index: REPRESENTAÇÃO (11541)-0601755-35.2022.6.00.0000-[Propaganda Política - Propaganda Eleitoral - Internet, Propaganda Política - Propaganda Eleitoral - Divulgação de Notícia Sabidamente Falsa, Propaganda Política - Propaganda Eleitoral - Redes Sociais]-DISTRITO FEDERAL-BRASÍLIA

Brasão da República
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

 

REPRESENTAÇÃO Nº 0601755-35.2022.6.00.0000 – CLASSE 11541 – BRASÍLIA – DISTRITO FEDERAL

 

Relator: Ministro Sérgio Banhos

Representante: Coligação Brasil da Esperança

Advogados: Eugênio José Guilherme de Aragão – OAB: 4935/DF e outros

Representada: Carla Zambelli Salgado de Oliveira

Representada: Caroline Rodrigues de Toni

Representada: Renata J. Barreto

Representado: André Machado Valadão

Representado: Nikolas Ferreira de Oliveira

Representado: Leandro Panazzolo Ruschel

Representado: Responsável pelo perfil @vemprarua_Br no Instagram

DECISÃO

A Coligação Brasil da Esperança ajuizou representação, com pedido de liminar, em desfavor de Carla Zambelli Salgado de Oliveira, André Machado Valadão, Nikolas Ferreira de Oliveira, Leandro Panazollo Ruschell, Caroline Rodrigues de Toni, Renata J. Barreto e Responsável pelo perfil "@vemprarua_br" no Instagram, por suposta veiculação de desinformação em seus perfis em redes sociais, mediante a divulgação de conteúdo gravemente descontextualizado e sabidamente inverídico, com o objeto de vincular o candidato ao cargo de presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva à miséria e a ameaças ditatoriais, em infração aos arts. 9º-A, 22, X, e 27, § 1º, da Res.-TSE 23.610.

Os autos foram inicialmente distribuídos ao Ministro Ricardo Lewandowski e, ato contínuo, foram redistribuídos à Ministra Maria Cláudia Bucchianeri, com fundamento na Portaria-TSE 1.007/2022 (ID 158302590).

Em 12.1.2023, os autos me foram redistribuídos, nos termos do art. 2º, § 5º, da Res.-TSE 23.608, em razão do encerramento da atuação das ministras e dos ministros designados para apreciação de representações, reclamações e pedidos de direito de resposta referentes às Eleições de 2022 (IDs 158365853 e 158552140).

Por despacho (ID 158564463), ante a aparente perda do objeto da representação, determinei a intimação da representante para que se manifestasse a respeito do interesse no prosseguimento do feito, e que, após, fosse ouvida a Procuradoria-Geral Eleitoral.

A Coligação Brasil da Esperança, na manifestação apresentada (ID 158627249), requereu o prosseguimento do feito, aduzindo persistir o interesse quanto ao pedido de aplicação de multa por propaganda eleitoral irregular.

Por sua vez, a douta Procuradoria-Geral Eleitoral opinou pela extinção do processo, sem resolução de mérito, apontando a perda do objeto da representação quanto aos pedidos de remoção de conteúdo veiculado na internet e de abstenção de divulgação com o mesmo teor, afirmando a inexistência de previsão legal para a incidência de multa no caso dos autos (ID 158657691).

É o relatório.

Decido.

Evidencia-se a regularidade da representação processual (procuração de ID 158300846).

Inicialmente, registro que, na sessão de 28.3.2023, este Tribunal Superior concluiu o julgamento do Recurso na Representação 0601754-50, da relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, ocasião em que o Colegiado decidiu, por maioria, que é possível a aplicação da multa prevista no art. 57-D da Lei 9.504/97 nas representações por propaganda eleitoral irregular divulgada na internet mediante veiculação de informação inverídica e, por conseguinte, persiste o interesse jurídico na determinação de remoção definitiva do conteúdo impugnado, independentemente da superveniência das eleições.

Tal compreensão foi reafirmada no Recurso na Representação 0601756-20, também da relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, julgado na sessão ordinária em regime híbrido realizada no dia 18.4.2023 e cujo acórdão ainda não foi publicado.

Desse modo, ante a possibilidade de aplicação de multa e de que seja determinada a remoção definitiva do conteúdo desinformativo, não há falar em perda do objeto da representação em virtude da realização das eleições, de modo que cumpre prosseguir na instrução processual.

A Coligação Brasil da Esperança requer, na petição inicial, o deferimento de medida liminar, com fundamento no art. 300 do Código de Processo Civil, visando a que seja determinada a remoção das publicações impugnadas nos autos e que os representados se abstenham de veicular outras notícias e publicações com o mesmo teor, em ambos os casos sob pena de multa, de modo a preservar a lisura e a higidez das eleições e do processo eleitoral.

Alega que os representados veicularam desinformação em seus perfis em redes sociais com o objetivo de vincular o candidato a presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva à miséria e a ameaças ditatoriais, traçando “um paralelo imaginário associando uma eventual vitória de Lula nas eleições vindouras a um cenário trágico, no qual se instalaria uma ‘ditadura comunista’ no Brasil, acompanhada de fome generalizada” (ID 158300845, p. 4).

Argumenta que as publicações impugnadas veicularam informação sabidamente inverídica e já desmentida por agências de checagem a respeito de suposto plano para implantação do comunismo no Brasil, e, no que se refere ao hipotético risco de crescimento da miséria no país, divulgaram ilações contrariadas por dados publicados em relatório da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e, por conseguinte, teriam propagado conteúdo gravemente descontextualizado, que atingiria a integridade do processo eleitoral – por afetar a liberdade de conhecimento dos cidadãos e o direito livre de voto – e ofenderia a honra e a imagem do candidato Luiz Inácio Lula da Silva e do Partido dos Trabalhadores, incidindo, assim, nas vedações previstas nos art. 9º-A, 22, X, e 27, § 1º, da Res.-TSE 23.610.

Como é consabido, a concessão da tutela de urgência pressupõe o preenchimento de requisitos, consistentes em probabilidade do direito (fumus boni juris) e perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (periculum in mora).

No que se refere à probabilidade do direito, a autora da representação afirma que os conteúdos das postagens impugnadas nos autos evidenciariam manifesta ofensa às normas e aos princípios que regem a propaganda eleitoral, de modo a ferir a lisura do processo eleitoral, ante o emprego de estratégia de propagação de desinformação e de manipulação de narrativas, com violação da liberdade de pensamento e à cidadania dos eleitores.

Argumenta que o perigo de dano residiria na perpetuação de desinformação que macula a lisura do processo eleitoral e veicula propaganda eleitoral negativa contra o então candidato Luiz Inácio Lula da Silva e o Partido dos Trabalhadores, por meio de publicações veiculadas na internet, cujo alcance é amplificado de forma exponencial pelo alto número compartilhamentos, com significativa interferência na liberdade de opinião e de pensamento dos eleitores, violando o direito ao voto livre e a democracia.

Acerca de tais alegações, observo que o art. 9º-A da Res.-TSE 23.610, incluído pela Res.-TSE 23.671, dispunha que “é vedada a divulgação ou compartilhamento de fatos sabidamente inverídicos ou gravemente descontextualizados que atinjam a integridade do processo eleitoral, inclusive os processos de votação, apuração e totalização de votos, devendo o juízo eleitoral, a requerimento do Ministério Público, determinar a cessação do ilícito, sem prejuízo da apuração de responsabilidade penal, abuso de poder e uso indevido dos meios de comunicação”.

O referido dispositivo regulamentar foi revogado pela Res.-TSE 23.714, de 20.10.2022 (DJE de 24.10.2022), a qual dispõe a respeito da matéria no art. 2º, caput, cujo teor é o seguinte: “É vedada, nos termos do Código Eleitoral, a divulgação ou compartilhamento de fatos sabidamente inverídicos ou gravemente descontextualizados que atinjam a integridade do processo eleitoral, inclusive os processos de votação, apuração e totalização de votos”.

Ainda quanto ao tema, o art. 27, § 1º, da Res.-TSE 23.610, com a redação dada pela Res.-TSE 23.671, estabelece que “a livre manifestação do pensamento de pessoa eleitora identificada ou identificável na internet somente é passível de limitação quando ofender a honra ou a imagem de candidatas, candidatos, partidos, federações ou coligações, ou divulgar fatos sabidamente inverídicos, observado o disposto no art. 9º-A desta Resolução”.

Na espécie, sem prejuízo de exame mais detido da questão controvertida por ocasião do julgamento do mérito da representação, verifico que o requisito alusivo ao perigo de dano não está configurado, pois, ainda que se reconhecesse, em juízo de cognição sumária, a suposta ilicitude das postagens impugnadas e sua alegada aptidão para influenciar o eleitor e interferir negativamente no processo eleitoral, há de se considerar que o processo eleitoral já foi encerrado – inclusive com a eleição e a diplomação do candidato da coligação representante – e, desse modo, a eventual concessão de liminar para remoção das publicações em tela não surtiria efeito prático em relação ao pleito já findo.

Ainda quanto ao ponto, observo que, intimada para se manifestar a respeito da aparente perda do objeto da demanda – por despacho proferido antes das recentes decisões deste Tribunal que afastaram tal possibilidade, mencionadas alhures –, a representante se limitou a argumentar que, “por se tratar de representação eleitoral ajuizada em razão da perpetração de desinformação, remanesce a apreciação do pedido de aplicação de multa constante na inicial” (ID 158627249, p. 1), sem nada dizer a respeito do pedido de liminar para remoção de conteúdo.

Ademais, o indeferimento da medida liminar, na espécie, não enseja risco ao resultado útil do processo, pois a eventual remoção das postagens impugnadas poderá ser determinada em caráter definitivo por ocasião do julgamento de mérito, caso sejam reconhecidas a ilicitude dos conteúdos publicados e a procedência dos pedidos formalizados na representação.

Assim, por não estar presente o requisito necessário para a concessão da tutela de urgência requerida, alusivo ao perigo da demora, é caso de indeferimento do pedido de medida liminar formulado pela Coligação Brasil da Esperança.

De outra parte, verifica-se que um dos representados não foi devidamente identificado na petição inicial da representação, constando apenas a sua qualificação como “Responsável pelo perfil @vemprarua_br no Instagram”.

Quanto ao ponto, assinalo que o art. 17, § 1º, da Res.-TSE 23.608 prevê a possibilidade de a representação ser endereçada genericamente contra o responsável pela propaganda irregular, desde que requerida liminarmente diligência para a respectiva identificação e sejam fornecidos elementos indispensáveis para obtenção dos dados, sob pena de indeferimento da petição inicial, in verbis:

Art. 17. A petição inicial da representação relativa à propaganda irregular será instruída, sob pena de não conhecimento:

[...]

§ 1º Desconhecida a autoria da propaganda, a petição inicial poderá ser endereçada genericamente contra a(o) responsável, desde que requerida liminarmente diligência para a identificação desta ou deste e fornecidos os elementos indispensáveis para a obtenção dos dados, sob pena de indeferimento da petição inicial.

Por sua vez, os arts. 39 e 40 da Res.-TSE 23.610 estabelecem o seguinte:

Art. 39. O provedor responsável pela guarda somente será obrigado a disponibilizar os registros de conexão e de acesso a aplicações de internet, de forma autônoma ou associados a dados cadastrais, a dados pessoais ou a outras informações disponíveis que possam contribuir para a identificação da usuária ou do usuário, mediante ordem judicial, na forma prevista nesta seção (Lei nº 12.965/2014, art. 10, caput e § 1º).

Art. 40. A parte interessada poderá, com o propósito de formar conjunto probatório em processo judicial, em caráter incidental ou autônomo, requerer ao juízo eleitoral que ordene à(ao) responsável pela guarda o fornecimento dos dados constantes do art. 39 desta Resolução (Lei nº 12.965/2014, art. 22).

§ 1º Sem prejuízo dos demais requisitos legais, o requerimento deverá conter, sob pena de inadmissibilidade (Lei nº 12.965/2014, art. 22, parágrafo único):

I - fundados indícios da ocorrência do ilícito de natureza eleitoral;

II - justificativa motivada da utilidade dos dados solicitados para fins de investigação ou instrução probatória;

III - período ao qual se referem os registros; e (Redação dada pela Resolução nº 23.671/2021)

IV - a identificação do endereço da postagem ou conta em questão (URL ou, caso inexistente, URI ou URN), observados, nos termos do art. 19 da Lei nº 12.965/2014, o âmbito e os limites técnicos de cada provedor de aplicação de internet. (Incluído pela Resolução nº 23.671/2021)

§ 2º A ausência de identificação imediata da usuária ou do usuário responsável pela divulgação do conteúdo não constitui circunstância suficiente para o deferimento liminar do pedido de quebra de sigilo de dados.

§ 3º A ordem judicial que apreciar o pedido deverá conter, sob pena de nulidade, fundamentação específica quanto ao preenchimento de todos os requisitos legais previstos nos incisos I a III do § 1º deste artigo. (Grifo nosso.)

Todavia, no que se refere ao representado não identificado de plano na petição inicial (Responsável pelo perfil @vemprarua_br no Instagram), a autora da representação não formulou o requerimento de que tratam os arts. 17, § 1º, da Res.-TSE 23.610 e 40, caput, da Res.-TSE 23.610, visando a que fosse determinado ao responsável pela guarda o fornecimento dos dados mencionados no art. 39 da Res.-TSE 23.610, alusivos ao usuário em tela, a fim de que fosse identificado para citação e exercício do direito de defesa, o que, em princípio, ensejaria o indeferimento da petição inicial quanto ao referido demandado, com base no primeiro dispositivo regulamentar acima citado.

Pelo exposto:

I – Indefiro o pedido de medida liminar formulado pela Coligação Brasil da Esperança, ante a ausência do requisito para a concessão da tutela de urgência atinente ao perigo da demora, nos termos do art. 300 do Código de Processo Civil e na linha da fundamentação exposta acima.

II – Citem-se os representados Carla Zambelli Salgado de Oliveira, Caroline Rodrigues de Toni, Renata J. Barreto, André Machado Valadão, Nikolas Ferreira de Oliveira e Leandro Panazzolo Ruschel para apresentar defesa, no prazo de dois dias, nos termos do art. 18 da Res.–TSE 23.608.

III – Oficie-se às empresas Facebook, Instagram e Twitter, a fim de que preservem os conteúdos impugnados nesta representação (item 50.1.1 da petição inicial) e os respectivos dados cadastrais das usuárias e dos usuários, até o trânsito em julgado da decisão final do processo.

IV – Intime-se a Coligação Brasil da Esperança, a fim de que, no prazo de dois dias, manifeste-se a respeito da aparente existência de causa para o indeferimento da petição inicial quanto ao Responsável pelo perfil @vemprarua_br no Instagram, considerando a ausência do requerimento de diligências previsto nos arts. 17, § 1º, da Res.-TSE 23.610 e 40, caput, da Res.-TSE 23.610.

Publique-se.

Intime-se.

 
Ministro Sérgio Silveira Banhos
                                      Relator