Brasão da República

JUSTIÇA ELEITORAL
 018ª ZONA ELEITORAL DE ALTAMIRA PA
 

 

AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (11527) Nº 0601175-29.2020.6.14.0018 / 018ª ZONA ELEITORAL DE ALTAMIRA PA

REPRESENTANTE: LOREDAN DE ANDRADE MELLO

Advogados do(a) REPRESENTANTE: ROBERIO ABDON D OLIVEIRA - PA7698-A, IVAN LIMA DE MELLO - PA16487-A

INVESTIGADO: ELEICAO 2020 CLAUDOMIRO GOMES DA SILVA PREFEITO, ELEICAO 2020 JORGE GONCALVES DE SOUZA VICE-PREFEITO, WELINGTON JOSE GONCALVES MOURA, CHRYSTIANO ALVES DA COSTA, ELEICAO 2020 ADEVALDO DA SILVA BRITO VEREADOR

Advogados do(a) INVESTIGADO: THIAGO SALIM FRANCO DE ALMEIDA - PA16942, RAYNA CALDERARO CRISTO - PA28639, RAFAEL DUQUE ESTRADA DE OLIVEIRA PERON - PA19681-A, ORLANDO BARATA MILEO JUNIOR - PA7039-A
Advogados do(a) INVESTIGADO: THIAGO SALIM FRANCO DE ALMEIDA - PA16942, RAYNA CALDERARO CRISTO - PA28639, RAFAEL DUQUE ESTRADA DE OLIVEIRA PERON - PA19681-A, ORLANDO BARATA MILEO JUNIOR - PA7039-A
Advogados do(a) INVESTIGADO: ALANO LUIZ QUEIROZ PINHEIRO - PA10826-A, ANA CARLA RODRIGUES GONCALVES - PA22801
Advogados do(a) INVESTIGADO: ALANO LUIZ QUEIROZ PINHEIRO - PA10826-A, ANNA JULIA FALCAO BASTOS - PA22575
Advogado do(a) INVESTIGADO: ANNA JULIA FALCAO BASTOS - PA22575

 

 

RELATÓRIO

 

LOREDAN DE ANDRADE MELLO, candidato a prefeito de Altamira nas eleições de 2020,  ajuizou ação de investigação judicial eleitoral em desfavor de CLAUDOMIRO GOMES DA SILVA, prefeito eleito de Altamira pela Coligação “A ESPERANÇA VAI NOS LIBERTAR”; de JORGE GONÇALVES DE SOUZA, vice-prefeito eleito de Altamira pela Coligação “A ESPERANÇA VAI NOS LIBERTAR”; de WELINGTON JOSÉ GONÇALVES MOURA; de CHRYSTIANO ALVES DA COSTA; e de ADEVALDO DA SILVA BRITO, candidato eleito para o cargo de Vereador de Altamira/PA pelo Partido Social Democrático – PSD.

Alega o impetrante o seguinte: que, no dia 15.11.2020, data em que foi realizada a Eleição Municipal em Altamira/PA, vários eleitores estavam trajando camisas amarelas idênticas (cor da campanha eleitoral dos investigados) e posicionavam-se próximos aos colégios eleitorais; que o senhor CHRYSTIANO ALVES DA COSTA foi abordado por Policiais Federais, que encontram camisas amarelas no interior do veículo que aquele conduzia, R$ 2.200,00 (dois mil e duzentos reais) em notas de cinquenta, vinte e dez reais, santinhos dos candidatos CLAUDOMIRO e DEDÉ; que, na Delegacia da Polícia Federal, CHRYSTIANO revelou que recebeu o material de campanha de uma pessoa no comitê de campanha de CLAUDOMIRO, no dia anterior, e que havia sido contratado por WELINGTON JOSÉ, coordenador da campanha de CLAUDOMIRO, recebendo R$ 200,00 (duzentos reais) por semana e, naquele dia, recebeu R$ 400,00 (quatrocentos reais); que a Polícia Militar realizou outra apreensão de camisas, cujo caso foi noticiado na página “https://www.facebook.com/1297525200312468/posts/3637151013016530/”; que as abordagens realizadas por pessoas que trabalhavam para a campanha eleitoral dos investigados sobre os eleitores, oferecendo-lhes vantagens financeiras para votarem nos investigados e para vestirem a camisa amarela e ficarem circulando nas proximidades dos colégios eleitorais, configuraria captação ilícita de sufrágio.

Foto e vídeos (01 ao 05) anexos à petição inicial demonstram aglomeração de pessoas com camisas amarelas nas proximidades do local de votação E.M.E.F. Prof. Antônio Gondim Lins. Tal aglomeração também foi registrada no vídeo 06, apesar de não ser possível identificar o respectivo local de votação.

Notificados, os representados CLAUDOMIRO GOMES DA SILVA e JORGE GONÇALVES DE SOUZA apresentaram contestação, alegando o seguinte: que somente o fato de ter sido apreendido R$ 2.200,00 (dois mil e duzentos reais), 7 (sete) camisetas amarelas e poucos santinhos de candidatos dentro de um veículo não indicou algum fato que pudesse configurar captação ilegal de sufrágio ou abuso de poder nas campanhas eleitorais, e que isso acarretaria inépcia da inicial por ausência da causa de pedir; que a representante sustentou suas alegações com matéria jornalística de um fato isolado, sem demonstrar concretamente nenhum liame entre ele e o uso exorbitante de dinheiro por parte dos investigados para desequilibrar a disputa eleitoral em Altamira; que o autor não apresentou um eleitor cooptado de forma ilícita ou demonstrou promessa de benesse ou a distribuição de dinheiro com o aval de CLAUDOMIRO GOMES DA SILVA em detrimento do livre exercício do voto.

 O representado ADEVALDO DA SILVA BRITO apresentou contestação em que alega o seguinte: que as provas colecionadas aos autos pela parte representante, auto de prisão em flagrante e vídeo de noticiário jornalístico, não são capazes, por si só, de comprovar as acusações assacadas na inicial, por não demonstrarem a prática de abuso de poder e/ou de captação ilegal de sufrágio; que, ao contrário do que parece crer a representante, desde sempre é permitida a entrega de santinhos em comitês eleitorais na véspera da eleição, bem como o uso ou transporte de sete camisetas e valor em dinheiro muito inferior a dez mil reais, mormente quando a pessoa encontrada possui profissão definida e mantém comercial informal de confecções/camisetas, como no caso em tela; que as alegações da exordial não trouxeram qualquer capacidade lesiva concreta de afetar a higidez do processo eleitoral, muito menos apresentaram gravidade capaz de influenciar direta ou indiretamente no resultado da eleição.

Em contestação, o representado WELINGTON JOSÉ GONÇALVES MOURA aduz que as provas trazidas aos autos pela parte representante (auto de prisão em flagrante e vídeo de noticiário jornalístico) não são capazes, por si só, de provar qualquer envolvimento do representado nas acusações trazidas na inicial, por não demonstrarem a prática de abuso de poder e/ou de captação ilegal de sufrágio. 

CHRYSTIANO ALVES DA COSTA contesta alegando: que os fatos registrados pelo autor configuraram ato de campanha natural emanado dos simpatizantes da candidatura de CLAUDOMIRO GOMES; que, na ocasião em que prestou depoimento junto à autoridade policial, em nenhum momento lhe foi perguntado sobre a origem do dinheiro encontrado no porta-luvas do carro que dirigia, de propriedade da sua mãe (modelo Onix, cor prata), esclarecendo aos policiais que o detiveram que as camisas encontradas no veículo não foram distribuídas; que o dinheiro encontrado no porta-luvas do veículo não foi recebido do candidato e que não se destinou à compra de votos.

Foi realizada audiência de instrução em que foi ouvida a testemunha do investigante - Sra. MARIA DAS GRAÇAS CARVALHO LIMA. 

Em alegações finais, o investigante reiterou a tese trazida na petição inicial, ressaltando que, no relatório do IPL nº 2020.0113676-DPF/ATM/PA, concluiu-se ser provável que CHRYSTIANO ALVES DA COSTA, de forma livre e consciente, oferecia e dava dinheiro para eleitores em troca de obter voto para o candidato a vereador DEDÉ nas eleições municipais, e que foi apreendido com CHYSTIANO cheque no valor de R$ 200,00 (duzentos reais) assinado pelo Investigado CLAUDOMIRO GOMES em 13 de novembro de 2020. Alegou, ademais, que, em sede policial, CHRYSTIANO revelou que havia sido contratado por WELINGTON JOSÉ, coordenador da campanha e braço-direito de CLAUDOMIRO GOMES, e que recebeu o material de campanha que foi apreendido consigo no comitê de campanha de CLAUDOMIRO. Requer-se, ao final, a cassação dos diplomas/mandatos e a declaração de inelegibilidade dos investigados, com aplicação de multa.

Os investigados CLAUDOMIRO GOMES DA SILVA e JORGE GONÇALVES DE SOUZA apresentaram alegações finais, ressaltando que o representante não produziu uma única prova na instrução processual sobre o abuso de poder econômico, valendo-se apenas de imagens, não confirmadas em juízo, e que o inquérito policial juntado aos autos não o vincula aos fatos carreados pelo representante, por concluir não ter havido qualquer ligação entre o indiciado e os investigados. Por fim, alegam que a única testemunha ouvida na instrução limitou-se a dizer que fora abordada na rua com convite para trabalhar no dia das eleições, não para vender ou trocar o voto, mesmo porque já havia votado. No mesmo sentido foram as alegações finais dos representados CHRYSTIANO ALVES DA COSTA E WELINGTON JOSE GONÇALVES MOURA, aduzindo-se que o Sr. Chrystiano esclareceu, em sede policial, que apenas foi contratado pelo Sr. Wellington José Gonçalves Moura para PRESTAR SERVIÇOS NA CAMPANHA dos candidatos ao cargo majoritário, e, por tal razão, tinha em seu carro santinhos e dinheiro (que era referente aos serviços prestados tanto ao referido candidato quanto às vendas de roupa que realiza). Os investigados requerem, ao final, a improcedência desta ação.

Em alegações finais, o Ministério Público Eleitoral (ID nº 102963203) ressalta que, em que pese o esforço jurídico dos nobres causídicos contratados pelos representados, os argumentos demonstram o frágil conjunto probatório que se analisa dos autos, face aos seguintes fatos: da análise dos referidos vídeos, não restou evidências suficientes para configurar captação ilícita de sufrágio ou abuso do poder econômico que acarretassem o comprometimento ou a legitimidade do resultado das eleições, vez que não restou comprovado que houve oferecimento de vantagem financeira em troca de votos em favor dos representados, mas apenas o exercício do direito do eleitor de manifestar silenciosamente a sua preferência no dia do pleito; que a testemunha Maria das Graças Carvalho Lima alegou, em audiência, ter sido abordada por pessoa em veículo de cor preta, mas o veículo que foi apreendido com o investigado Chystiano era de cor prata, conforme se depreende das fotos de ID n° 100656230; que, do contexto do inquérito policial, não restou comprovado que as ações de Chystiano eram de expresso consentimento/conhecimento dos candidatos representados, vez que em seu relatório final, a autoridade policial não afirmou com precisão a participação dos candidatos representados. Por fim, manifesta-se pela improcedência da presente ação, não se vislumbrando possibilidade de aplicação das penas legais cominadas.

Vieram os autos conclusos para decisão.
 

FUNDAMENTAÇÃO

 

Trata-se de investigação judicial eleitoral em que é imputada a prática de abuso de poder econômico (art. 22, caput, da LC n.º 64/90) e captação ilícita de sufrágio (art. 41-A, da Lei n.º 9.504/97) em face dos candidatos eleitos CLAUDOMIRO GOMES DA SILVA (prefeito), JORGE GONÇALVES DE SOUZA (vice-prefeito) e ADEVALDO DA SILVA BRITO (vereador), e dos investigados WELINGTON JOSÉ GONÇALVES MOURA e CHRYSTIANO ALVES DA COSTA.

As preliminares arguidas se confundem com a análise do mérito, motivo pelo qual as rejeito.

Não havendo questões processuais pendentes, passo à análise do mérito.

Antes de analisar as consequências jurídicas, passo à prova dos fatos alegados pelas partes. Em resumo, o autor afirma que o investigado CHRYSTIANO ALVES DA COSTA teria sido contratado por WELINGTON JOSÉ, coordenador da campanha de CLAUDOMIRO GOMES, para abordar pessoas nas ruas, aleatoriamente, oferecendo-lhes vantagens financeiras para votarem nos investigados candidatos nas eleições e para vestirem camisas amarelas, contexto em que deveriam ficar circulando nas proximidades dos colégios eleitorais em Altamira-PA. Para a cooptação, Chrystiano teria recebido o material de campanha no comitê de Claudomiro, dentre os quais estariam camisas amarelas e santinhos de candidatos, além de quantia de dinheiro em espécie para realizar as contratações dos mencionados serviços no dia da eleição. Os investigados alegam que não houve qualquer cooptação de eleitores, sendo permitida a entrega de santinhos em comitês eleitorais na véspera da eleição, e que não restou comprovado que o valor apreendido com Chrystiano foi oriundo de Claudomiro, o que suplantaria a hipótese de uso de numerário para a configuração do abuso de poder econômico aduzido na inicial.

Esses são os fatos que serão objeto da análise probatória, ressaltando às partes seus ônus: ao autor, o do fato constitutivo de seu direito e, aos investigados, o do fato extintivo/impeditivo/modificativo do direito do autor.

Das pessoas trajando camisas amarelas nas proximidades de locais de votação.

Com a inicial, foi juntada uma foto de diversas pessoas vestindo camisas amarelas (58995784), das quais não constam qualquer logo, frase ou número.

Do vídeo 01 (ID n.º 58995785) ao 05 (ID n.º 58995793), verifica-se que as filmagens foram realizadas em um mesmo quarteirão, nos arredores do local de votação E.M.E.F. Prof. Antônio Gondim Lins, conquanto em ângulos diversos.

No vídeo 01, nota-se que também há conjunto de pessoas trajando camisas vermelhas. Em nenhum desses cenários, foi registrada cooptação de eleitores.

O vídeo 06 (ID n.º 58995794) foi gravado em localidade diversa, demonstrando diversas pessoas com camisas amarelas, cujo local de votação não foi possível identificar.

O fato de diversos eleitores/militantes estarem nas ruas com camisas amarelas não revela, por si só, a incidência de captação ilícita de sufrágio, porquanto nenhuma gravação demonstrou a ocorrência de cooptação de eleitores ou compra de votos. Ademais, o vídeo de ID n.º 58995785 revelou que havia no local militantes com camisas padronizadas na cor vermelha, de modo que, em um primeiro momento, as provas trazidas pelas imagens demonstraram apenas manifestações silenciosas de eleitores que não ultrapassaram os limites da liberdade de expressão. Para a configuração do abuso de poder econômico apto a ensejar a captação ilícita de sufrágio a que se refere o art. 41-A da Lei n.º 9.504/97, é necessário um conjunto probatório robusto, inconteste e idôneo, para que reste inequívoca a ilicitude da conduta. 

Também não é possível concluir das imagens que quaisquer desses eleitores/militantes tenham sido cooptados pelo investigado Chrystiano, e, muito menos, que houve a interferência do investigado Claudomiro para tal. In casu, o ônus probatório cabe à parte autora, não havendo que se falar em caracterização de ilícitos eleitorais por meros juízos de dedução. Nesse contexto, os investigantes não demonstraram que houve distribuição de camisas em massa por ordem dos investigados candidatos no pleito, para que, desse modo, fosse possível a configuração do abuso do poder econômico.

Da apreensão de camisas, santinhos e dinheiro em posse de CHRYSTIANO ALVES DA COSTA.

Conforme relatório da autoridade policial, CHRYSTIANO ALVES DA COSTA foi surpreendido portando blusas, santinhos, anotações com os destinatários dos materiais, adesivos, dinheiro em espécie no valor de R$ 2.200,00, em notas fracionadas,  em frente a um local de votação. Concluiu-se, no âmbito inquisitório, que Chrystiano, de forma livre e consciente, arregimentou eleitores, oferecendo e distribuindo a eles dinheiro em troca de obtenção de votos em favor do candidato a vereador DEDÉ nas eleições municipais. 

Verifica-se do relatório que não houve menção a qualquer participação dos investigados Claudomiro, Jorge e Adevaldo - candidatos no pleito municipal - no que se refere às condutas praticadas por Chrystiano. De fato, houve elementos de provas que demonstraram indícios de ilícitos praticados por Chrystiano, conquanto ainda esteja sujeito a ao regular processo criminal para, somente então, haver juízo definitivo. 

Todavia, o que importa à presente ação é aferir o liame entre as condutas de Chrystiano e eventual determinação dos investigados candidatos à época, para ser possível comprovar a ocorrência de abuso de poder econômico por estes. Ocorre que o inquérito policial não mencionou tal liame, e, apesar de as suas peças serem juntadas nestes autos, conforme requerimento da parte autora, esta não demonstrou a ocorrência desse vínculo. Meras presunções não são aptas a ensejar o abuso de poder econômico, para o qual se exigem provas robustas. Tais provas não foram apresentadas oportunamente pelos investigantes e não restou comprovada em sede inquisitorial.

Ademais, sendo o inquérito policial um procedimento inquisitório, cujas conclusões ainda serão confirmadas em sede judicial, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, as conclusões por ele trazidas devem ser acompanhadas de provas e informações relevantes que confirmem, de forma inequívoca, a existência do abuso de poder econômico. Entretanto, no caso dos autos, isso não foi verificado, mormente pelo fato de o investigante não conseguir demonstrar a participação dos candidatos nas ações de Chrystiano.

Em audiência de instrução, a testemunha MARIA DAS GRAÇAS CARVALHO LIMA afirmou que, no dia da eleição, foi abordada em via pública por um senhor que lhe ofereceu R$ 70,00 para trabalhar durante o pleito, ocasião em que retirou do porta-luvas do seu veículo diversas blusas amarelas. Ainda segundo a testemunha, no dia seguinte, verificou, em um noticiário televisivo, que a pessoa que lhe ofereceu o numerário  havia sido presa e que, portanto, tratava-se do investigado Chrystiano. Conforme manifestação ministerial (ID n.º 102963203), tal depoimento vai de encontro com o relatado nos autos do inquérito policial, na medida em que a testemunha Maria das Graças afirmou que a pessoa que a abordou dirigia um veículo preto, enquanto a cor do veículo apreendido em sede policial é prata, conforme imagem acostada aos autos do inquérito de ID n.º 100656230 (fls. 97).

Nesse contexto, a desarmonia do depoimento da testemunha prestado em juízo torna a prova em comento frágil e insubsistente, não se arrimando em nenhuma outra que permita um juízo condenatório de elevada gravidade, qual seja, a cassação de registros/diplomas.

É pacífico na doutrina e na jurisprudência do Egrégio TSE que somente será cabível ao Judiciário retirar o mandato político daquele que o conseguiu por meio legítimo (voto da maioria dos cidadãos) mediante decisão fundamentada em provas inequívocas tanto da conduta praticada quanto da participação do detentor do cargo público. 

Da alegação de abuso do poder econômico.

Inicialmente, para a configuração do abuso de poder econômico, é necessário que o candidato utilize de recursos patrimoniais sob seu controle ou gestão em seu favorecimento eleitoral, conforme o seguinte aresto do E. TSE:

“[...] 3. O abuso de poder econômico entrelaçado com o abuso de poder político pode ser objeto de Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME), porquanto abusa do poder econômico o candidato que despende recursos patrimoniais, públicos ou privados, dos quais detém o controle ou a gestão em contexto revelador de desbordamento ou excesso no emprego desses recursos em favorecimento eleitoral. Precedentes: REspe n.º 28.581/MG, de minha relatoria, DJe de 23-9-2008; REspe n.º 28.040/BA, Rel, Min. Ayres Britto, DJ de 1.º-7-2008 [...]” (TSE - AAI n.º 11.708/MG - DJe 15-4-2010, p. 18-19).

Na inicial, a parte autora alega que “os Investigados tiveram gastos não declarados na prestação de contas com a confecção/compra de camisas amarelas e pessoal de campanha, eis que as investigações revelam indícios de que as pessoas recebiam valores para ficar próximas aos colégios eleitorais, como se estivessem esperando algo ou alguém”. Ocorre que, conforme já detidamente mencionado alhures, o investigante não demonstrou nos autos, de forma inequívoca, a participação direta dos candidatos com eventual distribuição em massa de camisas em troca de votos.

Conforme entendimento sedimentado do E. TSE, o abuso de poder econômico caracteriza-se pelo uso desmedido de recursos patrimoniais que, por sua vultosidade, é capaz de comprometer a isonomia da disputa eleitoral e sua legitimidade. Nesse sentido: "[...] 1. Configura abuso do poder econômico a utilização de recursos patrimoniais em excesso, sejam eles públicos ou privados, sob poder ou gestão do candidato, em seu benefício eleitoral. [...]" (AgR-RO 98090/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe de 4/9/2017).

Objetivamente, o valor apreendido correspondeu a R$ 2.200,00, ao passo que a testemunha ouvida em juízo afirmou que foi oferecido a ela o quantitativo de R$ 70,00 no dia do pleito. Assim, não há nos autos outra prova de distribuição de camisas ou valor em dinheiro em troca de votos, mas apenas o isolado depoimento da testemunha ouvida em juízo. Assim, seguindo o precedente acima citado (AgR-RO 98090/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe de 4/9/2017), verifica-se que o valor apreendido de R$ 2.200,00 equivale a 0,7% da totalidade de despesas do candidato Claudomiro na sua campanha e, adiciona-se a isso, o fato de ele ter sido eleito com a diferença de 14.981 votos em relação ao segundo colocado. Portanto, não se verifica qualquer óbice à isonomia do pleito pelo que foi demonstrado aos autos, e, somado ao fato de inexistir objetiva comprovação da participação efetiva dos investigados candidatos à época, não resta configurado o abuso de poder econômico.

O investigante alega que, durante a lavratura do auto de prisão em flagrante de Chrystiano, foi apreendido cheque no valor de R$ 200,00. Tal cheque consta dos autos do inquérito policial (ID n.º 100656230, fls. 73-74), possuindo como sacador o candidato Claudomiro Gomes e como beneficiário/tomador o Sr. Chrystiano Alves, cujo sacado é a agência do Banco do Brasil em que foi aberta a conta de campanha do candidato. Ocorre que,  na prestação de contas de Claudomiro, foi declarada a realização de despesas com Chrystiano com serviços de militância no valor total de R$ 685,00, de modo que tal cheque provavelmente foi emitido para o pagamento das mencionadas despesas devidamente declaradas perante a Justiça Eleitoral. 

 Desse modo, o ônus de provar que tal cheque possui íntima relação com eventual contratação de pessoas no dia da eleição como forma de angariar ilicitamente votos cabe à parte autora, o que não se vislumbrou dos autos. O título de crédito, por si só, não comprova a participação de Claudomiro com os fatos alegados na inicial, não havendo que se falar, desse modo, de abuso de poder econômico.

Afasto, portanto, à míngua de provas consistentes, o suposto ilícito de abuso de poder econômico pela prática de distribuição de camisetas por ordem dos candidatos.

Da alegação de captação ilícita de sufrágio.

Conforme doutrina de José Jairo Gomes (2020), a captação ilícita de sufrágio denota a ocorrência de ato ilícito eleitoral ofensivo à livre vontade do eleitor, impondo-se, assim, a responsabilização dos agentes e beneficiários do evento, que se configura sempre que a eleitor for oferecido, prometido ou entregue bem ou vantagem com o fim de obter-lhe o voto. Ainda segundo o autor:

Embora o dispositivo em exame se destine a “candidato” (TSE - AAI n.º 212-84/SE - DJe 15-10-2014), não é imperioso que a ação ilícita seja levada a efeito pelo candidato, ele mesmo. Poderá ser realizada de forma mediata, por interposta pessoa, já que se entende como “desnecessário que o ato de compra de votos tenha sido praticado diretamente pelo candidato, mostrando-se suficiente que, evidenciado o benefício, haja participação de qualquer forma ou com ele consentido [...]” (TSE - REspe n.º 21.792/MG - DJ, 21-10-2005, p. 99). É, pois, suficiente que a participação do candidato beneficiado seja indireta, havendo de sua parte “explícita anuência” (TSE - REspe n.º 21.327/MG - DJ 31-8-2006, p.125). Assim, não se exige que sua vontade seja manifestada de forma expressa, podendo sê-lo tacitamente, desde que evidente. Basta, na verdade, “seu consentimento com o ato ilegal” (TSE - AgRO n.º 903/PA - DJ 7-8-2006, p.136), ou, ainda, seu “conhecimento ou mesmo a ciência dos fatos que resultaram na prática do ilícito eleitoral, elementos esses que devem ser aferidos diante do respectivo contexto fático” (TSE - RO n.º 2.098/RO - DJe 4-8-2009, p. 103).

In casu, para que o suposto ato de distribuição de camisas e dinheiro em troca de votos seja imputado aos candidatos investigados nesta ação, e, consequentemente, para que sejam eleitoralmente responsabilizados, há mister que seja demonstrada a existência de liame entre o seu agir e o fato aludido, mediante ações ou, até mesmo, omissões. Nesse contexto, a culpa lato sensu dos investigados deveria  ser evidenciada para que eventual responsabilidade lhes fossem imputada. Entretanto, isso não ocorreu, de modo que qualquer responsabilização pelos fatos aduzidos na inicial se fundaria em mera presunção, ou seja, haveria um juízo de responsabilização objetiva, o que é vedado, conforme o seguinte aresto do E. TSE: 

“[...] 5. A desnecessidade de comprovação da ação direta do candidato para a caracterização da hipótese prevista no art. 41-A da Lei n.º 9.504/97 não significa dizer que a sua participação mediata não tenha que ser provada. Por se tratar de situação em que a ação ou anuência se dá pela via reflexa, é essencial que a prova demonstre claramente a participação indireta, ou, ao menos, a anuência do candidato em relação aos fatos apurados. 6. A afinidade política ou a simples condição de correligionário não podem acarretar automaticamente a corresponsabilidade do candidato pela prática da captação ilícita de sufrágio, sob pena de se transmudar a responsabilidade subjetiva em objetiva. Recursos especiais providos para reformar o acórdão regional” (TSE - REspe n,º 603-69/MS -DJe 15-8-2914).

Ademais, o objeto ou o fim da ação ilícita do art. 41-A da Lei n.º 9.504/97 é o voto do cidadão. Portanto, não há configuração da captação ilícita de sufrágio se outra for a causa da ação manifestada, porquanto estaria, nesse caso, ausente o requisito atinente ao condicionamento da entrega da vantagem ao voto, conforme entendimento do E. TSE:

“1. Na espécie, das circunstâncias fáticas delineadas no acórdão regional, depreende-se que o recebimento da vantagem - materializada na distribuição gratuita de bebidas - foi condicionado à permissão de colagem do adesivo de campanha, e não à obtenção do voto. 2. Não há como enquadrar a conduta imputada aos recorrentes no ilícito previsto no art. 41-A da Lei das Eleições, porquanto não restou demonstrado o especial fim de agir consistente no condicionamento da entrega da vantagem ao voto do eleitor. 3. Recursos especiais providos.” (TSE - REspe n.º 63.949/SP - DJe t. 23, 3-2-2015, p. 89-87.

Do contexto dos autos, não restou demonstrado o especial fim de agir de compra de votos na conduta de Chrystiano. Inclusive a testemunha MARIA DAS GRAÇAS CARVALHO LIMA afirmou somente que ele lhe ofereceu R$ 70,00 para que ela vestisse a camisa amarela no dia das eleições, mas não há no seu depoimento qualquer relato de que Chrystiano teria oferecido a vantagem em troca de votos ou, ainda, em troca de serviços no sentido de cooptar outros eleitores a votarem nos candidatos investigados nesta ação. Tal captação também não foi evidenciada em qualquer das filmagens trazidas pelo autor.

Pelo cotejo das provas dos autos, entendo não restar configurada a conduta vedada do art. 41-A da Lei n.º 9.504/97 - captação ilícita de sufrágio.

 

DISPOSITIVO

 

Ante o exposto,  estando ausente a comprovação do abuso de poder econômico ou de conduta vedada de captação ilícita de sufrágio, JULGO IMPROCEDENTE a presente Ação de Investigação Judicial Eleitoral, e indefiro o pedido de cassação do mandato, de aplicação de multa e de declaração de inelegibilidade.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Ciência ao Ministério Público Eleitoral.

 

Altamira-PA, datado e assinado eletronicamente.

 

 

Antônio Fernando de Carvalho Vilar

Juiz Eleitoral da 18ª ZE