JUSTIÇA ELEITORAL
132ª ZONA ELEITORAL DE ITABIRA MG
REGISTRO DE CANDIDATURA (11532) Nº 0600169-60.2020.6.13.0132 / 132ª ZONA ELEITORAL DE ITABIRA MG
IMPUGNANTE: DIRETORIO MUNICIPAL DO PARTIDO SOCIAL CRISTAO - PSC
Advogado do(a) IMPUGNANTE: PAULO CESAR CAMILO - MG191987
IMPUGNADO: MARCO ANTONIO LAGE
Advogados do(a) IMPUGNADO: JOAO VICTOR SAMPAIO BRANDAO - MG118482, LUCAS DEMIAN ALMEIDA TORRES - MG148997, HUGO HENRIQUE GOMES - MG109167, DANILO DIEGO RAMOS DE ALMEIDA - MG188708, CAMILA COSTA PEIXOTO - MG163110, AMANDA TORQUATO DUARTE - MG157788, BERNARDO PASTORINI PIRES - MG126602, MARCELO AUGUSTO SANTOS TONELLO - MG75425, RAFAEL SANTIAGO COSTA - MG98869, SERGIO AUGUSTO SANTOS RODRIGUES - MG98732, MARCOS ANTONIO FONSECA RIBEIRO - MG139355
I - RELATÓRIO
Trata-se de ação de impugnação ao registro de candidatura do Sr. Marco Antônio Lage ajuizada pelo Diretório Municipal de Itabira do Partido Social Cristão – PSC.
Aduz, em suma, que o impugnado não se desincompatibilizou para concorrer ao pleito de prefeito. Diz que o demandado ocupava cargo de Diretor-Coordenador no Instituto Minas Pela Paz – IMPP e que, somente em 05/06/2020, desligou-se de referida entidade. Noticia mais: que o acionado figurava, também, como integrante de cargo de alto escalão da CEMIG, tendo deixado de se desincompatibilizar, também, no que atina a este contexto.
De sua feita, sustenta o impugnado inépcia da peça portal (haja vista alegada ausência de congruência entre o que argumentado e o que pedido), ilegitimidade passiva do candidato a candidato a vice-prefeito. No mérito, refere que a atuação do acionado no âmbito do IMPP era subordinada, bem como que os projetos eram desenvolvidos em circunscrições diversas da que se realizará o pleito dentro do qual pretende candidatar-se a prefeito. Assevera que o contrato que dera origem à presente impugnação obedece a cláusulas uniformes e que o aporte financeiro do ente público para mantença do Instituto foi irrelevante. Por fim, quanto à apresentação de desincompatibilização um dia após vencido o prazo legal, pugna por adoção de interpretação teleológica, no sentido de que se deve priorizar o fortalecimento da democracia por via da pouca importância dos fatos aduzidos pelo impugnante diante da necessidade de se disponibilizar, ao eleitorado, maior número possível de candidatos para eleição por voto direito.
Sobre o trabalho que desenvolvia na CEMIG, afirma que este era meramente técnico-administrativo e que, por isto, não reuniria condições de, exercendo mencionada função, influir nas eleições.
As partes acostaram documentos diversos em lastreio ao que argumentam.
Alegações finais apresentadas por todos, inclusive pelo Ministério Público. O impugnante, nesta oportunidade, acostou documentos, evento seguido de pedido, pelo impugnado, de desconsideração destes, haja vista que não se tratam de documentos novos, na acepção do CPC. As partes, em resumo, corroboraram os argumentos iniciais.
O parquet opinou pelo julgamento de improcedência do pedido, ancorado nos argumentos do impugnado.
Vieram-me conclusos para julgamento.
Breve relato do que importa.
II – FUNDAMENTOS
II.1 – Preliminares
Como acima grafado, sustentou o ora impugnado inépcia da inicial e ilegitimidade passiva do candidato a candidato a vice-prefeito.
Tais pedidos foram analisados e afastados, conforme evento 17150291, ao qual me reporto - nada obstante o advogado signatário tenha deixado de apresentar procuração do, até então, segundo demandado. Excluí, pois, de ofício, o impugnado em questão do polo passivo da lide.
No que atina à juntada de documentos em fase de alegações finais, tendo em vista que não se há falar em novidade destes, nos termos da lei, acolho o pedido do impugnado e determino a retirada destes dos autos.
Observadas as condições de ação e pressupostos de processo para o caso vertente, vou ao mérito.
II.2 – Mérito
Consoante já delineado, importa definir se os serviços prestados pelo candidato a candidato a prefeito, nos termos do que posto à inicial e debatido ao longo do processo, têm por efeito a necessidade de se o excluir, ou não, do pleito que se avizinha.
Analisarei, a seguir, separadamente, cada uma das duas situações postas.
II.2.1 – A impugnação ao registro de candidatura no contexto de atuação do impugnado junto ao IMPP – Instituto Minas Pela Paz.
O Instituto Minas Pela Paz, de saída, é uma OSCIP – Organização da Sociedade Civil de Interesse Público. Trata-se de entidade que desenvolve ação de utilidade pública, voltada para o interesse coletivo. É uma qualificação jurídica atribuída por lei a personalidades de direito privado para que exerçam funções delegadas pelo Poder Público. Estabeleço a premissa para que não reste dúvidas quanto ao enquadramento do IMPP no rol estabelecido pela LC n. 64/90, art. 1º, II, “l”, c/c art. 1º, IV, “a”.
Conforme aduzido pelo próprio impugnado, “suas funções consistiam em cumprir e fazer cumprir as deliberações desse órgão” (Conselho Deliberativo). Ora, quem cumpre ou faz cumprir, necessariamente, no mínimo “representa”, como diz supramencionado dispositivo jurídico, a pessoa que deliberou a respeito da ação a ser observada. Ademais, a expressão que designa o cargo ocupado pelo impugnado é “Diretor Coordenador”. Nada obstante a “declaração” do IMPP acostada, o nomen juris é eloquente a não mais poder.
“Conceitos como unidade de comando, centralização e descentralização, autoridade, poder e responsabilidade, delegação e relações laterais entre departamentos são alguns dos aspectos importantes a serem considerados para uma direção eficaz”, diz Eunice Lacava Kwasnicka, em “Introdução à Administração” (Atlas,p. 250, 2010, 6ª edição).
No “Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa” tem-se que diretor é “aquele que ocupa o cargo mais alto numa administração”
Então, seja do ponto de vista da técnica administrativa, seja do ponto de vista semântico da própria língua portuguesa, “diretor”, em resumo, é quem define. Não há adoção de teleologismo interpretativo que seja capaz de suplantar o real significado das palavras, no contexto da hipótese ou na verificação do respectivo fenômeno. Qualquer “declaração” aposta nos autos que tente desdizer este imperativo, portanto, deve ser abordada com muita restrição (quiçá desconsiderada), a ponto de não se poder considerá-la apta a sustentar a tese do candidato a candidato a prefeito.
Ademais, é dos autos que (34/79) o impugnado era presidente de multicitada pessoa jurídica (documento emitido em 10/09/2020).
Concluo: na condição de Diretor Coordenador (ou de Presidente) da IMPP, deveria o demandado se desincompatibilizar, a tempo e modo, do cargo – o que não fez. Mesmo que não se verificasse, na prática (como alegado), o exercício das respectivas funções (o que não se demonstrou, dado o acima firmado), haveria, no mínimo, “representação”, como diz a lei de inelegibilidades e conforme asseverado pelo próprio réu, quando descreve o que seriam suas funções. Ignorar a natureza do cargo exercido, de acordo com descrição estatutária ou com o que teria se verificado na prática, redundaria em agasalhar, aliás, conduta estioladora do princípio da isonomia, dado que, por exemplo, qualquer servidor público de nível inferior na hierarquia da administração pública, precisa, também, dar cabo de sua desincompatibilização para concorrer a cargo público eletivo. Não prospera, portanto, o argumento da defesa quanto a este ponto.
Friso que o impugnado afastou-se do cargo um dia após vencido o prazo para tal. O processo eleitoral demanda celeridade, tal como se observa do que previsto em lei e amplamente sufragado por doutrina e jurisprudência. Há de haver um dia, um critério temporal fixo e objetivo, que imponha o dies ad quem para a prática de atos dentro do processo. Comezinho. A “interpretação teleológica” mencionada e requerida pelo réu – que, em socorro ao que aduz, evoca o princípio democrático –, ao pedir a desconsideração de prazo com previsão legal, restaria por ferir, justamente, a própria democracia, na medida em que se chancelaria desigualdade, posto que se lhe concederia prazo mais dilatado do que o imposto pelo Estado Democrático de Direito para os demais candidatos.
Na qualidade de OSCIP, a entidade recebeu dinheiro público para seu funcionamento. Diz o impugnado que a quantia foi irrelevante. Ora, sem relevância é tal argumento, haja vista a objetividade e clareza do fato de que houve repasse público de verbas para o IMPP. Quando o dinheiro é público, nenhum valor é irrelevante. A teleologia da norma, expressão muito usada pela defesa, é, exatamente, proteger a coisa pública, a lisura do processo eleitoral, com âncora, sobretudo, no arquiprincípio da isonomia. Desimporta o quantum; no caso, dá-se relevo ao quid do aporte de dinheiro público.
Alega o demandado, ademais, uniformidade de cláusulas contratuais. Cita jurisprudência do TSE. Transcrevo: “(…) esclareceu a Ministra Luciana Lóssio no julgamento do Recurso Especial nº 41-14-MA, em 02.08.2018, segundo o qual ‘os contratos e cláusulas uniformes não excluem toda e qualquer manifestação de vontade do contratado, mas apenas impõe, essencialmente, a estipulação padronizada do conteúdo negocial pelo contratante´´”.
A passagem, numa primeira vista, apresenta uma contraditio in terminis, e nada diz com uniformidade, propriamente, de cláusulas contratuais. Pretende ressaltar, tão somente e ao que parece, o caráter público da evença, no sentido e sob o aspecto de que a manifestação volitiva do particular, qualquer que seja este, se revelaria apenas na vontade de aderir às cláusulas a serem delimitadas pelo ente contratante; trata-se, aliás, de uma exigência pré-contratual, abstrata, determinada pela Constituição e por Lei, para que se observe o princípio da igualdade, da impessoalidade e da eficiência da administração pública. Não fosse assim, restaria completamente esvaziado o conteúdo do dispositivo da lei de inelegibilidade em tela, dado que, estabelecida a premissa de cláusulas uniformes em consonância com o que sustenta o réu, qualquer contrato público, necessariamente, seria celebrado por via de cláusulas uniformes.
Dito isto, tem-se que “cláusulas uniformes” do contrato administrativo tangencia as condições estabelecidas pelo poder público para contratação de toda e qualquer prestação de serviço e aquisição de bem para seu funcionamento e implementação, com previsão de regras únicas e invariáveis para todos os contratantes, imposição trazida, como dito, em âmbito pré-negocial, abstrato, pela CRFB/88 e pelas leis que tratam do tema.
A par disto, verifico que o representado não prova a sua alegada unicidade de conteúdo das cláusulas do contrato. Acosta, aliás, em supedâneo ao argumento, instrumento público de chamamento do município de Belo Horizonte, que não guarda qualquer relevância para as eleições municipais de Itabira.
Apesar de desconsiderados, como acima posto, os documentos acostados em sede de alegações finais, é público e notório que, muito recentemente – há menos de um mês, em 16/10/2020, para ser preciso -, foi inaugurada uma unidade da APAC em Itabira. Ora, a negociação que culminou na construção e funcionamento de referida casa de ressocialização, todo o processo, não se desenrolou, começo ao fim, após a saída do impugnado do IMPP, entidade contratada para que desse conta da implementação da APAC nesta cidade. É evidente a ressonância positiva que tal fato representaria em eventual candidatura do réu.
De se ver, então, que o serviço prestado pelo IMPP se desenvolve em todo o estado de Minas Gerais, inclusive, há menos de um mês (ressalto), em Itabira.
Então, pela atuação do representado no IMPP, pela desincompatibilização a destempo, pela inconsistência absoluta do argumento de haver cláusulas uniformes, pela efetiva prestação de serviços em Itabira, necessário reconhecer o que dito pelo autor à peça inicial como verdadeiro, à luz do Direito e dos fatos, ao que se deve, via de consequência, afastar o quanto delineado pela defesa a respeito deste tema.
II.2.2 – Da atuação do representado junto à CEMIG
Aqui também o representado exerceu o cargo de Diretor. Desta vez “Diretor de Relações Institucionais e Comunicação da Companhia Energética de Minas Gerais – CEMIG”.
A CEMIG, como se sabe, é sociedade economia mista, enquadrando-se, portanto, nos comandos da LC n. 64/90, art. 1º, II, “l”, c/c art. 1º, IV, “a”.
Para que se evitem repetições desnecessárias, reporto-me, quanto ao conceito do cargo de Diretor, ao que transcrevi e afirmei acima. Negar interferência no comando de mencionada empresa, por tudo o que dos autos sobeja, beira à má-fé.
O impugnado admite que ocupava mencionado cargo, mas quer fazer crer a este Juízo que não tinha qualquer poder de deliberação, o que anda em via contrária ao que exsurge dos autos.
A própria denominação do posto que ocupou revela, a não mais poder, que, efetivamente, atuou em altos níveis de hierarquia na companhia em quadra. Diz que “não assumiu quaisquer funções de direção dentro da concessionária”. Nada obstante, diz de “suas atribuições apenas consultivas e típicas de assessoramento ao Diretor Presidente”. Mais uma vez, o alegado colide frontalmente com as atribuições inerentes à função de Diretor. Ainda assim, não há exigência legal de que exista poder de deliberação para que se configure a necessidade de desincompatibilização; incorrer-se-ia, também aqui, nas mesmíssimas incongruências com sistema político-eleitoral configurado pela Constituição e pelo arcabouço legal em vigor. A declaração da CEMIG acostada, diante do que encimado, bem como revelando-se desamparada de outras provas, não ultrapassa os limites de uma afirmação que não encontra amparo na legalidade, nos conceitos, tipos e fatos.
Vale, no mais, o que fundamentado para afastar as alegações do impugnado quanto à sua atuação no IMPP, dado que as circunstâncias são análogas.
Assim, merecem prosperar, assim como alhures, o que discorrido pelo impugnante.
III – CONCLUSÃO
Pelo expendido, resolvo o processo, com espeque no art. 487, I, CPC, e LC n. 64/90, art. 1º, II, “l”, c/c art. 1º, IV, “a”, e JULGO PROCEDENTE o pedido do impugnante para declarar o impugnado, Marco Antônio Lage, inelegível, e, via de consequência, indeferir seu pedido de registro de candidatura.
Publique-se. Intime-se.
Itabira/MG, 3 de novembro de 2020.
DALMO LUIZ SILVA BUENO
Juiz Eleitoral