EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DA 160ª ZONA ELEITORAL

 

RRC nº 0600198-42.2020.16.0134

Requerente: Ministério Público Eleitoral

Requerido(a): Paulo Sergio Nunes

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, por meio da sua agente signatária, vem, respeitosamente, no uso de suas atribuições legais, com fulcro no art. 127 da Constituição Federal, bem como no art. 3º da Lei Complementar nº 64/1990 c/c o art. 32, III, da Lei nº 8.625/1993, propor

 

AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO

DE REGISTRO DE CANDIDATURA



em face de Paulo Sérgio Nunes, já devidamente qualificado(a) nos autos do processo em epígrafe (RRC), candidato(a) a vice-prefeito no município de Reserva do Iguaçu/PR, pelo partido Partido Socialista BrasileiroPSB, com o nº 40, ante as razões de fato e de direito a seguir articuladas.

 

I – DOS FATOS

 

O(a) requerido(a) Paulo Sérgio Nunes pleiteou, perante a Justiça Eleitoral, registro de candidatura ao cargo de vereador pelo partido Partido Socialista BrasileiroPSB, após regular escolha em convenção partidária, conforme edital publicado no Diário Oficial Eletrônico do TRE-PR.

No entanto, o(a) requerido(a) encontra-se com restrição ao seu direito de elegibilidade, porquanto se enquadra na hipótese prevista no art. 1º, I, g, da LC nº 64/1990, com redação dada pela LC nº 135/2010, segundo o qual são inelegíveis:

os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da data da decisão […].

Conforme o TSE1,

a inelegibilidade prevista no art. 1º, I, g, da LC nº 64/1990 não incide em todo e qualquer caso de rejeição de contas públicas, sendo exigível o preenchimento cumulativo dos seguintes requisitos: (i) rejeição das contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas; (ii) decisão do órgão competente que seja irrecorrível no âmbito administrativo; (iii) desaprovação decorrente de (a) irregularidade insanável que configure (b) ato de improbidade administrativa, (c) praticado na modalidade dolosa; (iv) não exaurimento do prazo de oito anos contados da publicação da decisão; e (v) decisão não suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário.

No caso em tela, restam cumpridos todos os requisitos exigidos pelo TSE na sua interpretação da LC nº 64/1990.

Observa-se, de início, a existência de “rejeição das contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas”, tendo em vista que o(a) impugnado(a) teve suas contas relativas ao exercício financeiro de 2008, na condição de presidente da Câmara dos Vereadores de Reserva do Iguaçu julgadas irregulares pelo Tribunal de Contas do Estado do Paraná, com trânsito em julgado em 20/08/2015 (Processo nº 141860/19).

Assinala-se, outrossim, que o órgão responsável pela desaprovação das contas do(a) impugnado(a) ostenta competência para esse julgamento, conforme a jurisprudência do TSE:

 

EMENTA - ELEIÇÕES 2016. REGISTRO DE CANDIDATURA. RECURSO ELEITORAL. CAUSA DE INELEGIBILIDADE DA ALÍNEA 'G' DO INCISO I DO ART. 1º DA LEI COMPLEMENTAR Nº 64/90. DECISÃO PROFERIDA POR ÓRGÃO COMPETENTE. PREENCHIMENTO DE TODOS OS REQUISITOS EXIGIDOS PELA JURISPRUDÊNCIA. INELEGIBILIDADE CONFIGURADA. INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE REGISTRO MANTIDO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Em razão da possibilidade de o Juízo conhecer de ofício das causas de inelegibilidade não se há falar em decadência do direito de o Ministério Público Eleitoral opinar pelo indeferimento do pedido de registro de candidatura porque não apresentou a possível impugnação. 2. "Compete ao Tribunal de Contas julgar as contas de presidente de Câmara Municipal, nos termos do art. 71, inciso II, da CF/1988, norma de reprodução obrigatória para os Estados da Federação (art. 75 da CF/1988). Precedentes. (...)". (TSE: Recurso Especial Eleitoral nº 96558, Acórdão de 11/11/2014, Relator (a) Min. GILMAR FERREIRA MENDES, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 11/11/2014). 3. A omissão de retenção de Imposto de Renda exclusivamente sobre o subsídio do Presidente da Câmara de Vereadores caracteriza irregularidade insanável conforme precedentes do TSE, de forma que o eventual pagamento a posterior dos valores não elide a irregularidade. 4. "A inelegibilidade prevista na alínea g do inciso I do art. 1º da LC nº 64/90 não exige o dolo específico, bastando para tal o dolo genérico ou eventual, que se caracteriza quando o administrador assume os riscos de não atender aos comandos constitucionais e legais, que vinculam e pautam os gastos públicos. (...)" (Recurso Ordinário nº 44880, Acórdão de 24/05/2016, Relator (a) Min. LUCIANA CHRISTINA GUIMARÃES LÓSSIO, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 112, Data 13/06/2016, Página 36). 5. Presentes todos os elementos exigidos pela Jurisprudência para a caracterização da causa de inelegibilidade da alínea 'g' do inciso I do art. 1º da Lei Complementar nº 64/90 deve ser indeferido o pedido de registro de candidatura. 6. Recurso conhecido e desprovido. (TRE-PR - RE: 12535 DOUTOR ULYSSES - PR, Relator: IVO FACCENDA, Data de Julgamento: 17/10/2016, Data de Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 17/10/2016) Destacou-se.

 

Aludida decisão sobre as contas, em igual passo, ostenta a nota de irrecorribilidade (conforme certidão de contas irregulares de anexa que demonstra o trânsito em julgado do procedimento em 20/08/2015), o que perfaz a exigência de “decisão do órgão competente que seja irrecorrível no âmbito administrativo”.

No caso dos autos, destaca-se que a presente desaprovação de contas decorre de irregularidade insanável que configura ato doloso de improbidade administrativa. Nesse sentido, pois, aponta-se que a seguinte irregularidade insanável configura ato doloso de improbidade administrativa:

O acórdão do TCE-PR reconheceu que o requerido não reteve o IRRF sobre a remuneração dos vereadores Antônio da Silveira Caldas (R$ 346,68), José Evandro de Oliveira Soares (R$ 133,64), Nilton Vedi Pereira (R$ 431,69), Benedito Antonio Ochovi (R$ 110,96), Coleta de Fatima Serpa (R$ 346,68), Iraides de Oliveira Machado (R$ 40,27), causando prejuízo ao erário no total de R$ 1.409,93.

Tal conduta representa irregularidade insanável e ato doloso de improbidade administrativa que causa prejuízo ao erário e atenta contra os princípios administrativos da legalidade e da moralidade (artigo 10, X, e 11, caput, II da Lei de Improbidade Administrativa).

Ressalta-se que para o reconhecimento de improbidade administrativa exige-se o dolo genérico, e não específico, ou seja, a vontade de praticar a conduta que ensejou a improbidade. Nesse sentido:

 

 

ELEIÇÕES 2016. RECURSO ELEITORAL EM REGISTRO DE CANDIDATURA. CAUSA DE INELEGIBILIDADE DEVIDAMENTE TIPIFICADA. ART. 1.º, I, G, DA LC N.º 60/90. IMPROVIMENTO DO RECURSO. REGISTRO INDEFERIDO. 1. Para a configuração da inelegibilidade constante do art. 1º, I, g, da LC 64/90, imprescindível é o preenchimento de alguns requisitos, como a existência de prestação de contas relativas ao exercício de cargo ou funções públicas, o julgamento e rejeição das contas, a detecção de irregularidade insanável, que essa irregularidade caracterize ato doloso de improbidade administrativa e que haja decisão irrecorrível do órgão competente para julgar as contas. 2. A rejeição das contas por descumprimento do limite previsto no art. 29 - A da CF/88, ausência de procedimento licitatório, irregularidade em processos de licitação, Ausência de Comprovação dos Pagamentos de Imposto de Renda Retido na Fonte, conforme pacífica jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, configuram, em tese, irregularidades insanáveis e atos dolosos de improbidade administrativa, apta a atrair a inelegibilidade prevista no art. 1º , I , g , da LC nº 64 /90. 3. Para efeito do enquadramento da inelegibilidade prevista na alínea g do inciso I do art. 1º da Lei das Inelegibilidades, não se exige o dolo específico, bastando para tal o dolo genérico ou eventual, que se caracteriza quando o administrador assume os riscos de não atender aos comandos constitucionais e legais, que vinculam e pautam os gastos públicos. 4. Recurso improvido para indeferir o registro de candidatura. (TRE-MA - RE: 12206 BARÃO DE GRAJAÚ - MA, Relator: RAIMUNDO JOSÉ BARROS DE SOUSA, Data de Julgamento: 21/09/2016, Data de Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 21/09/2016). Destacou-se.

 

Pondera-se que a rejeição de contas – no presente caso concreto – se caracteriza pela irregularidade insanável, cujo significado traduz a ideia de intencional contrariedade aos princípios da administração pública e de violação à probidade administrativa.

A jurisprudência entendia que irregularidades insanáveis são as que apresentam “nota de improbidade” (TSE - REspe nº 23.345/SE – Rel. Min. Caputo Bastos - j. 24.9.2004). A partir da edição da LC nº 135/2010, o legislador estabeleceu que a inelegibilidade deve ser imputada àqueles que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa”.

JOSÉ JAIRO GOMES2 observa que “o requisito de que a inelegibilidade também configure ‘ato doloso de improbidade administrativa’ tem a única finalidade de estruturar a inelegibilidade […]. Destarte, não há falar em condenação em improbidade administrativa, mas apenas em apreciação e qualificação jurídica de fatos e circunstâncias relevantes para a estruturação da inelegibilidade em apreço”.

Das irregularidades apontadas e do inteiro teor da decisão listada, observa-se que o(a) impugnado(a) cometeu faltas graves e que, em tese, configuram ato doloso de improbidade administrativa.

Deve-se consignar que a Justiça Eleitoral tem a tarefa de aferir se os fatos que deram causa à rejeição de contas por irregularidade insanável contêm a aptidão de configurar ato doloso de improbidade administrativa, ou seja, se, em tese, importam dano ao erário, enriquecimento ilícito ou violação aos princípios da Administração Pública.

Nesse sentido, aliás, o TSE decidiu que

[p]ara fins de análise do requisito “irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa”, contido no art. 1º, I, g, da LC 64/90, compete à Justiça Eleitoral aferir elementos mínimos que relevem má-fé, desvio de recursos públicos em benefício próprio ou de terceiros, dano ao erário, improbidade ou grave afronta aos princípios que regem a administração pública. (Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 482/RS – j. 15.10.2019 - Relator Min. Jorge Mussi).

No mesmo passo, é desnecessário demonstrar qualquer elemento subjetivo específico para a configuração da inelegibilidade em apreço, sendo certo que

[o] dolo genérico ou eventual é o suficiente para a incidência do art. 1º, I, "g", da LC nº 64/1990, o qual se revela quando o administrador deixa de observar os comandos constitucionais e legais que vinculam sua atuação [...]

(TSE - Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 6085/RJ - Acórdão de 25.6.2019 - Relator Min. Edson Fachin).

Por fim, anota-se que – considerada a data da definitividade da decisão de rejeição de contas – não houve o exaurimento do prazo de 8 anos previsto em lei, e tampouco existem notícias de que essa decisão tenha sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário.

 

II – PEDIDO

 

Ante o exposto, o Ministério Público Eleitoral requer:

a) seja o(a) requerido(a) citado(a) no endereço constante do seu pedido de registro para apresentar defesa, se quiser, no prazo legal, nos termos do art. 4º da LC nº 64/1990 e do art. 41, caput, da Res.-TSE nº 23.609/2019;

b) a produção de todos os meios de provas admitidas em direito, especialmente a juntada da prova documental em anexo;

c) após o regular trâmite processual, seja indeferido em caráter definitivo o pedido de registro de candidatura do(a) requerido(a).

 

Pinhão, datado e assinado digitalmente.

 

Lorena Almeida Barcelos de Albuquerque

Promotor(a) Eleitoral da 160ª Zona Eleitoral de Pinhão/PR

1 Por todos: REspe nº 67036/PE – Rel. Min. Luís Roberto Barroso - j. 3.10.2019.

2DIREITO ELEITORAL, Editora Atlas, 6ª Edição, p. 178-179.