JUSTIÇA ELEITORAL
060ª ZONA ELEITORAL DE BUÍQUE PE
REGISTRO DE CANDIDATURA (11532) Nº 0600055-35.2020.6.17.0060 / 060ª ZONA ELEITORAL DE BUÍQUE PE
REQUERENTE: JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO, #-BUIQUE É POVO DE NOVO 77-SOLIDARIEDADE / 17-PSL, COMISSAO EXECUTIVA PROVISORIA MUNICIPAL DO PARTIDO SOCIAL LIBERAL DE BUIQUE - PSL, SOLIDARIEDADE - BUIQUE - PE - MUNICIPAL
IMPUGNANTE: O TRABALHO VAI CONTINUAR (MDB, PSB, PC DO B, PROS), BUÍQUE QUER MUDANÇA (PSD, PTB, DEM)
Advogado do(a) REQUERENTE: VADSON DE ALMEIDA PAULA - PE22405-A
Advogado do(a) IMPUGNANTE: CAIO CESAR VIANA DE AZEVEDO - PE39568
Advogado do(a) IMPUGNANTE: CARLOS HENRIQUE PACHECO DE ARAUJO - PE32099
IMPUGNADO: JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO
Advogado do(a) IMPUGNADO: VADSON DE ALMEIDA PAULA - PE22405-A
RELATÓRIO
Cuidam os autos de pedido de registro de candidatura para concorrer ao pleito eleitoral de 2020, tendo como requerente JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO, que pleiteia o deferimento do seu registro da candidatura ao Cargo de Prefeito de Buíque-PE pela Coligação BUÍQUE É POVO DE NOVO.
O requerimento do seu RRC foi enviado eletronicamente, pelo sistema CANDEX, à Justiça Eleitoral, no dia 16.09.2020. Recebido o pedido no sistema CAND, foi gerado o seguinte Processo de Requerimento de Registro de Candidatura – RRC – no sistema PJe: RCand n.º 0600055-35.2020.6.17.0060.
Em 25.09.2020, foi publicado o edital n.º 07, no DJE nº 197/2020, dando publicidade do Demonstrativo de Regularidade dos Atos Partidários – DRAP n.º 0600054-50.2020.6.17.0060 - da Coligação BUÍQUE É POVO DE NOVO, formada pelos partidos SOLIDARIEDADE e PSL, acompanhado dos Requerimentos de Registro de Candidatura dos seus candidatos a Prefeito, JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO – RRC n.º 0600055-35.2020.6.17.0060 e a Vice-Prefeito, MODÉZIO SOARES MACEDO - RRC n.º 0600056-20.2020.6.17.0060, iniciando assim, o prazo para impugnações ao registro.
Em 29.10.2020, JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO, por meio de seu advogado constituído nos autos, requereu, no ID n.º 10553405, a juntada de cópia da Decisão Interlocutória constante no ID n.º 10572271 proferida pelo Gabinete do Des. Josué Antônio Fonseca de Sena, durante o Plantão Judiciário do 2º Grau, no dia 12.09.2020, deferindo antecipação de tutela recursal a fim de suspender, por ora, os efeitos da decisão proferida pela Câmara Municipal de Buíque-PE, quando do julgamento da Prestação de Contas de Governo do Prefeito de Buíque, exercício 2015.
Na mesma Petição ID n.º 10553405, o impugnado ainda junta cópia da Decisão Liminar, ID n.º 10572275, proferida no dia 09.09.2020 deferindo o pedido de antecipação da tutela recursal para sobrestar os efeitos dos Acórdãos n.º 10.628/2019 (Processo: 024.296/2016-3), n.º 2.516/2018 (Processo: 007.945/2015-9), n.º 7.242/2017 e n.º 5.835/2017 (Processo: 005.138/2015-9), todos proferidos pelo Tribunal de Contas da União, até o pronunciamento definitivo da Turma Julgadora.
No dia seguinte, em 30.10.2020, JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO, por intermédio de seu advogado, requereu a juntada de duas certidões, sendo uma da Câmara Municipal de Buíque e a outra do Tribunal de Contas da União, a fim de comprovar que, no momento, inexistiam contas julgadas irregulares em ambas as instituições.
Dentro do prazo de impugnações, no dia 30.10.2020, foram protocoladas 02 impugnações ao Registro de candidatura de JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO.
A impugnação de ID n.º 11028970 de 30.10.2020, promovida pela Coligação BUÍQUE QUER MUDANÇA, foi proposta em desfavor de JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO.
A COLIGAÇÃO BUÍQUE QUER MUDANÇA alega que o requerente já foi Prefeito do município de Buíque entre os anos 2008 e 2016 e que em 2018 teve suas contas de governo, do exercício financeiro de 2015, recomendadas pela rejeição em Parecer Técnico do TCE no processo Nº 16100151-8 de Relatoria do Conselheiro Dirceu Rodolfo Melo Júnior. Relata que, posteriormente, realizado o julgamento das citadas contas no Órgão Legislativo municipal, a maioria dos vereadores de Buíque se manifestou no sentido de acatar a recomendação do TCE, julgando as contas como rejeitadas.
A fim de comprovar o alegado, a COLIGAÇÃO BUÍQUE QUER MUDANÇA junta aos autos o inteiro teor da deliberação do TCE no processo Nº 16100151-8, no ID n.º 11030218, e o Decreto Legislativo nº 04/2018, de ID n.º 11030220, em que se dá a decretação de aprovação do Parecer Técnico do TCE que recomenda a rejeição da prestação de contas de governo do exercício de 2015, período em que o impugnado era Prefeito.
Como fundamento para a impugnação da candidatura do requerente, a COLIGAÇÃO BUÍQUE QUER MUDANÇA alega a presença da causa de inelegibilidade elencada no Art. 1º, I, “g”, da LC nº 64/90, que considera inelegível aquele que tiver suas contas rejeitadas.
A impugnante enumera, em sua impugnação, os 5 (cinco) requisitos que, de forma cumulativa, configurariam inelegibilidade, quais sejam, “I) - Decisão do órgão competente; II) Decisão irrecorrível no âmbito Administrativo; III) – Desaprovação das contas devido à irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa; IV) Prazo de oito anos contados da decisão, não ter ainda exaurido; V) – Decisão não suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário”.
A seguir, passa a discorrer sobre o preenchimento de cada um dos requisitos. Em relação ao primeiro requisito, (I) decisão do órgão competente, alega a impugnante que nos termos do Art. 31, §1º da Constituição Federal de 1988, o Poder Legislativo Municipal é quem possui competência constitucional para fiscalizar as contas do município, com o auxílio do Tribunal de Contas do Estado.
Em relação ao segundo requisito, (II) Decisão irrecorrível no âmbito Administrativo, defende que nos arts. 203 a 206 do Regimento Interno da Câmara de Vereadores do Município de Buíque-PE, não teriam quaisquer recursos previstos administrativamente, o que tornaria a decisão proferida definitiva.
Quanto ao terceiro requisito, III) – Desaprovação das contas devido à irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, alega que foram encontradas diversas irregularidade insanáveis que supostamente configurariam ato doloso de improbidade administrativa. Em seguida elenca algumas, como a ausência de recolhimento de contribuições patronais previdenciárias ao RGPS, a não aplicação do percentual mínimo de 15% em ações e serviços públicos de saúde e o desrespeito à Lei de Responsabilidade Fiscal com supostas evidências de dano ao Erário e superendividamento do município.
Alega a COLIGAÇÃO BUÍQUE QUER MUDANÇA que não teria exaurido ainda o prazo do quarto requisito, IV) Prazo de oito anos contados da decisão, não ter ainda exaurido. Alegando que o Decreto Legislativo nº 04 dataria do final de 2018 e que, portanto, encontra-se vigente.
Por último, quanto ao quinto requisito, V) – Decisão não suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, alega que o impugnado teria ajuizado junto ao Juízo da Vara Única Comarca de Buíque-PE, Ação Anulatória com pedido de tutela de urgência, sob o nº 0000498-54.2020.8.17.2360, com a intenção de anular o julgamento de contas rejeitadas deliberado pela Câmara Municipal. Alega que foi indeferido o pedido de Tutela de Urgência pela Juíza da 1ª instância, na data de 31.08.2020. Junta aos autos, no ID.º 11030241, a decisão em comento.
Após, alega, a COLIGAÇÃO BUÍQUE QUER MUDANÇA, que o impugnado teria feito uso, nas palavras do impugnante, de “manobras escusas e obscuras” na condução dos agravos. Aduz que o impugnado, por intermédio de seus advogados, interpôs Recurso de Agravo de Instrumento (AI nº 0001431-07.2020.8.17.9480) no dia 02.09.2020, junto à 1ª Câmara Regional do TJPE de Caruaru-PE, onde fora distribuído para a relatoria do Desembargador Honório Gomes do Rego Filho, e que no mesmo dia requereu a desistência.
Alega que, no mesmo dia 02.09.2020, o impugnado interpôs o mesmo Recurso (AI nº 0012722-86.2020.8.17.9000), desta vez, perante o TJPE, em Recife, sendo distribuído para o Desembargador Josué Antônio Fonseca de Sena. Relata a COLIGAÇÃO BUÍQUE QUER MUDANÇA que, quatro dias depois, no dia 06.09.2020, o impugnado também requereu a desistência deste recurso.
Continuando o relato da COLIGAÇÃO BUÍQUE QUER MUDANÇA, aduz que, no dia 07.09.2020, o impugnado interpôs novo agravo no plantão do TJPE, sendo que o Desembargador Agenor Ferreira de Lima Filho teria reconhecido de pronto que a matéria não seria de apreciação no plantão e, portanto, não conheceu o recurso (AI nº 0001586-10.2020.8.17.9480), remetendo-o ao Juízo prevento, qual seja, a 1ª Câmara Regional do TJPE de Caruaru-PE. Alega que nesta nova distribuição teria sido sorteado novo relator que prontamente teria reconhecido também sua incompetência, uma vez que haveria prevenção em relação ao Desembargador Honório Gomes do Rego Filho, sendo distribuído para sua relatoria. No dia 20.09.2020, segundo a COLIGAÇÃO BUÍQUE QUER MUDANÇA, o impugnado desistiu também deste terceiro Agravo.
Continua, ainda, em sua peça de impugnação alegando a COLIGAÇÃO BUÍQUE QUER MUDANÇA que no dia 28.09.2020 foi acostada aos autos de piso, do Juízo da Vara Única Comarca de Buíque-PE, nº 0000498-54.2020.8.17.2360, uma decisão do Plantão de 2º Grau, do dia 12.09.2020, de relatoria do Doutor Desembargador Josué Antônio Fonseca de Sena, concedendo a Tutela de Urgência, no sentido de suspender os efeitos do Decreto Legislativo nº 04/2018.
Por fim, alega a COLIGAÇÃO BUÍQUE QUER MUDANÇA, “total ilegalidade e nulidade” da decisão proferida pelo plantão de 2º grau que teria ofendido as regras de definição de competência, principalmente no tocante à prevenção. Alega que, por considerar esta última decisão nula, voltaria a viger o Decreto Legislativo nº 04/2018 e, portanto, configuraria o preenchimento do quinto e último requisito.
Aduz ainda que foi protocolado diretamente na Presidência do TJPE, pedido de suspensão da referida liminar, nos autos nº 0014185-63.2020.8.17.9000, pendente de decisão.
Por último, a COLIGAÇÃO BUÍQUE QUER MUDANÇA pede o indeferimento do registro da candidatura de JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO por alegar terem sido preenchidos todos os requisitos legais previstos no Art. 1º, inc. I, alínea “g, da Lei Complementar nº 64/1990.
A impugnação de ID n.º 11036790 de 30.10.2020, promovida pela Coligação O TRABALHO VAI CONTINUAR, foi proposta em desfavor de JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO alegando que estava tempestiva e que era cabível a presente demanda.
Como fundamento para impugnação, a Coligação O TRABALHO VAI CONTINUAR alegou que o impugnado, JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO, feriu o disposto no art.1º, I, “g”, da Lei Complementar n.º 64/90 incidindo em inelegibilidade, vez que teve suas contas de governo do ano de 2015, ano em que era Prefeito do município de Buíque, rejeitadas pelo Poder Legislativo Municipal de Buíque-PE, não por meras falhas formais, mas vícios graves, insanáveis.
A COLIGAÇÃO O TRABALHO VAI CONTINUAR manifesta-se no mesmo sentido da impugnação anterior, relatando o mesmo Parecer Técnico do TCE Nº 16100151-8, no ID n.º 11030218, e o Decreto Legislativo nº 04/2018, de ID n.º 11030220, em que se dá a decretação de aprovação do Parecer Técnico do TCE que recomenda a rejeição da prestação de contas de governo do exercício de 2015. Porém, acrescenta ainda que JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO ainda incorreu em Tomadas de Contas Especiais pelo Tribunal de Contas da União.
Alega a COLIGAÇÃO O TRABALHO VAI CONTINUAR que as Tomadas de Contas Especiais de nº TC 024.296/2016-3, 005.138/2015-9 e 007.945/2015-9 teriam sido julgadas irregulares pelo TCU, inclusive com a imputação de multa e de devolução ao erário de quantias o que configuraria, na opinião do impugnante, irregularidade grave, insanável e ato de improbidade administrativa. A fim de comprovar o alegado junta aos autos os julgados do TCU de ID n.º 11039419, ID n.º 11039420, ID n.º 11039421 e ID n.º 11039424.
Aduz que as irregularidades apontadas pelo TCE e mantidas pela Câmara Legislativa seriam insanáveis e constituiriam ato de improbidade administrativa por supostamente ferir a Constituição Federal, a Lei de Responsabilidade Fiscal e as normas de direito orçamentário/fiscal.
Relata, a fim de defender seu ponto de vista, que a própria Comissão de Planejamento, Orçamento e Desenvolvimento Econômico teria apontado a ocorrência de graves irregularidades. Adiciona ainda a suposta falta de transparência das informações da gestão de JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO no ano de 2015.
Em seguida, a COLIGAÇÃO O TRABALHO VAI CONTINUAR passa a relatar os mesmos fatos alegados pela COLIGAÇÃO BUÍQUE QUER MUDANÇA, relatando que foram interpostos 4 (quatro) Agravos de Instrumento contra o indeferimento de Tutela de Urgência pelo Juízo da Vara da Comarca de Buíque-PE e que apenas no quarto, em um plantão judicial, o impugnado teria obtido o deferimento da tutela recursal a fim de suspender os efeitos da decisão proferida pela Câmara Municipal de Buíque quando do julgamento das contas de governo, exercício 2015, em que o impugnado era o Prefeito.
Alega ainda a COLIGAÇÃO O TRABALHO VAI CONTINUAR que o impugnado jamais poderia ter interposto o 4º agravo, já que o 3º ainda estava em andamento e que isso teria inviabilizado a propositura de qualquer remédio processual contra a referida liminar.
Aduz ser evidente que o impugnado, através de interposição sucessiva e sem qualquer observância das regras de prevenção teria conturbado o Judiciário induzindo este a erro. Adiciona inclusive a suposta divergência de datas para a sua convenção, entre o 3º e 4º agravo, no sentido de influenciar a decisão liminar do plantão o que justificaria a urgência do caso.
Alega ainda que o impugnado utilizou-se da questão da convenção para criar uma urgência, uma vez que tinha consciência que poderia participar da convenção mesmo estando sub judice. Reforça que esta suposta criação de urgência, e repetidas interposições de agravos comprovariam a litigância de má-fé do impugnado e defende que por tudo isso a decisão do Plantão de 2º Grau, do dia 12.09.2020, de relatoria do Doutor Desembargador Josué Antônio Fonseca de Sena, concedendo a Tutela de Urgência, deveria ser nula, em seu ponto de vista.
A COLIGAÇÃO O TRABALHO VAI CONTINUAR pleiteia, por fim, a procedência da presente AIRC no sentido de indeferir o pedido de registro de candidatura de JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO para as eleições municipais de 2020, uma vez recair sobre ele a inelegibilidade disposta na alínea “g”, do art. 1º, inciso I, da LC 64/90.
Ao fim, requer ainda, a COLIGAÇÃO O TRABALHO VAI CONTINUAR, que, em decorrência da interposição de 4 agravos de instrumentos sucessivos, visando, segundo o impugnante, à desconstituição de uma única decisão, que seja aplicada multa por litigância de má-fé ao impugnado.
Em 02.10.2020, foi emitida certidão, pela Secretaria Judiciária Remota de 1º Grau, vinculando os RRCs dos candidatos JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO e MODÉZIO SOARES MACEDO ao DRAP n.º 0600054-50.2020.6.17.0060 da BUÍQUE É POVO DE NOVO.
Em 02.10.2020, foi realizada a notificação do impugnado JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO para, querendo, apresentar defesa das impugnações, no prazo de 07 (sete) dias.
Em 06.10.2020, tempestivamente, foi apresentada contestação de ID n.º 12807930. Na defesa de JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO, foi alegado, inicialmente, a tempestividade de sua apresentação.
Alega o impugnado que as duas impugnações, tanto a da COLIGAÇÃO BUÍQUE QUER MUDANÇA quanto a da COLIGAÇÃO O TRABALHO VAI CONTINUAR, teriam se baseado em um único argumento que foram as rejeições das contas de governo, exercício 2015, rejeitadas pela Câmara Municipal.
Porém, argumenta o impugnado que, apesar das impugnações, o Decreto Legislativo nº 04/2018 estaria suspenso por decisão proferida pelo TJPE nos autos da ação anulatória nº 0000498-54.2020.8.17.2360 em tramitação na Comarca de Buíque-PE. O impugnado junta aos autos no ID n.º 12807943 referida Decisão.
O impugnado rebate o argumento das impugnações, de que a Decisão do Plantão de 2º Grau, do dia 12.09.2020, de relatoria do Doutor Desembargador Josué Antônio Fonseca de Sena, concedendo a Tutela de Urgência, deveria ser nula, argumentando que de acordo com a súmula nº 41 do TSE “Não cabe à Justiça Eleitoral decidir sobre o acerto ou desacerto das decisões proferidas por outros órgãos do Judiciário ou dos tribunais de contas que configurem causa de inelegibilidade”.
Aduz, JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO, por meio de seu advogado, que, no momento do registro de sua candidatura, o impugnado estaria plenamente apto por força de decisão judicial que suspendeu os efeitos do julgamento da Câmara Municipal de rejeição de contas.
Alega que, em virtude de supostas nulidades existentes no processo legislativo que culminou no julgamento das contas rejeitadas foi ajuizada Ação Anulatória n° 0000498-54.2020.8.17.2360 em que restou demonstrada violação do devido processo legal. Aduz que teve a tutela negada em 1ª instância, mas que foi revertido em 2º grau, em decisão concedendo a liminar proferida no dia 12.09.2020 e juntada aos autos de piso em 28.09.2020. Referida decisão deferindo tutela consta neste caderno processual no ID n.º 10572272.
Adiciona ainda, em contestação, que JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO também teria obtido, em seu favor, decisão interlocutória que data de 09.09.2020, nos autos do Agravo de Instrumento nº 1028634-23.2020.4.01.0000, que suspendeu os efeitos dos acórdãos 10628/2019 (Processo: 024.296/2016-3), 2516/2018 (Processo: 007.945/2015-9), 7242/2017 e 5835/2017 (Processo: 005.138/2015-9), da 2ª Câmara do TCU, os quais apreciaram Tomadas de Contas Especiais em desfavor do impugnado. A decisão anexada aos autos no ID nº 10572275.
No mérito, o impugnado cita o art. 1º, I, “g”, da LC 64/90 no trecho em que diz “salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário”. Alega que nesse requisito o impugnado não se enquadraria nesta hipótese de inelegibilidade, vez que a decisão em Agravo de Instrumento apreciado pelo TJPE teria sustado os efeitos do DECRETO LEGISLATIVO Nº 04/2018.
Argumenta ainda que o momento adequado para aferição das condições de elegibilidade e causas de inelegibilidade seria no momento de formalização do pedido de registro de candidatura, sustentado no art. 11, § 10, da Lei nº 9504/97 e art. 52 da Res. TSE nº 23609/2019. Nesse sentido, o marco temporal para avaliação seria o dia 16.09.2020, período em que o Decreto Legislativo nº 04/2018, relativo às contas de governo, exercício 2015, processo TC nº 16100151-8, encontrava-se com seus efeitos suspensos.
Aduz ainda, em sede de contestação que a Lei nº 13.877, de 27 de setembro de 2019, deu nova redação aos parágrafos 1º e 2º do artigo 262, e afastando, desta forma, a “inelegibilidade superveniente”. Alega que esta nova legislação já se aplicaria às Eleições de 2020.
Por fim, requer o impugnado que esta Ação de Impugnação ao Registro de Candidatura seja julgada totalmente improcedente, pelo fato de se encontrarem com efeitos suspensos tanto o Decreto Legislativo nº 04/2018 da Câmara Municipal de Buíque quanto as Tomadas de Contas Especiais apreciadas pelo TCU, ambas por força de decisões judiciais.
No dia 07.10.2020 o impugnado junta espontaneamente aos autos Certidões de Objeto e Pé de ações constantes da certidão da Justiça Estadual, ID n.º 5370439, relativo aos processos nº 0000177.10.2017.8.17.0360, nº 0000214-37.2017.8.17.0360, nº 0000296-68.2017.8.17.0360, nº 0000387-61.2017.8.17.0360, nº 0000645-03-2019.8.17.0360 e nº 0000873-75.2019.8.17.0360.
Em 11.10.2020, foi determinado pelo Juízo Eleitoral que, considerando o disposto no art. 42, da Resolução TSE nº 23.609/2019, e vez que trata-se apenas de matéria de direito, não haveria audiência de instrução. Determina cumprimento de diligência ao impugnado no prazo de 03 (dias).
Secretaria Judiciária Remota de 1º Grau junta Informação acerca da documentação necessária ao devido Processo de Requerimento de Registro de Candidatura.
Devidamente intimado, no dia 12.10.2020, para apresentar documentação pendente, JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO apresenta Certidão de Objeto e Pé faltante no dia seguinte, dia 13.10.2020.
No dia 13.10.2020, as duas coligações impugnantes juntam as Petições ID n.º 15761577 e ID n.º 15821291, a fim de colacionar ao caderno processual Decisão Terminativa do Desembargador Dr. Honório Gomes do Rego Filho, nos autos do AI nº 0001794-91.2020.8.17.9480, proferida neste mesmo dia, revogando a decisão proferida pelo plantão judiciário de 2º grau no dia 12.09.2020. A decisão restabeleceu os efeitos da decisão de Primeiro Grau que negara a concessão de tutela provisória de urgência, mantendo, assim, os efeitos da rejeição das contas apresentadas por JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO, então prefeito, em relação ao exercício de 2015, conforme julgamento da Câmara Municipal de Buíque. Referida decisão consta autos nos ID nº 15763260.
Em 14.10.2020, o impugnado junta Petição de Aditamento de Contestação reforçando seus argumentos sobre a inelegibilidade superveniente e de que o momento adequado para aferição das condições de elegibilidade e causas de inelegibilidade seria no momento de formalização do pedido de registro de candidatura.
Em 15.10.2020, é determinada a intimação das partes desta AIRC para apresentação de alegações finais em 05 (cinco) dias. No mesmo dia, todas as partes são intimadas.
No último dia do prazo, dia 20.10.2020 tanto os impugnantes quanto o impugnado juntaram suas alegações finais.
A COLIGAÇÃO O TRABALHO VAI CONTINUAR, em suas alegações finais, inicialmente, alega a tempestividade de sua manifestação. Como fundamento, aduz a coligação que no dia 13.10.2020 foi proferida decisão pelo Desembargador Honório Gomes, nos autos do Agravo de Instrumento de nº 0001794-91.2020.8.17.9480, a qual negou seguimento ao recurso interposto por JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO, e revogou decisão liminar proferida em sede de Plantão Judiciário do 2º Grau, do dia 12.09.2020.
Argumenta, a COLIGAÇÃO O TRABALHO VAI CONTINUAR, que, por conta da referida decisão, foram mantidos os efeitos da rejeição das contas apresentadas por JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO, então Prefeito, em relação ao exercício de 2015, conforme julgamento da Câmara Municipal de Buíque.
Rebate a alegação feita pela defesa de JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO de que no momento de registro de candidatura ele estava na plenitude de seus direitos políticos, argumentando que o impugnado, mesmo naquela data de 16.09.2020, já se encontrava com direitos políticos suspensos, uma vez que o Poder Judiciário teria sido levado a erro em face de sucessivas interposições de recursos.
Sustenta seu argumento no fato de que o Desembargador que concedeu a liminar não teria nem mesmo conhecimento dos recursos anteriores, vez que o agravante não menciona a interposição prévia de três recursos de mesma natureza de forma que o agravante teria induzido o Judiciário a erro.
Diante disso, alega que a decisão proferida no plantão judiciário do dia 12.09.2020 não deveria ter sequer existido, vez que só teria sido deferida por ter o Juízo sido induzido a erro. Sendo assim seria nula e inexistente, não gerando efeitos no mundo jurídico ante a, segundo a coligação, flagrante ilegalidade, má-fé processual e imoralidade. Junta ainda jurisprudências no sentido de que decisão nula não geraria efeitos jurídicos.
Alega ainda a COLIGAÇÃO O TRABALHO VAI CONTINUAR que no caso em tela o Juízo Eleitoral deveria ater-se à medida judicial válida e eficaz, qual seja, a decisão proferida pelo Desembargador Honório Gomes em 13.10.2020, que revogou a liminar anteriormente concedida.
Quanto ao argumento do impugnado acerca da Súmula nº 41 do TSE, alega que não se trata de negar a vigência da súmula, e sim de, diante de decisão do TJPE viciada e já revogada, reconhecer que na data do registro, não deveria o impugnado estar elegível.
Discorreu ainda a COLIGAÇÃO O TRABALHO VAI CONTINUAR, acerca da configuração de irregularidades graves e insanáveis quanto ao desatendimento do mínimo constitucional quanto ao percentual de gastos com a saúde, além do déficit orçamentário e endividamento do município. Além da falta de transparência apontada pelo TCE.
Por fim, a COLIGAÇÃO O TRABALHO VAI CONTINUAR pleiteia pelo deferimento desta AIRC e pela aplicação de multa por litigância de má-fé ao impugnado.
Quanto às alegações finais da COLIGAÇÃO BUÍQUE QUER MUDANÇA, ID n.º 19197968, como fundamento alega as mesmas questões da COLIGAÇÃO O TRABALHO VAI CONTINUAR quanto à decisão do Desembargador Honório Gomes, nos autos do Agravo de Instrumento de nº 0001794-91.2020.8.17.9480, a qual negou seguimento ao recurso interposto por JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO, e revogou a decisão liminar proferida em sede de Plantão Judiciário do 2º Grau, do dia 12.09.2020.
Alega a COLIGAÇÃO BUÍQUE QUER MUDANÇA, que no caso concreto em tela, agora com a liminar cassada, preenche todos os requisitos do artigo 1º, I, “g” da LC 64/90. Alega ainda que a Justiça Eleitoral teria competência para analisar a configuração ou não de ato doloso de improbidade administrativa, mesmo que o TCE não tenha dito expressamente isso em seu Parecer Técnico.
Em suas alegações finais, o impugnado JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO reafirma seus argumentos da peça de contestação. Reforça a tese de que alterações supervenientes nas condições de elegibilidade e inelegibilidade não deveriam ser consideradas e que o marco temporal deveria ser o do pedido de registro da candidatura.
Sustenta que há conservação dos efeitos da liminar revogada–art. 64 do CPC –ainda que a decisão tenha sido proferida por juiz incompetente. Alega a inaplicabilidade do art. 26-c, § 2º, da LC 64/90 – hipótese da alínea “g” –diversidade de situação das alíneas “d, e, h, j, l e n”.
Defende a ausência de irregularidade insanável, caracterizadora de ato doloso de improbidade administrativa, diante da ausência de nota de improbidade no TCE/PE.
Aduz a não incidência de inelegibilidade superveniente – reforma eleitoral de 2019 - lei federal nº 13.877, de 27 de setembro de 2019 – alteração do art. 262 do código eleitoral. Por fim, requer a total improcedência das Impugnações ao Registro de Candidatura (AIRC), promovidas contra JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO.
O Ministério Público Eleitoral, no dia 22.10.2020 apresentou sua manifestação ID n.º 19766121, opinando pelo deferimento da AIRC e indeferimento do registro de candidatura de JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO. Entendeu o MPE que as irregularidades apontadas poderiam sim ser consideradas faltas graves e que, em tese, poderiam configurar ato doloso de improbidade administrativa.
Ainda, em sua Cota Ministerial, alega o MPE que “a rejeição das contas pelo Tribunal de Contas por fatos configuradores de ato doloso de improbidade administrativa e, ausente qualquer notícia de provimento judicial que tenha suspendido ou desconstituído as referidas decisões, há de ser reconhecida a inelegibilidade por 8 anos”.
Por fim, a COLIGAÇÃO BUÍQUE QUER MUDANÇA pugna pela Tutela de Urgência em Caráter Incidental para realização de bloqueio do valor doado pela Direção Estadual do partido Solidariedade, no último dia 16.10.2020, até a decisão final sobre o deferimento ou indeferimento do registro da candidatura do impugnado.
Autos foram remetidos conclusos.
É o relatório. DECIDO.
FUNDAMENTAÇÃO
Cuida-se de impugnação ao registro de candidatura de JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO, ao argumento de que lhe faltaria uma das condições de elegibilidade na forma do art. art. 14, § 9º, da Constituição Federal c/c art. 1º, inciso I, alínea “g”, da Lei Complementar nº 64/90 (redação da LC 135/2010).
Importa referir, inicialmente, que a CF/88, em seu § 3º, art. 14, nomina, expressamente, em seus incisos I a VI, as condições de elegibilidade exigidas para o cidadão que se proponha a exercer cargo público eletivo. Destarte, antes de proceder ao registro de candidatura, o pretenso candidato haverá de demonstrar o preenchimento das condições acima descritas.
Elegibilidade é, portanto, a capacidade de o cidadão poder vir a exercer atos que impliquem ou culminem na sua eleição, pelo povo, mediante o exercício do voto direto e secreto, nos termos do caput do art. 14 da CF/88 e inelegibilidade seria a perda ou ausência das condições previstas no referido dispositivo constitucional.
Falando de outra forma, a inelegibilidade é a restrição temporária do direito público político subjetivo passivo. Os direitos políticos integram o núcleo de proteção fundamental do Jus Civitatis, possibilitando ao cidadão participar da vida política com o exercício do direito de votar e ser votado. Assim, é indubitável que as inelegibilidades surgem como exceções constitucionais e infraconstitucionais dentro do contexto normativo vigente.
A norma constitucional, no art. 14, § 9º, dispõe que Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.
As causas de inelegibilidades presentes na Lei Complementar n.º 64 (atualizada pela LC 135/10) guardam perfeita relação de concordância com a Constituição Federal, visando garantir a proteção da legitimidade, a normalidade das eleições e da moralidade e probidade para o exercício das funções públicas eletivas.
O art. 1º, I, “g”, da LC no 64/1990 (Lei das Inelegibilidades), define que são inelegíveis para qualquer cargo “os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos oito anos seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição”.
No caso em exame, o debate recai sobre se o impugnado preenche ou não a condição de elegibilidade, em razão do fato de que o mesmo teve suas contas rejeitadas pela Câmara Municipal de Vereadores de Buíque/PE, em decisão definitiva e irrecorrível, e se estaria no pleno gozo de seus direitos políticos.
Para a incidência da hipótese de inelegibilidade prevista no art. 1º,I, "g", da LC n.º 64/90, é necessária a presença cumulativa dos seguintes requisitos: a) contas rejeitadas por decisão irrecorrível do órgão competente; b) rejeição por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa; c) inexistência de decisão judicial que suspenda ou anule os efeitos da rejeição.
Ressalto que a norma não exige a existência de condenação específica por ato de improbidade administrativa, nem é necessário que tenha havido processo judicial objetivando tal condenação.
Dessa forma, o reconhecimento dessa condição compete à Justiça Eleitoral. Não se trata de nova apreciação das contas do administrador público, já julgadas pelo órgão competente. Cumpre, sim, ao julgador do registro de candidaturas, a partir dos fundamentos empregados na análise das contas, verificar se os atos que levaram à sua desaprovação configuram irregularidade insanável decorrente de ato doloso de improbidade.
A respeito do tema, manifesta-se a doutrina de Rodrigo López Zílio:
A tarefa de aferir se as contas rejeitadas, reputadas insanáveis, têm o condão de apresentar nota de improbidade, gerando restrição ao direito de elegibilidade do administrador público, é da própria Justiça Eleitoral, nos autos da AIRC ou RCED (se matéria de cunho superveniente). Portanto, é a Justiça Eleitoral quem, analisando a natureza das contas reprovadas, define se a rejeição apresenta cunho de irregularidade insanável, possuindo característica de nota de improbidade (agora, dolosa) e, assim, reconhece o impeditivo à capacidade eleitoral passiva. O julgador eleitoral deve necessariamente partir da conclusão da Corte administrativa sobre as contas apreciadas, para definir a existência da irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade, de modo a caracterizar inelegibilidade. (Direito Eleitoral. 5ª ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2016, págs. 230-231.
Inicialmente, observa-se que nas exordiais de impugnação cuidaram as Coligações impugnantes de ressaltar que a rejeição das contas do impugnado pela Câmara de Vereadores, referentes ao exercício de 2015, se deu com base nas irregularidades apontadas no Parecer Prévio emitido pelo Tribunal de Contas de Pernambuco no processo TCE-PE N° 16100151-8, destacando a ausência de recolhimento de contribuições patronais previdenciárias ao RGPS; não aplicação do percentual mínimo de 15% em ações e serviços públicos de saúde; desrespeito à lei de responsabilidade fiscal; aumento de superendividamento do município e déficit na arrecadação tributária, trazendo danos ao erário. Desse modo, não procede a alegação do impugnado no sentido de não ter os impugnantes elencado na exordial de impugnação quais irregularidades teriam ocasionado a rejeição das contas que estariam revestidas de insanabilidade e consistiriam em ato doloso de improbidade administrativa, consoante disposto no art.1º, I, “g”, da LC nº 64/1990.
As supostas ilegalidades ocorridas durante a sessão legislativa da Câmara de Buíque, que julgou irregulares as mencionadas contas, não podem ser objeto de análise em sede de impugnação de registro de candidatura. A respeito, já tramita, na Comarca de Buíque, uma ação objetivando a anulação do referido julgamento, na qual foi prolatada decisão indeferindo o pedido de liminar formulado pelo impugnado. Em decisão exarada pelo Desembargador Relator em sede de Agravo de Instrumento impetrado no Tribunal de Justiça de Pernambuco, foi revogada a decisão liminar proferida em sede de Plantão Judicial do Segundo Grau do dia 12 de setembro de 2020 e restabelecidos os efeitos da decisão de Primeiro Grau que negara a concessão de tutela provisória de urgência, de forma que continua prevalecendo a decisão emanada da Câmara Municipal (ID 15763260).
Nesse contexto, sustenta o impugnado que o marco temporal para aferir as condições de elegibilidade e as causas de inelegibilidade é a formalização do pedido de registro da candidatura, à luz do art. 11, § 10, da Lei nº 9.504/1997, e da Súmula 43 TSE. Afirma que, no momento do registro de candidatura, dia 16/09/2020, o Decreto Legislativo nº 04/2018 estava suspenso por decisão judicial proferida no plantão de 2º grau do dia 12/09/2020, o que perdurou até 13/10/2020, quando a citada decisão foi revogada, não havendo causa de inelegibilidade apta a ensejar o indeferimento do RRC. Ademais, alega que a recente minirreforma eleitoral, consubstanciada na Lei Federal nº 13.877, de 27 de setembro de 2019, incluiu os parágrafos 1º e 2º ao art. 262, do Código Eleitoral, e afastou a “inelegibilidade superveniente”, aquela decorrente da situação geradora de inelegibilidade surgida entre a data do pedido de registro e, segundo a Súmula 47 do TSE, até a data do pleito. Desse modo, aduz que mesmo com a revogação da liminar deferida em favor do impugnado pelo Tribunal Competente, o impugnado possui plenas condições de elegibilidade.
No que tange à aplicação dos parágrafos 1º e 2º do art. 262, do Código Eleitoral, incluídos pela Lei Federal nº 13.877, de 27 de setembro de 2019, às eleições de 2020, não tem razão o impugnado. Isso porque os parágrafos inseridos no referido dispositivo legal foram vetados pelo Presidente da República, veto que foi analisado pelo Congresso Nacional, no dia 27 de novembro de 2020, em sessão conjunta, na qual os parlamentares decidiram pela derrubada do veto, sendo a promulgação do veto publicada no Diário Oficial da União (DOU) em 13 de dezembro de 2019. Nessa linha, os parágrafos 1º e 2º do art. 262, do Código Eleitoral, não se aplicam às eleições de 2020, respeitando o princípio da anualidade eleitoral fixado pelo artigo 16 da Constituição Federal, segundo o qual a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência.
Também não merece acolhimento a alegação do impugnado no sentido de que as alterações desfavoráveis supervenientes ao pedido de registro não devem ser consideradas, diante do previsto no art. 11, § 10, da Lei nº 9.504/1997, e na Súmula 43 TSE, ao argumento de que as condições de elegibilidade e as causas de inelegibilidade devem ser aferidas na formalização do pedido de registro da candidatura.
O registro de candidatura do impugnado ainda não havia sido julgado na data em que foi proferida decisão pelo Desembargador Relator, em sede de Agravo de Instrumento impetrado no Tribunal de Justiça de Pernambuco, que revogou a decisão liminar proferida em sede de plantão judicial do segundo grau do dia 12 de setembro de 2020 e restabeleceu os efeitos da decisão de primeiro grau que negara a concessão de tutela provisória de urgência, de forma que continua prevalecendo a decisão emanada da Câmara Municipal. Não se trata, portanto, de inelegibilidade superveniente, aquela surgida após o registro, que, por tal razão, não poderia ser alegada na fase de impugnação, mas antes da data da eleição, a teor da previsão contida no verbete sumular 47 do TSE, in verbis: A inelegibilidade superveniente que autoriza a interposição de recurso contra expedição de diploma, fundado no art. 262 do Código Eleitoral, é aquela de índole constitucional ou, se infraconstitucional, superveniente ao registro de candidatura, e que surge até a data do pleito.
Com efeito, a medida liminar, que suspendeu a eficácia da decisão de rejeição de contas foi revogada ainda durante o trâmite do processo de registro de candidatura. Trata-se, em verdade, de inelegibilidade preexistente, não sendo passível de o impugnado alegar surpresa, considerando que se tratava de decisão proferida em sede de plantão judiciário, passível de reforma a qualquer tempo nos autos do Agravo de Instrumento interposto contra decisão proferida pelo juízo a quo, tal como ocorreu no caso. Não se trata, assim, de ampliação do alcance do art. 26-C da LC 64/90 para incidir sobre a alínea “g”, do inciso I, art. 1º, da LC 64/90, conforme alega o impugnado em suas alegações finais.
Na esteira do que foi dito, trago à colação os seguintes julgados do TSE:
ELEIÇÕES 2018. RECURSOS CONTRA EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA. SUPLENTE DE DEPUTADO ESTADUAL. INELEGIBILIDADE SUPERVENIENTE. CONDENAÇÃO POR ÓRGÃO COLEGIADO DA JUSTIÇA ELEITORAL. USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO. INELEGIBILIDADE DO ART. 1º, I, ALÍNEA D, DA LEI COMPLEMENTAR 64/90. INCIDÊNCIA. PROVIMENTO DOS RECURSOS. CASSAÇÃO DO DIPLOMA. SÍNTESE DO CASO
1. O recorrido, diplomado suplente de deputado estadual, eleito no pleito de 2018, foi condenado em ação de investigação judicial eleitoral às penas de cassação do diploma de prefeito e de inelegibilidade, referente às Eleições de 2012, por uso indevido dos meios de comunicação, em decisão proferida após o pedido de registro, o qual foi deferido pela Corte de origem, em razão da concessão de medida liminar em ação cautelar que suspendeu os efeitos da condenação na AIJE.
2. Na data do pedido de registro, em 10.8.2018, ainda não havia sido proferida a decisão colegiada no bojo da AIJE 883–86, o que veio a ocorrer em 23.8.2018, mediante acórdão publicado em 29.8.2018. Na data do julgamento do registro, em 17.9.2018, o recorrido tinha em seu favor a liminar, proferida em 10.9.2018, que suspendeu os efeitos da condenação.
3. Após o trânsito em julgado da decisão que deferiu o registro do candidato – em 20.9.2018 – e antes da data do pleito de 2018, ocorrido em 7.10.2018, a liminar foi revogada em razão da rejeição dos embargos de declaração na AIJE – decisão de 24.9.2018, publicada em 1º.10.2018. QUESTÃO PRÉVIA
4. Após a inclusão do feito na pauta de julgamento, o recorrido apresentou petição postulando o pedido de suspensão do julgamento, com a retirada do feito de pauta, para oportuna apreciação de duas questões que não merecem acolhimento, pois não diz respeito a nenhuma matéria de índole processual ou superveniente que possa obstar a análise dos recursos contra a expedição de diploma. Não se trata, ademais, de matéria de ordem pública, cognoscível pela primeira vez nesta instância.
5. No que respeita aos novos §§ 1º e 2º do art. 262 do Código Eleitoral, tais inovações legislativas não podem ser consideradas na hipótese dos autos, pois os três recursos contra expedição de diploma foram ajuizados em face do deputado ainda em 19.12.2018, quando estava em vigor a redação anterior do aludido artigo, cujo caput nem sequer trazia conceituação específica sobre os limites temporais de aferição da inelegibilidade tida por superveniente, definidas até então na pacífica jurisprudência desta Corte Superior, que a reputava caracterizada até a data do pleito. A derrubada dos vetos aos novos §§ 1º e 2º do art. 262 do Código Eleitoral, trazidos pela Lei 13.877/2019, ocorreu 1 ano depois da propositura das demandas, ou seja, em 13.12.2019.
6. A Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental 603, ajuizada pelo Partido Solidariedade, tem por objeto os julgamentos dos Recursos Especiais Eleitorais 283–41.2016.6.06.0081 e 145–89.2016.6.20.0047 desta Corte, cuja controvérsia jurídica "cinge–se ao marco temporal para se considerar as 'alterações, fáticas ou jurídicas, supervenientes ao registro' na limitação de uma candidatura, com base no artigo 11, § 10°, da Lei n° 9.504/1997 (Lei das Eleições), tendo em vista o direito político fundamental ao ius honorum", conforme consta na decisão do Ministro Luiz Fux, que determinou o processamento do feito.
7. O entendimento desta Corte é no sentido de que "a mera existência de Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental, cuja liminar ainda não foi examinada pelo Supremo Tribunal Federal, não é suficiente para acarretar o sobrestamento dos feitos judiciais em andamento" (AI 816–40, rel. Min. Henrique Neves, DJE de 16.9.2014).
8. A celeridade que exigem os feitos eleitorais, a ausência de fundamento jurídico apto a afastar a necessidade de se concluir a prestação jurisdicional, bem como a inexistência de determinação do STF suspendendo os feitos em andamento inviabilizam o acolhimento do pedido de suspensão do processo até o julgamento da ADPF 603. ANÁLISE DOS RECURSOS CONTRA EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA
9. Os recursos contra expedição de diploma serão analisados em conjunto em razão de todos terem sido ajuizados em face da mesma pessoa e sob o mesmo fundamento, qual seja: inelegibilidade decorrente de condenação em ação de investigação judicial julgada procedente pela Justiça Eleitoral, em decisão proferida por órgão colegiado.
10. A revogação da liminar, em razão da rejeição dos embargos de declaração proferida no âmbito da AIJE, ocorreu após o trânsito em julgado da decisão que deferiu o registro e antes do pleito de 2018.
11. A situação se amolda perfeitamente ao instituto da inelegibilidade superveniente, aquela surgida após o registro – que, por esse motivo, não poderia ser alegada na fase de impugnação –, mas antes da data da eleição, a teor da previsão contida no verbete sumular 47 do TSE.
12. No julgamento do RO 0600967–22.2018.6.05.0000, rel. Min. Admar Gonzaga, PSESS em 18.12.2018 (ID 3257738), este Tribunal decidiu que não poderia analisar em sede recursal no processo de registro de candidatura inelegibilidade surgida após o deferimento do registro, sob pena de violação ao devido processo legal, sem prejuízo de posterior exame em sede de eventual recurso contra a diplomação.
13. O argumento de que o recorrido teria sido mero beneficiário da conduta não merece acolhimento, pois tal tese foi rechaçada pela própria Corte de origem nos autos da AIJE, ao consignar que "a alegação dos recorrentes Luiz Sobral e Hisidora Alves de Souza de que seriam apenas meros beneficiários da conduta ilícita perpetrada por José Sidnei não merece prosperar. Isso porque preceitua o art. 22, XIV, da Lei Complementar nº 64/90 que a inelegibilidade será decretada ao representado e para quantos hajam contribuído para a prática do ilícito" (RCED 0603914–49, ID 10722088, pp. 27–28).
14. O Tribunal Regional Eleitoral baiano ainda concluiu que, "no caso em exame, os candidatos não foram meros beneficiários do ato ilícito investigado, tendo em vista que a empresa, Avante Promoções de Publicidades Ltda.–EPP – cujo proprietário é o mesmo da Rádio Líder FM – foi contratada para realizar a campanha publicitária dos recorrentes" (RCED 0603914–49, ID 10722088, p. 28).
15. Embora o registro de candidatura tenha sido deferido em razão da concessão de liminar, o recorrido estava inelegível na data do pleito de 2018, por força do disposto no art. 1º, I, d, da LC 64/90, em virtude da revogação dos efeitos da medida acautelatória, o que fez ressurgir sua condenação por uso indevido dos meios de comunicação em ação de investigação judicial eleitoral proferida por órgão colegiado.
16. No julgamento do REspe 173–93, rel. Min. Jorge Mussi, DJE de 11.5.2018, este Tribunal consignou que "o c. Supremo Tribunal Federal, no RE 929.670/DF, fixou tese com repercussão geral de que a condenação por abuso de poder ou uso indevido dos meios de comunicação social, em Ação de Investigação Judicial Eleitoral transitada em julgado, com base no texto originário do art. 22, XIV, da LC 64/90, é apta a atrair a inelegibilidade de oito anos do art. 1º, I, d, da referida Lei, com redação da LC 135/2010 (Lei da Ficha Limpa). Entendimento aplicável a todos os processos de registro de candidatura em trâmite" (REspe 173–93, rel. Min. Jorge Mussi, DJE de 11.5.2018).
17. Tendo em vista que a decisão colegiada na qual o recorrido foi condenado por uso indevido dos meios de comunicação, praticado no pleito de 2012, foi proferida após o julgamento do seu registro de candidatura a deputado estadual e antes das Eleições de 2018, os presentes recursos contra expedição de diploma são cabíveis na espécie e merecem provimento, pois a hipótese se enquadra na inelegibilidade superveniente prevista no art. 262 do Código Eleitoral, bem como no art. 1º, I, d, da LC 64/90, segundo o qual são inelegíveis "os que tenham contra sua pessoa representação julgada procedente pela Justiça Eleitoral, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado, em processo de apuração de abuso do poder econômico ou político, para a eleição na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes". CONCLUSÃO Recursos contra expedição de diploma providos para cassar o diploma de suplente de deputado estadual do recorrido, com determinação de execução imediata do julgado, após sua publicação, nos termos do art. 216 do Código Eleitoral.
(0603914-49.2018.6.05.0000 RCED - Recurso Contra Expedição de Diploma nº 060391449 - SALVADOR – BA, Acórdão de 17/03/2020, Relator(a) Min. Sergio Silveira Banhos Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 130, Data 01/07/2020, grifei)
ELEIÇÕES 2018. RECURSO ORDINÁRIO. REGISTRO DE CANDIDATURA. DEPUTADO FEDERAL. IMPUGNAÇÃO. INDEFERIMENTO. PRIMEIRA CAUSA DE PEDIR: INELEGIBILIDADE. ART. 1º, I, P, DA LC N. 64/90. DOAÇÃO ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA JURÍDICA. DIRIGENTE. EQUILÍBRIO E LISURA DO PLEITO. NÃO COMPROMETIMENTO. PROPORCIONALIDADE. PONDERAÇÃO NECESSÁRIA. ELEMENTOS DE CONVICÇÃO. CONTEMPORANEIDADE. CORRELAÇÃO. FATO. AUSÊNCIA. NÃO INCIDÊNCIA DA PECHA. SEGUNDA CAUSA DE PEDIR: INELEGIBILIDADE. ART. 1º, I, G, DA LC N. 64/90. CONTAS PÚBLICAS. REJEIÇÃO. GESTOR. SUPERINTENDÊNCIA. AUTARQUIA. MANIFESTAÇÕES E RECURSOS DO IMPUGNANTE. PRECLUSÃO TEMPORAL. INEXISTÊNCIA. CERTIDÃO. JUNTADA. TSE. DOCUMENTO NOVO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. TEOR. ALCANCE INSUFICIENTE. TESE NOVA. LINHA ARGUMENTATIVA. NÃO CONFORMAÇÃO COM MANIFESTAÇÕES ANTERIORES. TRIBUNAL DE CONTAS. DECISÃO SUSPENSA. LIMINAR DA JUSTIÇA COMUM. AÇÃO ORDINÁRIA. POSTERIOR REVOGAÇÃO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. MEDIDA EFÊMERA. RESTRIÇÃO. CAPACIDADE PASSIVA ELEITORAL. RESTABELECIMENTO. DATA ANTERIOR À DA DIPLOMAÇÃO. REQUISITOS CARACTERIZADORES DA ALÍNEA G. PREENCHIMENTO. REVISÃO DO CONTEÚDO DECISÓRIO DA CORTE DE CONTAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 41/TSE. INCIDÊNCIA DA CAUSA DE INELEGIBILIDADE. DESPROVIMENTO.
I. INELEGIBILIDADE DO ART. 1º, I, P, DA LC N. 64/90
1. Nos termos da iterativa jurisprudência desta Corte Superior – reafirmada para as eleições de 2018 –, "a procedência de representação por doação de recursos financeiros de campanha acima do limite legal não atrai, por mero apriorismo, a incidência da inelegibilidade do art. 1º, I, p, da LC n. 64/90, a qual demanda, ante a sua natureza restritiva a direito fundamental, a impossibilidade de um juízo de proporcionalidade e de razoabilidade, com a percepção, ainda que em tese, de vulneração dos bens jurídicos tutelados pelo art. 14, § 9º, da CF, quais sejam, a normalidade e a legitimidade das eleições" (RO n. 0603059–85/SP, de minha relatoria, PSESS de 8.11.2018).
2. A contrariedade aos bens jurídicos tutelados, com a necessária ponderação no exame de cada caso concreto, há de ser extraída do decreto condenatório proferido na representação correspondente, sopesando–se fatos e elementos de convicção contemporâneos e correlacionados.
3. No caso, embora o Tribunal a quo tenha partido de uma premissa teórica correta, ao destacar, introdutoriamente, a jurisprudência desta Corte, incorreu, no passo seguinte, em manifesto equívoco, pois colheu os subsídios do seu convencimento da atual declaração de bens do candidato (anexada ao registro de candidatura ora em apreço), e não dos elementos reconhecidos pelo juízo da condenação.
4. O reforço sobre a inexistência de conjuntura mais gravosa, demonstrativa de quebra da normalidade do pleito, advém da condenação da doadora, nos autos da representação, ao pagamento de multa no patamar mínimo legal, sem cumulação de proibição de contratar com o poder público.
5. Inelegibilidade não configurada. Fundamento afastado.
II. INELEGIBILIDADE DO ART. 1º, I, G, DA LC N. 64/90
6. Prestada informação pela serventia judiciária do Tribunal a quo no sentido da ocorrência de equívoco cartorário, uma vez não observada integralmente a norma regulamentar sobre publicações e intimações durante o período eleitoral, descabe assentar preclusão temporal em desconsideração à forma e ao prazo pelos quais esses atos foram efetivados.
7. A juntada de certidão durante o trâmite do recurso, mesmo o ordinário, diretamente nesta Corte Superior, pressupõe que a iniciativa da parte esteja revestida de justo motivo, sendo dela o ônus argumentativo e demonstrativo sobre impedimento anterior, sob pena de supressão de instância.
8. O intuito de retratar, por certidão, situação cuja consolidação, se existente, ocorreu em período anterior à própria formalização do requerimento de registro de candidatura, e que poderia ter sido alegada a tempo e modo, é suficiente para afastar o permissivo do art. 435 do CPC.
9. In casu, a medida liminar, de natureza efêmera, pela qual suspensa a eficácia da decisão de rejeição de contas (TC n. 03780/026/06), foi revogada em 16.10.2018, antes, portanto, da diplomação dos eleitos e ainda durante o trâmite do processo de registro de candidatura na instância originária.
10. Por se cuidar de inelegibilidade pré–existente, não cabe cogitar de surpresa do eleitorado e do próprio candidato, uma vez consabido que a situação jurídica do player era provisória, passível, assim, de revisão a qualquer tempo nos autos da ação ordinária na qual deferida a tutela de urgência, tal como ocorreu na espécie, a reforçar a intelecção de que o marco final da diplomação, e não o da eleição, se mostra mais consentâneo com o arcabouço normativo, interpretado de forma holística, para fins de incidência de inelegibilidade.
11. Posterior notícia de restabelecimento da liminar, por decisão igualmente efêmera, proferida após a data da diplomação, não enseja nova análise do caso sob essa ótica.
12. Os requisitos do art. 1º, I, g, da LC n. 64/90 demandam preenchimento conjugado, o que se observa na hipótese: (i) o recorrente exercia cargo público (superintendente de autarquia); (ii) a decisão foi emanada pelo órgão competente (Tribunal de Contas do Estado de São Paulo); (iii) as irregularidades são consideradas insanáveis e configuram, em tese, ato doloso de improbidade administrativa ante o forte traçado de que o recorrente nenhum apreço demonstrou pela delicada situação financeira do ente autárquico – e, como exemplo, o total dos precatórios devidos superou a cifra de R$ 102.000.000,00 (cento e dois milhões de reais), havendo anotação, sobre o saldo de precatórios, de que expressivo numerário não foi inscrito no mapa do exercício nem no balanço patrimonial de modo a falsear a confiabilidade das peças contábeis –; e (iv) há trânsito em julgado da deliberação da Corte de Contas, não mais suspensa por tutela acautelatória do Poder Judiciário.
13. Inelegibilidade configurada. Fundamento mantido.
CONCLUSÃO
14. Recurso ordinário não provido, haja vista a manutenção da conclusão regional sobre a incidência da inelegibilidade descrita na alínea g do inciso I do art. 1º da LC n. 64/90.
15. Petição ID n. 14495538, de 8.8.2019, não conhecida.
(604627-39.2018.6.26.0000 RO - Recurso Ordinário nº 060462739 - SÃO PAULO - SP Acórdão de 13/08/2019 Relator(a) Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 50, Data 13/03/2020- grifei)
No mérito, vale esclarecer que a inelegibilidade decorrente de rejeição de contas encontra-se disciplinada no art.1º, I, “g”, da LC nº 64/1990.
Como se vê, a inelegibilidade por rejeição de prestação contas depende da existência, simultânea, dos seguintes fatores: a) que o candidato tenha tido suas contas relativas ao exercício de cargos ou função pública rejeitadas pelo órgão competente; b) que a rejeição tenha se dado em razão de irregularidades insanáveis que configure ato doloso de improbidade administrativa; c) que a decisão haja transitado em julgado; d) que tenha decorrido menos de oito anos da data da decisão; e) que tal decisão não tenha sido suspensa ou anulada por decisão judicial.
No presente caso, restou incontroverso que: a) o impugnado teve suas contas referentes ao exercício de 2015, quando exercia o cargo de Prefeito de Buíque, rejeitadas por decisão da Câmara de Vereadores de Buíque baseadas em parecer prévio emitido pelo Tribunal de Contas de Pernambuco; b) não houve recurso de tal decisão, que se deu em 06/12/2018, portanto há menos de 8 (oito) anos da data do pedido de registro de candidatura do impugnado; d) inexiste decisão judicial suspendendo ou anulando a mencionada decisão.
No que tange à Tomadas de Contas Especiais, o impugnado obteve, em seu favor, decisão interlocutória que data de 09.09.2020, nos autos do Agravo de Instrumento nº 1028634-23.2020.4.01.0000, que suspendeu os efeitos dos acórdãos 10628/2019 (Processo: 024.296/2016-3), 2516/2018 (Processo: 007.945/2015-9), 7242/2017 e 5835/2017 (Processo: 005.138/2015-9), da 2ª Câmara do TCU, os quais apreciaram Tomadas de Contas Especiais em desfavor do impugnado. A decisão foi anexada aos autos no ID nº 10572275.
Por outro lado, registre-se que o candidato figura na relação disponibilizada pelo TCE-PE, que lista os “gestores públicos que tiveram suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas irregulares, por decisão irrecorrível, nos 8 anos anteriores ao pleito de 15/11/2020, nos termos do que dispõe o art. 1º, I, “g”, da Lei Complementar n. 64/1990”.
Como já dito, é entendimento pacífico nos Tribunais que “a insanabilidade das irregularidades que causarem a rejeição das contas pode ser aferida pela Justiça Eleitoral nos processos de registro de candidatura” (TSE – RO 577 – Rel. Min. Fernando Neves da Silva – DJU 03/09/2002). Assim, no presente caso resta-nos verificar se as irregularidades apontadas pelo Tribunal de Contas de Pernambuco no parecer prévio que serviu de suporte para que a Câmara Municipal de Buíque rejeitasse as contas do ora impugnado são consideradas “irregularidades insanáveis que configurem ato doloso de improbidade administrativa”.
Conforme se vê da Decisão TCE-PE N° 16100151-8, o Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco recomendou a rejeição da prestação de contas referentes ao exercício de 2015 apresentadas pelo ex-prefeito JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO em face de restarem constatadas as seguintes irregularidades (ID11030219):
(...)PARECER PRÉVIO
Decidiu, à unanimidade, a SEGUNDA CÂMARA do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco em sessão Ordinária realizada em 05/07/2018,
CONSIDERANDO o Relatório de Auditoria;
CONSIDERANDO o deficit de execução orçamentária da ordem de R$ 6.813.922,96, a significar a realização de despesa em volume superior às receitas arrecadadas;
CONSIDERANDO o crescente endividamento do Município, demonstrando uma baixa capacidade de honrar com os compromissos de curto prazo, visto que o Passivo Circulante cresceu 133,50%, passando de R$ 2.439.133,94 (2014) para R$ 5.695.463,51 ( 2015), da outra banda piorou a situação financeira do Município, sofreu uma redução no Disponível de 10,18%, passou de R$ 4.290.590,83 (2014) para R$ 3.853.646,02 (2015), ponto 3.2.1 do Relatório de Auditoria;
CONSIDERANDO o crescimento dos Restos a Pagar Processados no exercício destas contas, visto que cresceu de forma expressiva, precisamente 164,58%, passou de R$ 1.972.618,27 (2014) para R$ 5.219.152,85 (2015), ponto 3.2.1 do Relatório de Auditoria;
CONSIDERANDO que o Prefeito contribuiu para a geração do deficit orçamentário supracitado, uma vez que: a) autorizou despesas orçamentárias em patamares superiores ao devido, graças a não anulação das dotações indicadas como fontes de créditos adicionais; b) as receitas orçamentárias foram superestimadas, resultando em frustração da arrecadação; c) não arrecadou os impostos municipais, as taxas e nem a receita de contribuição de iluminação pública; e d) não elaborou o decreto contendo a Programação Financeira e o Cronograma Mensal de Desembolso;
CONSIDERANDO que as despesas com saúde atingiram apenas o percentual da 9,78%, aplicando nos serviços de saúde abaixo do mínimo constitucional que é de 15,00% - art. 77, dos ADCT da CF/88, regulamentado pela Lei Complementar n° 141/2012, nos termos do Apêndice V do Relatório de Auditoria;
CONSIDERANDO que o comprometimento com as despesas de pessoal no 3° quadrimestre foi superior ao percentual máximo permitido – 54,00%, precisamente 63,33% da Receita Corrente Líquida, contrariando o art. 20, inciso III, da Lei Federal n° 101/2000, nos termos do Apêndice III do Relatório de Auditoria;
CONSIDERANDO as deficiências no Portal da Transparência da Prefeitura Municipal de Buíque, visto que o Poder Executivo municipal não disponibilizou integralmente para a sociedade o conjunto de informações exigido na LRF, na Lei Complementar nº 131/2009, na Lei nº 12.527/2011 (LAI) e na Constituição Federal, apresentando nível de transparência “Crítico”, conforme aplicação de metodologia de levantamento do ITMPE, item 10.1 do Relatório de Auditoria;
CONSIDERANDO o disposto nos artigos 70 e 71, inciso I, combinados com o artigo 75, bem como com os artigos 31, §§ 1º e 2º, da Constituição Federal e o artigo 86, § 1º, da Constituição de Pernambuco ;
EMITIR Parecer Prévio recomendando à Câmara Municipal de Buíque a das rejeição contas do(a) Sr(a). Jonas Camelo De Almeida Neto, relativas ao exercício financeiro de 2015. (...)
Ao comentar o art. 1°, I, “g”, da LC 64/09, leciona o renomado especialista JOEL JOSÉ CÂNDIDO que, para ser considerada insanável, a irregularidade “deve se erigir em improbidade administrativa, e não se circunscrever só a erro de aspecto formal” e acrescenta que “a Lei n° 8.429, de 2.6.92, define os casos que se caracterizam como improbidade administrativa, e eles, neste artigo ora comentado, têm a mesma aplicação conceitual” (Em Direito Eleitoral Brasileiro, pág. 133, Ed. Edipro, 1998).
No caso ora analisado, as irregularidades elencadas pelo Tribunal de Contas não apontam enriquecimento ilícito por parte do impugnado. Resta-nos, porém, averiguar se tais irregularidades causaram prejuízos ao erário, ou se atentam contra os princípios da administração pública.
Conforme ensinamentos doutrinários, dolo é a vontade e consciência de realizar a conduta descrita no tipo.
A inelegibilidade em testilha se aperfeiçoa com o dolo genérico ou eventual, que se configura quando o administrador assume os riscos de não atender aos comandos constitucionais e legais, que vinculam a Administração Pública. Isso, não se exige o dolo especifico de causar prejuízo ao erário ou atentar contra os princípios administrativos, bastando a vontade de praticar a conduta em si que ensejou a improbidade. A esse respeito, assim se manifestou o STJ: "o dolo que se exige para a configuração de improbidade administrativa é a simples vontade consciente de aderir à conduta, produzindo os resultados vedados pela norma jurídica - ou, ainda, a simples anuência aos resultados contrários ao direito quando o agente público ou privado deveria saber que a conduta praticada a eles levaria -, sendo despiciendo perquirir acerca de finalidades específicas" (ED-Al n. 1.092.100/RS, Rei. Min. Mauro Campbell Marques, DJE 31.5.2010).
No mesmo sentido vem decidindo o Tribunal Superior Eleitoral:
Eleições 2016. Agravo regimental no recurso especial. Registro de candidatura. Indeferimento. Cargo de vereador. Rejeição de contas. Pagamento de verbas indevidas. Descumprimento do art. 39, § 4º, da Constituição da República. Incidência da inelegibilidade prevista no art. 1º, i, g, da LC nº 64/90. Decisão mantida. Desprovimento. 1. O art. 1º, inciso I, alínea g, do Estatuto das Inelegibilidades reclama, para a sua caracterização, o preenchimento, cumulativo, dos seguintes pressupostos fático-jurídicos: (i) o exercício de cargos ou funções públicas; (ii) a rejeição das contas pelo órgão competente; (iii) a insanabilidade da irregularidade apurada, (iv) o ato doloso de improbidade administrativa; (v) a irrecorribilidade do pronunciamento que desaprovara; e (vi) a inexistência de suspensão ou anulação judicial do aresto que rejeitara as contas. 2. A aludida inelegibilidade se aperfeiçoa não apenas com o dolo específico, mas também com o dolo genérico, que se caracteriza quando o administrador assume os riscos de não atender os comandos constitucionais e legais, que vinculam a Administração Pública [...]” (Ac de 16.5.2017 no AgR-REspe 46890, rel. Min.Luiz Fux, grifei)
No tocante à não obediência às normas e padrões contábeis exigidos pela Contabilidade Pública; e à não disponibilização integralmente para a sociedade do conjunto de informações exigido na LRF, vê-se, à evidência, que se tratam de descumprimentos de meras formalidades governamentais e que, a rigor, não podem ser consideradas como causa de inelegibilidade por improbidade administrativa.
Por outro lado, no que se refere às demais irregularidades apontadas no citado parecer do TCE-PE, extrai-se do caderno processual que o conjunto dessas irregularidades constituem vício insanável caracterizador de ato doloso de improbidade administrativa, de forma que os pressupostos para a inelegibilidade prevista no art. 1º, I, "g", da LC n.º 64/90 restam claramente atendidos. Vejamos:
No que concerne à extrapolação do limite de gastos com pessoal imposto pela Lei de Responsabilidade Fiscal, tenho que caracteriza ato de improbidade administrativa passível de gerar inelegibilidade.
De acordo com o inteiro teor do decidido pelo TCE-PE (ID 11030218), “A Despesa Total com Pessoal do Poder Executivo, no 3º quadrimestre de 2015, alcançou R$ 46.107.483,52, e atingiu o percentual de 63,33% em relação à Receita Corrente Líquida do Município, desrespeitando, assim, o limite previsto no artigo 20 da LRF”.
A respeito valem ser transcritos o seguintes Acórdãos do Tribunal Superior Eleitoral:
“[...] Deputado estadual. Registro de candidatura. Inelegibilidade. Art. 1º, i, g, da LC 64/90. Rejeição de contas públicas. Julgamento. Competência. Irregularidades insanáveis. Ato doloso de improbidade administrativa. Desprovimento. [...] 3. As irregularidades que ensejaram a rejeição das cinco contas públicas são insanáveis e configuram ato doloso de improbidade administrativa, atraindo a inelegibilidade do art. 1º, I, g, da LC 64/90. São elas: a) extrapolação do limite de 70% das despesas da Câmara Municipal com folha de pagamento (art. 29-A, § 1º, da CF/88); b) divergência de valores entre as despesas empenhadas e o valor declarado nas contas, comprometendo a veracidade do balanço orçamentário; c) omissão do dever de prestar contas quanto à gestão de três fundos municipais, impossibilitando a aferição da regularidade dos recursos financeiros aplicados. Agravo regimental desprovido.” (Ac. de 25.9.2014 no AgR-RO nº 41351, rel. Min. João Otávio de Noronha.)
“[...]. Registro de candidatura. Indeferimento. Eleições 2012. Vereador. Rejeição de contas pelo TCE/ES. Expresidente da Câmara Municipal. Ausência de recolhimento de contribuição previdenciária e extrapolação dos limites de gastos pelo Poder Legislativo. Art. 29-A. Irregularidades insanáveis que configuram ato doloso de improbidade. Incidência da inelegibilidade do art. 1°, I, g, da LC n° 64/90. [...] 1. Nos termos da orientação fixada neste Tribunal, o não recolhimento de verbas previdenciárias e a extrapolação dos limites de gastos pelo Poder
Legislativo Municipal previstos na Constituição Federal são irregularidades insanáveis que configuram atos dolosos de improbidade administrativa. 2. O saneamento do processo promovido pelo TCE com base na sua legislação específica, diante da quitação do débito, não tem o condão de assentar a boa-fé e a ausência de dolo por parte do recorrente, porquanto o dolo a se perquirir para a incidência da inelegibilidade por rejeição de contas se refere às condutas irregulares praticadas. [...]” (Ac. de 19.8.2014 no REspe nº 4366, rel. Min. Luciana Lóssio.)
“[...] Registro de candidatura indeferido. Inelegibilidade do art. 1º, inciso I, alínea g, da Lei Complementar nº 64/1990. [...] Descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal. [...] 6. O Tribunal Regional Eleitoral, analisando o conjunto probatório dos autos, concluiu pela existência dos requisitos da causa de inelegibilidade do art. 1º, inciso I, alínea g, da LC nº 64/1990. Inviável o reenquadramento jurídico dos fatos no caso concreto. 7. O TSE tem entendido que o descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal configura vício insanável e ato doloso de improbidade administrativa. [...]” (Ac. de 24.6.2014 no AgR-REspe nº 16522, rel. Min. Gilmar Mendes.)
“Eleições 2012. Registro de candidatura. Indeferimento. Rejeição de contas. Inelegibilidade. Art. 1º, I, g, da Lei Complementar nº 64/90. Incidência. 1. A não observância do limite previsto no art. 29-A da Constituição Federal e o descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal configuram irregularidades insanáveis que constituem, em tese, ato doloso de improbidade administrativa para efeito de incidência da inelegibilidade. Precedentes. 2. Para a apuração da inelegibilidade prevista na alínea g do inciso I do art. 1º da LC nº 64/90, não se exige o dolo específico; basta, para a sua configuração, a existência de dolo genérico ou eventual, o que se caracteriza quando o administrador deixa de observar os comandos constitucionais, legais ou contratuais que vinculam a sua atuação. [...]” (Ac. de 25.4.2013 no AgR-REspe nº 38567, rel. Min. Henrique Neves.)
“[...]. Eleições 2012. Registro de candidatura Vereador. Indeferimento. Presidente da Câmara Municipal. Contas de gestão. Tribunal de Contas. Rejeição. Irregularidade insanável. Ato doloso de improbidade. Art. 1°, I. g, da LC n°64/90. Incidência. [...]. 1. Está consolidado nesta Corte o entendimento de que a irregularidade decorrente da extrapolação do limite máximo previsto no artigo 29-A, I, da Constituição Federal para as despesas do Poder Legislativo é insanável e constitui ato doloso de improbidade administrativa (Precedentes [...]). 2. A jurisprudência deste Tribunal já assentou ser irrelevante a indagação quanto ao percentual extrapolado para a caracterização da inelegibilidade em questão (Precedente: REspe nº 115-43, rel. Min. Marco Aurélio, redator para acórdão Min. Dias Toffoli, de 9.10.2012). [...]” (Ac. de 2.4.2013 no AgR-REspe nº 39659, rel. Min. Luciana Lóssio.)
“ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. INDEFERIMENTO. CARGO DE VEREADOR. REJEIÇÃO DE CONTAS. DESPESAS EM VALOR SUPERIOR AO LIMITE FIXADO NO ART. 29-A, I, DA CRFB/88. EXCESSO DE 0,84%. DOLO PRESUMIDO. INCIDÊNCIA DA INELEGIBILIDADE PREVISTA NO ART. 1º, I, G, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 64/90. DECISÃO MANTIDA. DESPROVIMENTO.
1. O art. 1º, inciso I, alínea g, do Estatuto das Inelegibilidades reclama, para a sua caracterização, o preenchimento, cumulativo, dos seguintes pressupostos fático-jurídicos: (i) o exercício de cargos ou funções públicas; (ii) a rejeição das contas pelo órgão competente; (iii) a insanabilidade da irregularidade apurada, (iv) o ato doloso de improbidade administrativa; (v) a irrecorribilidade do pronunciamento que desaprovara; e (vi) a inexistência de suspensão ou anulação judicial do aresto que rejeitara as contas;
2. O ultraje aos limites do art. 29-A da Lei Fundamental de 1988 qualifica-se juridicamente, para fins de exame do estado jurídico de elegibilidade, como (i) vício insanável e (ii) ato doloso de improbidade administrativa, independentemente do percentual que exorbita o teto de gastos constitucional (Precedentes: TSE - AgR-RO nº 161.144, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, PSESS em 16.11.2010; REspe nº 115-43/SP, redator para o acórdão Min. Dias Toffoli, PSESS em 9.10.2012; REspe nº 93-07/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, PSESS em 18.12.2012; AgR-REspe nº 326-79/SP e AgR-REspe nº 455-51/SP, Rel. Min. Henrique Neves, DJe de 20.5.2013; AgR-REspe nº 198-52/SP, Rel. Min. Henrique Neves, DJe de 28.5.2013; AgR-RO nº 709-18/SP, Rel. Min. Maria Thereza, PSESS de 4.11.2014; REspe nº 588-95/SP, de minha relatoria, PSESS em 1º.12.2016).
3. O dolo da conduta do Presidente da Câmara Municipal que procede à realização de despesas exorbitando os tetos constitucionais do art. 29-A é presumido, circunstância que afasta, para sua caracterização, qualquer análise a respeito do aspecto volitivo do agente que praticou o ato irregular.
4. In casu, a) o Recorrente teve suas contas, relativas ao exercício de 2011, rejeitadas pelo Tribunal de Contas, nos termos do Acórdão n° TC-002549/026/11, com trânsito em julgado em 12.12.2014 (fls. 217). As irregularidades materializaram-se com a realização de despesas em montante correspondente a 7,84% do somatório da receita tributária e transferências, efetivamente realizadas no exercício anterior, em desacordo com o art. 29-A, inciso I, da Constituição de 1988, incluído pela Emenda Constitucional n° 25, de 2000;
b) ao apreciar a quaestio, o TRE/SP, debruçando-se sobre o acervo fático-probatório, concluiu que a irregularidade apurada pela Corte de Contas (i.e. realização de despesas a maior, em flagrante desacordo com o art. 29-A, I, da CRFB/88) consubstancia vício insanável, apta, desse modo, a atrair a causa de inelegibilidade prevista na alínea g do inciso I do art. 1° da LC nº 64/90;
c) a fixação de limites constitucionais para gastos em âmbito municipal, levada a efeito pelo constituinte reformador em sucessivas reformas (ECs nº 25/2000 e nº 58/2009), ancorou-se na necessidade premente de implantar uma política de responsabilidade fiscal nessas entidades, de forma a reduzir, sobremaneira, a discricionariedade do gestor (no caso, Presidente da Câmara Municipal) na realização de despesas do Poder Legislativo que, não raro, comprometiam a saúde financeira da municipalidade, em razão do investimento em áreas pouco prioritárias, e, por consequência, devastavam as contas públicas locais;
d) aludido arranjo institucional evita, ou, ao menos, amaina, a promiscuidade oneômana das Câmaras Municipais com gastos dessa natureza, a qual, à evidência, subtraía recursos essenciais à manutenção dos serviços públicos básicos da edilidade.
e) a aplicação das máximas da proporcionalidade e da razoabilidade para aferir a existência in concrecto de dolo na transgressão aos arts. 29, VI, e 29-A da Constituição, instituiria um critério excessivamente subjetivo e casuístico de análise dessas condutas, de sorte a estimular o gestor a proceder a gastos em patamares sempre próximos (a maior ou a menor) dos limites estabelecidos, testando diuturnamente a tolerância decisória do Tribunal com tais violações;
f) a fixação de standard objetivo no exame de ofensas aos tetos dos arts. 29, VI, e 29-A (i.e., a simples contrariedade já configurar vício insanável e doloso de improbidade) empresta segurança jurídica, previsibilidade e isonomia a todos os gestores no âmbito do Legislativo local, os quais terão plena ciência ex ante acerca das condutas permitidas ou proscritas;
g) os Presidentes de Câmaras Municipais deverão ser mais cautelosos e prudentes no controle dos gastos orçamentários, porque o ultraje aos limites constitucionais, em qualquer percentual, ensejará irregularidade de natureza insanável caracterizada como dolosa para fins de inelegibilidade. É a própria efetividade das normas constitucionais que estão em jogo: ou bem referidas disposições são dotadas de imperatividade, força cogente, e, portanto, de cumprimento compulsório, ou bem se apresentam como recomendações sem qualquer força vinculante a seus destinatários;
h) ademais, parâmetros objetivos repudiam eventuais voluntarismos decisórios, materializados em juízos de proporcionalidade e de razoabilidade desprovidos de qualquer desenvolvimento analítico e metodológico, recaindo, bem por isso, em achismos travestidos de fundamentação jurídica. A consequência inescapável é desastrosa, por ocasionar mais insegurança e injustiças aos envolvidos, e, no limite, por comprometer a própria credibilidade da Justiça Eleitoral, que terá decisões conflitantes em situações bastante assemelhadas;
i) no âmbito eleitoral, em especial nas impugnações de registro por alínea g, prestigiar essa política de maior responsabilidade fiscal reclama uma postura fiscalizatória mais criteriosa por parte da Justiça Eleitoral, sempre que se verificar a inobservância dos limites encartados nos arts. 29, VI, e 29-A, razão pela qual é defeso transigir com comportamentos desidiosos e irresponsáveis praticados pelos Presidentes de Câmaras Municipais, que, sabidamente, tinham plena consciência das restrições orçamentárias previamente estabelecidas e, ainda assim, ultrapassaram os limites impostos pela Lei Maior. Advogar tese oposta equivale a abrir uma fresta perigosa e deletéria para a realização de despesas para além do que autoriza a Constituição;
j) como consectário, a desaprovação das contas, alusivas ao exercício de 2011 (TC-002549/026/11), ante a realização de despesas em montante superior ao previsto no art. 29-A, consubstancia vício insanável configurador de ato doloso de improbidade administrativa.
5. Agravo regimental desprovido.” (0000441-96.2016.6.26.0386 RESPE - Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 44196 - PIRAPORA DO BOM JESUS - SP Acórdão de 01/06/2017 Relator(a) Min. Luiz Fux Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 07/08/2017 )
No mesmo sentido, é o julgado do TRE/PE:
“ELEIÇÕES 2012. REGISTRO DE CANDIDATURA. IMPUGNAÇÃO. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA DA COLIGAÇÃO. REJEIÇÃO DE CONTAS. TCE. INELEGIBILIDADE ART. 1º, I, "G" DA LEI COMPLEMENTAR N.º 64/90.
1. Preliminar de ilegitimidade ativa rejeitada. Não importa as atribuições do representante da coligação impugnante antes da eleição (presidente da comissão de licitação da recorrente e também seu responsável pela prestação de contas). No processo, ele atua como representante da coligação e é isso o que importa;
2. A Câmara Municipal de Solidão julgou como irregulares as contas municipais da recorrente referente ao exercício financeiro de 2003 em razão das seguintes irregularidades: a) excesso de gastos com pessoal, com franca violação à lei de responsabilidade fiscal; b) não anexação à prestação de contas das demonstrações contábeis consolidadas; c) não envio de prestação de contas dos fundos municipais de saúde, criança e adolescente e assistência social; d) aplicação dos recursos do FUNDEF com desvio de finalidade;
3. O conjunto dessas irregularidades constituem vício insanável caracterizador de ato doloso de improbidade administrativa, cabendo, nesse caso a incidência do art. 1º, I, G da LC 64/90;
4. Em relação ao exercício financeiro de 2004, constatou-se a presença das seguintes irregularidades: execução direta de serviços contratados como execução indireta, infringindo o art.11, inciso I, da Lei nº 8429/92; procedimento licitatório em desacordo com a Lei 8666/93; c) excessos de gastos com obras de engenharia decorrentes de despesas indevidas no montante de R$ 18.320,00.
5. Neste caso, primeiramente o TCE aprovou as contas com ressalvas. Entretanto, após pedido de rescisão apresentado pelo MP de Contas, o TCE reformou sua decisão e recomendou considerar as contas irregulares.
6. Entretanto, comungo do entendimento de que, quando a irregularidade se refere a verba referente à convênio, a competência do TCE é para julgar e não opinar sobre as contas;
7. Dessa forma, também as irregularidades referente ao exercício financeiro de 2003 incidem na inelegibilidade prevista no art. art. 1º, I, G da LC 64/90;
8. Recurso desprovido.”
(RE - Recurso Eleitoral n 5935 - solidão/PE ACÓRDÃO de 22/08/2012 Relator(a) CARLOS DAMIÃO PESSOA COSTA LESSA Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 22/08/2012)
No que diz respeito às despesas com saúde, que atingiram apenas o percentual de 9,78%, com aplicação de recursos mínimos nas ações e serviços públicos de saúde abaixo do mínimo constitucional, que é de 15,00% - art. 77, do ADCT da CF/88, regulamentado pela Lei Complementar n° 141/2012, vem sendo considerada pelo TSE como ato de improbidade administrativa para fins da incidência da inelegibilidade prevista no Art. 1º, I, “g”, da Lei Complementar nº 64/90.
De acordo com o inteiro teor do decidido pelo TCE-PE (ID 11030218), “O Município de Buíque aplicou em ações e serviços públicos de saúde, por meio do FMS, o percentual de 9,78%, não atendendo, assim ao previsto no artigo 77 dos ADCT da CF”.
Nesse ponto, destaco o teor do seguinte julgado do TSE:
“Eleições 2012. Registro de candidatura. Indeferimento. Rejeição de contas. Percentual mínimo constitucional. Saúde. Não aplicação. Inelegibilidade. Art. 1º, I, g, da Lei Complementar nº 64/90. Incidência. - A não aplicação de percentual mínimo de receita resultante de impostos nas ações e serviços públicos de saúde constitui irregularidade insanável que configura ato doloso de improbidade administrativa - para efeito da incidência da inelegibilidade prevista no Art. 1º, I, g, da Lei Complementar nº 64/90 [...]”
(Ac. de 5.2.2013 no AgR-REspe nº 44144, rel. Min. Henrique Neves.)
Quanto ao déficit de execução orçamentária da ordem de R$ 6.813.922,96, a significar a realização de despesa em volume superior às receitas arrecadadas; e o crescente endividamento do Município, demonstrando uma baixa capacidade de honrar com os compromissos de curto prazo, visto que o Passivo Circulante cresceu 133,50%, passando de R$ 2.439.133,94 (2014) para R$ 5.695.463,51 ( 2015), da outra banda piorou a situação financeira do Município, sofreu uma redução no Disponível de 10,18%, passou de R$ 4.290.590,83 (2014) para R$ 3.853.646,02 (2015), ponto 3.2.1 do Relatório de Auditoria, conforme descrito no parecer do TCE/PE, aprovado pela Câmara de Vereadores de Buíque/PE (ID 11030218), também constitui irregularidade insanável que configura ato doloso de improbidade administrativa.
Nesse ponto, destaco trecho do parecer prévio do TCE/PE (ID 11030218):
[ID.06] Existência de deficit de execução orçamentária, ou seja, o Município realizou despesas em volume superior à arrecadação de receitas, no montante de R$ 6.813.922,96 (item 2.5).
Irregularidades ou deficiências relacionadas:
[ID.03] Ausência de elaboração de programação financeira e cronograma de execução mensal de desembolso (Item 2.3).
[ID.19] Empenhar e vincular despesas aos recursos do FUNDEB sem lastro financeiro, em montante acima da receita recebida no exercício, provocando comprometimento da receita do exercício seguinte (Item 7.3).
[ID.20] Baixo percentual de arrecadação da Receita Tributária Própria em relação à Receita Total arrecadada (Item 2.5.1).
[ID.21] Baixa arrecadação dos créditos inscritos em dívida ativa (Item 2.5.1).
[ID.11] O Município não tem capacidade de honrar imediatamente (Item 3.2.1) ou no curto prazo (Item 3.2.2) seus compromissos de até 12 meses.
[ID.03] Ausência de previsão, na programação financeira, de desdobramento das receitas previstas em metas bimestrais de arrecadação (Item 2.3).
Irregularidades ou deficiências relacionadas:
[ID.04] O Município não tem capacidade de honrar imediatamente seus compromissos de curto prazo (Item 3.2.1).
[ID.05] O Município não tem capacidade de pagamento de seus compromissos de até 12 meses contando com os recursos a curto prazo (caixa, bancos, estoques, etc.) (Item 3.2.2).
[ID.06] Existência de deficit de execução orçamentária, ou seja, o Município realizou despesas em volume superior à arrecadação de receitas, no montante de R$ 6.813.922,96 (item 2.5).
[ID.07] Inscrição de Restos a Pagar não Processados a serem custeados com recursos vinculados sem que houvesse disponibilidade de caixa (Item 3.4.1).
[ID.08] Inscrição de Restos a Pagar sem que houvesse disponibilidade de recursos, vinculados ou não vinculados, para seu custeio (Item 3.4.1).
[ID.09] Ausência de recolhimento de contribuições previdenciárias ao RGPS (Item 3.4.2).
[ID.10] Ausência de recolhimento de contribuições previdenciárias ao RPPS (Item 9.3).
[ID.11] O Município não tem capacidade de honrar imediatamente (Item 3.2.1) ou no curto prazo (Item 3.2.2) seus compromissos de até 12 meses.
[ID.12] Ausência de previsão, na programação financeira, de desdobramento das receitas previstas em metas bimestrais de arrecadação (Item 2.3).
Relatou a auditoria que o Município de Buíque apresentou um baixo desempenho de arrecadação no exercício de 2015, demonstrou que a Receita Arrecadada foi de R$ 83. 425.939,66, e a Receita Prevista no Orçamento de 2014 foi de R$ 95.726.900,00. Já no tocante à execução orçamentária apresentou um deficit de R$ 6.813.922,96, visto que a Receita Arrecadada foi de R$ 83.425.939,66, enquanto que a despesa executada foi maior, no valor de R$ 90.239.862,62, detalhes quadros/gráficos abaixo extraídos do Relatório de Auditoria. (...)
Quando analiso os números do Quociente de Arrecadação, ponto 2.1.1 do Relatório de Auditoria, quadro acima, constato que os Orçamentos do Município estão sendo superestimados, senão vejamos:
. A Receita Prevista no ano de 2015 – R$ 95.726.900,00, é 67,49% maior quando comparado com a Receita Prevista nos últimos quatro anos – R$ 64.612.000,00 (2011). Já a Receita Arrecadada entre 2011 e 2015, cresceu 46,23%. Passou de R$ 57.050.586,84 (2011 – deficitária) para R$ 83.425.939,66 (2015 – deficitária);
. Ao longo dos anos, constato que a Receita Arrecadada cresceu, mesmo assim, o crescimento está muito menor do que o crescimento da Receita Prevista. O crescimento da Receita Prevista na Lei Orçamentária Anual – LOA do exercício destas contas: A Receita Prevista em 2015 foi de R$ 95.726.900,00, enquanto que a de 2014 foi de R$ 90.437.800,00, constato um acréscimo de 5,85%;
. O orçamento de 2013 foi o que esteve mais perto do equilíbrio, visto que a Prefeitura arrecadou R$ 78.316.721,82 e a Receita Prevista foi de R$ 81.072.200,02;
. O crescimento da Receita Prevista entre os exercícios de 2013 e o de 2015 foi de 18,08%, passando de R$ 81.072.200,00 (2013) para R$ 95.726.900,00 (2015), enquanto que a Receita arrecada teve um incremento de apenas 6,52%, passando de R$ 78.316.721,28 (2013) para R$ 83.425.939,66 (2015).
. O Município não elaborou a Programação Financeira e o Cronograma Mensal de Desembolso, evitando, assim, evidenciar despesas em patamares superiores às receitas arrecadas, quando não realizou a limitação de empenho e movimentação financeira, nos termos do art. 9° da LRF:
(...)
. A despesa autorizada cresceu 49,72%, entre os exercícios de 2011 e 2015, foram respectivamente R$ 67.863.874,93 e R$ 101.604.862,42, e a despesa realizada cresceu 47,40%, entre os exercícios de 2011 e 2015, foram respectivamente R$ 61.217.565,34 e R$ 90.239.862,63;
A LOA do Município de Buíque, no exercício destas contas, não expressa a real situação orçamentária do Município, não atende, assim, ao Princípio Orçamentário da Exatidão, de natureza complementar, que o doutrinador Osvaldo Maldonado Sanches 1 (2004, p. 149), define como:
“ P r i n c í p i o o r ç a m e n t á r i o , d e n a t u r e z a c o m p l e m e n t a r , s e g u n d o o q u a l a s e s t i m a t i v a s o r ç a m e n t á r i a s d e v e m s e r t ã o e x a t a s q u a n t o p o s s í v e l , a f i m d e d o t a r o O r ç a m e n t o d a c o n s i s t ê n c i a n e c e s s á r i a p a r a q u e e s s e p o s s a s e r empregado como instrumento de gerência, de programação e de controle.”
1SANCHES, Osvaldo Maldonado. Dicionário de orçamento, planejamento e áreas afins. 2. ed. atual. e ampl. Brasília: OMS, 2004. 393 p
O superdimensionamento das Receitas contraria a Lei de Responsabilidade Fiscal, e ao agir assim, o Município está sujeito ao não recebimento das transferências voluntárias, art. 11, parágrafo único, da LRF. Esta prática de superdimensionar as Receitas também vai de encontro ao art. 12 da LRF, que define regras claras para estimar a Receita Prevista para o exercício seguinte, nos termos transcritos (...)
O Município não apresenta uma Insuficiência de arrecadação, e sim uma peça orçamentária com uma receita superestimada, orçamento este que está em desacordo com a LRF. Como demonstrado acima, a Receita Prevista vem crescendo ano a ano, e somente no exercício de 2015, quando comparado com o exercício de 2013, o crescimento foi de 18,08%, passou de R$ 81.072.200,00 (2013) para R$ 95.726.900,00. O Município já tinha conhecimento pleno da Receita arrecada em 2013, que foi de R$ 78.316.721,28, quando da elaboração da LOA do exercício destas contas. Ademais, a Receita Arrecadada em 2014 foi praticamente a mesma do exercício de 2013 – R$ 78.970.301,53.
Entendo se tratar de uma irregularidade grave, que afronta normas importantes da LRF, além desconstruir uma característica imprescindível do Orçamento Programa, a de ser uma peça de planejamento, gerência e controle das finanças públicas.
Estamos enfrentando uma questão visceral, que passa pela efetividade de normas vitais da LRF, sem o quê não teríamos como falar de uma real ação transparente, planejada e responsável, à míngua de previsões factíveis na Lei dos Meios, sem o devido contato com o descortínio fático histórico já realizado em exercícios encerrados, sem se respeitar premissas e estudos técnicos consistentes.
Após quase 18 (dezoito) anos, quando é que os arts. 11 e 12 da LRF serão observados – tanto pelos órgãos de controle no exercício de sua missão, quanto pelos órgãos controlados-, a ponto de proliferarem os chamados ORÇAMENTOS FICTÍCIOS, verdadeiros “hologramas” de orçamentos jamais realizados, urdidos adrede para lastrear créditos adicionais à margem de uma esfera da homeostase orçamentária, para justificar a fixação de despesas à míngua das reais possibilidades fiscais do ente.
Senhores Conselheiros, insigne Procurador, aqui presente, conforme relatado, constato aqui, uma situação preocupante na Gestão Orçamentária, Financeira e Patrimonial do Município de Buíque, um Município que possui uma arrecadação razoável quando comparado a muitos municípios de Pernambuco, está se realizando despesas sem nenhum planejamento, endividando-o, essa situação poderá tornar inviável as administrações futuras se continuar o endividamento nos níveis atuais. Posto isso, considero grave as irregularidades aqui anotadas. (...)
As supramencionadas irregularidades apontadas pela Câmara Municipal de Buíque, com base no parecer exarado pelo Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco, que deram causa à desaprovação das contas do impugnado, enquadram-se nos pressupostos fáticos configuradores da inelegibilidade do art. 1º, inciso 1, alínea “g”, da LC n° 64/90.
Nesse sentido decidiu o TSE:
ELEIÇÕES 2016. REGISTRO DE CANDIDATURA. CARGO. PREFEITO. CANDIDATO COM MAIOR VOTAÇÃO NOMINAL. INDEFERIMENTO DO REGISTRO. REJEIÇÃO DE CONTAS. ART. 1°, 1, G, DA LC N° 64/90. DECRETOS DA CÂMARA DOS VEREADORES. NÃO APLICAÇÃO DO MÍNIMO CONSTITUCIONAL EM EDUCAÇÃO. NÃO RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. REITERADA FALTA DE PAGAMENTO DOS PRECATÓRIOS. DÉFICIT ORÇAMENTÁRIO E ECONÔMICO. AUMENTO DO ENDIVIDAMENTO PÚBLICO MUNICIPAL. IRREGULARIDADES INSANÁVEIS E CONFIGURADORAS DE ATO DOLOSO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. QUAESTIO IURIS. NÃO INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO DA SÚMULA N° 24 DO TSE. QUESTÃO DE FUNDO. DECRETO LEGISLATIVO E PARECER DO ÓRGÃO DE CONTAS QUE NÃO SE MANIFESTARAM EXPRESSAMENTE ACERCA DO CARÁTER DOLOSO E DA INSANABILIDADE DOS VÍCIOS. SUPOSTA USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA POR PARTE DA JUSTIÇA ELEITORAL. IMPROCEDÊNCIA DA ALEGAÇÃO. AUSÊNCIA DE HOMOGENEIDADE NA COGNIÇÃO EXERCIDA PELA JUSTIÇA ELEITORAL EM IMPUGNAÇÕES DE REGISTRO DE CANDIDATURA. ESTRUTURA NORMATIVA DA HIPOTESE DE INELEGIBILIDADE QUE INFORMA A AMPLIAÇÃO OU A REDUÇÃO DA COGNITIO EM AIRCs. TIPOLOGIA DA ALÍNEA G QUE POSSIBILITA À JUSTIÇA ELEITORAL EXAMINAR SE A IRREGULARIDADE APURADA SE REVELA INSANÁVEL E CONFIGURADORA DE ATO DOLOSO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PREMISSAS FÁTICAS QUE ATRAEM A INCIDÊNCIA DOS ELEMENTOS FÁTICO-JURÍDICOS CONTEMPLADOS NA CAUSA RESTRITIVA AO EXERCÍCIO DO IUS HONORUM DO ART. 1°, 1, G, DA LC N° 64/90. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A cognição realizada pela Justiça Eleitoral, nas impugnações de registro de candidatura, autoriza a formulação, por parte do magistrado eleitoral, de juízos de valor no afã de apurar a existência, no caso concreto, dos pressupostos fático-jurídicos das inelegibilidades constantes do art. l, inciso 1, de maneira a produzir uma regra concreta acerca do estado jurídico de elegibilidade do pretenso candidato, sem, contudo, imiscuir-se no mérito do título (judicial, administrativo ou normativo) que embasa a pretensão deduzida ou desautorizar as conclusões nele constantes (e.g., assentar dolo quando o aresto da Justiça Comum expressamente consignar culpa).
2.A estrutura normativa de cada hipótese de inelegibilidade informa os limites e possibilidades da atividade cognitiva exercida legitimamente pelo juiz eleitoral, ampliando ou reduzindo o objeto cognoscível, razão por que inexiste uniformidade na cognitio desempenhada na aferição da higidez do ius honorum do pretenso candidato à luz das alíneas do art. l, inciso 1 (i.e., a cognição autorizada em alínea g não deve se assemelhar àquela realizada nos casos de alínea o pelas distinções do tipo eleitoral).
3.A homogeneidade na tipologia das alíneas do art. 1°, inciso 1, enquanto ausente, justifica a distinção quanto à amplitude do objeto cognoscível (i.e., se maior ou menor a profundidade da cognição), condicionada, no entanto, ao específico pressuposto fático-jurídico sub examine.
4. O art. 11, inciso 1, alínea g, do Estatuto das Inelegibilidades reclama, para a sua caracterização, o preenchimento, cumulativo, dos seguintes pressupostos fático-jurídicos: (i) o exercício de cargos ou funções públicas; (ii) a rejeição das contas pelo órgão competente; (iii) a insanabilidade da irregularidade apurada, (iv) o ato doloso de improbidade.. administrativa; irrecorribilidade do pronunciamento que desaprovara; e (vi) a inexistência de suspensão ou anulação judicial do aresto que rejeitara as contas.
4.1. De um lado, o art. l, inciso 1, alínea g, da LC n° 64/90 possui, em sua tipologia, elementos que reduzem, na medida em que manietam, em alguma medida, a cognição horizontal do juiz: requer menor amplitude intelectiva identificar se o indivíduo desempenha cargo ou função pública, bem como saber se o pronunciamento exarado é suscetível de impugnação (requisito da irrecorribilidade), ou se há, ou não, suspensão ou anulação judicial do acórdão de rejeição das contas.
4.2. Por outro lado, o art. l, inciso 1, alínea g, traz em seu bojo requisitos que ampliam a cognição do juiz eleitoral, habilitando-o a exarar juízos de valor concretos acerca de cada um deles. Assentar o caráter insanável de uma irregularidade apurada ou qualificar certa conduta ímproba como dolosa ou culposa não se resume a uma atividade intelectiva meramente mecânica, mas, ao revés, a apuração desses requisitos envolve maior espectro de valoração, notadamente quando o acórdão de rejeição de contas ou o decreto legislativo forem omissos com relação a tais pontos ou os examinarem de forma açodada, sem perquirir as particularidades das circunstâncias de fato. 5. In casu,
a) O Tribunal Regional, diversamente do que aduzido pelo Recorrente, procedera apenas à qualificação jurídica dos vícios apurados como insanáveis e configuradores de ato doloso de improbidade administrativa, atividade cognitiva autorizada a esta Justiça Especializada em impugnações de registro, ante sua expertise para verificar se as premissas fáticas delineadas no título que lastreia a impugnação de registro (i.e., acórdão da Corte de Contas) evidenciam a presença in concrecto dos requisitos encartados na causa restritiva de ius honorum em comento.
b) Endossar entendimento oposto, de ordem a interditar tal exame, emprestará à Justiça Eleitoral uma atribuição decorativa na análise das inelegibilidades, meramente subsuntiva e mecânica, máxime porque restrita a se pronunciar nas hipóteses em que o título (judicial, normativo ou administrativo) que ancora a impugnação expressamente aludir à existência dos requisitos constantes das alíneas. A Justiça Eleitoral seria atribuído o papel, em linguagem vulgar, de fazer o "cara-crachá".
c) Como corolário, o argumento de usurpação de competência, suscitado-nas razões recursais, é, por todo, -inconsistente.
d) A discussão jurídica travada cinge-se em apurar se o conjunto de irregularidades constantes do Decreto Legislativo Municipal que rejeitou as contas do Recorrente, com lastro no parecer do TCE/SP, atrai a incidência dos pressupostos fáticos configuradores da inelegibilidade do art. 11, inciso 1, alínea g, da LC n° 64/90.
e) Consta do pronunciamento hostilizado que a rejeição das contas do candidato pela Câmara dos Vereadores, alusivas aos exercícios financeiros de 2011 e 2012, época em que era Prefeito do Município de ltatinga/SP, amparou-se no seguinte conjunto de irregularidades: (i) a não aplicação do mínimo constitucional para a área de educação, (ii) o não recolhimento das contribuições previdenciárias, (iii) reiterada falta de pagamento dos precatórios, (iv) déficit orçamentário e econômico e (v) o aumento do endividamento público municipal.
f) Todo esse conjunto de irregularidades evidencia, de forma inconteste e cabal, que as conclusões constantes do aresto ora impugnado são irrespondíveis, porquanto aludidos vícios (e.g., não aplicação do mínimo constitucional para a área de educação, o não recolhimento das contribuições previdenciárias e o descumprimento aos ditames da Lei de Responsabilidade Fiscal) não apenas ostentam gravidade de per se para macular a gestão do Recorrente à frente da edilidade, como também demonstram que assumiu os riscos dessas práticas, ante o descumprimento deliberado (e repetido) das obrigações constitucionais e legais que lhe eram impostas. Doutrina e Jurisprudência desta Corte: AgR-RO n° 879-4510E, Rei. Mm. Henrique Neves da Silva, PSESS de 18.9.2014; REspe n° 527-541SP, ReI. Mm. Marco Aurélio, DJe de 2.9.2013; REspe n° 246-59/SP, Mm. Rei. Nancy Andrighi, PSESS de 27.11.2012.
6. A higidez fiscal e a aplicação responsável e escorreita dos recursos públicos dos entes federativos, em geral, e dos municípios, em particular, não encerram mera liberalidade, mas, ao revés, consubstanciam dever impostergável exigido aos detentores de mandato eletivo, que, por gerir a res pública, não podem estar isentos de amarras, constitucionais e legais, em sua atuação.
7. O escrutínio das urnas não confere - e não pode conferir - a tais agentes políticos um salvo-conduto ou um cheque em branco para procederem, a seu talante, à execução de despesas aquém dos percentuais mínimos estabelecidos constitucionalmente, como no caso, dos patamares a serem minimamente aplicados em serviços públicos de educação, bem como não autoriza a realização de gastos além dos limites preconizados pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
8. Ademais, assentar o caráter insanável e doloso de condutas desse jaez produz um efeito pedagógico do pronunciamento desta Justiça Eleitoral, na medida em que sinalizará para os players da competição eleitoral que não se transigirá com comportamentos desidiosos e irresponsáveis na condução da coisa pública, ao mesmo tempo em que promoverá os incentivos corretos para o aperfeiçoamento da gestão fiscal e da execução responsável do orçamento dessas entidades, conforme preconizam os balizamentos constitucionais e legais.
9. Por derradeiro, inexiste nos autos relato de que o candidato tenha logrado êxito na obtenção de tutela judicial favorável para afastar a rejeição das contas alusivas aos exercícios de 2011 e 2012, razão pela qual a inelegibilidade do art. 11, inciso 1, alínea g, do Estatuto das Inelegibilidades é medida que se impõe.
10. Ex positis, desprovejo o recurso especial, mantendo, por via de consequência, o indeferimento da candidatura do Recorrente, Ailton Fernandes Faria.
(RECURSO ESPECIAL ELEITORAL N° 260-11.2016.6.26.0026 - CLASSE 32 - ITATINGA - SÃO PAULO , Relator: Ministro Luiz Fux, sessão 30 de novembro de 2016 - grifei)
Trago à colação julgado do Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco:
EMENTA: ELEIÇÕES2018. REGISTRO DE CANDIDATURA. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO AO REGISTRO DE CANDIDATURA. RITO DO ART. 3º E SEGUINTES DA LEI COMPLEMENTAR N.º 64/90. REJEIÇÃO DE CONTAS DE PREFEITO RELATIVAS AOS EXERCÍCIOS DE 2011, 2012 e 2013 PELO TRIBUNAL DE CONTAS E TAMBÉM REJEITADAS PELA CÂMARA MUNICIPAL, ÓRGÃO COMPETENTE PARA TAL. APLICAÇÃO DO ART. 1º, INCISO I, ALÍNEA “G”, DA LEI DAS INELEGIBILIDADES. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO CONSIDERADA PROCEDENTE. INDEFERIMENTO DO REGISTRO DE CANDIDATURA.
1. Para configuração da inelegibilidade em comento são necessários os seguintes requisitos: (i) rejeição das contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas em face de irregularidade insanável; (ii) a irregularidade configurar, em tese, ato doloso de improbidade administrativa; e (iii) irrecorribilidade da decisão.
2. Resta evidenciado, portanto, que o então prefeito de Águas Belas omprometeu a execução financeira do município ao fazer uso de créditos extraorçamentários para o pagamento de despesa corrente, empenhou despesas sem justificativa fiscal, aplicou recursos do FUNDEB aquém do estipulado em lei e, ainda, reteve vultuosas quantias das contribuições previdenciárias devidas.
3. Retenção pelo gestor público, de contribuições previdenciárias em enorme quantia, desrespeitando a Lei de Responsabilidade Fiscal.
4. O descumprimento do art. 42 da Lei de Responsabilidade Fiscal é um grave atentado às finanças públicas, posto que configura crime previsto no art. 359-C do Código Penal.
5. Resta inelegível, por oito anos, detentor de cargo ou função pública cujas contas tiverem sido rejeitadas em detrimento de falha insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, por meio de decisum irrecorrível do órgão competente, salvo se suspenso ou anulado pelo Poder Judiciário, a teor do art. 1º, I, g, da Lei Complementar 64/1990.
6. Ao contrário do que afirma o impugnado em sua peça de contestação, a impropriedade cometida, para fins de punição pela LC 64/90 decorre de dolo do administrador público imprudente na gestão do orçamento e das finanças, pois se olvidou de observar os deveres impostos pela lei, para satisfação de outros interesses que não o público, ao endividar o município além de sua capacidade financeira com itens supérfluos, como contratação de banda.
7. Por fim, a não aplicação dos percentuais previstos em lei na área de educação, com recursos do FUNDEB, resta inconteste. Não deve prosperar a tese da defesa de que a aplicação a menor se justifica, pois houve aplicação em outras áreas da educação, dado que não trouxe provas de que os recursos foram alocados na pasta da educação. Tal prática, além de caracterizar total desprezo do gestor público para com a sociedade, ao impedir o investimento necessário na educação, é uma das condutas aptas a gerar a inelegibilidade em comento.
8. Quanto ao dolo exigido para a caracterização da hipótese de inelegibilidade é o genérico, bastando a consciência e vontade do agente em praticar a conduta ímproba, sem a necessidade de se perquirir qualquer fim específico no seu agir, conforme entendimento pacífico do TSE.
9. O descaso do impugnado na administração pública é evidente, considerando que suas contas foram julgadas irregulares em três exercícios financeiros, o que demonstra a falta de obediência aos princípios da Administração Pública, diante da violação dos deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições (art. 11, da Lei 8.429/1992).
10. Julgada Procedente a ação de impugnação ao registro de candidatura e, via de consequência, indeferido o registro de candidatura de Genivaldo Menezes Delgado ao cargo de Deputado Estadual pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB), sob o número 65789.
(TRE/PE, REGISTRO DE CANDIDATURA (11532) - 0601316-89.2018.6.17.0000 - Recife – PERNAMBUCO RELATOR: Desembargador ALEXANDRE FREIRE PIMENTEL, 17 de setembro de 2018)
Em suas alegações finais, o impugnado alega a ausência de nota de improbidade no parecer do TCE/PE. Nesse ponto, destaco o entendimento já manifestado pelo TSE no sentido de que a Justiça Eleitoral tem competência para examinar se a irregularidade apurada se revela insanável e configuradora de ato doloso de improbidade administrativa. Nesse sentido, entendeu o TSE:
(...)Trata-se de atividade cognitiva que, consoante exaustivamente afirmado, é franqueada à Justiça Eleitoral nas impugnações de registro de candidatura, ante a possibilidade de emissão de juízos de valor acerca da ocorrência, ou não, dos pressupostos fático-jurídicos da alínea g. É inobjetável que a Justiça Eleitoral ostenta expertise para verificar se as premissas fáticas delineadas no título que lastreia a impugnação de registro (i.e., acórdão da Corte de Contas) evidenciam a presença in concrecto dos requisitos encartados na aludida causa restritiva de ius honorum. Endossar entendimento oposto, de ordem a interditar tal exame, conferirá à Justiça Eleitoral uma tarefa decorativa na análise das inelegibilidades, meramente subsuntiva e mecânica, na medida em que somente poderia se pronunciar nas hipóteses em que o título (judicial, normativo ou administrativo) que ancora a impugnação expressamente aludir à existência dos requisitos constantes das alíneas. À Justiça Eleitoral seria atribuído o papel, em linguagem vulgar, de fazer o "cara-crachá". E não é disso que se trata (...) (RECURSO ESPECIAL ELEITORAL N° 260-11.2016.6.26.0026 - CLASSE 32 - ITATINGA - SÃO PAULO , Relator: Ministro Luiz Fux, sessão 30 de novembro de 2016 - grifei)
No caso destes autos, as atitudes do impugnado apontadas no parecer do TCE se deram de forma deliberada e consciente. Não se pode perceber que um gestor realize as ações supramencionadas por mera culpa stricto senso, ou seja, por imprudência, negligência ou imperícia.
Não podemos falar em conduta culposa na espécie dos autos. O administrador/gestor público tem toda a sua atividade determinada por limites legais. A atividade de gerir recursos públicos é imposta por deveres de conduta. A atuação ordinária é sempre pautada por atos de vontade. Sua inação diante de uma medida de cautela ou fiscalizatória não constitui uma simples negligência, senão muito mais apropriadamente uma omissão dolosa.
Portanto o ordenador de despesas atuou de forma deliberada em desrespeito ao patrimônio público e às normas legais, cujo desconhecimento é inescusável, evidenciando a presença do dolo.
Nem se diga que as irregularidades se deram por conta da crise financeira. Nesse ponto, filio-me à inteligência da Súmula n. 41 do e. TSE: “Não cabe à Justiça Eleitoral decidir sobre o acerto ou desacerto das decisões proferidas por outros órgãos do Judiciário ou dos tribunais de contas que configurem causa de inelegibilidade”. A inelegibilidade decorre de decisões proferidas em outros processos que não podem ser revistas em sede de registro de candidatura.
Por derradeiro, compulsando os autos, vislumbro que as irregularidades constatadas pelo Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco imputadas ao impugnado, são insanáveis, eis que feriram os princípios da legalidade, moralidade e da economicidade, agindo de forma contrária ao interesse público, ao patrimônio público e aos princípios que devem nortear a atuação do gestor público.
Superados, portanto, os requisitos de contas rejeitadas em função do exercício de cargo público, por irregularidade insanável que configura ato doloso de improbidade administrativa, por decisão irrecorrível do órgão competente, sem suspensão ou anulação pelo Poder Judiciário, e ainda, que o prazo prescricional de oito anos, referente a inelegibilidade prescrito pela Lei Complementar n. 135/2010, deve ser contado da decisão definitiva da Câmara de Vereadores de Buíque, que se deu em 06/12/2018, sem recurso, tenho que o impugnado encontra-se inelegível.
Em suas alegações finais, a Coligação O TRABALHO VAI CONTINUAR pede que, em decorrência da interposição sucessiva de 4 agravos de instrumentos, visando à desconstituição de uma única decisão, e de modo a conturbar o processamento da presente AIRC, levando esta Justiça Eleitoral a erro, seja aplicada multa por litigância de má-fé ao impugnado, a ser arbitrada por este juízo.
No termo do previsto no art. 80, do Código de Processo Civil: Art. 80. Considera-se litigante de má-fé aquele que: I - deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso; II - alterar a verdade dos fatos; III - usar do processo para conseguir objetivo ilegal; IV - opuser resistência injustificada ao andamento do processo; V - proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo; VI - provocar incidente manifestamente infundado; VII - interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório.
Não verifico nesta Justiça Especializada má-fé processual ou intuito de atentar contra a administração da Justiça, a justificar a aplicação da multa. Indefiro, portanto, o pedido.
Em petição de ID 19903153, a Coligação BUÍQUE QUER MUDANÇA pugna pela concessão da tutela provisória de urgência, inaudita altera partes, no sentido de deferir o bloqueio do valor doado pela direção estadual do Partido Solidariedade, no último dia 16/10/2020, até decisão final sobre o deferimento ou indeferimento do registro de candidatura do ora impugnado.
Ante o indeferimento do pedido de registro de candidatura do impugnado, nos termos do art. 13, da Lei nº 9.504/97, é facultado ao partido ou coligação substituir candidato que for considerado inelegível, renunciar ou falecer após o termo final do prazo do registro ou, ainda, tiver seu registro indeferido ou cancelado.
Desse modo, considerando o disposto no referido dispositivo legal, ante a possibilidade de substituição do impugnado, que a utilização de recursos públicos é submetida à prestação de contas, conforme assinalou o próprio requerente, bem como que a estreita via da AIRC não comporta apreciação de pedido de bloqueio de valores de Fundo Partidário, que deve ser instruído por meio de ação própria, indefiro o pedido de bloqueio.
Pelo exposto, julgo PROCEDENTES as impugnações formuladas pelas Coligações BUÍQUE QUER MUDANÇA e O TRABALHO VAI CONTINUAR para, em consequência, INDEFERIR o pedido de registro de candidatura de JONAS CAMELO DE ALMEIDA NETO ao cargo de Prefeito nas eleições municipais de 2020, em Buíque/PE, com base no artigo 1°, inciso I, alínea “g”, da Lei Complementar n° 64/90.
P.R.I. Ciência ao Ministério Público Eleitoral
Buíque, 23 de outubro de 2020.
INGRID MIRANDA LEITE
JUÍZA DA 60ª ZONA ELEITORAL