TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

ACÓRDÃO

RECURSO ESPECIAL ELEITORAL Nº 0600484-70.2020.6.19.0181 – IGUABA GRANDE – RIO DE JANEIRO


Relator: Ministro Benedito Gonçalves

Recorrente: Elifas Levi dos Reis Ramalho

Advogado: Pedro Corrêa Canellas – OAB: 168484/RJ
Recorrente: Jackeline da Silva Hermida 

Advogados: Rafael Ferreira da Fonseca – OAB: 167479/RJ e outro

Recorrido: Ministério Público Eleitoral
 

 

RECURSOS ESPECIAIS. ELEIÇÕES 2020. VEREADOR. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE). FRAUDE. COTA DE GÊNERO. ART. 10, § 3º, DA LEI 9.504/97. CANDIDATURAS FICTÍCIAS.

1. Recursos especiais interpostos contra aresto unânime do TRE/RJ, que reformou sentença para julgar procedentes em parte os pedidos formulados em Ações de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), ajuizadas em desfavor dos candidatos ao cargo de vereador de Iguaba Grande/RJ nas Eleições 2020 pelo Progressistas, por fraude à cota de gênero no lançamento de uma candidatura feminina (art. 10, § 3º, da Lei 9.504/97).

PRELIMINAR. CONTRADIÇÕES. TRE/RJ. REJEIÇÃO.

2. O primeiro recorrente (candidato alcançado pela cassação da chapa) aduz contradição no acórdão regional e argumenta que inúmeros candidatos (incluída a segunda recorrente, Jackeline, cuja fraude foi reconhecida) obtiveram baixa votação em face da desistência da candidatura majoritária por eles apoiada. Todavia, a Corte de origem assentou com clareza que o número de votos representou somente um dos elementos configuradores do ilícito, havendo diversas outras circunstâncias nesse sentido.

3. A segunda contradição alegada – de que os prints de rede social são anteriores ao início da campanha e, assim, inaptos para firmar a condenação – é matéria que se confunde com o próprio mérito da controvérsia.

TEMA DE FUNDO. PROVAS ROBUSTAS. VOTAÇÃO ÍNFIMA. CONTAS SEM GASTOS COM PROPAGANDA. INEXISTÊNCIA DE ATOS EFETIVOS DE CAMPANHA. CONFIGURAÇÃO. FRAUDE.

4. De acordo com o entendimento desta Corte, a fraude à cota de gênero deve ser aferida caso a caso, a partir das circunstâncias fáticas de cada hipótese, sobretudo levando-se em conta aspectos como falta de votos ou votação ínfima, inexistência de atos efetivos de campanha, prestações de contas zeradas ou notoriamente padronizadas entre as candidatas, entre outras, de modo a transparecer o objetivo de burlar o mínimo de isonomia entre homens e mulheres que o legislador pretendeu assegurar no art. 10, § 3º, da Lei 9.504/97.

5. No caso, a somatória dos elementos contidos no aresto a quo permite concluir que a candidatura teve como único fim burlar a regra do art. 10, § 3º, da Lei 9.504/97: (a) votação ínfima (um voto); (b) prestação de contas com movimentação módica (R$ 529,26) e recursos usados apenas para pagar serviços contábeis e advocatícios, além de encargos bancários; (c) ausência de atos efetivos de campanha.

6. O exame aprofundado da moldura fática do acórdão regional revela inúmeras contradições nas teses defensivas. Em primeiro lugar, tal como salientou o TRE/RJ, “causa estranheza o fato de familiares, amigos e conhecidos não terem nela votado, sobretudo por ter sido demonstrado nos autos que a [segunda] recorrente [...] é pessoa conhecida no município”.

7. A suposta candidata declarou em juízo, como uma das razões para não participar efetivamente da disputa, que “não tinha como fazer campanha sem o partido ajudar, né?”. Ademais, ao ser perguntada se “chegou a participar de alguma carreata, algum evento político?”, declarou “que eu me lembre, não”.

8. Os problemas de saúde alegados antecederam o próprio início do período eleitoral, conforme exames datados de 19/8/2020 e 16/9/2020 (Jackeline; hérnia inguinal) e de 5/7/2020 (sua filha; gravidez), o que enseja o seguinte paradoxo: a candidata optou por registrar a candidatura mesmo diante desses supostos impedimentos, para, logo depois, aduzir que desistiu da disputa exatamente por esses fatos. Ademais, na mesma época da hérnia, a candidata posou para fotografias, em locais diversos, apoiando pré-candidato à vereança, a reforçar as contradições da defesa.

9. A desistência da candidata majoritária apoiada pela chapa a que pertencem os recorrentes, ainda que eventualmente tivesse repercutido no ânimo dos candidatos proporcionais, por si só não afasta os vários elementos da fraude quanto a Jackeline.

10. Conclusão em sentido diverso demandaria reexame de fatos e provas, providência inviável em sede extraordinária, nos termos da Súmula 24/TSE.

11. Incabível conhecer do dissídio pretoriano quanto ao que decidido pelo TRE/RJ no Recurso Eleitoral 0600485-55, pois: (a) conforme a Súmula 29/TSE, “a divergência entre julgados do mesmo Tribunal não se presta a configurar dissídio jurisprudencial apto a fundamentar recurso especial eleitoral”; (b) o aresto tido como paradigma transitou em julgado na origem, sem que esta Corte pudesse se pronunciar sobre o caso.

CONCLUSÃO.

12. Recursos especiais a que se nega provimento. Considerando o efeito suspensivo concedido pelo TRE/RJ, determina-se a imediata execução do acórdão.

 

 

Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, em rejeitar a questão preliminar e, no mérito, negar provimento aos recursos especiais, determinando a imediata execução do acórdão, independentemente de publicação e a comunicação com urgência à Corte de origem, nos termos do voto do relator. 

 

Brasília, 3 de outubro de 2023.

 

MINISTRO BENEDITO GONÇALVES –  RELATOR

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO BENEDITO GONÇALVES: Senhor Presidente, trata-se de dois recursos especiais, sendo o primeiro interposto por Elifas Levi dos Reis Ramalho e o segundo por Jackeline da Silva Hermida (candidatos que compuseram a chapa proporcional do Progressistas para o cargo de vereador de Iguaba Grande/RJ nas Eleições 2020), contra acórdão proferido pelo TRE/RJ, no julgamento conjunto das AIJEs 0600484-70 e 0600487-25, assim ementado (ID 159.135.977 da AIJE 0600484-70):

RECURSOS ELEITORAIS. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. REUNIÃO DE PROCESSOS PARA JULGAMENTO CONJUNTO. ELEIÇÕES 2020. FRAUDE À COTA DE GÊNERO. ART. 10, §3º DA LEI Nº 9.504/97. CARACTERIZAÇÃO.

I – Preliminar de decadência do direito de ação ante a não inclusão de todos os candidatos ao cargo de vereador pelo partido e da agremiação partidária no polo passivo das demandas, sob o entendimento de existência de litisconsórcio passivo necessário Rechaçada. Tanto os suplentes quanto a agremiação partidária não são considerados litisconsortes passivos necessários nas ações em que se discute fraude à cota de gênero, de acordo com posicionamento consolidado do Tribunal Superior Eleitoral.

II – Preliminar de coisa julgada material. Alegação de impossibilidade de reconhecimento de fraude à cota de gênero na AIJE uma vez que a decisão que deferiu o DRAP transitou em julgado. Necessidade de que as ações sejam idênticas para que reconheça a coisa julgada material. No caso em análise, os elementos identificadores da demanda, quais sejam, as partes, o pedido e a causa de pedir do DRAP e da AIJE são diversos. Ausente identidade entre as demandas, não há que se falar em coisa julgada material. Precedentes de Regionais.

III – Mérito. Cinge-se a controvérsia em aferir se houve o emprego de fraude, por meio do registro de uma candidatura feminina fictícia, pelo partido Progressistas, nas eleições 2020, com o intuito de assegurar o preenchimento meramente formal do percentual de gênero estatuído pelo art. 10, §3º da Lei nº 9.504/97.

IV – Os elementos probatórios coligidos aos autos demonstram que a candidatura de Jackeline da Silva Hermida foi meramente formal, pelos seguintes motivos: a) votação inexpressiva nas urnas; b) ausência de efetiva participação em atos de campanha próprios e realização de campanha em favor de candidato ao cargo de vereador de outra agremiação política; c) prestações de contas, com registro apenas de utilização de recursos próprios no valor de R$ 529,26 para pagamento de honorários de advogado e contador, os quais não foram reconhecidos pela candidata em seu depoimento pessoal em juízo.

V – Com efeito, restou comprovado que a referida candidata teve apenas 1 (um) voto, que seria da própria, de acordo com declarações prestadas em sede judicial. Ademais, não foram juntadas fotografias, “prints” de postagens em redes sociais ou conversas em aplicativos nem notas fiscais de materiais de campanha. Também não foram indicadas testemunhas ou produzidas quaisquer outras provas a indicar que a candidatura tenha sido real e efetiva. A própria candidata declarou em juízo que não praticou atos de campanha para si. Entretanto, há fotografias nos autos que comprovam a participação em atos de campanha de candidato a vereador de outro partido no mesmo pleito, conhecido como “Jeffinho”.

VI – A alegação de desistência tácita em razão da gravidez de risco de sua filha e de problemas de saúde pessoais não se coaduna com os elementos constantes nos autos. O laudo da gravidez da sua filha com a classificação de risco foi elaborado em data bem anterior ao período de escolha dos candidatos, tendo sido demonstrada a ciência dessa condição por Jackeline anteriormente ao registro de candidatura. Os problemas de saúde pessoais, por outro lado, não impediram que, no mesmo período, a mesma realizasse atos de campanha para outro candidato, como demonstram fotografias constantes nos autos.

VII – A prestação de contas da candidata, por sua vez, não tem registro da confecção de materiais de propaganda eleitoral e aponta como único registro a utilização de recursos próprios para pagamento de serviços advocatícios e contábeis, não reconhecida em juízo pela candidata.

VIII – Embora tenha sido reconhecida a fraude à cota de gênero na sentença proferida na AIJE N.º 0600484-70, o Juízo a quo entendeu que não houve prova de que os outros candidatos registrados pelo partido, à exceção da então Presidente do órgão partidário municipal e da própria Jackeline, tinham conhecimento da fraude perpetrada e tenham atuado de forma específica para a sua consecução. Com base nessa constatação, julgou improcedentes os pedidos de cassação de diploma do candidato eleito, de nulidade dos votos obtidos pela grei na eleição proporcional e de recálculo dos quocientes eleitoral e partidário. Posicionamento consolidado do TSE de que “Caracterizada a fraude e, por conseguinte, comprometida a disputa, a consequência jurídica em sede de Ação de Investigação Judicial Eleitoral é: i) a cassação dos candidatos vinculados ao Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (Drap), independentemente de prova da participação, ciência ou anuência deles; ii) a inelegibilidade daqueles que efetivamente praticaram ou anuíram com a conduta; e iii) a nulidade dos votos obtidos pela Coligação, com a recontagem do cálculo dos quocientes eleitoral e partidários, nos termos do art. 222 do Código Eleitoral.” (REspe nº 060023973, 25/08/2022). Necessidade de reforma das sentenças proferidas em primeiro grau para aplicação das aludidas consequências jurídicas.

IX – Afastamento da incidência da inelegibilidade em relação à presidente do partido Progressistas à época, devido ao seu caráter personalíssimo. Dos elementos trazidos aos autos, não há comprovação da ciência ou anuência da dirigente partidária em relação à fraude, nem que tenha efetivamente contribuído para a sua consecução.

X – AIJE 0600484-70. Parcial provimento do recurso interposto pelo Ministério Público Eleitoral, parcial provimento do recurso interposto por Ana Grasiella Moreira Figueiredo Magalhães e desprovimento do recurso interposto por Jackeline da Silva Hermida para reformar a sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na referida AIJE e determinar a cassação do diploma de Elifas Levi dos Reis Ramalho, a cassação de todos os candidatos vinculados ao DRAP do partido Progressistas do Município de Iguaba Grande no pleito proporcional de 2020, a nulidade de todos os votos obtidos pela agremiação nesse pleito, a retotalização dos votos das eleições proporcionais e o recálculo dos quocientes eleitoral e partidário, mantendo-se a declaração de inelegibilidade de Jackeline da Silva Hermida para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos subsequentes ao pleito de 2020 e afastando-se a inelegibilidade em relação à Ana Grasiella Moreira Figueiredo Magalhães.

XI – AIJE 0600487-25. Provimento do recurso interposto pelo partido Republicanos para reformar a sentença de 1º grau que julgou improcedentes os pedidos formulados na referida AIJE, determinando a cassação do diploma de Elifas Levi dos Reis Ramalho, a retotalização dos votos das eleições proporcionais de 2020 no Município de Iguaba Grande e o recálculo dos coeficientes eleitoral e partidário.

XII – Determinação do recálculo dos quocientes eleitoral e partidário, a partir dos votos remanescentes, excluindo-se do universo dos votos originariamente válidos os ora anulados, nos termos do art. 109 do Código Eleitoral.

Na origem, o Ministério Público Eleitoral (AIJE 0600484-70) e o Diretório Municipal do Republicanos (AIJE 0600487-25) ajuizaram Ação de Investigação Judicial Eleitoral em desfavor dos ora recorrentes, dos demais candidatos que compuseram a respectiva chapa proporcional e, ainda, na primeira ação, de Ana Grasiella Moreira Figueiredo Guimarães (presidente do órgão partidário local à época dos fatos e candidata ao cargo de prefeito, embora tenha desistido no curso da disputa).

Alegou-se, em resumo, fraude no preenchimento da cota mínima de gênero a que alude o art. 10, § 3º, da Lei 9.504/97, sendo fictícia a candidatura de Jackeline da Silva Hermida.

Em primeiro grau, os pedidos foram julgados procedentes em parte na AIJE 0600484-70 apenas para declarar a inelegibilidade da recorrente Jackeline da Silva Hermida e de Ana Grasiella Moreira Figueiredo Guimarães, ao passo que, na AIJE 0600487-25, julgaram-se improcedentes os pedidos.

O TRE/RJ, de forma unânime, reformou a sentença para, de um lado, decretar a nulidade dos votos recebidos pela chapa proporcional, além de cassar o respectivo Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP) e os diplomas dos candidatos a eles vinculados, com recálculo dos quocientes eleitoral e partidário, e, de outra parte, afastar a inelegibilidade imposta a Ana Grasiella Moreira Figueiredo Guimarães.

Interpostos embargos de declaração, foram eles rejeitados (ID 159.136.007).

No recurso especial de Elifas Levi dos Reis Ramalho, aduziu-se o seguinte (ID 159.136.018):

a) afronta aos arts. 489, § 1º, II a IV, e 1.022, parágrafo único, II, do CPC/2015, e ao art. 275 do Código Eleitoral, com esteio nas seguintes alegações: (a.1) contradição, pois Ana Grasiella Moreira Figueiredo Guimarães, presidente do diretório municipal e então candidata ao cargo de prefeito, “praticamente abandonou a campanha durante o decorrer do pleito” (fl. 8), de modo que “quase metade dos candidatos com a menor votação do município eram apoiadores da chapa majoritária capitaneada pela candidata Grasiella” (fl. 8), o que revela não ter havido fraude; (a.2) contradição, visto que os três prints extraídos de rede social, os quais demonstrariam que Jackeline da Silva Hermida estaria fazendo campanha em favor de adversário ao mesmo cargo, são anteriores ao próprio início da campanha;

b) dissídio pretoriano no que se refere a caso decidido pelo TRE/RJ, relativo aos mesmos município e pleito, com moldura fática similar, no Recurso Eleitoral 0600485-55.2020.6.19.0181, em que houve reforma da sentença para julgar improcedentes os pedidos;

c) divergência jurisprudencial, em relação a acórdãos do Tribunal Superior Eleitoral, “no sentido de que votação zerada, ausência de movimentação financeira e de material de campanha não são suficientes para caracterizar a fraude. É preciso prova inconteste da fraude e do abuso para embasar a grave sanção de cassação de todos os registros de candidatura sob pena de violação ao princípio da soberania popular” (fl. 18);

d) ainda quanto ao dissídio, “o acórdão regional não indica quais seriam essas provas robustas que demonstram a fraude, mas apenas afirma que a candidata não trouxe ‘nenhuma prova da efetiva realização de atos de campanha’ mesmo após depoimento pessoal da candidata confirmando que desistiu da campanha para cuidar da saúde de sua filha, tal circunstância é reconhecida no próprio acórdão regional” (fl. 18);

e) há de se conferir efeito suspensivo ao recurso especial, porquanto presentes a verossimilhança do direito e o perigo da demora.

Por sua vez, no recurso especial de Jackeline da Silva Hermida, alegou-se o seguinte (ID 159.136.023):

a) ofensa ao art. 10, § 3º, da Lei 9.504/97, porquanto sua legenda não só atendeu ao percentual originário de 30% e 70% previsto no dispositivo em apreço, como também, “após a renúncia de uma candidata mulher (Maria Cleide de Lima – nome de urna ‘Cleide Fashion’), [...] registrou para o seu lugar outra candidata mulher (Katia Martins Faria – nome de urna ‘Katia Martins’)” (fl. 14);

b) “há nos autos provas de que a recorrente demonstrou interesse em ser candidata, tanto que participou da convenção do partido e teve seu nome homologado pelos convencionais, tendo sido confeccionado posteriormente para ela propaganda eleitoral via rádio e internet. Ao final, contabilizou receitas e despesas relativas à campanha, que foram utilizadas para cobrir despesas necessárias com advogado e contador” (fl. 14);

c) “a recorrente desistiu tacitamente de sua candidatura em virtude de problemas de saúde dela e da filha, circunstância que afasta o animus fraudandi” (fl. 15);

d) dissídio jurisprudencial no que tange à “imprescindibilidade de prova robusta da fraude à cota de gênero” (fl. 16), com destaque para o fato de que “um print, cujo conteúdo foi retirado supostamente das redes sociais de terceiros, registrando um momento anterior ao das eleições, sem qualquer pedido de voto ou menção a apoio de quem quer que seja” (fl. 19), não permite reconhecer o ilícito;

e) dissídio também porque “é admissível a desistência tácita de participar do pleito por motivos íntimos e pessoais, não controláveis pelo Poder Judiciário, sendo descabido e exagerado deduzir o ardil sem que se comprove má-fé ou prévio ajuste de vontades no propósito de burlar a ação afirmativa” (fl. 21);

f) o TRE/RJ, no Recurso Eleitoral 0600485-55.2020.6.19.0181, em caso bastante similar, assentou não ter havido fraude;

g) impõe-se conceder efeito suspensivo ao recurso especial, estando presentes a verossimilhança do direito e o perigo da demora.

O TRE/RJ, ao admitir os recursos especiais, atribuiu-lhes efeito suspensivo (ID 159.136.027).

Contrarrazões apresentadas (ID 159.136.031).

A d. Procuradoria-Geral Eleitoral opinou pela negativa de provimento dos recursos (ID 159.461.913).

É o relatório.

VOTO

O SENHOR MINISTRO BENEDITO GONÇALVES (relator): Senhor Presidente, a controvérsia cinge-se à prática de fraude à cota de gênero no registro da candidatura de Jackeline da Silva Hermida ao cargo de vereador de Iguaba Grande/RJ, pelo Progressistas, nas Eleições 2020.

Examino, ponto a ponto, a irresignação dos recorrentes nos dois recursos especiais.

1. Preliminar: Contradições no Acórdão Regional (Arts. 489, § 1º, II a IV, e 1.022, Parágrafo Único, II, do CPC/2015 e Art. 275 do Código Eleitoral)

O recorrente Elifas Levi dos Reis Ramalho, cujo diploma foi cassado em virtude do reconhecimento da fraude quanto à candidatura de Jackeline da Silva Hermida, aduz afronta aos arts. 489, § 1º, II a IV, e 1.022, parágrafo único, II, do CPC/2015, e ao art. 275 do Código Eleitoral, com esteio em duas alegações.

Quanto ao primeiro argumento, de que inúmeros candidatos ao cargo de vereador (incluída Jackeline) obtiveram baixa votação diante da desistência da candidatura majoritária de Ana Grasiella Moreira Figueiredo Guimarães, por eles apoiada, a irresignação não merece prosperar.

O TRE/RJ, ao julgar os embargos declaratórios, registrou com clareza que a reduzida votação representou apenas um dos elementos fáticos-probatórios configuradores da fraude em relação a Jackeline. Confira-se (ID 159.136.010):

4. Da alegada omissão quanto à existência de candidatos que também receberam votação inexpressiva

Aduz a segunda embargante que um dos argumentos que embasaram a tese de fraude à cota de gênero foi a votação pífia (um voto) da candidata, ao cargo de vereador Jackeline da Silva Hermida.

Alega, no entanto, que outros candidatos no município também receberam uma votação ínfima ou zerada e, por esse motivo, o acórdão seria omisso.

Argumenta que ‘o Acórdão ignora que a embargante não foi a única a obter baixa votação nas últimas eleições municipais de Iguaba Grande. Conforme demonstrado nos autos, em consulta realizada junto ao site G1 (ID num. 94114762 - Pág. 4/5), restou demonstrado que 20 (vinte) candidatos, dentre eles 5 homens, receberam menos de 10 votos nas urnas, sendo que 2 deles, sendo um do sexo feminino e outro do sexo masculino, não obtiveram nenhum voto’.

Mais uma vez não assiste razão à recorrente.

A uma, porque tal questão foi tratada no voto condutor em apurada análise do caso concreto, sendo a votação pífia apenas um dentre os vários indícios de fraude à cota de gênero.

Vejamos:

[...]

(sem destaques no original)

Melhor razão não assiste ao recorrente quanto ao segundo argumento, de que os prints extraídos de rede social são anteriores ao próprio início da campanha e, portanto, não poderiam ter sido utilizados pelo TRE/RJ para assentar que Jackeline apoiou adversário ao mesmo cargo.

No ponto, constata-se que a irresignação, em verdade, confunde-se com o próprio mérito da controvérsia e, por isso, será examinada oportunamente.

Desse modo, rejeito a preliminar.

2. Tema de Fundo

Consoante o § 3º do art. 10 da Lei 9.504/97, “do número de vagas resultante das regras previstas neste artigo, cada partido ou coligação preencherá o mínimo de 30% (trinta por cento) e o máximo de 70% (setenta por cento) para candidaturas de cada sexo”.

A regra em apreço, em conjunto com inúmeras e igualmente relevantes disposições constitucionais e legais, tem como objetivo precípuo fomentar, garantir e proteger a efetiva participação feminina nas eleições como mecanismo de concretização da isonomia de gênero (art. 5º, I, da CF/88), da cidadania (art. 1º, II), da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e do pluralismo político (art. 1º, V).

Trata-se, ainda, de medida essencial que visa amainar notório paradoxo: de um lado, as mulheres constituem a maioria da população brasileira (51,1%), porém, ainda assim, são subrepresentadas no jogo político-democrático – nas Eleições 2022, apenas 33% das candidaturas são femininas, ao passo que, segundo a Inter-Parliamentary Union, o Brasil ocupa a 142ª (centésima quadragésima segunda) posição no ranking de representatividade no parlamento.

Diante desse cenário, o Tribunal Superior Eleitoral firmou histórica jurisprudência, no leading case no REspEl 193-92/PI, Rel. Min. Jorge Mussi, DJE de 4/10/2019, no sentido de que “a fraude da cota de gênero em eleições proporcionais implica a cassação de todos os candidatos registrados pela legenda ou pela coligação”.

Ainda de acordo com o entendimento desta Corte, para se caracterizar fraude, deve-se aferir caso a caso, a partir das circunstâncias fáticas de cada hipótese, sobretudo levando-se em conta aspectos como falta de votos ou votação ínfima, inexistência de atos efetivos de campanha, prestações de contas zeradas ou notoriamente padronizadas entre as candidatas, entre outras.

A reforçar esse entendimento, trago à colação julgado deste Tribunal, nos seguintes termos:

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. FRAUDE À COTA DE GÊNERO. ART. 10, § 3º, DA LEI 9.504/97. CONFIGURADO. PROVIMENTO.

1. A fraude à cota de gênero de candidaturas femininas representa afronta aos princípios da igualdade, da cidadania e do pluralismo político, na medida em que a ratio do art. 10, § 3º, da Lei 9.504/1997 é ampliar a participação das mulheres no processo político-eleitoral.

[...]

3. Existência de elementos suficientemente seguros para a condenação dos Investigados, diante da comprovação do ilícito eleitoral: (i) as 4 (quatro) candidatas não obtiveram nenhum voto; (ii) as contas apresentadas são absolutamente idênticas, em que registrada uma única doação estimável realizada pela mesma pessoa, no valor de R$ 582,00 (quinhentos e oitenta e dois reais); (iii) não houve atos efetivos de campanha; (iv) não tiveram nenhuma despesa; (v) não apresentaram extratos bancários ou notas fiscais; e (vi) o Partido das Investigadas não investiu recursos em suas campanhas.

[...]

(AgR-AREspE 0600651-94/BA, redator para acórdão Min. Alexandre de Moraes, DJE de 30/6/2022) (sem destaque no original)

No mesmo sentido, julgado de minha relatoria, em que reproduzi precedente da lavra do d. Ministro Sérgio Banhos na linha de que:

[...] as circunstâncias indiciárias relativas à elaboração das prestações de contas, associadas aos elementos de prova particulares de cada candidata – relações de parentesco entre candidatos ao mesmo cargo, votação zerada ou ínfima, não comparecimento às urnas, ausência de atos de propaganda, entre outros –, seriam suficientes para demonstrar, de forma robusta, a existência da fraude no cumprimento dos percentuais de gênero previstos no art. 10, § 3º, da Lei 9.504/97 (REspe 409-89/SP, Rel. Min. Sérgio Banhos, DJE de 13/3/2020).

[...]

(ED-REspEl 0600743-91/SC, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJE de 2/8/2022) (sem destaque no original)

A partir dessas considerações, há elementos nos autos que evidenciam prova robusta da fraude quanto à candidatura de Jackeline da Silva Hermida.

Com efeito, revelam-se elementos que, em seu somatório, permitem concluir que a referida candidatura foi registrada unicamente visando burlar a regra do art. 10, § 3º, da Lei 9.504/97. São eles:

a) votação ínfima, tendo obtido um único voto;

b) prestação de contas com movimentação módica (R$ 529,26) e com recursos utilizados unicamente para pagar serviços contábeis e advocatícios, além de encargos bancários;

c) ausência de quaisquer elementos que denotem a efetiva prática de atos de campanha, a exemplo de militância em redes sociais, participação no horário eleitoral gratuito, mobilização de rua, dentre outros.

O exame aprofundado desses fatos revela a existência de inúmeras contradições nas teses defensivas.

No que se refere ao primeiro item, chama a atenção a circunstância registrada no acórdão regional no sentido de que “causa estranheza o fato de familiares, amigos e conhecidos não terem nela votado, sobretudo por ter sido demonstrado nos autos que a recorrente, chamada de ‘Tia Jack’, é pessoa conhecida no município de Iguaba Grande” (ID 159.135.979).

Esse aspecto, por sua vez, está intrinsecamente relacionado a outros dois acima destacados.

Com efeito, tal como se destacou, não há um único registro, nas contas de campanha da candidata, de despesas com atos de propaganda.

No ponto, aliás, extrai-se do depoimento em juízo da suposta candidata que, ao fim e ao cabo, ela foi abandonada à própria sorte por sua agremiação ao não receber recursos para a prática de atos de propaganda. Transcreve-se do acórdão regional (ID 159.135.979):

Promotor de Justiça: A senhora desistiu? Tá dando a entender que desistiu da campanha, foi isso?

Jackeline: Por motivos, é... Financeiros do partido. Que não tinha como fazer campanha sem o partido ajudar, né? É complicado!

Promotor de Justiça: Sem dinheiro, né?

Jackeline: Isso! Não tem como!

(sem destaques no original)

Ademais, também em juízo, ao ser perguntada se “chegou a participar de alguma carreata, algum evento político?”, a suposta candidata declarou “que eu me lembre, não”.

Por outro vértice, como muito bem exposto pelo TRE/RJ, não socorre a pretensa candidata Jackeline a alegação de que problemas de saúde pessoais e de sua filha teriam impedido o prosseguimento de sua candidatura.

Isso porque as alegadas intercorrências eram anteriores ao próprio início da campanha, conforme exames datados de 19/8/2020 e 16/9/2020 (Jackeline; hérnia inguinal) e de 5/7/2020 (sua filha; gravidez), o que enseja o seguinte paradoxo: a candidata optou por registrar a candidatura mesmo diante dos supostos problemas de saúde, para, logo em seguida, alegar que desistiu da disputa exatamente em virtude de tais fatos.

Confira-se o substancioso acórdão regional (ID 159.135.979):

JACKELINE, por sua vez, em petição ID 31381138, fl. 96 do RE 0600484-70, alegou que os laudos e exames anexos à referida petição seriam aptos a demonstrar que a candidata teve que abdicar de sua campanha devido à gravidez de sua filha ter sido considerada de risco, bem como devido a uma hérnia umbilical.

[...]

Com relação aos laudos e exames médicos apresentados (ID 31381143, fl. 101 e subsequentes, do RE 0600484-70), vale assinalar que alguns deles são datados de 19/08/2020, 16/09/2020 e 19/10/2020.

[...]

Ademais, a alegação de desistência devido à gravidez de risco de sua filha também não parece verossímil, pois o laudo confirmando o risco da gravidez apresentado por JACKELINE em ID 31381141, fl. 99 (do RE 0600484-70) é datado de 05/07/2020 [...]

(sem destaques no original)

Não bastasse isso, verifica-se que, no mesmo período em que alegou estar com hérnia inguinal, a candidata posou para fotografias, em locais diversos, apoiando pré-candidato ao mesmo cargo, circunstância que reforça as inúmeras contradições da defesa. Extrai-se mais uma vez do aresto a quo (ID 159.135.979):

No ponto, esta Corte Superior já assentou que a alegação de desistência tácita deve ser corroborada com prova documental produzida em consonância com as circunstâncias fáticas dos autos a fim de justificar a tese de abandono e, por conseguinte, afastar a fraude. Confira-se:

ELEIÇÕES 2020. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. FRAUDE À COTA DE GÊNERO. ART. 10, § 3º, DA LEI 9.504/97. CANDIDATURA FICTÍCIA. CARACTERIZAÇÃO. PROVIMENTO.

[...]

3. A desistência tácita da candidatura não deve ser apenas alegada, mas demonstrada nos autos por meio de consistentes argumentos, acompanhados de documentos que corroborem a assertiva, e em harmonia com as circunstâncias fáticas dos autos, sob pena de tornar inócua a norma que trata do percentual mínimo de gênero para candidaturas.

4. No caso, as justificativas apresentadas pela recorrida são insuficientes para justificar a tese de abandono tácito da candidatura, não se prestando, por conseguinte, a afastar a suposta ocorrência de fraude.

[...]

7. A partir do leading case do caso de Jacobina/BA (AgR-AREspE 0600651-94, red. para o acórdão Min. Alexandre de Moraes, DJE de 30.6.2022), a jurisprudência deste Tribunal tem reiteradamente assentado que “a obtenção de votação zerada ou pífia das candidatas, a prestação de contas com idêntica movimentação financeira e a ausência de atos efetivos de campanha são suficientes para evidenciar o propósito de burlar o cumprimento da norma que estabelece a cota de gênero, quando ausentes elementos que indiquem se tratar de desistência tácita da competição” (REspEl 0600001-24, rel. Min. Carlos Horbach, julgado em 18.8.2022). Na mesma linha: REspEl 0600239-73, rel. Min. Alexandre de Moraes, DJE de 25.8.2022 e AgR-REspEl 0600446–51, rel. Min. Benedito Gonçalves, DJE de 15.8.2022.

[...]

(REspEl 0600986-77/RN, Rel. Min. Sérgio Banhos, DJE de 19/5/2023) (sem destaques no original)

Avançando, ressalte-se que a desistência da candidata majoritária Ana Grasiella, ainda que eventualmente possa ter influenciado nos ânimos dos candidatos ao cargo de vereador que a apoiavam, é incapaz por si só de elidir os inúmeros elementos configuradores da fraude em relação a Jackeline.

Frise-se, inclusive, que os autores das AIJEs alegaram a fraude apenas em relação a Jackeline, e não contra os demais candidatos, a denotar que a circunstância dessa desistência foi aquilatada no momento da propositura das ações.

Conclusão em sentido diverso demandaria reexame de fatos e provas, providência inviável em sede extraordinária, nos termos da Súmula 24/TSE. 

Por fim, incabível conhecer do dissídio jurisprudencial em relação ao que decidido pelo TRE/RJ no Recurso Eleitoral 0600485-55.2020.6.19.0181, que, no entender dos recorrentes, possuiria moldura fática similar à dos autos.

Em primeiro lugar, porque, nos termos da Súmula 29/TSE, “a divergência entre julgados do mesmo Tribunal não se presta a configurar dissídio jurisprudencial apto a fundamentar recurso especial eleitoral”.

De toda forma, verifica-se que o acórdão tido como paradigma transitou em julgado no âmbito do próprio TRE/RJ, sem que esta Corte Superior tenha se pronunciado naquele caso.

Assim, o caso não comporta outro desfecho que não o reconhecimento da fraude à cota de gênero, pois, como bem ressaltado pelo d. Ministro Jorge Mussi no REspEl 193-92/PI, “o registro das candidaturas fraudulentas possibilitou maior número de homens na disputa, cuja soma de votos, por sua vez, contabilizou-se para as respectivas alianças, culminando em quociente partidário favorável a elas [as legendas], que puderam então registrar e eleger mais candidatos”.

Caracterizada a fraude, tem-se como consequência a cassação de toda a chapa beneficiada, sob pena de perpetuar a burla à previsão de mínima isonomia de gênero prevista no art. 10, § 3º, da Lei 9.504/97, e a inelegibilidade daqueles que efetivamente praticaram ou anuíram com a conduta, nos termos do remansoso entendimento desta Corte Superior:

ELEIÇÕES 2016. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO (AIME). AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE). FRAUDE NA COTA DE GÊNERO. PROVAS ROBUSTAS. COMPROVAÇÃO. PROVIMENTO.

[...]

3. Caracterizada a fraude e, por conseguinte, comprometida a disputa, a consequência jurídica é: (i) a cassação dos candidatos vinculados ao DRAP, independentemente de prova da sua participação, ciência ou anuência; (ii) a inelegibilidade àqueles que efetivamente praticaram ou anuíram com a conduta; e (iii) a nulidade dos votos obtidos pela Coligação, com a recontagem do cálculo dos quocientes eleitoral e partidários, nos termos do art. 222 do Código Eleitoral.

[...]

(REspEl 764-55/PR, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJE de 18/5/2021) (sem destaque no original)

O acórdão recorrido, portanto, não merece reparo.

3. Conclusão

Ante o exposto, nego provimento aos recursos especiais.

Considerando que o TRE/RJ havia concedido efeito suspensivo aos recursos especiais, determino a imediata execução do acórdão, independentemente de publicação, comunicando-se com urgência à Corte de origem.

É como voto.

O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES (presidente): Agradeço ao eminente Ministro Relator.  

Há alguma divergência? 

ESCLARECIMENTO 

O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES (presidente): Senhores Ministros, então, aqui é importante ressaltar rapidamente, novamente, esse é mais um caso de fraude à cota de gênero, as eleições do ano que vem chegando. Essa cota de gênero – principalmente aos alunos que estão aqui nos assistindo –, a legislação determina que 30% da chapa, da lista aberta de cada partido, seja composto por mulheres, para que haja uma maior participação feminina nas eleições e na vida política do país, já da cota de gênero, 30%. 

Vários partidos, lamentavelmente, fazem o que nós denominamos de “candidaturas laranja”, ou seja, chamam determinadas mulheres para serem candidatas, sem que elas façam campanha, sem que elas tenham qualquer suporte para campanha. Simplesmente para que possa, chamando uma mulher, colocar mais dois homens na chapa. 

Constatado isso, com alguns requisitos objetivos, detalhados pelo eminente Ministro Relator, é constatada a fraude na cota de gênero e essa fraude anula o voto de toda a chapa: não só daquela candidata, de toda a chapa. Determina-se um recálculo para que se verifique quais os outros participantes que serão eleitos e aquela que participou da fraude à cota de gênero fica inelegível. 

Nesse caso, como bem ressaltou o eminente Ministro Relator, a votação foi ínfima de uma das candidatas – um voto –, não fez campanha e o que mais realmente chama a atenção, como disse o eminente Ministro Relator, é que os “problemas de saúde” – porque um nem seria problema de saúde, porque era a gravidez da filha, não é um problema de saúde – eram anteriores ao próprio registro da candidatura. Então, quando se registrou, sabia já da questão de ela ter uma hérnia inguinal e a sua filha estar grávida. 

E também, bem destacou o eminente Ministro Relator, que nessa época da suposta hérnia inguinal, a candidata posou para fotografias e fez carreata com outro pré-candidato, caracterizando bem a fraude à cota de gênero.  

PROCLAMAÇÃO DO RESULTADO 

O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES (presidente): O Tribunal, então, por unanimidade, rejeitou a questão preliminar e, no mérito, negou provimento aos recursos especiais, mantendo a decisão e determinando a imediata execução do acórdão, independentemente de publicação e a comunicação com urgência à Corte de origem, nos termos do voto do relator, que também afastou o efeito suspensivo que havia sido dado pelo tribunal de origem.  

EXTRATO DA ATA

REspEl nº 0600484-70.2020.6.19.0181/RJ. Relator: Ministro Benedito Gonçalves. Recorrente: Elifas Levi dos Reis Ramalho (Advogado: Pedro Corrêa Canellas – OAB: 168484/RJ). Recorrente: Jackeline da Silva Hermida (Advogados: Rafael Ferreira da Fonseca – OAB: 167479/RJ e outro). Recorrido: Ministério Público Eleitoral.

Julgamento conjunto: REspEl nos 0600484-70 e 0600487-25.

Usou da palavra, pelo recorrente Elifas Levi dos Reis Ramalho, o Dr. Pedro Canellas.

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, rejeitou a questão preliminar e, no mérito, negou provimento aos recursos especiais, determinando a imediata execução do acórdão, independentemente de publicação e a comunicação com urgência à Corte de origem, nos termos do voto do relator.

Composição: Ministros Alexandre de Moraes (presidente), Cármen Lúcia, Nunes Marques, Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares.

Vice-Procurador-Geral Eleitoral: Paulo Gustavo Gonet Branco. 

 

SESSÃO DE 3.10.2023.