index: RECURSO ESPECIAL ELEITORAL (11549)-0600266-09.2024.6.25.0028-[Propaganda Política - Propaganda Eleitoral - Conduta Vedada a Emissora de Rádio/Televisão na Programação Normal, Representação]-SERGIPE-CANINDÉ DE SÃO FRANCISCO
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL
RECURSO ESPECIAL ELEITORAL (11549) Nº 0600266-09.2024.6.25.0028 (PJe) - CANINDÉ DE SÃO FRANCISCO - SERGIPE
RELATORA: MINISTRA ISABEL GALLOTTI
RECORRENTE: WILLAMES DE LIMA, RADIO XINGO LTDA, LUIZ EDUARDO DE OLIVEIRA COSTA
Advogado do(a) RECORRENTE: EDSON FELIX DA SILVA - SE13011
Advogado do(a) RECORRENTE: EDSON FELIX DA SILVA - SE13011
Advogado do(a) RECORRENTE: VICTOR EMANUEL DE MENEZES MACEDO MAIA - SE6405-A
RECORRIDA: COLIGAÇÃO AVANÇA CANINDÉ
Advogado do(a) RECORRIDA: FABIANO FREIRE FEITOSA - SE3173-A
ELEIÇÕES 2024. CANDIDATO. PREFEITO. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA NEGATIVA. RÁDIO. VEICULAÇÃO. PROGRAMAÇÃO NORMAL. ATRIBUIÇÃO. PRÁTICA DE CRIME. OFENSA À HONRA. DIVULGAÇÃO DE FATO INVERÍDICO. DIFAMAÇÃO CONFIGURAÇÃO. SÚMULAS 24, 28, 29 E 30/TSE. NEGADO SEGUIMENTO.
1. Recurso especial interposto contra acórdão do TRE/SE que reformou a sentença de primeiro grau para julgar procedente pedido em representação ajuizada contra emissora de rádio por prática de propaganda eleitoral negativa em detrimento de candidato ao cargo de prefeito nas Eleições 2024 e condenar os representados ao pagamento de multa.
2. O art. 43 da Res.-TSE 23.610/2019, ao regulamentar o art. 45 da Lei 9.504/97 à luz do entendimento fixado pelo Supremo Tribunal Federal no âmbito da ADI 4451/DF, dispõe que, no período posterior ao encerramento do prazo para a realização das convenções partidárias, as emissoras de rádio e televisão não poderão, em sua programação normal e noticiário, veicular propaganda política (inciso III) ou dar tratamento privilegiado a candidato, partido ou coligação (inciso IV).
3. A jurisprudência do TSE é no sentido de que a configuração de propaganda eleitoral negativa pressupõe ato que macule a honra ou a imagem de candidato ou divulgue fato inverídico em seu desfavor.
4. Este Tribunal já se manifestou no sentido de que “estar-se-á diante de uma conduta vedada pelo art. 45 da Lei nº 9.504/1997 quando a crítica ou matéria jornalísticas venham a descambar para a propaganda política, passando nitidamente a favorecer ou desfavorecer uma das partes na disputa eleitoral” (REspEl 0600197-83.2020.6.18.0004/PI, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 10/10/2022).
5. Extrai-se da moldura fática do acórdão de origem que os recorrentes, durante o período eleitoral, veicularam programa jornalístico utilizando expressões difamatórias contra candidato adversário e atribuindo-lhe a prática de crime sem respaldo probatório. Incidência das Súmulas 24, 28, 29 e 30/TSE.
6. Recurso especial a que se nega seguimento.
DECISÃO
Trata-se de recursos especiais interpostos pela Rádio Xingo LTDA, por Willames de Lima e por Luiz Eduardo de Oliveira Costa contra acórdão proferido pelo TRE/SE assim ementado:
RECURSO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2024. REPRESENTAÇÃO. EMISSORA DE RÁDIO. PROPAGANDA ELEITORAL NEGATIVA. IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM. OFENSA À IMAGEM E À REPUTAÇÃO DO ENTÃO CANDIDATO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA. CARACTERIZAÇÃO. ARTS. 22, X, E 43, II, III E § 3º, DA RESOLUÇÃO-TSE Nº 23.610/2019. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
1.É lícito às emissoras de rádio e televisão difundir opinião favorável ou contrária a candidato, partido ou coligação, desde que essa manifestação não se configure propaganda eleitoral e não importe em tratamento privilegiado em detrimento dos demais participantes da disputa eleitoral.
2.Ao analisar o conteúdo impugnado, é certo que a conduta dos recorridos caracterizou fato ofensivo à imagem e à reputação do então candidato, restando evidente o tratamento desfavorável ao mesmo, visto que trouxe impactos negativos a campanha eleitoral dele, já que concorreu para exercer o mandato de prefeito municipal.
3.Conhecimento e provimento do recurso.
(Id. 163343457)
A Coligação Avança Canindé ajuizou representação contra os recorrentes por alegada prática de propaganda eleitoral negativa mediante a veiculação de programa jornalístico, no qual utilizaram expressões difamatórias e atribuíram a prática de crime a pré-candidato adversário, em conduta ofensiva à honra e à imagem.
Em primeiro grau, o pedido foi julgado improcedente (id. 163343433).
O TRE/SE reformou a sentença de primeiro grau para julgar procedentes os pedidos e condenar a representada Rádio Xingo LTDA ao pagamento de multa no valor de R$21.282,00 e os representados Willames de Lima e Luiz Eduardo de Oliveira Costa ao pagamento de multa individual no valor de R$5.000,00, nos termos de ementa acima transcrita.
No recurso especial interposto por Luiz Eduardo de Oliveira Costa, alega-se (id. 163343464):
a) “[...] não se pode extrair dos fatos narrados na inicial houve a realização de propaganda eleitoral irregular” (fl. 6);
b) “[...] o TSE destaca o caráter dialético imanente às disputas político -eleitorais, o que exige uma maior deferência à liberdade de expressão e, por outro lado, uma menor intervenção do Poder Judiciário” (fl. 6);
c) dissídio jurisprudencial quanto a acórdão do TRE/PR, no sentido de que “[...] direito de crítica não poder sofrer limitação arbitrária, quanto a realização de comentários depreciativos que não desbordam para a falsidade fantasiosa, injúria, calúnia ou difamação configura a propaganda eleitoral negativa” (fl. 7);
d) divergência jurisprudencial em relação a acórdão do STF, sustentando que “a liberdade de expressão constitui um dos fundamentos essenciais da sociedade” (fl. 7);
e) dissenso jurisprudencial referente a acórdão do TRE/SE, aduzindo que “[...] o magistrado deve verificar se as críticas ultrapassam os limites constitucionais da liberdade de imprensa e de manifestação do pensamento, em ofensa à honra e à dignidade do candidato, em contexto indissociável de disputa a pleito vindouro” (fl. 8);
f) conformidade com o art. 5º, IX, da Constituição Federal (CF), pois “[...] não há que se falar em propaganda irregular, só há que se falar liberdade de expressão e de imprensa [...]o radialista, ora recorrente, ao fazer a comentarios e opiniões, não faz críticas e seus comentários não são providos de expressão aviltante, difamatória, injuriosa ou mesmo sabidamente inverídica” (fls. 9-10);
g) “como forma de corroborar todo o exposto, imprescindível a transcrição de sentenças deste douto Juízo a respeito de processos como este, in verbis” (fl. 11);
h) “[...] demonstrar a total improcedência da representação manifestada, o STF, no julgamento de mérito da ADI 4451 (rel. Min. Alexandre de Morais, j. 20 e 21/06/2018, Informativo 907), consolidou entendimento quanto à segunda parte do inciso III, do art. 45, in verbis: ‘não existe permissivo constitucional para limitar preventivamente o conteúdo do debate político em razão de conjectura sobre o efeito que alguns conteúdos possam vir a ter junto ao público. O exercício do direito à liberdade de expressão não pode ser cerceado pelo Estado ou por particular’” (fl. 15).
i) divergência jurisprudencial quanto a acórdão do TRE/SE, visto que “[...] ante a ausência de demonstração e qualquer conduta ilícita que tenha sido praticada pelos Representados, a presente representação deve ser julgada improcedente” (fl. 16);
j) “[...] não há qualquer mensagem de cunho eleitoral, tratando-se de elemento que traz simples saudação aos participantes do evento. Ou seja, em evidente divergência na interpretação do artigo art. 45, III, da Lei n. 9.504/97 43 da Resolução-TSE nº 23.610/2019” (fl. 16); e
k) dissídio jurisprudencial referente a acórdãos do TRE/SE, do TSE e do TRE/MA.
Por fim, requer-se o provimento do recurso especial para julgar improcedente a representação.
No recurso especial interposto pela Rádio Xingó LTDA e por Willames de Lima, alega-se (id. 163343467):
a) “de acordo com a jurisprudência consolidada do TSE, ‘as críticas, mesmo que intensas, são parte do processo eleitoral e não garantem, por si só, o direito de resposta, desde que não ultrapassem os limites do questionamento político nem se transformem em insultos pessoais, acusações de crimes ou afirmações claramente falsas’ (Acórdão de 23.9.2014 no Rp nº 127927, rel. Min. Tarcísio Vieira de Carvalho Neto)” (fl. 7);
b) “[...] o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI nº. 4.451, rel. Ministro Alexandre de Morais, julgada em 21/06/2018 (DJe 129, divulgação 1º/03/2019, publicado em 06/03/202019), decidiu pela inconstitucionalidade dos incisos II e III (na parte impugnada) do art. 45 da Lei 9.504/1997, bem como, por arrastamento, dos §§ 4º e 5º do mesmo artigo [...] deixando claro que o direito de crítica ou matéria jornalística deve ser assegurado aos meios de comunicação social, especialmente em período eleitoral, devendo o magistrado, em cada caso concreto, avaliar o uso indevido do veículo de comunicação para fins de favorecimento a uma determinada candidatura” (fls. 8-9);
c) “[...] impõe-se como regra a preservação e livre exercício de liberdades fundamentais, dentre as quais a de expressão e de imprensa, consoante redação do art. 220 da Constituição Federal” (fl. 9);
d) “[...] não houve propaganda negativa extemporânea, vez que os recorrentes não extrapolaram os limites da liberdade de imprensa [...] houve apenas uma manifestação de opinião sobre a gestão de Weldo Mariano, que apoia o pré-candidato Kaká Andrade na Prefeitura Municipal. Ou seja, uma opinião jornalística sobre práticas políticas, sem a intenção de incitar o eleitor ou pedir que não vote no pré-candidato. Nesse contexto, apenas criticou-se a aliança política entre a gestão atual e o pré-candidato Kaká Andrade, de modo que os comentários tecidos não atribuem ofensa à imagem de ninguém, mas apenas crítica aceitável num cenário democrático, de modo que os fatos não ensejam reprimenda da Justiça Eleitoral” (fl. 9);
e) “[...] não se verifica nenhuma inverdade nas críticas tecidas pelos representados, que refletem a sua opinião sobre questão política pertinente. Neste sentido, já se manifestou o Supremo Tribunal Federal que ‘é precisamente em período eleitoral que a sociedade civil em geral e os eleitores em particular mais necessitam da liberdade de imprensa’ (ADI nº 4.451-MC- Rel. Min. Ayres Britto, j. 2.9.2010” (fl. 11); e
f) “no âmbito do Tribunal Superior Eleitoral, o tema liberdade de informação e de manifestação do pensamento vem sendo continuamente discutido, tendo a sua jurisprudência caminhado para uma posição mais flexível e tolerante sobre os limites da crítica” (fl. 9).
Por fim, requer-se o provimento do recurso especial para julgar improcedente a representação.
A Presidência da Corte de origem admitiu os recursos especiais (id. 163343469).
Contrarrazões (id. 163343479).
A Procuradoria-Geral Eleitoral opinou pelo não conhecimento ou, superados os óbices, não provimento dos recursos (id. 163484681).
É o relatório.
A peça do recurso de id. 163343465 está assinada eletronicamente e foi juntada no prazo legal, no sistema PJe, pelo Dr. Victor Emanuel de Menezes Macedo Maia, cuja procuração se encontra no id. 163343419.
A peça do recurso de id. 163343467 está assinada eletronicamente e foi juntada no prazo legal, no sistema PJe, pelo Dr. Edson Felix Silva, cuja procuração se encontra nos ids. 163343412 e 163343412.
No mérito, a controvérsia consiste em aferir se houve, ou não, divulgação de propaganda eleitoral negativa em programa de televisão realizado em 16/8/2024, após as convenções para as Eleições 2024.
O art. 22, X, da Res.-TSE 23.610/2019 dispõe que “não será tolerada propaganda [...] que caluniar, difamar ou injuriar qualquer pessoa, bem como atingir órgãos ou entidades que exerçam autoridade pública”.
Por sua vez, a Res.-TSE 23.610/2019, ao regulamentar o art. 45 da Lei 9.504/97 à luz do entendimento fixado pelo Supremo Tribunal Federal no âmbito da ADI 4451/DF, assim disciplinou a matéria relativa às vedações impostas às emissoras de rádio e televisão, após a realização das convenções, em sua programação normal e em seu noticiário:
Art. 43. A partir de 6 de agosto do ano da eleição, é vedado às emissoras de rádio e de televisão, em sua programação normal e noticiário (Lei nº 9.504/1997, art. 45, I, III, IV, V e VI; vide ADI nº 4.451):
I - transmitir, ainda que sob a forma de entrevista jornalística, imagens de realização de pesquisa ou qualquer outro tipo de consulta popular de natureza eleitoral em que seja possível identificar quem for entrevistado ou em que haja manipulação de dados;
II - veicular propaganda política;
III - dar tratamento privilegiado a candidata, candidato, partido político, federação ou coligação, inclusive sob a forma de retransmissão de live eleitoral de que trata o art. 29-A desta Resolução; (Redação dada pela Resolução nº 23.732/2024)
IV - veicular ou divulgar filmes, novelas, minisséries ou qualquer outro programa com alusão ou crítica voltada especificamente a candidata, candidato, partido político, federação ou coligação, mesmo que dissimuladamente, exceto programas jornalísticos ou debates políticos; (Redação dada pela Resolução nº 23.732/2024)
V - divulgar nome de programa que se refira a candidata ou candidato escolhido em convenção, ainda quando preexistente, inclusive se coincidente com o nome da candidata ou do candidato ou o nome por ela ou ele indicado para uso na urna eletrônica, e, sendo coincidentes os nomes do programa e da candidata ou do candidato, fica proibida a sua divulgação, sob pena de cancelamento do respectivo registro.
[...]
§ 3º Sem prejuízo do disposto no parágrafo único do art. 75 desta Resolução, a inobservância do estabelecido neste artigo sujeita a emissora ao pagamento de multa no valor de R$ 21.282,00 (vinte e um mil, duzentos e oitenta e dois reais) a R$ 106.410,00 (cento e seis mil, quatrocentos e dez reais), duplicada em caso de reincidência (Lei nº 9.504/1997, art. 45, § 2º).
(sem destaque no original)
De acordo com o entendimento deste Tribunal, a configuração de propaganda eleitoral negativa pressupõe ato que macule a honra ou a imagem de candidato ou divulgue fato sabidamente inverídico em seu desfavor. É o que se infere:
ELEIÇÕES 2022. TUTELA CAUTELAR. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA NEGATIVA. DEFERIMENTO.
[...]
2. A livre circulação de pensamentos, opiniões e críticas visam a fortalecer o Estado Democrático de Direito e à democratização do debate no ambiente eleitoral, de modo que a intervenção desta justiça especializada deve ser mínima em preponderância ao direito à liberdade de expressão. Ou seja, a sua atuação deve coibir práticas abusivas ou divulgação de notícias falsas, de modo a proteger a honra dos candidatos e garantir o livre exercício do voto.
[...]
(Ref-Rp 0600851-15.2022.6.00.0000/DF, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 22/9/2022)
Ainda nessa linha, os seguintes precedentes em que emissora de rádio foi condenada ao pagamento de multa por divulgação de propaganda negativa contendo críticas que ultrapassaram o direito à liberdade de expressão:
RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2020. EMISSORA DE RÁDIO. CONDUTA VEDADA. ART. 45, III, DA LEI Nº 9.504/1997. REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE. AUSÊNCIA. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. DEMONSTRAÇÃO. AUSÊNCIA. INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO Nº 28 DA SÚMULA DO TSE. LIBERDADE DE IMPRENSA E DE INFORMAÇÃO. EXTRAPOLAÇÃO. HARMONIA DO ACÓRDÃO REGIONAL COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. MULTA APLICADA EM DOBRO. REINCIDÊNCIA DA CONDUTA VEDADA. POSSIBILIDADE. ENUNCIADO Nº 30 DA SÚMULA DO TSE. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO.
1. Hipótese em que a Corte regional, por unanimidade, manteve sentença que julgou caracterizada conduta vedada consubstanciada em propaganda política veiculada por emissora de rádio após as convenções, em ofensa ao art. 45, III, da Lei nº 9.504/1997.
[...]
3. De acordo com a jurisprudência do TSE, estar-se-á diante de uma conduta vedada pelo art. 45 da Lei nº 9.504/1997 quando a crítica ou matéria jornalísticas venham a descambar para a propaganda política, passando nitidamente a favorecer ou desfavorecer uma das partes na disputa eleitoral, o que deve ser avaliado em cada caso concreto. Precedente.
4. Não se trata de cercear a liberdade de expressão, mas tão-somente de inibir os excessos para que não haja a configuração de propaganda política que venha a causar desequilíbrio no pleito, especialmente nos veículos de rádio e televisão.
5. Na hipótese dos autos, o Tribunal de origem verificou nítido apoio ao candidato à reeleição, pois a emissora, por meio de seu programa radiofônico, fez exaltação à administração do candidato à reeleição, em franca defesa de sua gestão, e em detrimento das propostas defendidas por seu opositor político. Entendimento em harmonia com a jurisprudência desta Corte. Precedente: AgR-REspEl nº 0600358-74/SE, de minha relatoria, julgado em 28.4.2022, DJe de 10.5.2022.
[...]
(REspEl 0600197-83.2020.6.18.0004/PI, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 10/10/2022 – sem destaque no original)
AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2020. VEREADOR. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL NEGATIVA. ART. 43, II, DA RES.-TSE 23.610/2019. DIVULGAÇÃO. COMENTÁRIO. PROGRAMA DE RÁDIO. FATO SABIDAMENTE INVERÍDICO. CONFIGURAÇÃO. NEGATIVA DE PROVIMENTO.
[...]
2. Consoante jurisprudência desta Corte Superior, a garantia da livre manifestação de pensamento não possui caráter absoluto, afigurando-se possível a condenação por propaganda eleitoral negativa, no caso de a mensagem divulgada ofender a honra ou a imagem do candidato, dos partidos ou coligações, ou propagar fatos sabidamente inverídicos.
3. Na espécie, extrai-se da moldura fática do aresto a quo que, no dia 28/9/2020, foi divulgado o seguinte comentário em programa da rádio agravante: "com isso, pressupõe-se que o parlamentar, no caso o vereador Nilton Senhorinho, parece desconhecer o seu ¿telhado de vidro' e continua incitando desafios infundados e mirabolantes em uma emissora rádio ao invés de explicar a população pra onde foi parar essa dinheirama pública que o Ministério Público de Pernambuco o acusa de ter utilizado em benefício próprio".
4. O TRE/PE assentou que "não há dúvida de que a conduta da [agravante] era objetivamente capaz de tisnar a imagem do candidato do partido [agravado], em verdadeiro abuso e desvirtuamento da liberdade de imprensa e de expressão, sem qualquer preocupação com a nobre missão de informar, mormente ao omitir por completo o fato de ter sido o candidato absolvido em 1ª instância, pelo Juízo Federal da 24ª Vara, nos autos da Ação Penal nº 0000181-63.2016.4.05.0000".
5. Diante desse quadro, em que foi veiculada notícia sabidamente inverídica do candidato, com omissão acerca da sentença absolutória, tem-se caracterizado o ilícito na espécie, não se cuidando de mera manifestação pessoal.
[...]
(AgR-REspEl 0600502-68.2020.6.17.0045/PE, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 15/12/2022 – sem destaque no original)
Ademais, este Tribunal já assentou que “os limites impostos pela legislação eleitoral visam conceder tratamento isonômico aos candidatos, dando iguais oportunidades de exposição da campanha junto ao eleitorado, não importando em violação aos arts. 5º, IX, e 220 da Constituição Federal” (ED-AgR-REspEl 3536-63.2010.6.18.0000/PI, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 11/11/2013).
Extraio da moldura fática do acórdão de origem que os recorrentes, durante o período eleitoral, veicularam o programa jornalístico “Jornal da Xingó” atribuindo a prática de crime a candidato adversário, utilizando expressões como “Willame, muito bom dia, meu amigo, escute, eu acho que você está fazendo essa denúncia muito importante, porque isso está afetando a população de Canindé de uma forma cruel”, “agora, como esse dinheiro sumiu, é que é preciso ser aberto. Como esse dinheiro foi pago, ao dono da empresa não chegou para os pideiros. Essa é que seria a questão básica do Ministério Público deveria intervir para resolver”, “você veja a imensidão do crime, a imensidão do crime, e é uma situação sem perspectiva de solução” e “agora é preciso colocar a culpa exatamente em quem gerou essa situação, que quem gerou essa, essa, essa piora considerável do município foi a intervenção branca do atual candidato”.
Na mesma ocasião, utilizaram expressões difamatórias, tais como “são essas promessas, essas promessas de encher de falsidade, de hipocrisia e de mentira que a gente tem que avaliar” e “devia dizer o prejuízo que foi causado no município” e “as pessoas estão agonizando, as pessoas não aguentam mais, é, tamanho desrespeito”. Confira:
Na hipótese dos autos, a insurgente alega que, no dia 16/08/2024, o proprietário da Rádio Xingo Ltda, Luiz Eduardo de Oliveira Costa, no programa Jornal da Xingó, “fez uso indevido do meio de comunicação para macular a candidatura do candidato da Recorrente e promover a candidatura do candidato opositor, mediante ataques a honra e veiculação de desinformação”.
Confira-se a degravação juntada na petição inicial:
(04:39) Luiz Eduardo Costa: "Willame, muito bom dia, meu amigo, escute, eu acho que você está fazendo essa denúncia muito importante, porque isso está afetando a população de Canindé de uma forma cruel. Não se pode admitir que o município fique dois meses sem botar água no povo quando está começando o verão, enquanto o inverno foi fraco e não encheu as barragens. Agora veja uma coisa, eu me permito discordar um de você quando, quanto à atribuição de culpa, mas não tenho nada a ver com a administração de Weldo, nem nada a ver com a intervenção que houve aí, ,Branca, mas sou observador das coisas, eu lembro que quando houve essa intervenção Branca, o candidato que fora derroto na eleição anterior e que vinha trabalhando na justiça para afastar o Prefeito Weldo, fez uma união com ele sob o pretexto de que iriam resolver os problemas de Canindé, inclusive com uma pessoa nas finanças da absoluta confiança deles, dele. E o que a gente viu foi o desastre aumentar. É preciso ver os problemas que foram criados nesse período da intervenção e dar um certo crédito a esse que chegou agora, o secretário de finanças novo, para ver se ele resolve. Porque inclusive o Prefeito não pode pagar esses problemas que estão criados aí com o pipeiro, porque teoricamente já está pago, foi aquilo que eu escrevi, (Fala do radialista Willame está sobreposta nesse momento, sendo incompreensível entender a continuação da fala de Luiz Eduardo), agora por que? Por que não repassaram esse dinheiro para os pipeiros? Esse é que é o problema. Esse é que é o problema. E é isso, e é isso que o Ministério Público poderia fazer, chamar o Diretor, dono dessa empresa, dono, dono, quem for, e dizer, meu amigo, você recebeu esse dinheiro quando? A dois meses atrás. Por que não passou "pros" pepeiros? É esse o problema. Daí a necessidade do Ministério Público. Porque o grande erro do atual Prefeito, o Weldo, foi ter entregue à prefeitura a esse pessoal que disse que ia melhorar. E ele pode não querer dizer talvez está um tanto temeroso, mas o que foi feito piorou consideravelmente a situação do município, o município já estava em uma situação difícil. E o que se fez nesses últimos meses foi piorar. É essa que é a gravidade do fato. E o Prefeito fica imprensado, porque afinal de contas, no topo, o responsável era ele, só que ele era um responsável que não mandava. Ele infelizmente cedeu a sua autoridade para os outros, e os outros usaram da autoridade dele pra fazer o que queriam. Então, a situação foi gerada antes. Agora é consequência, né? Que caiu das costas dele. Como ele vai resolver, não sei. Mas quem gerou essa situação de pior caos, disseram que o município "tava" num caos. Foi a palavra da pessoa que assumiu, do atual candidato, antes de candidato derrotado, que disse que o município "tava" num caos e que eles iam contratar uma equipe de advogados, uma equipe de financistas, todos eles recebendo por prestação de assessorias, né? Não é um salário simples, quer dizer, esvaziaram os cofres com muitas despesas e agravaram a situação de tal modo que hoje a gente tem é, dezenas de pideiros, vinte e tantos ou trinta e tantos, a dois meses sem receber e a população sem água, e o, e o, e a grande questão é que o Prefeito não pode resolver, porque ele não pode pagar outra vez, foi pago. Agora, como esse dinheiro sumiu, é que é preciso ser aberto. Como esse dinheiro foi pago, ao dono da empresa não chegou para os pideiros. Essa é que seria a questão básica do Ministério Público deveria intervir para resolver. É papel fiscalizatório do Ministério Público e a gente está vendo uma certa ausência do Ministério e essas coisas se agravando. Agora veja a consequência, a pessoa passa dois meses sem água, bebendo água de barragem, podre, putrefata, onde o gado está ali, defecando, o cavalo, está sendo lavado, tudo. E vai dar água "pras" crianças. Nessas casas tem idosos, tem crianças que estão bebendo essas águas. Esse tipo de água. Você veja a imensidão do crime, a imensidão do crime, e é uma situação sem perspectiva de solução. Sem perspectiva de solução. Porque o que se pode fazer agora, talvez, é quando vencer o próximo mês, o Prefeito pagar imediatamente. Porque esses dois meses que estão atrasados, só o Ministério Público quem pode dizer como é que vai ser feito, só ele, chamar o secretário da época, dizer como foi, chamar o presidente, o diretor, o dono dessa empresa (Continuação áudio 02.) Que faz a concessão do do, dos carros pipas enquanto isso o povo está se arrebentando. Agora é preciso colocar a culpa exatamente em quem gerou essa situação, que quem gerou essa, essa, essa piora considerável do município foi a intervenção branca do atual candidato, porque ele assumiu a responsabilidade de melhorar a Canindé, por isso houve acordo, por isso houve o entendimento, por isso ele passou a mandar. Isso foi um desastre. Isso foi um desastre. Agora, o secretário de Finanças atual, ele está numa situação encalacrada, eu não sei como é que vai resolver, e essa situação encalacrada é resultado da intervenção. É isso que eu queria deixar bem claro para o povo de Canindé, para saber exatamente o que acontece, e é isso que você vem batendo com muita razão, com muita racionalidade, com muito equilíbrio dessa situação, viu? Obrigado, um abraço a todos, muito obrigado meus amigos." (00:01:00) Willame Lima: " Muito bem, mas é esse o trabalho que a gente vem fazendo, viu, seu Luiz Eduardo, é alertando a população com relação a esse desastre que vem acontecendo no município de Canindé, e as pessoas estão agonizando, as pessoas não aguentam mais, é, tamanho desrespeito, a gente até entende, foi o que a gente estava comentando desde o início aqui da nossa fala, a gente comentando com relação às dificuldades. " (00:01:29) Luiz Eduardo Costa: "Ô Willame, Willame me permita, mas veja, chamando sobretudo a atenção, como você tem chamado, pra quem fez essa promessa de melhoria pra quem fez essa promessa de melhoria e por isso, fez o acordo com uma pessoa com a qual ele estava lutando na justiça pra afastar, e "prometi" seria um novo tempo, cadê o novo tempo? São essas promessas, essas promessas de encher de falsidade, de hipocrisia e de mentira que a gente tem que avaliar, que foram feitas lá pra setembro do ano passado, né, nesse tempo todo que durou a intervenção branca e deu no que deu, essa consequência terrível do povo ficar sem a coisa essencial que é a água para beber, meu amigo, (Fala incompreensível para continuação devido a fala sobreposta do radialista Willame), nunca aconteceu isso, nunca, e é como eu estou dizendo Willame, e acho que você concorda comigo, não tem como solucionar, difícil, porque o problema teoricamente já tá pago. Teoricamente não, de fato já tá pago. Teoricamente deveria ser passado para o pipeiro, e não foi. (Fala incompreensível), é pra essa situação que a gente clama para que o Ministério Público tenha uma posição de gerar uma possibilidade de resolver. Isso não pra um dia, dois, três deles. Já dura dois, né?. Agora, é o que eu digo, o Prefeito, que reassumiu, Weldo, ele não tem como resolver isso, não tem. A situação é constrangedora pra ele, eu sei que é, mas não tem como resolver. Agora ele devia dizer isso, só isso. Devia dizer talvez esteja pressionado a não falar, mas devia dizer. Devia dizer o prejuízo que foi causado no município e os problemas que geraram pra ele próprio. Essa intervenção que veio pra salvar, arrebentou tudo e arrebentou possivelmente a ele, se ele não tiver a decisão de explicar isso tudo, que é o que deve acontecer. Mas a responsabilidade é de quem prometeu melhorar e tomou conta. " (00:03:45) Willame Lima: " É uma situação realmente complexa, é uma situação muito complexa, a situação foi o que a gente via falando, na verdade, a gente acompanhando, o prefeito ele foi nocauteado, ele foi nocauteado, mas aí só ele para explicar, até então não houve por parte do prefeito, do gestor, um pronunciamento oficial, e aí as pessoas ficam sem entender o que de fato está acontecendo. Mas é preciso que publicamente o prefeito possa explicar à população. Será que também ele pode explicar? Será que ele pode se pronunciar? A situação é complexa. A situação é complexa." (grifei)
Ao analisar o conteúdo impugnado, é certo que a conduta dos recorridos caracterizou fato ofensivo à imagem e à reputação do então candidato Kaká Andrade, restando evidente o tratamento desfavorável ao mesmo, com acusações vagas ao atual gestor que o apoiava.
Dessa forma, entendo que as afirmações realizadas se enquadram na hipótese de propaganda eleitoral negativa e que comprometem o princípio da isonomia.
Com isso, a própria conduta dos recorridos Willames de Lima e Luiz Eduardo de Oliveira Costa, e o fato de a emissora de rádio ter veiculado a propaganda eleitoral negativa, justificam a aplicação da multa prevista no art. 43, § 3º, da Resolução-TSE nº 23.610/2019.
(Id. 163353501 – sem destaque no original)
As premissas fáticas estabelecidas pela Corte de origem revelam que as declarações dos recorrentes tentam desqualificar a imagem do candidato oposto atribuindo-lhe a prática de crime sem respaldo probatório, além de utilizar conteúdo ofensivo à reputação, o que denota tratamento desfavorável entre os candidatos e extrapola os limites da liberdade de expressão, não se tratando de crítica aceitável.
Dessa forma, entendo configurada propaganda eleitoral negativa, em violação aos arts. 22, X, e 43, II, III e § 3º, da Res.-TSE 23.610/2019.
Considerado o que consta do acórdão regional, foi dado adequadro enquadramento jurídico aos fatos e conclusão diversa, no sentido de que não houve a divulgação de conteúdos ofensivos à honra e à imagem, demandaria reexame de fatos e provas, providência incabível nesta via processual (Súmula 24/TSE).
No que se refere às alegações de dissídio jurisprudencial, as pretensões não merecem prosperar.
Nos termos da Súmula 28/TSE, “a divergência jurisprudencial que fundamenta o recurso especial interposto com base na alínea b do inciso I do art. 276 do Código Eleitoral somente estará demonstrada mediante a realização de cotejo analítico e a existência de similitude fática entre os acórdãos paradigma e o aresto recorrido”.
Consoante a jurisprudência deste Tribunal, “[...] a meratranscriçãodaementa, de trechos ou, até mesmo, do inteiro teor de acórdãos desta Corte ou de tribunais regionais eleitorais não é suficiente para caracterizar odissídiojurisprudencial, nos termos do Enunciado Sumular nº 28 do TSE” (AgR-AREspE 0600566-23.2020.6.05.0139/BA, Rel. Min. Raul Araújo Filho, DJE de 6/9/2024).
Nos termos da Súmula 29/TSE, “a divergência entre julgados do mesmo Tribunal não se presta a configurar dissídio jurisprudencial apto a fundamentar recurso especial eleitoral”.
Os julgados trazidos como paradigma não possuem similitude fática, pois em nenhum deles se extrapolaram os limites da liberdade de expressão, ao passo que, no caso dos autos, assentou-se que os recorrentes ultrapassaram esses limites.
Além disso, a simples transcrição de ementas sem realizar o devido cotejo analítico e a apresentação de julgados do mesmo tribunal não são aptos a configurar divergência a fundamentar recurso especial.
Incide, ademais, a Súmula 30/TSE: “não se conhece de recurso especial eleitoral por dissídio jurisprudencial, quando a decisão recorrida estiver em conformidade com a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral”.
O acórdão recorrido, portanto, não merece reparo.
Em face do exposto, nego seguimento ao recurso especial, nos termos do art. 36, § 6º, do RI-TSE.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília (DF), data registrada no sistema.
assinado eletronicamente
MINISTRA ISABEL GALLOTTI
Relatora