JUSTIÇA ELEITORAL
053ª ZONA ELEITORAL DE UIRAÚNA PB
REGISTRO DE CANDIDATURA (11532) Nº 0600096-77.2020.6.15.0053 / 053ª ZONA ELEITORAL DE UIRAÚNA PB
REQUERENTE: VALERIA LIRA DE SOUSA, PARTIDO TRABALHISTA BRASILEIRO - PTB - POÇO DANTAS/PB - COMISSÃO PROVISÓRIA
IMPUGNANTE: SOLIDARIEDADE - SDD - POÇO DANTAS/PB - COMISSÃO PROVISÓRIA, PROMOTOR ELEITORAL DO ESTADO DA PARAÍBA
Advogado do(a) REQUERENTE: EDNELTON HELEJONE BENTO PEREIRA - PB1352300-A
Advogado do(a) IMPUGNANTE: FRANCISCO ROMANO NETO - PB12198
IMPUGNADO: VALERIA LIRA DE SOUSA
Processo nº: 06000967720206150053 - REGISTRO DE CANDIDATURA
Requerente: VALÉRIA LIRA DE SOUSA
Partido/Coligação: Partido Trabalhista Brasileiro
Trata-se de pedido de registro de candidatura apresentado em nome de de VALÉRIA LIRA DE SOUSA, para concorrer ao cargo de Vereador, sob o número 14567, pelo(a) Partido Trabalhista Brasileiro (14 - PTB), no Município de(o) POÇO DANTAS.
Publicado o edital, tempestivamente foram apresentadas duas impugnações, uma delas pelo Ministério Público Eleitoral e a outra pelo Partido Solidariedade - SDD - Poço Dantas.
As peças impugnativas se erguem sobre a mesma base: inelegibilidade reflexa da requerente por ser ela companheira do atual Prefeito do Município que está findando o segundo mandato consecutivo.
Sustentam os impugnantes que a união estável entre Valéria Lira e o atual prefeito da cidade é fato público e notório. Que os os mesmos se apresentam perante a sociedade como um casal e que Valéria é conhecida na cidade como a "Primeira Dama".
Juntam como provas diversas fotos das redes sociais em que os dois aparecem como um casal, seja em ocasiões particulares, seja em eventos públicos enquanto prefeito da cidade, inclusive fotos de uma suposta cerimônia de enlace em que aparecem juntos em cenário romântico e com um bolo típico de celebrações de casamentos/uniões.
No mérito, requerem os impugnantes a procedência das Ações de Impugnação ao Registro de Candidatura com o indeferimento do registro da Impugnada.
A impugnação inicialmente apresentada pelo Solidariedade - SDD Poço Dantas continha fotos íntimas da requerente que estavam descontextualizadas dos autos além de atingir, de maneira indevida e injustificada, a honra e a intimidade da ora requerente. Em função disso, foi determinado o desentranhamento da petição destes autos, abrindo-se prazo para reapresentação, desta vez sem as mencionadas fotos.
Regularmente citada, a candidata contestou as impugnações sustentando que:
a) não possui qualquer vínculo consanguíneo ou afim com o Prefeito, portanto não se encaixando na vedação constitucional do art. 14, § 7º da CF/1988;
b) a peça impugnativa do Solidariedade- SDD visava tumultuar o feito e desestabilizar emocionalmente a requerente, expondo indevidamente fatos degradantes e humilhantes;
c) que a esposa do prefeito de Poço Dantas também pleiteia a candidatura ao cargo de vereadora com o RRC nº 0600107-09.2020.6.15.0053 (em tramitação neste juízo) e que o processo fora impugnado alegando-se a mesma inelegibilidade reflexa;
d) que ocorreu litigância de má-fé por parte do Solidariedade-SDD, já que o MPE abordou o mesmo ponto sem necessitar constranger a impugnada;
e) que a impugnada tem apenas um "namoro qualificado" com o prefeito, e que as fotos apresentadas não são suficientes para demonstrar o vínculo de união estável;
f) que a senhora Antônia Pereira Queiroz Gurgel tanto ainda é primeira-dama do município que ainda mora na residência oficial
Requer o acolhimento da preliminar de carência da ação e consequente extinção do feito sem o julgamento do mérito e a condenação do segundo impugnante por litigância de má-fé com condenação de 10% (dez por cento) sobre o valor máximo declarado de gastos de campanha majoritária para o município. No mérito, requer a total improcedência das impugnações e o deferimento da candidatura.
Intimado para manifestação sobre os argumentos e documentos apresentados na impugnação, o MPE reiterou o pedido pela procedência da Impugnação alegando que a postulante não trouxe nenhum elemento capaz de afastar os fatos apontados na impugnação.
O Solidariedade-SDD sustentou que a preliminar suscitada de carência da ação não deve prosperar já que a própria impugnada reconhece a existência do "namoro qualificado" e que não teve o impugnante a "intenção de ridicularizar, violar ou expor privacidade, muito menos de praticar violência ao gênero feminino", reafirmando o pedido pela procedência da Impugnação e o indeferimento do pedido de registro.
A documentação exigida pelo art. 27 da Resolução TSE nº 23.609/2019 foi juntada aos autos, conforme informação do Cartório. O DRAP do partido PTB de Poço Dantas também já foi julgado deferido.
É o relatório.
Decido.
O pano de fundo das duas impugnações é o mesmo: inelegibilidade reflexa da companheira do prefeito que está terminando o segundo mandato, com incidência do art. 14, § 7º, que fala, em sua literalidade, da inelegibilidade de "cônjuge e parentes cosangüíneos ou afins até segundo grau".
Em preliminar, a impugnada sustenta que, por não ser cônjuge nem parente consangúinea ou afim, a AIRC padeceria de carência.
A União estável é reconhecida no Direito brasileiro como legítima originadora da família. Trata-se da família que se erige com base na afetividade e não apenas nos laços sangüíneos.
O Supremo Tribunal Federal já decidiu, com Repercussão Geral, que a união estável se equipara ao casamento para efeitos sucessórios, inclusive em uniões de pessoas do mesmo sexo (RE 646721 da relatoria do Min. Roberto Barroso. Julgado em 30/11/2018). Desse modo, em que pese em algumas passagens da Constituição a literalidade do texto apontar apenas o "cônjuge", a moderna e consentânea interpretação da Constituição impõe a leitura como "Cônjuges e companheiros". Isso é ponto pacífico na doutrina e na jurisprudência também em matéria eleitoral. Veja-se trecho do aclamado manual de Direito Eleitoral de José Jairo Gomes (Ed. 2020. pág. 377-378, versão digital):
Apesar de o citado § 7o, art. 14, da Lei Maior aludir a “cônjuge”, é evidente que a inelegibilidade em exame também se aplica a companheiros na hipótese de união estável, pois a família se origina tanto do casamento quanto da união estável. Vale lembrar que a Constituição Federal e o Código Civil reconhecem a união estável entre o homem e a mulher, caracterizando essa relação como entidade familiar. Além disso, no que concerne ao casamento, não importa seja ele civil ou religioso, pois em ambos comparece a inelegibilidade em foco.
[...]
A união estável goza do status de entidade familiar. Sendo em tudo semelhante ao casamento (CF, art. 226, § 3o), em relação a ela também incide a inelegibilidade prevista no artigo 14, § 7o, da Lei Maior. Assim: “1. De acordo com a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a união estável atrai a incidência da inelegibilidade prevista no art. 14, § 7o, da Constituição Federal. Nesse sentido: Res. – TSE no 21.367, rel. Ministro Luiz Carlos Madeira, de 1o-4-2003” (TSE – REspe no 23.487/TO – PSS 21-10-2004).
(grifei)
A Jurisprudência do TSE também é pacífica a esse respeito:
“Registro de candidatura. Candidato a deputado estadual. Configuração de parentesco por afinidade. União estável. Inelegibilidade. Negativa de seguimento. 1. A jurisprudência do TSE é pacífica no sentido de que ‘a união estável atrai a incidência da inelegibilidade prevista no art. 14, § 7o, da Constituição Federal’ (REspe no 23.487), com a ressalva de que o mero namoro não se enquadra nessa hipótese (REspe no 24.672). 2. Existência, no caso, de relacionamento afetivo entre o recorrente e a filha do governador de Rondônia, o que configura união estável, nos moldes do art. 1.723 do Código Civil de 2002. 3. Incidência de inelegibilidade em função de parentesco por afinidade. 4. Recurso a que se nega seguimento.”
(Ac. de 27.3.2007 no RO no 1.101, rel. Min. Carlos Ayres Britto.)
(grifei)
“Registro. Candidato. Vereador. União estável. Irmã do prefeito. Inelegibilidade. Art. 14, § 7o, da Constituição Federal. Incidência. 1. De acordo com a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a união estável atrai a incidência da inelegibilidade prevista no art. 14, § 7o, da Constituição Federal. Nesse sentido: Res.-TSE no 21.367, relator Ministro Luiz Carlos Madeira, de 1o.4.2003. 2. É inelegível candidato que mantém relacionamento caracterizado como união estável com a irmã do atual prefeito. [...]”
(Ac. de 21.10.2004 no REspe no 23.487, rel. Min. Caputo Bastos.)
“[...] Inelegibilidade do art. 14, § 7º, da CR/88. União estável. Comprovação. [...] 1. Ao contrário do alegado, o impugnante logrou comprovar a existência de união estável entre o agravante e a filha da atual prefeita e candidata à reeleição. Configuração, in casu, da inelegibilidade de que trata o art. 14, § 7º, da CR/88. [...]”
(Ac. de 28.10.2008 no AgR-REspe nº 32.050, rel. Min. Aldir Passarinho Junior.)
Posto isso, superada a alegada preliminar de carência da ação. Também superada a alegação de relação de concubinato, já que ainda que o fosse, também estaria apata a atrair a inelegibilidade do art. 14, § 7º da CF/88.
Quanto à segunda preliminar, de alegada litigância de má-fé, entendo assistir razão à impugnada. Isso porque as fotos da candidata desnuda que vieram aos autos na peça impugnativa do Solidariedade-SDD de Poço Dantas não guardavam relação com o fundamento da impugnação. Tanto é assim, que determinado o desentranhamento da mesma dos autos e protocolizada nova peça processual, desta vez sem as fotos, nenhum prejuízo argumentativo sofreu a AIRC. Também corroborando tal entendimento, a impugnação apresentada pelo Ministério Público Eleitoral, fundada nas mesmas razões fáticas, deixou claro a prescindibilidade das fotos íntimas.
Não havendo razão legal ou lógico-argumentativa a justificar a medida extrema de se excepcionar a intimidade da impugnada, não há outra conclusão autorizada a não ser a de que o propósito foi de intimidar, expor ao ridículo, ofender, menosprezar a ora impugnada.
Quanto ao argumento levantado em manifestação posterior pelo Solidariedade-SDD - Poço Dantas de que teria "marcado a opção segredo de justiça", o que não se concretizou na prática, conforme constato em breve consulta aos autos. Ao revés, o processo de registro de candidaturas é público, estando acessível a toda e qualquer pessoa que tenha acesso à internet.
Ainda que se alegue que as fotos incluídas no processo foram publicizadas em grupos de whatsapp da cidade e da região, há que se considerar que a origem decorreu de erro, como alega o próprio impugnante em sua petição, não contando com o consentimento da pessoa fotografada.
No mais, ocorreu em momento passado e talvez já superado ou em vias de superação pela vítima e pela população da cidade.
Tem espaço aqui o chamado "direito ao esquecimento", que consiste no direito de não se ter reexposta, reevidenciada uma situação passada que lhe foi vexatória, ofensiva, ridicularizadora, estigmatizante. Em outras palavras, é o direito de não ser marcado eternamente por fatos pretéritos, de modo a sofrer repercussões negativas daí decorrentes em caráter permanente. Sobre o tema, explica o professor de direito Civil da UERJ, Anderson Schreiber em entrevista concedida ao portal jurídico Migalhas1:
"O direito ao esquecimento deve ser visto como um direito da pessoa humana de se defender contra uma retratação pública desatualizada e opressiva, que a apresente como algo diverso do que ela efetivamente é. Por exemplo, uma pessoa trans tem direito a não ser retratada publicamente como uma pessoa que nasceu com um sexo diverso, porque essa retratação pública minaria o desenvolvimento da sua trajetória pessoal. A vítima de um crime sexual tem direito a não ser lembrada, a todo tempo, por meios públicos de comunicação, de que foi vítima desse crime. Se toda vez que o nome dela surgir em algum lugar ele for associado ao crime, ela estará sendo retratada de modo diminuído, desse atual, preso a um evento pretérito que ela se esforça por superar."
Após grande repercussão da exposição das fotos na cidade e na região, o Impugnante ainda protocolizou nova petição com uma tarja preta sobre as partes íntimas e sobre o rosto da impugnada.
Insistiu, pois, em trazer aos autos, ainda que de forma um pouco mais mitigada, a intimidade da candidata impugnada, não logrando êxito em demonstrar onde está o caráter imprescindível de tal prova ante o contexto fático dos autos. As fotos editadas permitem a perfeita identificação da pessoa ali exposta, não sendo capaz de garantir o seu direito à intimidade, que não está sendo alvo de discussão nestes autos.
Não satisfeito com a exposição, o Solidariedade - SDD Poço Dantas repetiu a peça com as mesmas fotos nos autos do RRC nº 0600107-09.2020.6.15.0053 (Antônia Pereira de Queiroz Gurgel - ex-esposa/esposa do Prefeito), bem como nos autos do DRAP nº 0600083-78.2020.6.15.0053 (Drap da Proporcional do PTB de Poço Dantas), ambos em tramitação neste juízo.
Assim, restam claros os elementos a evidenciar que o Solidariedade - SDD usou do processo para atingir objetivos não acobertados pelo direito, de maneira a atrair a incidência do art. 80, III do CPC/15.
Pelas razões invocadas, acolho parcialmente a segunda preliminar para CONDENAR o litigante de má-fé ao PAGAMENTO DE MULTA no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), o que faço tomando de empréstimo o art. 36, § 3º da Lei 9.504/97, já que inexiste valor de causa nos feitos eleitorais e a aplicação analógica do referido dispositivo da lei das Eleições já foi utilizada pelo TSE em condenação de tal natureza. Senão, vejamos:
“Eleições 2008. Agravo regimental em recurso especial. Representação. Propaganda eleitoral. Afirmação falsa. Pretensão de conduzir o juízo a erro. Litigância de má-fé [...] 1. No caso dos autos, o TRE/SP asseverou que a agravante fez afirmação falsa, procurando conduzir o Juízo a erro, porquanto, ao contrário do que alegado, o panfleto impugnado foi confeccionado de acordo com as regras legais, o que denotaria a má-fé da agravante no ajuizamento da representação [...] 3. Tendo sido definido pelo Tribunal a quo que o ajuizamento da representação foi de má-fé, a imposição da multa por litigância de má-fé é pertinente, com base no art. 18 do CPC. 4. Tendo em vista a inexistência de valor da causa nos feitos eleitorais, afigura-se razoável a fixação considerando o critério atinente à multa fixada na representação, aplicando-se, por analogia, o disposto no § 3º do art. 36 da Lei nº 9.504/97. 5. Na espécie, não havendo na presente representação condenação ao pagamento de multa, considero razoável ter-se como parâmetro o valor despendido para a confecção dos panfletos pelos ora agravados. [...]”
(Ac de 4.12.2014 no AgR-REspe nº 1007054 , rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura.)
(grifei)
Não sendo a preliminar acolhida parcialmente questão prejudicial, sigamos com a análise do mérito.
Sedimentado o fato de que a união estável atrai a inelegibilidade reflexa prevista no art. 14, § 7º da CF/88 e também superada a questão de haver um relacionamento entre a hora impugnada e o atual prefeito da cidade de Poço Dantas, José Gurgel Sobrinho, já que em sua contestação a impugnada alega que vive um "namoro qualificado" com o prefeito, o que resta controvertido é saber se as provas trazidas aos autos e todo o contexto processual revelam que a relação é ou não união estável.
O Código Civil, em seu artigo 1.723, traz o conceito de união estável e descreve os elementos necessários para sua caracterização, quais sejam: “convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”.
A lei não exige um prazo mínimo de relacionamento para a configuração da união estável, tampouco exige coabitação. Nesse sentido tem se posicionado o STJ:
A coabitação não é elemento indispensável à caracterização da união estável. (STJ – Jurisprudência em tese – Edição nº 50 – de 11.02.2016). Precedentes: AgRg no AREsp 649786/GO, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/08/2015, DJe 18/08/2015; AgRg no AREsp 223319/RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/12/2012, DJe 04/02/2013; AgRg no AREsp 59256/SP, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/09/2012, DJe 04/10/2012; AgRg nos EDcl no REsp 805265/AL, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS), TERCEIRA TURMA, julgado em 14/09/2010, DJe 21/09/2010; REsp 1096324/RS, Rel. Ministro HONILDO AMARAL DE MELLO CASTRO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/AP), QUARTA TURMA, julgado em 02/03/2010, DJe 10/05/2010; REsp 275839/SP, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, Relatora para Acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 02/10/2008, DJe 23/10/2008. (STJ – Jurisprudência em tese – Edição nº 50 – de 11.02.2016).
Cai por terra portanto a alegação de que o fato de a ex-esposa do prefeito morar na residência oficial do município como prova de que não há união estável.
As fotos em que a impugnada aparece sozinha em festas ou eventos públicos não demonstram que a mesma não vive uma relação estável, já que felizmente é dado à mulher moderna o direito de frequentar ambientes e eventos sem necessariamente estar acompanhada do marido, companheiro ou namorado.
Quanto à prova emprestada do RRC nº 0600107-09.2020.6.15.0053 (em tramitação neste juízo), em nome de Antônia Pereira Queiroz Gurgel, também não é capaz de infirmar a relação da atual impugnada com o prefeito, já que constam daqueles autos pedido de divórcio protocolizado em juízo em janeiro de 2020. No mais, como já frisado, ainda que a relação fosse de concubinato, não seria inviável a caracterização da união estável.
Tanto o chamado namoro qualificado como a união estável são relações públicas, contínuas e duradouras, conforme define a legislação civil. O elemento a distinguir as duas tem natureza subjetiva, sedo apelidado pela doutrina e pela Jurisprudência como affectio maritalis. Trata-se, a grosso modo, da intenção de constituir família, externada ao público através do comportamento do casal perante o seio da sociedade em que vive.
As redes sociais são grandes aliadas na árdua tarefa de caracterizar ou não nos autos o elemento subjetivo. Das fotos acostadas pelas duas impugnações, bem como das matérias que circularam em blogs da região é possível concluir-se que há affectio maritalis entre Valéria Lira de Sousa e José Gurgel Sobrinho.
São diversas as publicações em que aparecem juntos, inclusive em cerimônias oficiais, além de que há fotos de evento assemelhado a um matrimônio, em que os dois posam em cenário repleto de simbolismos de afeto, frente a um bolo em que se observam velas em forma de casal, objeto típico dos enlaces românticos. No mesmo contexto, há fotos ainda do casal em pose como se estivessem trocando alianças e as beijando, o que me parece uma demonstração clara de intenção de constituir família externada de maneira pública a amigos e convidados. Referido evento parece ter ocorrido em local típico de festas (buffet) e a julgar pelo número de doces sobre a mesa, destinado a considerável número de convidados.
Em sua contestação a impugnada sustenta que estando o senhor José Gurgel em trajes informais, lógico seria que não se tratava a ocasião de um matrimônio ou algo assemelhado. No entanto, não me parece ser essa uma inferência lógica, já que os demais elementos do contexto apontam em sentido contrário.
No mais, os comprovante de pagamento debitados da conta pessoal de Valéria tendo como favorecido Mateus de Queiroz Gurgel, filho do prefeito, feitos de maneira reiterada, só reforçam o contexto probatório de configuação da união estável.
ISTO POSTO, julgo procedentes as Impugnações ao Registro de Candidatura apresentadas para INDEFIR o pedido de registro de candidatura de VALÉRIA LIRA DE SOUSA, para concorrer ao cargo de Vereador, em razão da incidência de inelegibilidade reflexa (art. 14,§ 7º da CF/88) caracterizada pela união estável da requerente do registro com o atual Prefeito que termina seu segundo mandato consecutivo.
Registre-se. Publique-se. Intime-se.
UIRAÚNA, 20 de Outubro de 2020.
PEDRO HENRIQUE DE ARAÚJO RANGEL
Juiz da 53ª Zona Eleitoral