TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO ESPÍRITO SANTO

JUIZ ELEITORAL DA 019ª ZONA ELEITORAL DE MUNIZ FREIRE ES - Dr. MARCELO MATTAR COUTINHO 

 

REGISTRO DE CANDIDATURA (11532) - Processo nº 0600142-66.2020.6.08.0019 - MUNIZ FREIRE - ESPÍRITO SANTO

Assunto: [Impugnação ao Registro de Candidatura]

REQUERENTE: JOAO BATISTA FERREIRA, MEU PARTIDO É MUNIZ FREIRE 40-PSB / 13-PT
IMPUGNANTE: PROMOTOR ELEITORAL DO ESTADO DO ESPIRITO SANTO

 

IMPUGNADO: JOAO BATISTA FERREIRA, MEU PARTIDO É MUNIZ FREIRE 40-PSB / 13-PT, PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO PSB, PARTIDO DOS TRABALHADORES - PT

 

 

 

REQUERENTE :JOAO BATISTA FERREIRA
IMPUGNANTE :PROMOTOR ELEITORAL DO ESTADO DO ESPIRITO SANTO
REQUERENTE :Meu partido é Muniz Freire 40-PSB / 13-PT
IMPUGNADO :JOAO BATISTA FERREIRA
IMPUGNADO :Meu partido é Muniz Freire 40-PSB / 13-PT
IMPUGNADO :PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO PSB
IMPUGNADO :PARTIDO DOS TRABALHADORES - PT
FISCAL DA LEI :PROMOTOR ELEITORAL DO ESTADO DO ESPIRITO SANTO

 

 

SENTENÇA

 

I. Relatório


 

Cuida-se de impugnação ajuizada pelo Ministério Público Eleitoral em face do pedido de registro de candidatura apresentado por JOÃO BATISTA FERREIRA (CPF 080.150.667-83) concorrente ao cargo de vice-Prefeito no Município de Muniz Freire, pela coligação Meu partido é Muniz Freire (PT e PSB), com o número 13, opção de nome JOÃO DO TUICO.

Aduz o MPE que João Batista Ferreira incorre na modalidade de inelegibilidade insculpida no art. 1º, I, g da Lei das Inelegibilidades:

Art. 1º São inelegíveis:

I - para qualquer cargo:

[...]

g) os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição;


 

Após regular citação, foi apresentada contestação, em que sustenta que a acusação do MPE não deve prevalecer em razão da desaprovação das contas não decorrer de irregularidade insanável praticada na modalidade dolosa.

É o breve relatório.

Decido.


 

II. Fundamentação


 

Considerando o fato de estarmos diante de matéria eminentemente de direito, tendo em vista ser despicienda a abertura da fase probatória e, em consequência, a apresentação de alegações finais, passo à análise do mérito, em consonância com o que preceitua o art. 43, § 3º da Resolução TSE nº 23.609/2019.

Ressalto, inicialmente, que candidato fez juntar aos autos a documentação exigida pela legislação em vigor – art. 27 da resolução 23.609/2019 do TSE.

E sem embargo dos argumentos trazidos na peça de defesa, tenho que assiste razão ao Ministério Público em sua pretensão.

Explico.

Compulsando os autos, vê-se que o pretenso candidato, nos autos do TC-2404/2012, no acórdão TC-386/2015, foi, de fato, condenado por “irregularidade referente ao item da Concessão de revisão geral anual em desconformidade com a Constituição Federal (item 4.2.2.1.1 do RTC 131/2013). Base legal: artigos 29, inciso VI e 37, inciso X, da Constituição Federal; Instrução Normativa TCEES n.º 26/2010;”

Ainda, também condenado no acórdão TC-732/2017, processo 2404/2012 em razão de revisão geral anual em desacordo com norma Constitucional:

A presente irregularidade diz respeito à violação do princípio da anterioridade (previsto na redação do art. 29, VI, da Constituição da República), por meio da edição da Lei municipal 2.212/2011, que, autorizando o reajuste nos subsídios dos vereadores da Câmara Municipal de Muniz Freire, o fez sob o título de revisão geral anual. Acerca dos fatos que permeiam esta irregularidade, a área técnica, através da ITC 9838/2014, sinteticamente os narra da seguinte forma: Relata a ITI 501/2014, que a Lei Municipal n.º 1994/2008 fixou o subsídio dos vereadores para a legislatura 2009/2012 em R$ 3.400,00. Posteriormente, o subsídio dos vereadores foi reajustado, a título de revisão geral anual, com o amparo nas seguintes leis: 1) A Lei Municipal n.º 2075/2009 concedeu o reajuste do subsídio dos vereadores municipais, no percentual de 5,79%, a título de revisão geral anual, a contar de 1º de janeiro de 2010; 2) A Lei Municipal n.º 2.173/2011 reajustou o do subsídio dos vereadores em 7%, a título de revisão geral anual, retroagindo seus efeitos a 1º de março de 2011. 3) A Lei Municipal n.º 2.212/2011 concedeu um reajuste de 5% a título de revisão geral anual, retroagindo seus efeitos a 1º de dezembro de 2011. Entende a ITI que a revisão geral anual aplica-se a todos, na mesma data, e sem distinção de índices, na forma prevista no art. 37, inciso X, da Carta Magna. Entretanto, no caso em análise ACÓRDÃO TC-386/2016 foi concedido no exercício de 2011, por intermédio da Lei 2.212/2011, reajuste apenas aos agentes políticos do Poder Legislativo, descaracterizando o conceito de revisão geral anual mencionado no supracitado artigo da Constituição Federal. Diante de tal verificação acerca da mencionada lei municipal, a ITI concluiu pela existência de vício de inconstitucionalidade, vez que não fora observado o princípio da anterioridade, materializado pelo artigo 29, inciso Vi da Constituição Federal. Conclui a ITI, portanto, que com a aprovação do reajuste previsto na Lei Municipal 2.212/2011, os agentes políticos determinaram sua própria remuneração, legislando, portanto, em causa própria. Assim, os valores pagos a título de revisão geral anual em decorrência da lei 2.212/2011, na verdade, referem-se a reajuste nos subsídios, o que não é permitido por lei. (Acórdão 386/2016 – Processo TC 2404/2012)

Também foi condenado no ACÓRDÃO TC-705/2015 proferido no processo TC2816/2013 (documento ID 11259028), mais uma vez, em razão de descumprimento de mandamento Constitucional em relação à concessão de revisão anual de subsídios.

A respeito dessas condenações, alega a defesa que as desaprovações das contas não decorrem de irregularidade insanável praticada na modalidade dolosa, sobretudo porque o acórdão TC-386/2016 destaca ausência de má-fé e de irregularidade grave.

Entretanto, neste aspecto, anota-se que “irregularidade insanável” é requisito posto pela Lei de Inelegibilidades, não constando da redação do art. 16 da Lei 8.443/1992, assim, a insanabilidade é requisito trazido pela Lei Eleitoral, cabendo, portanto, à Justiça Eleitoral dizer o que é ou não sanável.

Portanto, ainda que o Tribunal de Contas não faça menção sobre a sanabilidade da irregularidade, ou até diga que a irregularidade é sanável, isso pouco importa, pois aos olhos da LC 64/90, quem define o que é insanável, para fins de aplicação de inelegibilidade é a Justiça Eleitoral.

Seguindo com a análise, verifica-se que para caracterização da inelegibilidade, requer a LC 64/90 que a irregularidade “configure ato doloso de improbidade administrativa”.

Assim, além de insanável, para se ter a inelegibilidade em apreço a irregularidade deve configurar ato doloso de improbidade administrativa.

Neste aspecto também cabe à Justiça Eleitoral definir se a irregularidade é ou não ato doloso de improbidade administrativa e se constitui ou não inelegibilidade.

Exatamente nesse sentido não se tem mais o que acrescentar das precisas palavras de José Jairo Gomes:

Não é exigida a prévia condenação do agente por ato de improbidade administrativa, tampouco que haja ação de improbidade em curso na Justiça Comum. Na presente alínea g, o requisito de que a irregularidade também configure “ato doloso de improbidade administrativa” tem a única finalidade de estruturar a inelegibilidade. Logo, é a Justiça Eleitoral a única competente para apreciar essa matéria e qualificar os fatos que lhe são apresentados, afirmando se a irregularidade apontada é ou não insanável, se configura ato doloso de improbidade administrativa e se constitui ou não inelegibilidade. Isso é feito exclusivamente com vistas ao reconhecimento de inelegibilidade, não afetando outras esferas em que os mesmos fatos possam ser apreciados. Destarte, não há falar em condenação em improbidade administrativa pela Justiça Eleitoral, mas apenas em apreciação e qualificação jurídica de fatos e circunstâncias relevantes para a estruturação da inelegibilidade em apreço. (GOMES, José Jairo; Direito Eleitoral, editora Atlas, 14ª Edição, p. 285-286, grifo nosso).

Vê-se que cabe a esta especializada qualificar os fatos que lhe são trazidos e dizer se estes são insanáveis e se são atos dolosos de improbidade administrativa.

Observa-se, portanto que de acordo com a jurisprudência do TSE o pagamento de subsídio em desconformidade com norma constitucional é suficiente para configurar uma irregularidade insanável configuradora de ato doloso de improbidade:

Eleições 2012. Registro de candidatura. Deferimento. Rejeição de contas. Inelegibilidade. Art. 1º, I, g, da LC nº 64/90. Incidência. Alteração superveniente. Afastamento da inelegibilidade. Instância especial. Impossibilidade. [...] 3. Hipótese na qual o acórdão regional registra a rejeição de contas do presidente da Câmara de Vereadores em razão de défice orçamentário e patrimonial, falha de registro no sistema patrimonial, relatórios de gestão fiscal publicados fora do prazo e pagamento de subsídio a si mesmo acima do limite permitido constitucionalmente. 4. As irregularidades relativas ao défice orçamentário e ao pagamento de subsídios a vereadores acima do teto previsto na Constituição Federal são reconhecidas, pela maioria deste Tribunal, para efeito de incidência da inelegibilidade do art. 1º, inciso I, alínea g, da LC nº 64/90. Precedentes: REspe nº 103-28, rel. Min. Marco Aurélio, red. designado Min. Dias Toffoli, DJE de 25.3.2013; AgR-REspe nº 365-09, rel. Min. Dias Toffoli, PSESS em 25.10.2012; e AgR-REspe nº 340-25, rel. Min. Joaquim Barbosa, PSESS em 17.12.2008. [...]” (Ac. de 25.4.2013 no AgR-REspe nº 33261, rel. Min. Henrique Neves da Silva, grifo nosso)

[...]. Eleição municipal. 2012. Inelegibilidade. LC nº 64/90, art. 1º, I, g. Subsídio de vereadores. Reajuste automático. Contrariedade. Constituição Federal. [...]. 1. A rejeição de contas do então presidente da Câmara de Vereadores pelo Tribunal de Contas, em razão da violação ao disposto no art. 37, XIII, da Constituição Federal, enquadra-se na cláusula de inelegibilidade prevista no art. 1º, I, g, da LC nº 64/90, por configurar tal conduta vício insanável e ato doloso de improbidade administrativa. [...]” (Ac. de 14.2.2013 no AgR-REspe nº 45520, rel. Min. Dias Toffoli.)

"[...] Registro de candidatura. Vereador. Rejeição de contas. Pagamento de subsídios a vereadores. Violação ao art. 29, VI, "f", da Constituição Federal. Vícios insanáveis. Ato doloso de improbidade administrativa. [...] 1. A rejeição de contas do então presidente da Câmara de Vereadores pelo Tribunal de Contas Estadual, em razão do pagamento de subsídios a vereadores em percentual superior ao estabelecido na Constituição Federal, enquadra-se na inelegibilidade descrita no art. 1º, I, g, da LC nº 64/90, por configurar tal conduta vício insanável e ato doloso de improbidade administrativa. [...] 2. O cumprimento de lei orçamentária, aprovada pela própria Câmara, mas conflitante com a Constituição Federal, não basta para afastar o dolo, o elemento subjetivo do ato de improbidade administrativa.[…]" (Ac. de 5.2.2013 no AgR-REspe nº 106544, rel.  Min. Dias Toffoli.)

Eleições 2016. Agravo regimental no recurso especial. Registro de candidatura. Indeferimento. Cargo de vereador. Rejeição de contas. Pagamento de verbas indevidas. Descumprimento do art. 39, § 4º, da Constituição da República. Incidência da inelegibilidade prevista no art. 1º, i, g, da LC nº 64/90. Decisão mantida. Desprovimento. 1. O art. 1º, inciso I, alínea g, do Estatuto das Inelegibilidades reclama, para a sua caracterização, o preenchimento, cumulativo, dos seguintes pressupostos fático-jurídicos: (i) o exercício de cargos ou funções públicas; (ii) a rejeição das contas pelo órgão competente; (iii) a insanabilidade da irregularidade apurada, (iv) o ato doloso de improbidade administrativa; (v) a irrecorribilidade do pronunciamento que desaprovara; e (vi) a inexistência de suspensão ou anulação judicial do aresto que rejeitara as contas. 2. A aludida inelegibilidade se aperfeiçoa não apenas com o dolo específico, mas também com o dolo genérico, que se caracteriza quando o administrador assume os riscos de não atender os comandos constitucionais e legais, que vinculam a Administração Pública [...]” (Ac de 16.5.2017 no AgR-REspe 46890, rel. Min.Luiz Fux.)

Ademais, em fim de análise, a despeito da defesa não ter arguido nada nesse sentido, vislumbro que resta claro e preenchido requisito de irrecorribilidade da decisão, conforme demonstrou o MPE a impossibilidade de recurso em âmbito administrativo dos acórdãos (coisa julgada formal), e também o decurso de prazo inferior a 08 (oito) anos de todas as decisões trazidas nos autos.


III. Dispositivo

Ante o exposto, acolho a impugnação formulada pelo Ministério Público Eleitoral e, via de consequência, indefiro o pedido de registro de candidatura de JOÃO BATISTA FERREIRA para concorrer ao cargo de vice-Prefeito no Município de Muniz Freire, com o n.º 13, opção de nome JOÃO DO TUICO.

Registre-se. Publique-se. Intimem-se.

Cumpra-se o disposto no art. 49, §1º, da Res. TSE nº 23.609/2019.

Diligencie-se com urgência.

 

MUNIZ FREIRE-ES, 22 de outubro de 2020.

Dr. MARCELO MATTAR COUTINHO

Juiz Eleitoral