE MS

 

AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL nº  0600364-30.2024.6.12.0036
PROCEDÊNCIA: CAMPO GRANDE - MATO GROSSO DO SUL
REQUERENTE: PARTIDO SOCIAL DEMOCRATA CRISTÃO - COMISSÃO PROVISÓRIA - MUNICIPAL
ADVOGADO: ROUSTAN MAGNO DA SILVA AMARILLA FILHO - OAB/MS17179
ADVOGADO: NEWLEY ALEXANDRE DA SILVA AMARILLA - OAB/MS2921
ADVOGADA: LUIZA CAROLEN CAVAGLIERI FACCIN - OAB/MS13757
ADVOGADO: RAPHAEL SERGIO RIOS CHAIA JACOB - OAB/MS10889
REQUERENTE: DIRETÓRIO MUN. DO PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA - PDT
ADVOGADO: ROUSTAN MAGNO DA SILVA AMARILLA FILHO - OAB/MS17179
ADVOGADO: NEWLEY ALEXANDRE DA SILVA AMARILLA - OAB/MS2921
ADVOGADA: LUIZA CAROLEN CAVAGLIERI FACCIN - OAB/MS13757
ADVOGADO: RAPHAEL SERGIO RIOS CHAIA JACOB - OAB/MS10889
INVESTIGADA: ADRIANE BARBOSA NOGUEIRA LOPES
ADVOGADO: JOSE RIZKALLAH JUNIOR - OAB/MS6125
ADVOGADO: AUGUSTO MIYASATO FOGACA DE SOUZA - OAB/MS8855
ADVOGADO: LUIZ ELIDIO ZORZETTO GIMENEZ - OAB/MS17777
INVESTIGADA: CAMILLA NASCIMENTO DE OLIVEIRA
ADVOGADO: JOSE RIZKALLAH JUNIOR - OAB/MS6125
ADVOGADO: AUGUSTO MIYASATO FOGACA DE SOUZA - OAB/MS8855
ADVOGADO: LUIZ ELIDIO ZORZETTO GIMENEZ - OAB/MS17777

 

 

 

 

SENTENÇA

 

 

 

1. Relatório

 

1.1

PARTIDO SOCIAL DEMOCRATA CRISTÃO - COMISSÃO PROVISÓRIA - MUNICIPAL e DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA - PDT, qualificados nos autos, propuseram ação de investigação judicial eleitoral contra ADRIANE BARBOSA NOGUEIRA LOPES e CAMILLA NASCIMENTO DE OLIVEIRA, também qualificadas, pretendendo sejam aplicadas as sanções previstas no art. 22, XIV, da Lei Complementar nº 64/1990, que são: (i) a declaração de inelegibilidade das investigadas e (ii) a cassação dos respectivos registros de candidatura e/ou eventual cassação de seus diplomas.

 

1.2

Os requerentes alegam, em síntese, que:

- houve, por parte das investigadas, abuso do poder político e econômico a partir do viés religioso, pois (i) era constante presença da Prefeita Adriane Lopes em cultos religiosos, onde tinha a oportunidade de falar aos fiéis com o aval dos líderes, influenciando indiretamente na autodeterminação dos indivíduos, (ii) houve a formação de uma ramificada rede de campanha dentro das igrejas, por meio da cooptação de pastores evangélicos como verdadeiros cabos eleitorais – alguns desses incluídos na folha de pagamento da Prefeitura - subvertendo a liberdade de escolha dos eleitores evangélicos e fragilizando os pilares democráticos e (iii) ocorreu a disseminação da tônica do bem contra o mal pelos apoiadores das investigadas - comportamento reprovável que tipifica ato material de abuso de poder político e econômico a partir do viés religioso; 

- ocorreu a nomeação de líderes religiosos em cargos públicos com remunerações elevadas, a utilização de recursos estatais para angariar apoio político e a estruturação de eventos de grande magnitude em templos religiosos, muitas vezes financiados indiretamente por fundos públicos ou isenções fiscais, revelando uma simbiose entre o abuso de poder religioso e o abuso de poder; 

- não se pode admitir, sob o pretexto de exercício da liberdade de culto, que candidatos ou líderes religiosos interfiram ilegitimamente na liberdade de escolha político-eleitoral dos fiéis, para que não sejam maculados, dentre outros, os seguintes direitos constitucionais: pluralismo político, liberdade de pensamento, intimidade e a isonomia eleitoral; 

- ao instrumentalizar o poder econômico para financiar uma rede de influência espiritual e consolidar apoios eleitorais, a investigada não apenas distorceu os princípios da igualdade no processo eleitoral, mas também usou a máquina pública e recursos financeiros como alavanca para amplificar o alcance da manipulação religiosa, criando uma vantagem indevida e afrontando os alicerces do Estado Democrático de Direito; 

- a conexão entre o abuso religioso e o abuso econômico é inexorável, evidenciando-se no vultoso potencial financeiro mobilizado, sendo que tal abuso se manifesta tanto na contratação de pastores em cargos públicos, custeados pelo erário e transformados em cabos eleitorais de uma campanha dissimulada, quanto na realização de eventos religiosos de altíssimo custo, com claro viés político-eleitoral, enquadrando-se como exemplos a organização sistemática de ações em todas as subsedes da Igreja Assembleia de Deus Missões e a realização de um evento de magnitude sem precedentes em Campo Grande no luxuoso templo “Aliançados”, que não apenas corroboram a ilação de abuso deliberado do poder econômico e religioso, mas também desnudam uma estratégia integrada e insidiosa orientada a subverter a lisura do processo eleitoral e a fragilizar os fundamentos democráticos da igualdade de condições no pleito; 

- a constante presença das Prefeita Adriane Lopes em cultos religiosos lhe dava a  oportunidade de falar aos fiéis com o aval dos líderes, influenciando indiretamente na autodeterminação dos indivíduos;

- foi formada uma ramificada rede de campanha dentro das igrejas por meio da cooptação de pastores evangélicos como verdadeiros cabos eleitorais – alguns desses incluídos na folha de pagamento da Prefeitura - subvertendo a liberdade de escolha dos eleitores evangélicos e fragilizando os pilares democráticos;

- houve a disseminação da tônica do bem contra o mal pelos apoiadores das investigadas - comportamento reprovável que tipifica ato material de abuso de poder em razão da elevada repercussão dos fatos;

- as investigadas adotaram a prática reiterada de abuso de poder religioso derivada da participação frequente em cultos, do estreitamento de laços políticos com líderes religiosos e da disseminação, por parte de seus apoiadores, de uma narrativa maniqueísta, que contrapõe o "bem" ao "mal", posicionando a candidata adversária como a personificação do mal, sendo que tal manipulação, além de ofender os princípios basilares da igualdade de condições no processo eleitoral, subverte os valores democráticos, pois busca instrumentalizar a fé religiosa para fins eleitorais, distorcendo a livre manifestação da vontade popular; 

- diante da inexistência de um direito absoluto, a garantia de liberdade religiosa e a laicidade do Estado não afastam, por si sós, os demais princípios de igual estatura e relevo constitucional, que tratam da normalidade e da legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou midiático, assim como os que impõem a igualdade do voto e a igualdade de chances entre os candidatos;

- a Prefeita Adriane Lopes é missionária há 20 anos da Assembleia de Deus Missões, sendo que, atualmente, conforme levantamento realizado pelo Correio do Estado,13, 36% do eleitorado campo-grandense é evangélico, ou seja, dos 481.399 eleitores que compareceram às urnas, 173.303 são evangélicos, o que deixa evidente que esse segmento foi indubitavelmente o fiel da balança nas eleições;

- a conexão entre a candidata e o clero, extensivamente explorada de modo eleitoreiro, feriu fatalmente o princípio da isonomia – o que configura um abuso de poder religioso; 

- Adriane menciona explicitamente que o apóstolo orou por ela e que toda a igreja seria colocada em oração por sua candidatura, sendo que a frase "Vai lá na igreja que eu vou orar por você e vou colocar a igreja junto em oração" revela a instrumentalização clara da autoridade religiosa; quando uma figura respeitada no ambiente de fé, como apóstolo (líder máximo de uma Comunidade Cristã), endossa uma candidatura através de oração pública, cria-se um vínculo direto entre a vontade divina e a campanha eleitoral, sendo que essa situação coloca os fiéis em uma posição de pressão espiritual na qual o apoio à candidata é apresentado como parte de um processo de "cumprimento do propósito divino";

-  ao invocar a "vontade de Deus" e o "propósito de Deus" em um contexto eleitoral, Adriane não está meramente se colocando à mercê do que pode acontecer, mas ela está sugerindo, de maneira implícita, que sua candidatura e eventual vitória fazem parte desse propósito divino, sendo que essa estratégia retórica é frequentemente utilizada para criar uma conexão emocional entre os eleitores religiosos e o candidato sem que precise haver uma declaração direta de que sua candidatura é a "escolhida por Deus";

- a frequência assídua da então candidata em cultos religiosos, utilizando de forma recorrente o ambiente sagrado e a autoridade simbólica das igrejas como plataforma para impulsionar sua candidatura, evidencia sua plena consciência da estratégia abusiva empregada, o que demonstra não apenas o aproveitamento indevido da legitimidade espiritual do espaço religioso, mas também o uso deliberado da fé como instrumento para construir uma narrativa de favorecimento eleitoral, em clara afronta à liberdade de escolha dos eleitores e à igualdade no pleito;

- a utilização de argumentos religiosos em um ambiente onde os ouvintes estão predispostos a seguir orientações espirituais transforma a mensagem em uma orientação moral e emocional que interfere diretamente na autonomia do voto;

- o uso do espaço religioso e da autoridade espiritual em favor de uma candidatura, ainda que sem pedido explícito de votos, é suficiente para configurar abuso de poder, pois compromete a isonomia entre os candidatos;

- a desqualificação do adversário com base em insinuações religiosas é uma afronta ao princípio da igualdade e liberdade religiosa, garantido pela Constituição Federal; 

- a investigada Adriane Lopes explorou a autoridade moral e espiritual de ambientes religiosos e do público nele presente, associou sua trajetória pessoal ao favor divino, criando uma narrativa de predestinação e introduziu uma normatividade implícita que compromete a liberdade de escolha dos eleitores, sendo que o abuso, além de flagrante, revelou-se sistemático e deliberado, configurando uma estratégia claramente orientada para a manipulação da fé e da religiosidade dos eleitores;

- a estratégia abusiva orquestrada pela investigada transcendeu sua mera presença constante em igrejas e cultos religiosos evoluindo para a construção de uma sofisticada e alarmante rede de apoio composta por pastores evangélicos que atuaram como verdadeiros cabos eleitorais, sendo que esses líderes religiosos, dotados de grande influência sobre suas comunidades de fé, foram sistematicamente mobilizados para promover a candidatura de Adriane Lopes, não apenas reforçando sua associação com valores espirituais, mas também instrumentalizando a autoridade moral e o poder simbólico que possuem sobre os fiéis;

- os pastores Igor Carlos Martins, Gilmar Tavares Flor, Hemerson Ortiz da Mota, Edinara Molina Nogueira da Mota, Moacir Frank da Costa, Julinei Herao Ferreira, Francemildo Alexandre Ribeiro, Ivaldo Domingos Leôncio e Jorge Luiz Franco foram contratados com salários mensais que variam entre R$ 3,6 mil a R$ 8,9 mil, sendo que todos são da Igreja Evangélica Assembleia de Deus Missões (ADM) em Campo Grande - congregação religiosa a que Adriane Lopes e seu marido, o deputado estadual Lídio Lopes (sem partido), pertencem; 

- a nomeação de pastores de diversas subsedes da Igreja Assembleia de Deus Missões (“ADM”) por Adriane Lopes em cargos comissionados de sua gestão configura uma tentativa evidente de ramificar sua influência política por meio do abuso religioso, subvertendo o princípio da separação entre religião e Estado e comprometendo a lisura do processo democrático; 

- a alocação de uma série de pastores em cargos estratégicos, especialmente na Secretaria Municipal de Assistência Social (SAS), com salários elevados e dispensados de concurso público, demonstra não apenas favorecimento político, mas também a criação de um cabide de empregos que serviu como base de suporte para sua campanha; 

- esses líderes religiosos, com forte influência em suas comunidades, atuaram como cabos eleitorais naturais, utilizando suas posições de liderança para mobilizar o eleitorado em favor da candidata, vinculando a escolha política à orientação religiosa, sendo que essa prática compromete diretamente a liberdade de escolha dos eleitores, que passam a associar a candidatura ao respaldo espiritual de seus pastores; 

- o uso de dinheiro público para beneficiar um grupo específico de líderes religiosos representa uma grave violação ao princípio da impessoalidade na administração pública previsto no artigo 37 da Constituição Federal;

- a nomeação de pastores em cargos comissionados não apenas desequilibrou a disputa eleitoral, mas também feriu os pilares democráticos ao utilizar recursos e estruturas públicas para influenciar a fé e o voto, em clara afronta à igualdade entre os candidatos, sendo que essa prática reflete uma estratégia deliberada de abuso de poder religioso, que deve ser reconhecida e repudiada pela Justiça Eleitoral; 

- a captação de votos por meio de discursos de cunho religioso pela investigada Adriane foi inegavelmente vasta, tendo em vista que os fiéis, em sua devoção, efetivamente foram persuadidos a votar na aludida candidata sob a orientação de seus líderes espirituais, sendo que tal influência encontra-se profundamente enraizada na relação de confiança e respeito que o sacerdote estabelece com sua comunidade, o que confere à religião um poder único de orientação eleitoral; 

- a exposta manipulação emocional e espiritual ora retratada comprometeu gravemente a liberdade de escolha dos eleitores de Campo Grande, explorando sua crença de que apoiar a candidata Adriane Lopes era participar de uma causa divina e essencial, sendo que se trata de uma conduta típica de abuso de poder religioso, que desvirtuou a isonomia do pleito e criou um desequilíbrio inaceitável, atentando contra os princípios da igualdade e da lisura que regem o processo eleitoral;

- Adriane Lopes engendrou uma estratégia deliberada e meticulosa de abuso de poder religioso, articulando uma série de ações que integraram de maneira sistêmica sua campanha eleitoral ao uso indevido da fé e da estrutura religiosa, sendo que essa estratégia consistiu na nomeação de pastores em cargos municipais estratégicos, que passaram a atuar como verdadeiros cabos eleitorais, utilizando sua influência espiritual para moldar o comportamento eleitoral de seus fiéis; 

- Adriane buscou maximizar sua presença em igrejas, proferindo discursos em diversos momentos e ambientes religiosos, consolidando sua imagem como uma candidata legitimada pela fé, sendo que como estratégia destaca-se a organização de visitas sistemáticas a todos os setores das igrejas subsedes da Assembleia de Deus Missões, congregação da qual Adriane faz parte;

- as visitas foram cuidadosamente planejadas para assegurar sua exposição junto às comunidades religiosas, explorando o vínculo espiritual entre os líderes e os fiéis para amplificar sua aceitação e influência; 

- para consolidar e coroar essa extensa rede de influência religiosa, foi realizado no dia 17 de outubro um evento de grande magnitude, amplamente divulgado nas redes sociais tanto em tempo real quanto nos dias subsequentes, em que se evidenciou uma clara e manifesta exposição da candidata Adriane Lopes, em franco benefício de sua campanha e prejuízo direto à adversária no segundo turno, sendo que a utilização desse espaço de visibilidade, vinculado ao contexto religioso e promovido de forma massiva, reforça a instrumentalização da fé e das estruturas eclesiásticas como estratégia para desequilibrar o pleito, comprometendo a igualdade de condições entre os candidatos e a liberdade de escolha dos eleitores;

- a investigada deixou de ir a um debate para participar do evento “Mulheres que Transformam”, sendo que a divulgação e o convite para comparecimento do público em geral ocorreram pelas redes sociais, veículos de imprensa e, ainda, mediante divulgação ostensiva em serviços de mensageria (Plataforma WhatsApp);

- o evento foi realizado na Igreja Evangélica “Aliançados Arena” – localizada na Avenida Mato Grosso, 4840, no bairro Jardim Veraneio – um luxuoso templo que hospeda os eventos religiosos vinculados à “Comunidade Cristã Aliançados”;

- no mencionado evento de 17 de outubro de 2024, as investigadas receberam o apoio de lideranças nacionais, como Michelle Bolsonaro, as senadoras Damares Alves e Tereza Cristina, além de lideranças locais, como Ana Portela, presidente do PL municipal, e Ângela Amaral, do PL Mulher, bem como de outras figuras de destaque, como a vice-governadora do Distrito Federal, Celina Leão, e a primeira-dama de Mato Grosso do Sul, Mônica Riedel;

- diante da afronta à legislação eleitoral decorrente da utilização de espaço destinado à culto religioso (bem de uso comum do povo) para promoção de candidatura (art. 37, caput e § 4º, da Lei nº 9.504/97 e art. 19, caput e § 2º, da Res. TSE nº 23.610/19), foi distribuída a Notícia de Irregularidade em Propaganda Eleitoral nº 0600528-95.2024.6.12.0035;

- as falas das senadoras Tereza Cristina, Damares Alves e de Michelle Bolsonaro, além de figuras como Mônica Riedel e Celina Leão, estabelecem uma clara tentativa de construir uma rede de legitimidade ao redor da candidatura de Adriane Lopes ao utilizar um apelo à autoridade, senod que essas personalidades, reconhecidas nacionalmente, não só endossam a candidatura, mas também mobilizam um discurso de continuidade e transformação, associando a candidatura de Adriane a valores morais, princípios religiosos e prosperidade; 

- durante as eleições municipais, houve uma extensiva disseminação, por parte dos apoiadores e Adriane Lopes, de uma narrativa maniqueísta, que contrapunha o "bem" ao "mal", agravando o cenário ao posicionar a candidata adversária como a personificação do mal, reforçando um ambiente de polarização nocivo e de manipulação emocional;

- a utilização de uma imagem que associa "satanás" à adversária e "Jesus" à candidata não é apenas uma prática eleitoral abusiva, mas uma violação ética, social e jurídica com graves implicações para a democracia, sendo que essa narrativa maniqueísta instrumentaliza a fé, polariza a sociedade e compromete a liberdade de escolha dos eleitores, configurando um claro abuso de poder religioso;

- a disseminação de mensagens apócrifas, originadas de telefones “frios” – ferramenta típica de operações clandestinas –, reforça a intencionalidade espúria de ventilar acusações infundadas, vinculando Rose a alegadas traições à fé, sendo que tal sistema manipula a moral cristã ao descontextualizar passagens bíblicas e usá-las como arma retórica para legitimar a candidata Adriane, projetando-a como um bastião de valores divinos; 

- a realização de disparos em massa, especialmente em uma escala capaz de atingir toda uma capital como Campo Grande, demanda uma estrutura logística e financeira altamente sofisticada, sendo que tais operações requerem a aquisição de bases de dados com milhares de contatos, a contratação de serviços especializados em envios em grande escala e a utilização de ferramentas tecnológicas robustas frequentemente operadas por empresas clandestinas ou de reputação questionável;

- houve abuso do poder político na manutenção de pagamentos de verbas remuneratórias irregulares/ilegais a fim de evitar prejuízos eleitoras, não ocorrendo o cumprimento de prazos fixados em Termo de Ajustamento de Gestão (TAG) firmado com o Tribunal de Contas deste Estado, o que teria influenciado no pleito; 

- a Prefeita Adriane Lopes, deliberadamente e com fins de angariar votos, abusou do poder político ao omitir-se no cumprimento de Termo de Ajustamento de Gestão (TAG) firmado pelo município de Campo Grande com o Tribunal de Contas do Estado (TCE/MS), sendo que o comportamento reprovável da investigada visou não criar atritos com os servidores públicos municipais, de modo a fazê-los pensar que seriam mantidos os privilégios a eles concedidos (principalmente o pagamento de vantagens indevidas constantes de “folhas de pagamento secretas”), iludindo-os a votarem nela e em sua vice; 

- no quadro intitulado “relatório sintético anual folha de pagamento – ativo”, referente ao ano de 2024 (de janeiro a agosto), constata-se que nesses oito meses o valor bruto da folha cresceu de 159 milhões de reais para 189 milhões de reais, principalmente porque o número de servidores comissionados aumentou mais de 212%, indo de 1.342 para 2.857, enquanto o número de professores convocados saltou de 2.157 em janeiro para 6.380 em agosto, ampliando-se em mais de 295%, ficando evidente que essas nomeações e contratações tiveram patente cunho eleitoreiro, pois realizadas no ano eleitoral e em total e manifesto desvio de finalidade pelo fato de que a Prefeita candidata agiu com o único intuito de obter os votos dessas pessoas, logrando êxito, tendo em conta que a diferença entre ela e a segunda colocada foi pouco mais de 12 mil votos, facilmente explicável diante desse aumento de nomeações e contratações de quase 6.000 pessoas em 8 meses, além do número de servidores efetivos que pulou de 16.545 para 32.842 em apenas 5 meses;

- a Divisão de Fiscalização do TCE/MS também verificou que em relação à cláusula 3ª, subitem 3.1, do TAG, a Prefeita Adriane deixou de adimplir como lhe competia a obrigação nela estampada atinente à divulgação dos dados exigidos pela Lei de Acesso à Informação quanto à remuneração dos servidores, descumprimento este que favoreceu a manutenção de “folhas secretas”, simultaneamente beneficiando apaniguados e enganando a população; 

- a Prefeita Adriane, com a finalidade de não sofrer prejuízos eleitorais, não promoveu, antes das eleições, a interrupção dos pagamentos indevidos que foram constatados pelo TCE/MS e que motivaram a assinatura do Termo de Ajuste de Gestão, optando, deliberadamente, por aguardar o término do pleito para promover o corte de tais pagamentos, sob a justificativa de que o prazo final para o cumprimento do TAG encerrar-se-ia em dezembro de 2024, o que não corresponde à verdade;

- houve abuso do poder político por meio de assédio eleitoral em desfavor de servidores para obtenção de apoio político e para a utilização na campanha eleitoral;

- são várias as notícias de servidores que foram constrangidos a participar de eventos políticos, tendo sido criados diversos grupos de WhatsApp e alguns eventos exigiam a confirmação de presença, como é o caso do evento “Mulheres que Transformam” realizado no templo da igreja Aliançados na data de 17/10 (quinta-feira), às 10h, durante o expediente normal da Prefeitura, no qual era obrigatória a confirmação de presença via plataforma de eventos denominado “SYMPLA”, sendo que, além desta convocação com lista de presença, grande parte do secretariado de Adriane Lopes, utilizando-se da posição hierárquica que detinham e a mando dela, utilizavam-se dos seus cargos para constranger servidores públicos efetivos, comissionados e temporários a participarem de atos de campanha;

- o MPT realizou audiência com o Secretário Especial de Segurança e Defesa Civil de Campo Grande/MS (ata anexa) que confessou haver criado o grupo de WhatsApp denominado “Segurança com Adriane”, com 159 membros, para a divulgação de eventos, o que leva a crer que o grupo era utilizado para constranger os servidores a participarem dos atos de campanha das investigadas;

- em razão das graves denúncias de assédio eleitoral, o Ministério Público do Trabalho expediu a Recomendação n.º 41092/2024 (doc. anexo) direcionada ao Município de Campo Grande/MS determinando uma série de providências; 

- ao convocar servidores públicos para participar de atos políticos durante o horário de expediente e nas dependências físicas da repartição pública, cometeram as investigadas a conduta vedada prevista no art. 73, I, da Lei 9504/1997;

- a atual Prefeita e candidata à reeleição, Adriane Lopes, foi beneficiada por um esquema de compra de votos, utilizando recursos financeiros de origem desconhecida, em diversas regiões da cidade, sendo que as práticas incluem pagamento em dinheiro e promessas de vantagens pessoais a eleitores, em grave violação à normalidade, equilíbrio e legitimidade do processo eleitoral, caracterizando abuso de poder econômico para a captação ilícita de sufrágio;

- entre as evidências apresentadas, destacam-se depoimentos diversos, seja de liderança de bairro, seja de eleitores de distintas regiões da capital, sendo que o modus operandi do referido esquema montado é também revelado e descrito a partir do acervo probatório que instrui a inicial (vídeos, fotografias, comprovantes de PIX e depoimentos);

- o abuso do poder econômico está umbilicalmente jungido a um engenhoso esquema de compra de votos operado em prol da candidatura da Prefeita Adriane Lopes a partir do emprego de recursos patrimoniais (de origem ora desconhecida) para viabilizar a obtenção do voto do eleitor por via ilícita (mediante pagamento de valores em dinheiro), conduta grave o suficiente para alterar o resultado do pleito municipal; 

- uma das mais importantes e reveladoras denúncias foi obtida a partir do testemunho prestado por Sebastião Martins Vieira (popularmente conhecido como “Tião da Horta”), atual Presidente de Bairro do Portal Caiobá I, o qual afirmou ter feito campanha para a Prefeita Adriane Lopes no processo eleitoral deste ano, sendo que, no sábado que antecedeu o 1º turno de votação (ou seja, no dia 05/10/2024), recebeu de uma servidora municipal, então Secretária-Adjunta da Secretaria de Assuntos Comunitários (SAS), Simone Bastos Vieira, a quantia R$ 1.200,00 para viabilizar a compra de votos entre eleitores naquela localidade;

- no próprio dia da votação em 2º turno, muitos foram os relatos e denúncias de que servidores públicos nomeados por Adriane Lopes, vinculados ao seu gabinete, estavam circulando por diversas regiões da cidade e nos arredores de locais de votação em atitudes, no mínimo, suspeitas, entre as quais o uso indevido de um veículo de uma Secretaria Municipal no dia das eleições (um domingo), em que o motorista foi flagrado fazendo anotações em uma planilha, o que levanta fortes suspeitas sobre o comportamento registrado, não apenas pela presença injustificada de um veículo oficial da Secretaria de Assistência Social (SAS) nas proximidades de uma seção eleitoral, mas também pela ausência de explicações claras e documentadas quanto ao motivo de sua utilização no local, sendo que a alegação vaga de que o veículo estaria a serviço do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) contradiz a falta de comprovação formal, como identificação adequada no veículo ou documentação que legitimasse sua atuação;

- a cooptação da vontade do eleitor ocorria por meio da participação em reuniões político-eleitorais e de adesivagem a veículos no afã de supostamente “endossar” o apoio à referida candidata, sendo que a troca (isto é, o pagamento de dinheiro) implementava-se com a efetiva participação na reunião e/ou na adesivagem em prol de Adriane;

- o valor do “voto comprado” variava entre R$ 50,00 a R$ 100,00 por eleitor (podendo ser até maior se um mesmo eleitor participasse de mais de um tipo de ato (comparecer em reunião política ou promover a adesivagem do veículo);

- Berenice Paes Machado relatou que a ela (e a pessoas de seu convívio pessoal) foram oferecidos dinheiro e vantagem pessoal em troca de voto à Adriane Lopes, declarando ter recebido quantia em espécie, além de haverem prometido a reforma de sua residência;

- ao genro de Berenice, Diego, cabia encontrar pessoas dispostas a participar do ato sob a promessa de que alguém lá lhes pagaria, sendo que no caso relatado por Berenice houve ao menos um valor creditado via PIX na conta bancária de sua filha (Ana Paula Machado Casemiro, esposa de Diego), por pessoa identificada apenas como “Claudia Aparecida da Silva” (CPF ***.923.421-**), na data de 24/09/2024, às 23h06 (curiosamente, 12 dias antes do 1º turno);

- essa quantia era destinada a pagar todas as pessoas que Diego havia mobilizado a estar presente nas tais “reuniões políticas”, sendo que ficava Diego, então, com o encargo de efetuar o “repasse” aos eleitores cujos votos foram comprados a mando do sujeito identificado apenas por Adalto;

- Berenice também informou ter conhecimento de ao menos duas “reuniões políticas” no 1º turno e outras duas no 2º turno, tendo ela própria participado e recebido dinheiro em duas ocasiões, sendo uma reunião no bairro Nova Campo Grande e outra no Parque dos Laranjais (esta última no 2º turno), bem como que estiveram presentes pessoas identificadas com símbolos da campanha de Adriane distribuindo materiais de propaganda, o que é confirmado pelo vídeo gravado pela denunciante na reunião ocorrida em 22/10/24 (anexo XX), onde uma pessoa, ao microfone, discursa a eleitores apresentando-se como “Dinho”, diretor do UPA da Santa Mônica e “também coordenador da companha da prefeita Adriane Lopes lá na região do Imbirussu”, falando a mando de Adriane;

- Berenice esclareceu, ainda, que uma pessoa identificada apenas por Gonçalves foi o responsável pelos pagamentos aos eleitores presentes na “reunião política” ocorrida no bairro Parque dos Laranjais, bem como que chegou a discutir diretamente com Gonçalves ao saber que naquele dia somente 20 pessoas seriam pagas, embora houvesse “mais de mil pessoas” no local, tendo sido prometido o pagamento nos dias subsequentes, enquanto o valor combinado nesse caso foi de R$ 100,00/eleitor, o qual veio a ser pago alguns dias depois, antes da votação do 2º turno;

- de acordo com essa denunciante, que também disse ter recebido R$ 100,00 para participar da tal “reunião política” de 2º turno, no bairro Parque dos Laranjais, em uma casa cujo proprietário foi identificado por Clóvis, os eleitores que ali compareceram foram a pretexto de receber a quantia prometida de R$ 100,00, bem como que foi convocada, junto a outras pessoas conhecidas, por Elias (ao que soube dizer, um coordenador ligado à campanha de Adriane) e que os indivíduos que ficaram responsáveis pelo pagamento seriam Clóvis, dono da residência onde a reunião foi realizada, Kalica Gonçalves do Nascimento (o tal Gonçalves primeiramente mencionado na denúncia de Berenice) e André (ao que soube dizer, também coordenador ligado à campanha de Adriane);

- a eleitora Miriam Souza da Silva também relatou a compra de votos;

- Ivanor de Oliveira Brites fez circular em grupos de WhatsApp dois vídeos por ele gravados enquanto ainda o pleito estava em curso, sendo um feito durante a campanha no 2º turno e outro já no dia da votação do 2º turno, em que afirmou que eram pagos R$ 100,00 às pessoas que ali estavam e que aderissem ao ato de adesivagem, confirmando também que ele próprio recebeu tal quantia ao final do dia, bem como que o pagamento era operacionalizado pela pessoa de nome Nilsão, pelo filho deste, por um tal Alberto “Carioca” (ex-presidente de escola de Samba Unidos do Aero Rancho) e por um certo Nabam, lideranças comunitárias também envolvidas naquele ato de compra de votos; 

- houve abuso do poder econômico mediante uso indevido (abuso) dos meios de comunicação social, com confusão informacional dolosa e sites de notícias e perfis de redes sociais utilizados para propaganda escamoteada, beneficiando evidentemente a candidadata à reeleição Adriane Lopes e sua vice;

- diversos sites, embora se apresentem como “portais de notícias” e tenham sido supostamente criados com a finalidade de informar o público, revelaram-se, na verdade, como ferramentas de manipulação eleitoral, sendo que durante o período eleitoral esses domínios, sob a fachada de jornalismo isento, passaram a atuar como páginas de campanha, disseminando conteúdo tendencioso em favor da candidata Adriande Lopes e sua vice, reiteradamente propagando desinformação e ataques à honra e à imagem da outra candidata, Rose Modesto, e de seus apoiadores;

- a atuação de redes de desinformação no contexto eleitoral é um problema de graves consequências jurídicas, especialmente quando seu impacto é potencializado pela estrutura organizada e pela intencionalidade de seus atores;

- os principais envolvidos são dois irmãos, Fabrizio Portilho Coene e Francisco Henrique Portilho Coene, proprietários de uma série de sites de notícias, como o “Conteúdo MS”, “Diário Patriota”, “E o Mundo”, “Política e Voz”, todos pertencentes ao grupo G7 Mídia e Comunicação, sendo que tais plataformas foram ostensivamente utilizadas para produção de pseudo-matérias jornalísticas, cujo único escopo era a difamação e desconstrução da imagem da candidata Rose Modesto;

- o grupo G7 Mídia utilizava suas plataformas para disseminar informações com ênfase negativa sobre a candidata Rose Modesto e depois buscava reverberar tais informações por meio de compartilhamento organizado em serviços de mensagens, em especial o WhatsApp, tendo sido os irmãos, em mais de uma ocasião, alvo de ordens judiciais para exclusão de contas e conteúdo, o que demonstra, da parte deles, um total e completo desrespeito ao Judiciário, suas decisões e ao próprio processo democrático;

- observa-se um padrão uniforme de cobertura em todos os sites examinados, enquanto Rose Modesto é retratada de forma consistentemente negativa, com foco em sua suposta queda nas pesquisas e em controvérsias associadas, Adriane Lopes, por outro lado, é favorecida com uma abordagem positiva, destacando-se seu crescimento e os apoios políticos que tem recebido;

- essa convergência entre os referidos sites no tratamento conferido às candidatas não parece fruto do acaso, mas indica uma linha editorial coordenada ou, no mínimo, uma visão editorial claramente alinhada entre os veículos;

- outra ponta desse intrincado sistema de desinformação organizado era o influenciador Lopes Bahia, um produtor de conteúdo digital que, mesmo após banimentos judiciais, continuou a produzir e compartilhar informações enganosas sobre a mesma candidata por meio de vídeos difamatórios envoltos num falso manto de crítica e humor, além de montagens recheadas de desinformação, com o único objetivo de manipular a coletividade durante o pleito eleitoral;

- o Poder Judiciário, em diferentes ocasiões, entendeu pelo banimento das contas deste influenciador, uma vez que era flagrante o seu papel como difusor de desinformação e notícias falsas, mas, mesmo assim, prosseguiu ele com a criação de novos perfis, inclusive destacando em suas descrições que estava sendo “censurado pela esquerda” – como se o Poder Judiciário se prestasse a atender de forma parcial arroubos político-partidários, atentando dessa forma contra a própria lisura das autoridades responsáveis pelo processo eleitoral; 

- essas ações, ao serem coordenadas e amplificadas por meio de redes sociais e aplicativos de mensagens como WhatsApp e Instagram, configuram práticas de manipulação que distorcem a percepção dos eleitores e comprometem a integridade do processo eleitoral, sendo que em um de seus vídeos, por exemplo, o influenciador, em uma peça de “humor”, tece elogios à candidata Rose Modesto, apresentando-se ao final como se fosse Satanás;

- o favorecimento evidente da candidata a que essas páginas se referem fica patente não apenas pela constante exaltação de sua figura e propostas, mas também pela simultânea depreciação de seus adversários, em particular de Rose Modesto; e

- o caráter sistemático dessas publicações, marcadas por títulos sensacionalistas e conteúdo sabidamente falso, cria um ambiente de desinformação, onde a verdade é secundarizada em prol de um projeto eleitoral sendo que esse favorecimento não é circunstancial ou eventual, mas produto de uma estratégia deliberada para desequilibrar o processo eleitoral, manipulando a percepção do eleitorado e comprometendo a igualdade de condições entre os concorrentes (ID 123346608).

 

1.3

A inicial foi admitida (ID 123347164).

 

1.4

Adriane Barbosa Nogueira Lopes e Camilla Nascimento de Oliveira apresentaram defesa em que sustentam, em preliminar, que a inicial é inepta por ausência de previsão legal para a figura do abuso religioso, além de inadequação da via eleitora por ausência de alegação de prática de condutas vedadas. No mérito, asseveram, em resumo, que:

- inexiste abuso de poder político e econômico por viés religioso; 

- o TSE tem um claro posicionamento de que a análise do abuso deve limitar-se às hipóteses elencadas no artigo 22 da LC nº 64/1990, diante da necessidade de interpretação estrita das normas restritivas de direito, bem como que “não é viável a análise da conduta sob a ótica do abuso de poder de autoridade religiosa, diante da ausência de regramento legal específico sobre a matéria”;

- sob a ótica do abuso do poder econômico, os representantes não trouxeram prova capaz de caracterizar o ilícito apontado;

- os representantes não apresentaram uma prova sequer que pudesse caracterizar eventual doação recebida pelas representadas de entidade religiosa ou realização de propaganda eleitoral em bem de uso comum (igreja) e muito menos algum ilícito disposto na resolução apontada;

- os representantes querem ligar os atos religiosos praticados por Adriane Lopes a atos políticos, mas todos os atos praticados frente a sua comunidade cristã são legais e não tiveram conotação política, além de que são os mesmos praticados pela então candidata Rose Modesto em sua comunidade evangélica;

- no campo político, todos os líderes religiosos apoiaram os candidatos de sua preferência, sendo que dentro da sua comunidade Rose Modesto teve apoio de inúmeros pastores;

- se existe alguma vantagem em relação a este ponto, esta está em favor de Rose Modesto, que, conforme matéria do Correio do Estado, já é missionária da igreja Evangélica Nosso Senhor Jesus Cristo há 32 anos, enquanto que Adriane é de outra comunidade há 20 anos;

- Adriane sempre teve participação nos cultos de sua comunidade, não havendo que se falar em estreitamente de laços políticos com líderes de congregação visando frutos eleitoreiros;

- os representantes apontam que o discurso induz os ouvintes a acreditar em apoiá-la, fazendo novas interpretações subjetivas que em nada acrescentam para caracterizar o abuso apontado;

- todos os discursos apontados na inicial não tiveram conotação política, pois, (i) foram realizados em cultos religiosos por pessoa que frequenta as igrejas evangélicas há mais de 20 anos, (ii) neles não foram feitos referência a eventual número de campanha da candidata, (iii) não houve pedido de voto para os presentes, (iv) não houve distribuição de material de campanha dentro das igrejas;

- considerando que Campo Grande tem mais de 800.000 mil habitantes, somente na capital teríamos próximo de 500 igrejas evangélicas e, desse modo, tería no mínimo 500 pastores, sendo que, considerando que 14 desses pastores tivessem apoiado Adriane Lopes, o que daria um percentual de menos de 3% de pastores em Campo Grande, esse número é certamente irrisório e insignificante para demonstrar a falada “sofisticada e alarmante rede de apoio” que teria atuado como cabos eleitorais de Adriane Lopes, sendo esta mais uma invenção mirabolante perpetrada pelos representantes na tentativa de demonstrar eventual abuso de poder;

- em relação às apontadas contratações, são normais e existem dentro de uma administração municipal, conforme faculta a legislação, existindo pessoas nomeados até mesmo na gestão do ex-prefeito Marquinhos Trad, cujos atos estão muito longe de caracterizar uma ramificação de influência política por meio de abuso religioso como querem fazer parecer os representantes; 

- em relação ao apoio dessas pessoas a candidatura de Adriane Lopes, trata-se de atos voluntários exercido por servidores sob o manto da liberdade de expressão e pensamento, sendo que até então não se tem notícias de que estas pessoas realizaram eventuais atos políticos em horários de expediente;

- é público e notório que a candidata Rose Modesto teve apoio maciço da comunidade evangélica, até mesmo porque a mesma participa da sua comunidade há pelo menos 32 anos; 

- diferentemente das afirmações levianas dos representantes, o apoio político de pastores, os quais são livres para apoiarem qualquer candidato, e a nomeação de alguns deles na administração pública, nada provam em relação ao abuso de poder apontado pelos representantes, ficando evidente a tentativa de reverter a decisão das urnas de maneira ilegal e antidemocrática;

- não restou demonstrada prova de que houve o uso de dinheiro público para beneficiar grupo específico de líderes religiosos, não havendo que se falar em desequilíbrio do pleito;

- Rose Modesto assinou um pacto com a Igreja Católica durante a campanha eleitoral, com inúmeras promessas, caso fosse eleita, o que demonstra que nunca houve abuso de poder econômico dentro das igrejas evangélicas por parte de Adriane Lopes, não havendo qualquer desequilíbrio do pleito como querem fazer parecer os representantes;

- apesar de os representantes falarem muito em apoio político dos pastores mencionados, deixaram de demonstrar o alegado abuso de poder econômico e religioso dentro das igrejas que pudesse ser considerado grave a ponto de levar a cassação, não havendo prova de pedido expresso de voto nos cultos, bem como se a participação da candidata nos eventos teve fins eleitoreiros, sendo que a mera menção a apoio político não se confunde como abuso de poder;

- para que se caracterize o abuso de poder, deve haver a comprovação segura e robusta da gravidade dos fatos, além de sua significativa repercussão no desequilíbrio do pleito, provas estas que ficaram muito longe de serem demonstradas; 

- apesar da reunião política haver ocorrido na igreja Evangélica “Aliançados Arena”, não teve qualquer ligação com a igreja ou com os fiéis em questão, até mesmo porque é público e notório que aquele local é constantemente alugado para eventos, e para esta reunião não foi diferente, conforme contrato de locação ora anexado (devidamente informado na prestação de contas de campanha), sendo que neste dia ocorreu uma reunião política, devidamente permitida pela legislação eleitoral, com a presença de inúmeras apoiadoras, não havendo qualquer irregularidade no evento; 

- inexiste abuso de poder politico e descumprimento de TAG firmado com o TCE/MS;

- a terminologia “folha secreta”, mais uma vez utilizada pelos representantes, trata-se de uma estratégia desleal/ilegal realizada pelos opositores da candidata representada, que descontextualizaram o TAG com TCE, de maneira que a narrativa, divulgada massivamente, passou a ter aparência de veracidade, mesmo não sendo;

- se houvesse pagamento indevido pela representada a quem quer que seja, ela estaria respondendo por isso e não poderia ter sido realizado o TAG com TCE/MS;

- a remuneração dos servidores tidos como recebidos através da “folha secreta” foram retirados do portal da transparência do município, o que, por si só, comprova que a terminologia de “folha secreta” é uma estratégia maldosa para desiquilibrar o pleito, sendo agora sendo utilizada para induzir o judiciário a erro no sentido de que houve pagamento de vantagens indevidas;

- é teratológico dizer que são secretas as informações contidas no site do município, portal da transparência, uma vez que estão disponíveis a todos os cidadãos, ainda que a nomenclatura de algumas remunerações esteja equivocada, fato é que as informações das verbas rescisórias, utilizada pelos opositores como “super salários e/ou folha secreta”, estavam disponíveis no portal da transparência;

- o TAG firmado entre o Município e o Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul (TCE/MS), assinado em 07 de dezembro de 2023 –processo TC/18257/2022 (Inspeção), diferentemente do que foi dito pelos representantes, vem sendo cumprido regularmente pelo Município, não havendo qualquer denúncia de descumprimento, sendo que o prazo de vigência do TAG (doc. anexo) é até 10/12/2024, conforme disposto na cláusula 1.3, fato que demonstra não haver descumprimento, pois sequer se findou o prazo para o término do ajuste;

- o TAG firmado pela representada com o Tribunal de Contas possui previsão expressa de que “ele não implica em confissão de ilícito penal por parte da atual prefeita municipal”;

-  além de não haver desvios de recursos ou pagamento indevido como querem fazer acreditar os representantes, também não há qualquer ilícito eleitoral a eventual imprecisão das informações contidas no portal da transparência ou eventual descumprimento do TAG;

- não houve o aumento dos servidores ou aumento dos gastos com remuneração dos servidores;

- não houve qualquer contratação ou revisão de remuneração dos servidores, mas tão somente envio de informações para o TCE via SICAP em layout que levou a imprecisão das informações, fato este que vem sendo corrigido pelas equipes técnicas das duas instituições;

- a Análise Técnica da DFAPP (Divisão de Fiscalização de Atos De Pessoal e Previdência), id. n. 123347056, fls. 18-43, que aponta parcial cumprimento de algumas cláusulas do TAG, levantada pelos representantes como descumpridas, foi devidamente esclarecida, nos termos da resposta ora anexada, sendo que em algumas delas o município apontou o cumprimento parcial e outras demonstrou as medidas adotas solicitando a concessão de dilação do prazo para cumprimento integral da cláusula;

- de qualquer prisma que se analise, a imprecisão das informações contidas no portal da transparência, herdada de gestores anteriores, não caracteriza ilícito eleitoral ou abuso de poder político, pois não houve desvio de recurso público ou pagamento indevido para finalidade de obter votos por parte da representada;

- a apontada “folha secreta” não trouxe qualquer benefício eleitoral para representada, pelo contrário, foi massivamente atacada, com uso inclusive de condutas vedadas (telemarketing) para disseminar a falácia criada em torno da imprecisão das informações contidas no portal da transparência municipal;

- não há nos autos qualquer prova de coação de servidores realizada pelas representadas, fato que por si só afasta o imputado abuso de poder político, sendo que se trata de ato voluntário exercido por servidores sob o manto da liberdade de expressão e pensamento;

- a imputação da conduta vedada se limita a trazer convites divulgados por outros servidores, sem qualquer coação, para participar de eventos, sem qualquer prova que os convites não foram realizados de maneira espontânea e/ou que as representadas tenham participado direta ou indiretamente dos convites realizados; 

- a jurisprudência pátria firmou o entendimento no sentido de que, para a procedência de pedidos de cassação de mandato e inelegibilidade, é necessário que as provas sejam robustas para a configuração dos ilícitos perpetrados;

- a recomendação nº 41092/2024, expedida pelo Ministério Público do Trabalho, nada comprova em relação ao suposto assédio eleitoral, pois conforme o próprio termo diz trata-se apenas de uma recomendação, não havendo qualquer prova de alguma medida efetiva do MPT sobre estes fatos e muito menos a aplicação de alguma sanção;

- os apoiadores que enviaram convites espontâneos não cometeram abuso de poder político, muito menos as representadas que não tiveram participação ou coparticipação nas condutas deles;

- não há pagamento realizado pelas representadas, ou provas de que elas tenham conhecimento da conduta praticada por quem quer que seja, o que por si só afasta a alegação de captação ilícita de sufrágio pelas representadas;

- como exemplo da armação perpetrada pelos representantes e da fragilidade da prova apresentada pelos representantes, é o comprovante de pagamento anexado no valor de R$ 1.200,00 para pessoa de Sebastião Martins Vieira realizado por Simone Bastos Vieira, que trabalhou na campanha eleitoral para os candidatos Beto Pereira (primeiro turno) e Rose Modesto (Segundo turno);

- se os representantes quisessem realmente buscar a verdadeira punição daqueles que eventualmente cometeram algum ato ilícito e não meramente tentar reverter o resultado de uma eleição, deveriam entrar com ação contra as pessoas que cometeram as condutas vedadas e não como fez, imputando fato sem qualquer prova da participação das representadas;

- a alegação de abuso dos meios de comunicação trata-se de mero inconformismo com resultado das eleições, pois, mais uma vez, de maneira forçosa, sem prova da participação das representadas, tenta-se enquadrar a suposta propaganda irregular praticada por terceiros no alegado abuso;

- não se verifica qualquer vínculo das representadas com os respectivos veículos de comunicação que possa configurar influência ou conduta vedada, elementos que de pronto afastam as alegações iniciais; 

- basta uma simples consulta para chegar à conclusão que existe o dobro de sites e perfis que diariamente disseminaram fake news contra as candidatas representadas;

- não há nos autos prova de qualquer tipo de financiamento dos veículos de comunicação por parte das representadas, não havendo que se falar em abuso de poder pelos meios de comunicação, na medida em que os veículos são livres para emitirem suas opiniões, sejam favoráveis ou desfavoráveis, bem como livres também para emitir posicionamentos políticos, tudo acobertado pela liberdade de expressão e pensamento; 

- a legislação eleitoral autoriza a imprensa em geral a manifestar apoio favorável a determinada candidatura, sendo que a mera veiculação de matéria de nítido teor jornalístico não pode nem deve ser considerada como indício de cometimento de abuso, tal como tentam fazer os representantes;

- para a caracterização do abuso do poder político, é essencial a demonstração da autoria ou da participação do agente público na prática da conduta tida como abusiva;

- não basta a demonstração de que o posicionamento do veículo de comunicação seja favorável ou desfavorável, pois a classificação da conduta vedada somente ocorre nos casos de abuso consubstanciado na divulgação de informações inverídicas; e

- não houve a utilização de qualquer desvio ou excesso de poder por parte das representadas que pudesse caracterizar eventual abuso de poder político, econômico e religioso, muito menos captação de sufrágio para compra de votos.

Na remota hipótese de procedência dos pedidos iniciais, eventual penalidade deve ser aplicada balizada nos princípios constitucionais da razoabilidade e da proporcionalidade, afastando consecutivamente a cassação de registro ou diploma e inelegibilidade pleiteadas, ante a ausência de prova robusta e gravidade na conduta. Batem-se pelo acolhimento da preliminar e, alternativamente pela improcedência dos pedidos formulados na inicial, mas, na hipótese de procedência, que seja aplicada somente a pena de multa em seu mínimo legal (ID 123387776).

 

1.5

Foi determinada a realização de audiência de instrução e julgamento (ID 123402846).

 

1.6

A audiência de instrução e julgamento foi realizada e ouvidas testemunhas arroladas pelas partes (ID 123426871).

 

1.7

Em alegações finais, os requerentes batem-se pela procedência dos pedidos como formulados na inicial (ID 123440229), enquanto as investigadas reiteram, em preliminar, a inépcia da inicial por ausência de interesse processual, e, no mérito, sustentam a improcedência dos pedidos feitos na inicial (ID 123441032).

 

1.8

A representante do Ministério Público Eleitoral manifesta-se pela improcedência dos pedidos formulados na inicial (ID 123439894).

 

 

Relatei. Decido.

 

 

2. Fundamentação

 

2.1

Passa-se ao exame das preliminares arguidas na peça de defesa.

 

2.2

A preliminar de inépcia da inicial suscitada pelas requeridas não merece acolhimento, pois, embora o artigo 22 da LC nº 64/1990, de fato, não faça referência nominal à cassação do registro ou inelegibilidade do candidato por abuso de poder religioso, é certo que os requerentes sustentam que o viés religioso serviu de mero instrumento para que o abuso de poder econômico fosse perpetrato e, como é cediço, tal caso de abuso encontra amparo na legislação de regência e possibilita o ajuizamento da ação sob este fundamento.

 

2.3

Ademais, os requerentes reuniram múltiplos atos abusivos imputados às investigadas, entre os quais os relacionados ao abuso de econômico com viés religioso, o que é possível em uma só ação de investigação judicial eleitoral tendo em conta que, segundo o Tribunal Superior Eleitoral:

 

A APURAÇÃO DO ABUSO DO PODER ECONÔMICO, NOS FEITOS EM QUE OS FATOS APONTADOS SÃO MÚLTIPLOS, DEVE SER AFERIDA A PARTIR DO CONJUNTO DE IRREGULARIDADES APONTADAS. ASSIM, AINDA QUE ALGUMAS DELAS NÃO POSSUA, EM SI, GRAVIDADE SUFICIENTE PARA AUTORIZAR A CASSAÇÃO DO REGISTRO OU DO DIPLOMA DOS REPRESENTADOS, É POSSÍVEL QUE, NO CONJUNTO, A GRAVIDADE SEJA RECONHECIDA (REsp. 56876, rel. min. Henrique Neves da Silva, DJE de 10.12.2015; Agravo de Instrumento nº 30251, rel. min. Henrique Neves da Silva, DJE de 17.04.2017; Ação Cautelar nº 92888, rel. min. Henrique Neves da Silva, DJE 10.12.2015; REsp. nº 57046, rel. min. Henrique Neves da Silva, DJE de 10.12.2015).

 

2.4

Quanto à preliminar de falta de interesse de agir em decorrência da ausência de lastro probatório das condutas das requeridas que possam configurar os ilícitos que lhes são imputados na inicial, confunde-se com o mérito.

 

2.5

Superadas, portanto, as preliminares arguidas.

 

2.6

Passa-se ao exame do mérito.

 

2.7

A presente ação é o instrumento adequado para proteção da normalidade e legitimidade das eleições, consoante dispõe o artigo 14, § 9º, da Constituição Federal:

 

§ 9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.         (Redação dada pela Emenda Constitucional de Revisão nº 4, de 1994.

 

2.8

O artigo 22 da Lei Complementar nº 64, de 1990, dispõe, por sua vez, que:

 

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político ...

 

2.9

Em extensa petição inicial com 140 páginas, dividida em várias partes, cinco delas se referem as alegações de abusos do poder político e econômico a partir do (i) viés religioso, (ii) do poder político, (iii) do poder político para fins de assédio eleitoral, (iv) do poder econômico para fins de compra de voto e (v) do poder econômico mediante uso indevido (abuso) dos meios de comunicação social.

 

2.10

Quanto ao abuso de poder econônimico a partir do viés religioso, os requerentes alegam, resumidamente, que: (i) era constante presença da Prefeita Adriane Lopes em cultos religiosos, onde tinha a oportunidade de falar aos fiéis com o aval dos líderes, influenciando indiretamente na autodeterminação dos indivíduos; (ii) houve a formação de uma ramificada rede de campanha dentro das igrejas, por meio da cooptação de pastores evangélicos como verdadeiros cabos eleitorais – alguns desses incluídos na folha de pagamento da Prefeitura -, subvertendo a liberdade de escolha dos eleitores evangélicos e fragilizando os pilares democráticos; (iii) ocorreu a disseminação da tônica do bem contra o mal pelos apoiadores das investigadas - comportamento reprovável que tipifica ato material de abuso de poder político e econômico a partir do viés religioso; e (iv) houve a nomeação de líderes religiosos em cargos públicos com remunerações elevadas e a utilização de recursos estatais para angariar apoio político e a estruturação de eventos de grande magnitude em templos religiosos, muitas vezes financiados indiretamente por fundos públicos ou isenções fiscais, revelando uma simbiose entre o abuso de poder religioso e o abuso de poder econômico.

 

2.11

As requeridas contrapõem-se às alegações dos requerentes e sustentam quanto a este ponto, em suma, que: os requerentes não apresentaram prova que possa caracterizar eventual doação recebida por elas de entidade religiosa ou realização de propaganda eleitoral em bem de uso comum (igreja) e muito menos algum ilícito disposto na resolução apontada; as representantes querem ligar os atos religiosos praticados pela requerida Adriane Lopes a atos políticos, mas os atos praticados na sua comunidade cristã são legais e não tiveram conotação política; os mesmos atos são praticados pela então candidata Rose Modesto em sua comunidade evangélica; no campo político, os líderes religiosos apoiaram os candidatos de sua preferência, sendo que a candidata Rose Modesto teve apoio de inúmeros pastores; a requerida Adriane sempre teve participação nos cultos de sua comunidade, não havendo que se falar em estreitamente de laços políticos com líderes de congregação visando frutos eleitoreiros; os discursos apontados na inicial não tiveram nenhuma conotação política, pois (i) foram realizados em cultos religiosos por pessoa que frequenta as igrejas evangélicas há mais de 20 anos, (ii) neles não foi feita referência a eventual número de campanha da candidata, (iii) não houve pedido de voto para os presentes, (iv) e não houve distribuição de material de campanha dentro das igrejas; em relação às apontadas contratações, são normais e existem dentro de uma administração municipal, conforme faculta a legislação, existindo pessoas nomeadas até mesmo na gestão do ex-prefeito Marquinhos Trad, cujos atos não caracterizam ramificação de influência política por meio de abuso religioso; em relação ao apoio dessas pessoas à candidatura de Adriane Lopes, trata-se de ato voluntário exercido por servidores sob o manto da liberdade de expressão e pensamento, sendo que até então não se tem notícias de que estas pessoas realizaram eventuais atos políticos em horários de expediente; é público e notório que a candidata Rose Modesto teve apoio maciço da comunidade evangélica; os pastores são livres para apoiarem qualquer candidato e a nomeação de alguns deles na administração pública nada prova em relação ao abuso de poder; não restou demonstrado que houve o uso de dinheiro público para beneficiar grupo específico de líderes religiosos, não havendo que se falar em desequilíbrio do pleito; apesar de os requerente falarem muito em apoio político dos pastores mencionados, deixaram de demonstrar o alegado abuso de poder econômico e religioso dentro das igrejas que pudesse ser considerado grave a ponto de levar à cassação, não havendo prova de pedido expresso de voto nos cultos, bem como se a participação da candidata nos eventos teve fins eleitoreiros, sendo que a mera menção a apoio político não se confunde como abuso de poder; e, apesar da reunião política haver ocorrido na igreja Evangélica “Aliançados Arena”, não teve qualquer ligação com a igreja ou com os fiéis em questão, até mesmo porque é público e notório que aquele local é constantemente alugado para eventos.

 

2.12

Examinando-se os autos, verifica-se que não restou demonstrado o alegado abuso de poder econômico a partir de um viés religioso como suscitado pelos requerentes. Com efeito, as participações da requerida Adriane Lopes em cultos religiosos nos quais tenha discursado e recebido/pedido oração dos fiés, apresentando-se como uma candidata missionária evangélica não denotam, por si só, qualquer efetivo desequilibrio no pleito eleitoral, pois em seus discursos mencionados na inicial não houve direta ou indireta interferência na liberdade de escolha dos eleitores, tampouco pedido de votos para referida candidata.

 

2.13

Não é possível fazer uma inferência, como pretendente os requerentes, no sentido de que o fato de a requerida Adriane Lopes haver se apresentado com frequência dentro das igrejas durante o período de campanha, ao lado de líderes religiosos, tenha feito parte uma estratégia para condicionar, ainda que indiretamente, o voto do público evangélico, mesmo porque, como revelado na própria inicial, a requerida frequenta tais ambientes religiosos há mais de 20 anos. 

 

2.14

Ademais, não se pode olvidar que a própria candidata dos requerentes também teve o apoio de líderes evangélicos em sua campanha, assim como a requerida Adriane Lopes, conforme se extraí das notícias publicadas em mídias locais mencionadas ao longo da contestação (ID 123387776), não havendo, portanto, que se falar em desequelíbrio do pleito por este motivo.

 

2.15 

Quanto ao fato de a requerida Adriane Lopes haver recebido publicamente apoio de líderes religiosos, pelos mesmos motivos alhures apontados, não revela desequilíbrio na lisura do pleito, pois não há ilicitude em tal conduta.

 

2.16

No tocante à nomeação de alguns pastores evangélicos na administração da requerida Adriane Lopes, em torno de onze, não implica, como tenta fazer crer os requerentes, na formação de uma rede de influência dentro do meio evangélico para desequilíbrio do pleito e consolidação da posição dela no cargo de prefeita da cidade, pois, conforme mencionado na própria inicial, a requerente frequenta a mesma igreja evangélica há mais de 20 anos e é natural que membros dessa mesma igreja com quem tenha construído relações estejam entre aqueles nomeados para comporem sua administração, mesmo porque foram designados para cargos de confiança, não se mostrando tal situação como abuso ou algo ilícito, sendo algo comum a cada mudança de gestão e de gestores públicos. 

 

2.17

Ademais, parte dos pastores mencionados pelos requerentes na inicial sequer foram nomeados na gestão da requerida Adriane Lopes, mas do então prefeito Marcos Marcelo Trad, como se vê na contestação (ID 123387776 - fls. 22-3).

 

2.18

Em relação ao evento realizado no templo da Igreja Evangélica "Aliançados", "Mulheres que Transformam", ao contrário do que sustentou os requerentes, não se tratou de um evento religioso propriamente dito, como, aliás, constatado pelo oficial de justiça no bojo dos Autos nº 0600528-95.2024.6.12.0035, haja vista que, embora realizado em local onde se reúne referida comunidade evangélica, foi alugado para o evento político, como demonstrado pelas requeridas no documento ID 123387766, sendo que manifestações individuais de personalidades públicas sobre religião ou algo do tipo não descaracteriza a natureza do evento. 

 

2.19

Ainda quanto ao alegado abuso de poder econômico a partir de um viés religioso, os requerentes alegam que os apoiadores da candidatura da requerida Adriane Lopes criaram uma narrativa do "bem" contra o "mal" em que referida candidata é colocada na posição de representante do "bem", enquanto a candidata Rose Modesto estaria na posição de "mal", mas sequer restou demonstrado o efetivo envolvimento das requeridas na criação ou difusão da mencionada narrativa.

 

2.20

Cumpre acrescentar, ademais, que as análises feitas pelos requerentes dos discursos transcritos ao longo da inicial estão carregadas de impressões subjetivas que não revelam com segurança os alegados abusos religiosos voltados à interferência na liberdade de escolha dos eleitores.

 

2.21

Por fim, a suscitada conexão entre o abuso religioso e o abuso econômico também não restou suficientemente demonstrada nas alegações e provas apresentadas pelos requerentes, uma vez que não há nos autos elementos aptos a demonstrarem a mobilização de valores expressivos na contratação de um número limitado de pastores em cargos públicos e na realização de eventos religiosos ou políticos, a exemplo do que consta no documento ID 123387766.

 

2.22

Embora alegado na inicial, não restaram demonstradas, pelo menos não de modo suficiente a configurar abuso de poder econômico, com viés religioso: (i) a prática pelas investigadas de ostensiva campanha eleitoral no interior de templos, por vezes durante cerimônias religiosas, inclusive abrangendo discurso e distribuição de material de propaganda; (ii) o desvirtuamento dos santuários e a sua apropriação pelas candidatas como um espaço privado de autoridade e influência político-eleitoral; (iii) a propagação intencional pelas candidatas de informação sabidamente inverídica (evento de nítida finalidade eleitoral travestido de evento “de liderança”) para o atingimento de finalidade eleitoral; (iv) a atuação de pastores evangélicos como “equipe de campanha” e chamarizes dos cidadãos, ofertando protagonismo à candidata Adriane Lopes a fim de que os fiéis nela votassem; (v) a criação de uma tônica do “bem versus mal” - difundida por meio do ecossistema de desinformação criado para beneficiar as investigadas, consubstanciando abuso do poder de informação e mídia por meio de manipulação religiosa com participação das investigadas.

 

2.23

No que se refere à alegação de abuso de poder político pelo descumprimento de prazos fixados em Termo de Ajustamento de Gestão (TAG) a fim de evitar prejuízos eleitorais, também não restou confirmada nos autos, haja vista que, embora tenha restado demonstrado que a candidata requerida Adriane Lopes tenha de fato descumprido prazos para adimplemento de cláusulas específicas do TAG firmado referentes à transparência, não é possível concluir que isso, por si só, tenha sido feito com o principal intuito de angariar os votos deaqueles supostamente beneficiados pelo pagamento das supostas verbas reputadas irregulares/ilegais pelos requerentes, gerando o desequilíbrio do pleito, mesmo porque não restou cabalmente comprovado nos autos que o pagamento de tais verbas, embora possa não haver sido divulgado na forma devida, era indevido.

 

2.24

Ademais, as alegações dos requerentes no sentido de que a candidata representada teria feito várias nomeações e contratações de servidores pouco tempo antes do pleito com cunho eleitoreiro sequer restou confirmada pelos próprios documentos colacionados por eles com a inicial, sendo que de um deles se extrai claramente que a "enorme discrepância no que se refere a quantidade de servidores", constada no período de junho de agosto do ano passado, "foi provocado pelo envio repetido de servidores com vínculo efetivo e comissionado" (ID 123346608 - fl. 76) e não pela efetiva contratação/nomeação, como tentam fazer crer os requerentes, o que reforça a conclusão acima exposta.

 

2.25

Sobre a alegação de abuso do poder político mediante assédio eleitoral em desfavor de servidores para obtenção de apoio político e para a utilização na campanha eleitoral, de igual modo, não ficou demonstrado, tendo em conta que nem os documentos trazidos pelos requerentes com a inicial, nem as testemunhas ouvidas em juízo, revelaram com clareza o efetivo assédio com finalidade eleitoreira. Com efeito, como se pode ver das próprias capturas de tela com mensagens compartilhadas pelo aplicativo Whatsap pelo servidor Rodrigo Hata trazidas na inicial é possível extrair que eram efetuados apenas convites aos servidores para participarem de atos de campanha das candidatas requeridas (ID 123346608 - fl. 90) sem qualquer tom intimidador ou impositivo.

 

2.26

No tocante à alegação dos requerentes de abuso de poder econômico para captação ilícita de sufrágio nas eleições municipais de Campo Grande, alguns esclarecimentos iniciais são necessários.

 

2.27

Como cediço, configura-se o abuso do poder econômico mediante o uso excessivo e desproporcional de recursos patrimoniais, sejam eles públicos ou privados, de modo a comprometer a igualdade da disputa eleitoral e a legitimidade do pleito, em benefício de determinada candidatura.

 

2.28

Quanto ao crime de captação ilícitica de sufrágio, dispõe o caput do artigo 41-A da Lei nº 9.504/1997 que:

 

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990.               (Incluído pela Lei nº 9.840, de 1999).

 

2.29

Examinando-se as provas produzidas no feito no tocante a este ponto da alegação, constata-se que restou demonstrada a compra de votos (ou a promessa de) em favor da candidatura das requeridas. Com efeito, as testemunhas Berenice Paes Machado e Edivânia Souza do Nascimento, ao serem ouvidas em juízo, asseveraram que participaram de reuniões políticas a pretexto de receberem dinheiro em troca de voto nas candidatas requeridas.

 

2.30

A testemunha Ivanor de Oliveira Brites, por sua vez, também afirmou em juízo que gravou local onde houve compra de votos, tendo inclusive seu voto sido comprado em benefício da candidatura das requeridas.

 

2.31

A testemunha Sebastião Vieira Martins assegurou em audiência de instrução que trabalhou na campanha das requeridas e que recebeu dinheiro para efetuar compra de votos, sendo que há nos autos comprovação de uma transação via PIX no valor de R$ 1.200,00 em favor dela que foi paga por Simone Bastos Vieira (ID 123347221), nomeada para exercer função no gabinete da então prefeita e candidata requerida Adriane Lopes (ID 123346608 - fl. 101).

 

2.32

Apesar da relatada compra de votos pelas testemunhas alhures indicadas em benefício das requeridas, não restou cabalmente demonstrado nos autos a participação (direta ou indireta) ou a anuência delas, na condição de beneficiárias, nos ilícitos, sendo tal prova imprescindível para que se possa concluir que elas incorreram também no referido crime e merecem a sanção de inegilibilidade estabelecida no artigo 22, XIV, da LC nº 64/1990 por abuso de poder econômico. Com efeito, ainda que se tenham comprovantes de pix e fotos de eventos onde se realizaram supostas compras de votos, conforme juntado com a inicial (ID 123346608 - fls. 106-10), tais documentos, por si sós, não revelam a ligação ou envolvimento das requerida com tais ilícitos, seja diretamente ou por interposta pessoa ou com anuência delas, o que é imprescindível. 

 

2.33

Mesmo que se possa afirmar que os atos ilícitos a princípio constatados beneficiaram as requeridas, tal fato não é suficiente para levar à conclusão de que o bem jurídico tutelado pela norma (art. 22, caput, da LC nº 64/1990), isto é, a normalidade e legitimidade das eleições, foi maculada/afetada por ocasião das referidas condutas, sendo que não se comprovou compra substancial que pudesse gerar efetivo desequilíbrio da disputa. 

 

2.34

Ademais, cabe destacar que se deve tomar o depoimento da testemunha Sebastião Vieira Martins (a única que aponta uma relação próxima com alguém do gabinete da Prefeita Adriane Barbosa Nogueira Lopes) com ressalvas, haja vista que foi juntado aos autos pelas requeridas audio (ID 123387767), cuja autoria lhe é imputada, pedindo votos para candidata adversária das requeridas, o que gera certa perplexidade. 

 

2.35

Nesse sentido, embora a captação ilícita de sufrágio mereça a devida reprovabilidade por aqueles que na mesma incorreram, não houve na hipótese a quebra de isonomia do pleito capaz de atrair a cassação dos diplomas das requerida, pois, como visto, embora beneficiárias do ato, não houve a quebra da normalidade e legitimidade do pleito, tendo em conta a diferença de votos entre as candidatas que concorreram no 2º turna das eleições municipais e a potencialildade da conduta levada a efeito com a apontada compra de votos.

 

2.36

Não cabe também a declaração da inelegibilidade das investigadas como querem os requerentes, uma vez que não houve conduta concreta e individualizada delas no respectivo ilícito eleitoral. Com efeito, não há qualquer indicação da participação, seja direta ou indireta, das requeridas na eventual compra de votos, ainda que beneficiárias de tal conduta.

 

2.37

Por fim, os requerentes alegam o abuso do poder econômico das requeridas mediante uso indevido (abuso) dos meios de comunicação social, mas referida alegação também não ficou claramente demonstrada nos autos, haja vista que, embora se tenha trazido para o feito exemplares de notícias ou postagens de perfis favoráveis à candidatura das requeridas e desfavaráveis à candidatura adversária, não se logrou revelar a participação, o envolvimento, o vínculo das requeridas com os respectivos meios de comunicação que possa configurar o alegado abuso de poder.

 

2.38

Ademais, as requeridas trouxeram com a defesa apresentada outros exemplos de meios de comunicação e perfis em redes sociais que fizeram publicações no período eleitoral com pesadas críticas às requeridas e elogios à canditada adversária (ID 123387776 - fls. 48-50), corroborando, portanto, a inexistência de favorecimento desproporcional às requeridas ou quebra da normalidade e legitimidade das eleições.

 

2.39

Não se pode olvidar também que os veículos de comunicação são livres para até mesmo se posicionarem a favor ou contra determinada candidatura sem que isso importe em uso indevido dos meios de comunicação e quebra da normalidade/legitimidade do pleito, como, aliás, se posicionou o Tribunal Superior Eleitoral sobre a questão:

 

AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2018. CANDIDATOS A PRESIDENTE E VICE–PRESIDENTE DA REPÚBLICA. PRELIMINARES. INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL E INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. REJEIÇÃO. ABUSO DE PODER POLÍTICO. USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL. JORNAL IMPRESSO. PREVALÊNCIA DA LIBERDADE DE IMPRENSA. VEÍCULO DE COMUNICAÇÃO MANTIDO PELO ESTADO. PECULIARIDADES. BALIZAS MAIS ESTREITAS. USO. BEM PÚBLICO. COAÇÃO. SERVIDORES. CONDUTA VEDADA E ABUSO NÃO CONFIGURADOS. AUSÊNCIA DE PROVA ROBUSTA. INEXISTÊNCIA DE GRAVIDADE. IMPROCEDÊNCIA.

1. Não é inepta a petição inicial que descreve os fatos, os fundamentos do pedido e possibilita à parte o efetivo exercício do direito de defesa, corroborada com início de prova documental.

2. O candidato supostamente beneficiado pelo abuso de poder é parte legítima para figurar no polo passivo de ação de investigação judicial eleitoral, ainda que a conduta investigada não seja a ele atribuída. Precedentes.

3. A ação de investigação judicial eleitoral proposta em desfavor de candidatos a presidente e vice–presidente da República, em litisconsórcio com supostos autores de ato ilícito configurador de abuso, submete–se à relatoria do Corregedor–Geral da Justiça Eleitoral, na forma do artigo 22 da Lei Complementar 64/1990, operando–se o julgamento perante o Plenário do TSE, razão pela qual não há inadequação da via eleita.

4. Para se caracterizar o abuso de poder, impõe–se a comprovação, de forma segura, da gravidade dos fatos imputados, demonstrada a partir da verificação do alto grau de reprovabilidade da conduta (aspecto qualitativo) e de sua significativa repercussão a fim de influenciar o equilíbrio da disputa eleitoral (aspecto quantitativo). A mensuração dos reflexos eleitorais da conduta, não obstante deva continuar a ser ponderada pelo julgador, não se constitui mais em fator determinante para a ocorrência do abuso de poder, sendo agora revelado, substancialmente, pelo desvalor do comportamento.

5. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que fato ocorrido na imprensa escrita possui alcance inegavelmente menor em relação a outros veículos de comunicação social, como o rádio e a televisão, em face da própria característica do meio impresso, cujo acesso à informação tem relação direta com o interesse do leitor (Respe 56173/SC, Relatora Ministra Luciana Lóssio, DJe de 17.6.2016).

6. Os veículos impressos de comunicação podem assumir posição favorável em relação a determinada candidatura, inclusive divulgando atos de campanha e atividades parlamentares, sem que isso caracterize, por si só, uso indevido dos meios de comunicação social, devendo ser punidos pela Justiça Eleitoral os eventuais excessos (RO 7569–30IRJ, Relator Ministro João Otávio de Noronha, DJe de 5.11.2015).

7. Apesar de o jornal pertencer ao Governo da Paraíba e receber recursos públicos, circunstâncias que hão de estreitar as balizas para a liberdade de imprensa, porquanto não se poderia admitir que um veículo de comunicação estatal fosse utilizado deliberadamente como instrumento para favorecer determinada campanha, o conjunto fático–probatório não ostenta os elementos necessários a assim emoldurar as condutas descritas na inicial, tampouco a revelar gravidade suficiente para a imposição das penalidades que a espécie comporta.

8. A Corte Suprema assegurou a "manifestação livre de ideias e divulgação do pensamento nos ambientes universitários ou em equipamentos sob a administração de universidades públicas e privadas e serventes a seus fins e desempenhos" (ADPF 548/DF, sessão de 31.10.2018).

9. Inexistência de acervo probatório seguro a demonstrar o uso abusivo de um canal público de comunicação (jornal) em prol de determinada candidatura e em detrimento de outra, assim como ausência de condutas vedadas consistentes no uso de bem público e na coação de servidores do Estado.

10. O Tribunal Superior Eleitoral firmou orientação no sentido de que, para afastar legalmente determinado mandato eletivo obtido nas urnas, compete à Justiça Eleitoral, com base na compreensão da reserva legal proporcional e fundamento em provas robustas admitidas em direito, verificar a existência de grave abuso de poder, suficiente para ensejar as rigorosas sanções de cassação do registro, diploma ou mandato e inelegibilidade. Precedentes.

11. Ação de Investigação Judicial Eleitoral que, rejeitadas as preliminares, julga–se improcedente (Ac. de 8.8.2019 na AIJE nº 060182324, rel. min. Jorge Mussi).

 

2.40

Em conclusão, não se pode olvidar, como ressaltam os requerentes na inicial, que a Constituição Federal garante a livre manifestação do pensamento, a ampla circulação de ideias e o direito de cada indivíduo expressar sua fé ou descrença sem qualquer intervenção censória estatal, consagrando princípios que visam observar a laicidade do Estado (art. 19, I, CF) e assegurar o pleno exercício dos direitos políticos, o que tem também o propósito de garantir igualdade de tratamento aos participantes do certame eleitoral, assegurando a eles a paridade de armas e permitindo que os eleitores realizem suas escolhas sem estarem submetidos à influência corrosiva do poder econômico, político ou das engenhosas campanhas publicitárias que, por vezes, contaminam os meios de comunicação social, sendo que os fatos apurados nesta ação, ainda que evidenciem certa compra votos, como visto linhas atrás, não revelou a participação direta, indireta ou a anuência das investigadas, não caracterizando o desequilibrio na disputa eleitoral que tenha contaminado o processo eleitoral, bem como a existência de abuso do poder econômico, com o viés reliogoso, ou politico.

 

 

3. Dispositivo

 

3.1

Destarte, em razão dos argumentos expostos, julgo improcedentes os pedidos formulados nesta ação de investigação judicial eleitoral. Em razão da aparente prática do crime de compra de votos, determino que sejam extraídas cópias de peças destes autos (inicial, documentos que acompanham a inicial, termo de assentada da audiência de instrução com os depoimentos das testemunhas e petição do MP em alegações finais) e encaminhadas para a autoridade policial a fim de apuração dos fatos. Retire-se o segredo de justiça, pois não houve determinação nesse sentido. Oportunamente, decorrido o prazo para eventual recurso, arquivem-se.

P.R.I.C. 

Campo Grande (MS), na data da assinatura eletrônica.

 

Ariovaldo Nantes Corrêa

Juiz Eleitoral