index: REPRESENTAÇÃO (11541)-0600722-10.2022.6.00.0000-[Propaganda Política - Propaganda Eleitoral - Extemporânea/Antecipada]-CEARÁ-LIMOEIRO DO NORTE

Brasão da República
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

 

REPRESENTAÇÃO (11541)  Nº 0600722-10.2022.6.00.0000 (PJe) - LIMOEIRO DO NORTE - CEARÁ

RELATORA: MINISTRA CÁRMEN LÚCIA
REPRESENTANTE: PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA (PDT) - NACIONAL

Advogados do(a) REPRESENTANTE: MARA DE FATIMA HOFANS - RJ68152-A, MARCOS RIBEIRO DE RIBEIRO - RJ6281800A, IAN RODRIGUES DIAS - DF10074, FELIPE ANTONIO DE ARAUJO PEREIRA - PE40797, ANA CAROLINE ALVES LEITAO - PE49456-A, ALISSON EMMANUEL DE OLIVEIRA LUCENA - PE37719-A, WALBER DE MOURA AGRA - PE757-A
REPRESENTADO: PERFIL NA REDE SOCIAL INSTAGRAM: "@LIBERTA_LIMOEIRO"
 

DECISÃO
1. Representação, com pedido de tutela provisória de urgência, ajuizada pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT) – Nacional em desfavor do responsável pelo perfil constante da rede social Instagram conhecido como “@liberta_limoeiro”.

2. Na petição inicial, o representante alega ter “disseminado vídeo estruturado a partir de montagem de trechos de propaganda do pré-candidato à Presidência da República pelo Partido Democrático Trabalhista, o Senhor Ciro Gomes, com a nítida intenção de degradar e ridicularizar sua imagem” (ID 157895277, p.2).

Sustenta que “[...] a propaganda negativa propalada pelo representado promove desinformação a todos os usuários que tiverem acesso ao conteúdo, ora objurgado” (ID 157895277, p.3).

Afirma que “o Representado tenta macular a imagem do filiado ao partido, ora representante, ao colocá-lo” nas “seguintes situações descontextualizadas: 1. o vídeo inicia-se com o recorte de fala do Senhor Ciro Gomes “muito pior mesmo do que reagir com indignação sincera, é não respeitar os mandamentos. Em especial quatro deles: Não roubarás...” 2. neste ponto (00:00:10) o vídeo é cortado e passa mostrar uma imagem de notícia jornalística nos seguintes dizeres: “Ciro Gomes é alvo de buscas da PF em operação sobre irregularidades do Castelão”. 3. Em seguida, o vídeo retorna com a fala cortada do candidato (00:00:13) “Não matarás...” 4. Mais uma vez o vídeo é cortado, passando a exibir imagens e som com os seguintes dizeres: “esse Moro mandou prender um blogueiro. Ele que mande me prender. Eu recebo a turma dele na bala”. 5. Aos 23 segundos de vídeo, mais uma vez o vídeo é manipulado, de forma que se volta a exibir o vídeo fonte, mais uma vez recortando a fala do candidato a tirar de contexto: “cada vez mais na vida eu tento escutar tudo com humildade”. 6. Mais uma vez interrompido, é inserido recorte de um vídeo de 2014, onde o há um diálogo confuso entre uma mulher e o senhor Ciro Gomes. 7. Já aos 00:00:40 do vídeo guerreado, utilizando-se de montagem, o representado recorta a fala do candidato: “alguns chegaram a dizer que o meu temperamento é incompatível com a fé cristã”. 8. Mais uma vez, o vídeo é manipulado, passando a exibir imagens totalmente fora de contexto, em que o Senhor Ciro Gomes se exalta com a perturbação de sossego que sofrera por manifestantes em frente à sua residência” (ID 157895277, p.4).

Assinala ser “nítido o propósito de propalar os fatos inverídicos, diante da convicção do potencial danoso que o conteúdo virtual gera no eleitorado nacional, deturpando sua intimidade e, principalmente, sua ideologia e respeito a todos os credos e crenças no país” (ID 157895277, p.4).

Assevera que “o representado não respeitou a legislação eleitoral, vez que utilizou-se de propaganda eleitoral extemporânea antecipada negativa na internet, com artifício de montagem, trucagem e grave descontextualização para disseminar conteúdo difamatório; meio e forma proscritos durante o período eleitoral, e, consequentemente, proibida durante o período não eleitoral, na forma dos artigos 29, § 3º e artigo 74 da Resolução TSE nº 23.610/2019, incluído pela Resolução TSE nº 23.671/2021 e o art. 243, IX do Código Eleitoral” (ID 157895277, p.4).

3. Defende estarem presentes os elementos autorizadores da concessão do pedido liminar.

Para comprovação do fumus boni iuris, aponta “a violação à Lei nº 9.504/1997, à Resolução TSE nº 23.610/2019 e à jurisprudência deste Egrégio Tribunal Superior Eleitoral” (ID 157895277, p.12).

Em relação à comprovação do periculum in mora, assinala o “potencial da conduta perpetrada pelo Representado continuar a estorvar e macular a honra e a imagem do pré-candidato do partido Representante, máxime em razão do meio de veiculação do ilícito, a saber, rede social que conta com amplo número de seguidores e engajamento impossível de se mensurar” (ID 157895277, p.12).

4. Requer "medida liminar inaudita alter pars, com a expedição de ofício para que o provedor de aplicação (Instagram) exclua a postagem albergada no seguinte Link de acesso: < https://www.instagram.com/reel/CgaR6c2J6u7/?utm_source=ig_web_copy_ > tudo nos termos do art. 17, §1º-B da Resolução TSE nº 23.608/2019 e do art. 38 §1º, da Resolução TSE nº 23.610/2019, sob pena de imputação de multa a ser arbitrada por Vossa Excelência, dobrando-se a cada reincidência” (ID 157895277, p.13).

Requer, ainda, “a expedição de determinação para que a empresa controladora e provedora do Instagram entregue em juízo todos os dados que possibilitem a identificação do administrador do perfil @liberta_limoeiro, como registros de conexão e de acesso (IP’s), nos termos dos arts. 39 e 40 da Resolução TSE nº 23.610/2019, sob pena de multa por eventual descumprimento” (ID 157895277, p.13).

5. Pede “seja confirmada a medida liminar, caso deferida, com a remoção definitiva do conteúdo ora atacado, que se encontra albergada no seguinte Link de acesso: < https://www.instagram.com/reel/CgaR6c2J6u7/?utm_source=ig_web_copy_ > bem como que, em definitivo, o Representado se abstenha de veicular o conteúdo propagandístico eleitoral ilícito, contendo trucagem e montagem e fatos sabidamente inverídicos e acintosos à honra e à imagem do Senhor Ciro Gomes. Nessa linha meritória, também se requer a condenação do Representado ao pagamento da multa prevista no art. 36, §3º da Lei nº 9.504/1997, em patamar máximo, devido à veiculação de propaganda antecipada negativa” (ID 157895277, p.15).

Examinados os elementos constantes dos autos, decido.

6. Para efeito de liminar, há de se comprovarem os requisitos para o deferimento da medida requerida, tal como previsto no caput do art. 300 do Código de Processo Civil, segundo o qual “a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo”.

O direito brasileiro não autoriza tutela de urgência de natureza antecipada “quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão”, tal como se dispõe no art. 300, § 3º do Código de Processo Civil.

7. A solução da presente controvérsia jurídica, ainda que em sede liminar, exige uma breve consideração sobre o direito à livre manifestação do pensamento garantido na Constituição da República.

8. Quando do voto que proferi na Ação Direita de Inconstitucionalidade 6281, no Supremo Tribunal Federal, realcei que “a Constituição da República garante a liberdade de expressão, de informar e de ser informado, além da liberdade de imprensa, direitos fundamentais inerentes à dignidade humana e que, à sua vez, constituem fundamento do regime democrático de direito (inc. IV, IX e XIV do art. 5º e art. 220 da Constituição da República). A liberdade de expressão no direito eleitoral, instrumentaliza o regime democrático, pois é no debate político que a cidadania é exercida com o vigor de sua essência, pelo que o cidadão tem direito de receber qualquer informação que possa vir a influenciar suas decisões políticas” (pág. 293 do acórdão).

Naquele voto, também ressaltei a ocorrência de divulgação de informações falsas pelos novos meios de propaganda eleitoral, os quais, por vezes, se alimentam da instabilidade das mentiras digitais, apelidadas de fake news:

"Assim, com a revolução tecnológica da internet e das mídias sociais, a propaganda eleitoral se dá por novos meios e por divulgação instantânea para milhares de pessoas, muitas vezes veiculando informações falsas  (...).

(...)

As notícias são transmitidas, atualmente, principalmente por meio das redes sociais e aplicativos de mensagens e cada vez menos pela imprensa tradicional, o que contribui para o aumento da desinformação e das notícias falsas, as quais circulam livre e gratuitamente nas redes sociais e nos aplicativos de mensagens.

A esse respeito, Francisco Balaguer Callejón lembra que enquanto os meios de comunicação tradicionais são abertos e transparentes, as redes sociais muitas vezes se alimentam da instabilidade das fake news (págs. 294 e 297 do acórdão

9. Não se cogita do uso irrestrito e absoluto do direito fundamental à livre manifestação do pensamento. Por isso, é juridicamente possível a restrição desse direito fundamental quando constatada eventual ilicitude no seu exercício.

10. No caso concreto, tem-se o questionamento do conteúdo de mensagem ofensiva à honra de pré-candidato à presidência da República, divulgada por meio de redes sociais.

11. O representante pretende tutela provisória de urgência para remoção do vídeo publicado no perfil da rede social Instagram denominado @liberta_limoeiro, sob a alegação de que o seu conteúdo configura propaganda eleitoral negativa, contra a honra e a imagem do pré-candidato ao cargo de presidente da República Ciro Gomes, por meio de montagem e trucagem para descontextualizar fatos, de modo a disseminar conteúdo inverídico e difamatório. 

12. Tem-se no conteúdo do vídeo impugnado, nos termos da petição inicial (ID 157895277, p. 3):

1. o vídeo inicia-se com o recorte de fala do Senhor Ciro Gomes “muito pior mesmo do que reagir com indignação sincera, é não respeitar os mandamentos. Em especial quatro deles: Não roubarás...”

2. neste ponto (00:00:10) o vídeo é cortado e passa mostrar uma imagem de notícia jornalística nos seguintes dizeres: “Ciro Gomes é alvo de buscas da PF em operação sobre irregularidades do Castelão”. 3. Em seguida, o vídeo retorna com a fala cortada do candidato (00:00:13) “Não matarás...”

4. Mais uma vez o vídeo é cortado, passando a exibir imagens e som com os seguintes dizeres: “esse Moro mandou prender um blogueiro. Ele que mande me prender. Eu recebo a turma dele na bala”.

5. Aos 23 segundos de vídeo, mais uma vez o vídeo é manipulado, de forma que se volta a exibir o vídeo fonte, mais uma vez recortando a fala do candidato a tirar de contexto: “cada vez mais na vida eu tento escutar tudo com humildade”.

6. Mais uma vez interrompido, é inserido recorte de um vídeo de 2014, onde o há um diálogo confuso entre uma mulher e o senhor Ciro Gomes.

7. Já aos 00:00:40 do vídeo guerreado, utilizando-se de montagem, o representado recorta a fala do candidato: “alguns chegaram a dizer que o meu temperamento é incompatível com a fé cristã”.

8. Mais uma vez, o vídeo é manipulado, passando a exibir imagens totalmente fora de contexto, em que o Senhor Ciro Gomes se exalta com a perturbação de sossego que sofrera por manifestantes em frente à sua residência.

13. Neste caso, apesar da contundência das críticas e dos fatos relatados, não se verifica, em uma análise inicial, a propaganda eleitoral antecipada, na modalidade negativa.

A existência de “críticas políticas, ainda que duras e ácidas, ampliam o fluxo de informações, estimulam o debate sobre os pontos fracos dos possíveis competidores e de suas propostas e favorecem o controle social e a responsabilização dos representantes pelo resultado das ações praticadas durante o seu mandato. A extensão da noção de propaganda antecipada negativa a qualquer manifestação prejudicial a possível pré–candidato por cidadãos comuns transformaria a Justiça Eleitoral na moderadora permanente das críticas políticas na internet” (REspEl - Recurso Especial Eleitoral nº 060005754 – MA, Rel. Ministro Luís Roberto Barroso, DJe  22.6.2022).

14. Conforme entendimento deste Tribunal Superior Eleitoral, “a configuração de propaganda eleitoral extemporânea negativa pressupõe pedido explícito de não voto ou, ainda, ato que macule a honra ou a imagem de pré-candidato ou divulgue fato sabidamente inverídico em seu desfavor” (AgR-REspe nº 0600018-36/SP, relator o Ministro Benedito Gonçalves, DJe de 25.5.2022; AgR-REspe nº 0600016-43/MA, relator o Ministro Luis Felipe Salomão, DJe de 13.12.2021).

O cenário apresenta demonstra que, do que alegado na petição inicial, não se evidencia a plausibilidade do direito sustentado, razão pela qual não se verifica a presença dos requisitos para o deferimento da tutela cautelar de urgência.

Não se verifica, portanto, a presença dos requisitos para o deferimento da tutela cautelar de urgência.

15.Pelo exposto, indefiro o requerimento de medida liminar.

Defiro a expedição de comunicaçãopara que a empresa controladora e provedora do Instagram” informe, no prazo de 5 (cinco) dias, “todos os dados que possibilitem a identificação do administrador do perfil @liberta_limoeiro, como registros de conexão e de acesso (IP’s)”, nos termos em que requerido na petição inicial, devendo-se informar a este Tribunal Superior Eleitoral sobre as providências tomadas, no prazo de 48 horas, sob pena de fixação de multa e outras medidas para efetivo cumprimento da presente decisão.

Publique-se e intime-se

Brasília, 16 de agosto de 2022.

 

Ministra Cármen Lúcia

Relatora