index: AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL (12626)-0600001-62.2021.6.05.0062-[Cargo - Vereador, Corrupção ou Fraude, Ação de Impugnação de Mandato Eletivo]-BAHIA-IPIRÁ

Brasão da República
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

 

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL (12626)  Nº 0600001-62.2021.6.05.0062 (PJe) - IPIRÁ - BAHIA

RELATOR: MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES
AGRAVANTE: JOSE LUIZ CARNEIRO DE SOUZA, MARCOS MURILO BASTOS MASCARENHAS, WEIMA FRAGA DE OLIVEIRA, ARNOR PEREIRA DE SANTANA

Advogado do(a) AGRAVANTE: BARBARA MARQUES PUTRIQUE - RN15414-A
Advogado do(a) AGRAVANTE: BARBARA MARQUES PUTRIQUE - RN15414-A
Advogado do(a) AGRAVANTE: BARBARA MARQUES PUTRIQUE - RN15414-A
Advogado do(a) AGRAVANTE: BARBARA MARQUES PUTRIQUE - RN15414-A

AGRAVADO: ANDRE LUIS SILVA DE OLIVEIRA, JUDIMAR ALVES SALES, DIVANILSON ALMEIDA MASCARENHAS, EDIZIO SOUZA BISPO, EDVANDO DA SILVA SANTOS, LAELSON NEVES, ADNALDO PINTO SANTOS, EDMUNDO AZEVEDO CERQUEIRA, RAIMUNDO FREITAS PINDOBEIRA, LOURIVALDO PEREIRA LEITE, JOSE RAIMUNDO PEDREIRA MACEDO, RAIMUNDO SAMPAIO SIMAS, EDSON CARNEIRO DE SOUZA

Advogados do(a) AGRAVADO: ADEMIR ISMERIM MEDINA - BA7829-A, LUIZ EDUARDO GUIMARAES ROMANO PINTO - BA65250-A
Advogado do(a) AGRAVADO: LUIZ EDUARDO GUIMARAES ROMANO PINTO - BA65250-A
Advogados do(a) AGRAVADO: ADEMIR ISMERIM MEDINA - BA7829-A, LUIZ EDUARDO GUIMARAES ROMANO PINTO - BA65250-A
Advogado do(a) AGRAVADO: LUIZ EDUARDO GUIMARAES ROMANO PINTO - BA65250-A
Advogado do(a) AGRAVADO: LUIZ EDUARDO GUIMARAES ROMANO PINTO - BA65250-A
Advogados do(a) AGRAVADO: NIXON DUARTE MUNIZ FERREIRA FILHO - BA32046-A, ANDRE REQUIAO MOURA - BA24448-A, ADEMIR ISMERIM MEDINA - BA7829-A, LUIZ EDUARDO GUIMARAES ROMANO PINTO - BA65250-A
Advogado do(a) AGRAVADO: LUIZ EDUARDO GUIMARAES ROMANO PINTO - BA65250-A
Advogado do(a) AGRAVADO: LUIZ EDUARDO GUIMARAES ROMANO PINTO - BA65250-A
Advogados do(a) AGRAVADO: ADEMIR ISMERIM MEDINA - BA7829-A, LUIZ EDUARDO GUIMARAES ROMANO PINTO - BA65250-A
Advogado do(a) AGRAVADO: LUIZ EDUARDO GUIMARAES ROMANO PINTO - BA65250-A
Advogados do(a) AGRAVADO: ADEMIR ISMERIM MEDINA - BA7829-A, LUIZ EDUARDO GUIMARAES ROMANO PINTO - BA65250-A
Advogados do(a) AGRAVADO: ADEMIR ISMERIM MEDINA - BA7829-A, LUIZ EDUARDO GUIMARAES ROMANO PINTO - BA65250-A
Advogados do(a) AGRAVADO: ADEMIR ISMERIM MEDINA - BA7829-A, LUIZ EDUARDO GUIMARAES ROMANO PINTO - BA65250-A

 

DECISÃO

 

Trata-se de Agravo interposto por José Luiz Carneiro de Souza e outros contra decisão da Presidência do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia (TRE/BA) que negou seguimento ao Recurso Especial, ante a ausência de violação a dispositivo constitucional ou legal e a incidência dos enunciados 24, 28 e 30 da Súmula do TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL (TSE) (ID 157457522).

 

O Recurso Especial foi apresentado contra acórdão unânime por meio do qual a Corte Regional manteve a improcedência da Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (Aime), ajuizada para apurar suposta fraude no preenchimento da cota de gênero, em face de candidatos do Partido Democratas que concorreram ao cargo de Vereador em 2020 (ID 157457494).

 

Nas razões recursais (ID 157457521), os Recorrentes alegam divergência jurisprudencial e violação aos arts. 489, § 1º, III, IV e VI, e 1.022 do CPC; 275 do Código Eleitoral, bem como ao 10, § 3º, da Lei 9.504/1997; ao 23 da LC 64/1990 e ao 14, § 10, da Constituição Federal, sob os seguintes fundamentos: (i) o TRE/BA se recusou a “aclarar o julgado em pontos essenciais ao deslinde do feito e que per se têm o condão de modificar a conclusão”; (ii) cerceamento de defesa, em razão do indeferimento das seguintes diligências: (a) determinação para que o “município de Ipirá informasse o cargo exercido pela Sra. Lucivânia Bastos Marques, sua data de admissão e exoneração e o salário recebido”; e (b) oitiva do “motorista que a Sra. Crispina Santana Sodré relatou no seu depoimento”; (iii) o conjunto do fatos narrados comprovam a fraude, “mesmo se consideradas apenas as circunstâncias reconhecidas pelo acórdão, pois as candidatas receberam votação ínfima; não fizeram campanha; não tiveram gastos compatíveis e apoiaram abertamente outros candidatos homens do mesmo Partido”; (iv) os depoimentos prestados pelas investigadas apresentam inúmeras contradições, as quais não foram supridas; (v) Lucivânia Bastos Marques teve seu registro indeferido, porque, deliberadamente, não se desincompatibilizou do cargo público; (vi)  Mary Kelly Silva Souza Mascarenhas recebeu apenas 9 votos e fez campanha a favor de seu pai, eleito vereador; (vii) Regiane Santos Silva Bastos, que concorreu ao cargo de Vereador em 2012 e 2016 sem obter nenhum voto, confirmou que “não estava a par do mínimo que envolve uma campanha política”; (viii) Jucélia Mendes Santos Navarro também foi candidata em 2016 e, igualmente, não recebeu votos; (ix) Maila Souza Barbosa, em seu depoimento, “afirmou que não se recorda quando passou a ser candidata”; e (x) a conclusão do acórdão regional diverge do entendimento firmado por esta CORTE no julgamento do REspe 193-92, Rel. Min. JORGE MUSSI.

 

No Agravo (ID 157457525), alegam, em síntese, que: (i) houve usurpação de competência pela Presidência da Corte Regional; (ii) há ofensa aos dispositivos de lei apontados; e (iii)os fatos verificados no caso paradigma e no caso atual são semelhantes, no entanto, em um caso foi reconhecida a existência de fraude e no outro não”.

 

Em contrarrazões (ID 157457528), André Luis Silva de Oliveira e outros defendem o não conhecimento do Recurso.

 

O Vice-Procurador-Geral Eleitoral opina pelo desprovimento do Agravo (ID 157524314).

 

É o relato. Decido.

 

Inicialmente, não há qualquer ilegalidade na decisão da Presidência do TRE/BA, pois o TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL não está vinculado ao juízo de admissibilidade realizado na instância de origem, de modo que tal exame não impede o exercício definitivo pelo órgão ad quem. Nesse sentido: “o exame do mérito recursal, pelo Presidente do Tribunal a quo por ocasião do juízo de admissibilidade, não acarreta preclusão que obste esta Corte Superior de exercer segundo juízo de prelibação, não havendo falar em usurpação de competência” AgR-REspe 0601606-72 (Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES, DJe de 16/3/2021).

 

Quanto ao alegado cerceamento de defesa, conforme ressaltado pela Procuradoria-Geral Eleitoral, “é iterativo o entendimento do TSE de que o indeferimento da produção de provas consideradas inúteis ou protelatórias pelo magistrado não caracteriza cerceamento do direito de defesa, nem violação aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório. Na espécie, o acórdão do TRE/BA assentou que, de fato, as provas são inservíveis para resolução da questão, e, caso deferidas, em nada modificariam o resultado da demanda, ou seja, seriam inúteis” (ID 157524314).

 

De fato, “o indeferimento de provas não enseja o alegado cerceamento de defesa quando o magistrado, motivadamente, entende desnecessária sua produção” (AgR-AI 746-11 Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES, DJe de 10/12/2020), o que ocorreu na hipótese dos autos. Nesse sentido: RO 0603037-55, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe de 23/3/2022; AgR-Pet. 0600089-04, Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES, DJe de 18/5/2021; RO 0600870–81, Rel. MIN. TARCISIO VIEIRA DE CARVALHO NETO, PSESS de 13/11/2018; e AgR-REspe 59-46, Rel. Min. LUIZ FUX, DJe de 8/8/2017.

 

No caso, ao rejeitar os Embargos de Declaração, a Corte Regional assentou que todas as alegações foram devidamente enfrentadas, transcrevendo trechos do acórdão embargado, no qual consignado (ID 157457513):

[...] as diligências solicitadas mostram-se absolutamente inservíveis para o deslinde da controvérsia no presente feito e, mesmo que trouxessem as informações almejadas pela parte autora em nada modificariam o resultado da demanda, ou seja, seriam inúteis.

Observe-se que em relação à solicitação de informações à Prefeitura a cerca de Lucivânia Bastos Marques nada modificaria a lide uma vez que a tese que embasa a sentença não é influenciada por eventual resposta às informações solicitadas como bem se observa na decisão guerreada:

(...)

Há que se chamar a atenção ainda, de que a informação requerida  é objeto do processo de registro de candidatura e que já poderia ter sido acostada aos autos da presente desde a sua inicial. Não havendo justificativa para o requerimento em alegações finais, de oficiar à Prefeitura Municipal, atrasando assim a conclusão deste feito.

Em relação à oitiva de testemunha referida, melhor sorte não possuem os recorrentes. Observe-se que a magistrada de origem expõe, acertadamente, o entendimento de que:

Para que uma candidatura seja considerada fictícia, é preciso que existam provas robustas a evidenciar que tenha sido lançada com o propósito de burlar as regras eleitorais (…) apenas foram ouvidas neste processo as próprias candidatas, as quais foram uníssonas no sentido de que tinham interesse real na candidatura e na participação das eleições 2020 (…)

No caso específico da candidata Crispina Santana Sodré, assim como as demais candidatas, fora ouvida em termo de declarações, inclusive declarando que já fora candidata em outras oportunidades, que trabalhava ativamente em campanhas políticas há muitos anos, não havendo demonstração que haja vício de vontade em seu registro de candidatura.

Desta forma, despropositada e unicamente protelatória a oitiva de nova testemunha referida sobre fato que tangencia apenas o presente feito e não diz respeito ao cerne da demanda.

 

Além disso, assentou que “o acórdão embargado aferiu, em sua completude, as alegações e provas trazidas pelas partes, ainda que não tenha mencionado todas elas expressamente”, alcançando a conclusão de que o conjunto probatório “demonstra-se frágil, sem a necessidade de robustez que a procedência de uma AIME reclama”.

 

Dessa forma, o pronunciamento do TRE/BA, ainda que contrário aos interesses dos Recorrentes, mostra-se em conformidade com o art. 93, IX, da Constituição Federal, o qual exige “que a decisão judicial seja fundamentada; não que a fundamentação seja correta, na solução das questões de fato ou de direito da lide; declinadas no julgado as premissas, corretamente assentadas ou não, mas coerentes com o dispositivo do acórdão” ED-AI 481.132 (Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma, DJ de 1º/4/2005), “sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas AgR-ARE 1.056.580 (Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, DJe de 21/11/2017). De igual modo e pelas mesmas razões, não há falar na violação ao art. 489, §1º, I, do CPC.

 

Quanto ao mérito, trata-se de Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (Aime) voltada ao reconhecimento de fraude na cota de gênero do Partido Democratas.

 

Os Recorrentes asseveram que a candidata Lucivânia Bastos Marques teve o registro indeferido por não ter se desincompatibilizado de cargo público e não foi substituída pela Agremiação partidária, a fim de manter a observância do percentual previsto em lei.

 

Registram que as demais candidatas receberam votação insignificante, não fizeram campanha, não tiveram gastos compatíveis e apoiaram abertamente outros candidatos homens do mesmo partido, tudo a corroborar a fraude. Além disso, apontam a relação de parentesco existente entre a candidata laranja e candidato do sexo masculino.

 

O Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, concluindo pela ausência de provas para comprovar a prática de fraude na cota de gênero (ID 157339976), manteve a sentença de improcedência, a qual se lastreou nos seguintes elementos (ID 157457412):

Os autores, aqui, alegam que a regra da cota de gênero teria sido desrespeitada pelos candidatos e candidatas do Partido Democratas por duas razões: primeiro, pelo fato de uma das candidatas mulheres, Lucivânia Bastos Marques, ter tido o seu registro de candidatura indeferido, sem substituição por outra candidata mulher; e, segundo, pelo fato de as candidaturas femininas terem se revestido de sinais de fraude, tanto na campanha como na votação.

Em relação ao primeiro argumento, como já pacificado pelos tribunais, o indeferimento do registro de uma das candidaturas por razões não imputáveis à agremiação partidária não infirma a observância da regra da cota de gênero, mesmo na hipótese de tal candidatura ter sido necessária para o atendimento da proporção 30/70% de cada gênero pela agremiação partidária.

Entende-se, a este respeito, que a cota deve ser observada quando da apresentação do pedido de registro das candidaturas e não é maculada por eventuais fatos supervenientes (como o indeferimento ou a renúncia de uma candidatura feminina), salvo quando estes decorrem de abusos evidentes da parte da própria agremiação partidária.

[...]

O Partido Democratas, em Ipirá-Bahia, observou a cota de gênero quando da apresentação dos requerimentos de registro de candidatura, tanto é que teve a sua DRAP aprovada. No decorrer do feito, não ficou evidenciado que o pedido de registro da candidatura de Lucivânia Bastos Marques tenha sido deduzido de forma abusiva, com a pretensão apenas de completar a cota de gênero, quando já se conhecia ou, mais, se acreditava que sobreviria o indeferimento da candidatura. Tampouco ficou evidenciado que o Partido Democratas tenha deixado de promover a substituição da candidatura de Lucivânia Bastos Marques por outra candidata mulher quando existiam filiadas interessadas, não se podendo exigir, neste cenário, que, após o superveniente indeferimento da candidatura feminina, excluísse candidatos homens a fim de recompor a proporção de gênero das candidaturas. À luz de tais premissas, pode-se concluir que o indeferimento da candidatura de uma candidata mulher do Partido Democratas não foi capaz de macular o cumprimento da regra da cota de gênero.

Com isto, fica superado o primeiro argumento apresentado pelos autores.

Não há, outrossim, provas a corroborar o segundo argumento, no sentido de que as campanhas e os resultados nas urnas das candidatas mulheres do Partido Democratas do Município de Ipirá seriam capazes de evidenciar o caráter fraudulento de suas candidaturas.

[...].

A respeito das características das campanhas e resultados das candidaturas femininas, algumas considerações devem ser feitas.

Em primeiro lugar, a alegação dos autores no sentido de que as candidatas realizaram campanha e pediram votos apenas em favor de candidatos homens da mesma agremiação partidária não foi corroborada por nenhuma prova sequer. Com efeito, apenas foram ouvidas neste processo as próprias candidatas, as quais foram uníssonas no sentido de que tinham interesse real na candidatura e na participação das eleições 2020. As fragilidades nos depoimentos apontadas pelos autores na peça de alegações finais, embora de fato exponham o pequeno engajamento das candidatas no processo eleitoral, e até mesmo o pouco conhecimento quanto às regras que o regiam, não são capazes de evidenciar que as candidaturas foram forjadas, sobretudo considerando que, de acordo com os referidos depoimentos e documentos juntados aos autos, as candidatas requereram o seu registro de candidatura espontaneamente e fizeram campanha virtual e/ou presencial em favor de si próprias, com o propósito de participar da vida política local.

Em segundo, o mero fato de o Partido Democratas contar com dois candidatos da mesma família (pai e filha) nada representa de irregular, podendo-se supor tanto que o objetivo seria a filha completar a cota de gênero e colaborar com o pai, como sustenta o autor, como que o objetivo seria usar a força do pai perante o eleitorado para atrair confiança e votos para a filha, não havendo provas nos autos em qualquer sentido, o que impede o acatamento da conjectura autoral.

Em terceiro, o fato de as campanhas terem empregado poucos recursos financeiros não elide a presunção de que as candidatas tinham o propósito de participar ativamente da eleição, sobretudo considerando que, nas eleições de 2020, os atos de campanha “corpo a corpo” foram restringidos em razão da pandemia do COVID-19, e que, quando da propositura da presente ação, ainda estava em curso o prazo para prestação de contas, o que permitia às candidatas mulheres a complementação das informações a respeito de seus gastos eleitorais.

Por fim, os resultados eleitorais das candidatas mulheres do Partido Democratas foram pequenos (com votações de 9 a 33 votos), mas não ínfimos e se equipararam inclusive às votações de alguns homens e da maior parte das candidatas mulheres do partido a que pertencem os autores, o que, de um lado, não revela evidência de fraude e, de outro, revela contradição no comportamento dos autores, que não tiveram resultados muito distintos.

[...].

No caso ora analisado, a cota de gênero foi formalmente observada pelo Partido Democratas, com o pedido de registro de candidatos e candidatas de ambos os gêneros, na fração de 70% de homens e 30% de mulheres. Contra os pedidos de registro de candidatura, que são presumidamente idôneos, não foram apresentadas argumentos e provas hábeis a evidenciar a fraude. Não ficou evidenciado o propósito do Partido Democratas de burlar as regras eleitorais com o pedido de registro de uma candidatura sabidamente inviável, nem tampouco há regra, para o caso de indeferimento de candidatura superveniente, que imponha à agremiação a substituição ou a exclusão de candidatos com a finalidade de recompor a proporção de gênero. As características das campanhas e das votações finais das candidatas mulheres do Partido Democratas, ademais, não foram capazes de elidir a presunção de que a real intenção de todas era de concorrer no processo eleitoral. Dito isto, tenho que a pretensão inicial não restou corroborada, razão pela qual deve ser rechaçada, com fundamento na doutrina e na jurisprudência já indicadas. (grifei)

 

Realmente, o mero indeferimento superveniente do registro da candidata não comprova a alegada fraude na política de cotas, uma vez que, nos termos do § 4º do art. 17 da Res.–TSE 23.609/2019, o cálculo dos percentuais dos candidatos dentro de cada gênero se dá com base no número de candidaturas “efetivamente requeridas” (AREspE 0600866-82, Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES, DJe de 3/2/2022).

 

O acórdão regional se encontra em conformidade com a orientação jurisprudencial desta CORTE SUPERIOR ELEITORAL, segundo a qual “o fato de o registro de uma das candidatas ter sido negado por ausência de desincompatibilização, por si só, é incapaz de demonstrar o cometimento do ilícito” AgR-REspe 0600558-16 (Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe de 10/5/2022). No mesmo sentido: AgR-REspe 0600565-15, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, julgado em 9/6/2022; AgR-RO 0601693-22, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, DJe de 22/04/2021.

 

Na hipótese dos autos, o Democratas logrou eleger 6 (seis) candidatos do sexo masculino e outros 12 (doze) suplentes, entre os quais se incluem as mulheres investigadas. Eis o quadro de votação verificado:

 

Como se percebe, à exceção da candidata cujo registro foi indeferido (Lucivânia Marques), as outras não tiveram a votação zerada: a) Maila Barbosa (33); b) Jucélia Mendes (27 votos); c) Regiane Bastos (17 votos); e d) Mary Kelly (9 votos). Ressaltado pelo acórdão regional que o desempenho delas foi, inclusive, equivalente “às votações de alguns homens e da maior parte das candidatas mulheres do partido a que pertencem os autores”.

 

A consulta pública aos dados disponíveis no sítio eletrônico do TSE, relacionados com a prestação de contas das Investigadas, certifica que o Partido investiu recursos estimáveis em todas as candidaturas, inclusive naquela que teve o registro indeferido (Lucivânia Marques), a qual, assim como Jucélia Navarro, chegou a alocar recursos próprios na respectiva campanha, tendo realizado gastos, apresentado notas fiscais e extratos bancários para atestar a movimentação financeira.

 

Além do recurso proveniente do Partido, Maila Barbosa chegou a receber doação de pessoa física, tendo, igualmente, efetuado despesas e apresentado comprovantes bancários.

 

Ao contrário do que afirmam os Recorrentes, o fato de as candidatas Regiane e Jucélia terem sido candidatas em eleições anteriores (2012 e 2016), sem receber nenhum voto na época, não comprova, por si só, a alegada fraude em pleito totalmente diverso (2020).

 

Por outro lado, a realização de atos de campanha em conjunto com outros candidatos não representa nenhuma ilegalidade, na medida em que as candidatas possuem autonomia para definir a conveniência das ações referentes à campanha eleitoral, notadamente pela possibilidade de ampliar os canais de difusão da propaganda. Não se pode esquecer que, infelizmente, vivenciamos um país machista, no qual o apoio de candidatos homens ainda repercute sobremaneira no sucesso de candidatas mulheres.

 

Nesse contexto, para afastar as conclusões da Corte Regional e acolher os argumentos dos Agravantes, no sentido da existência de provas do ilícito, seria necessário o reexame de fatos e provas, providência incabível nesta seara especial (Súmula 24 do TSE).

 

Dessa forma, tendo em vista que o entendimento do TSE se firmou no sentido de que “a prova de fraude no preenchimento da cota de gênero deve ser robusta e levar em conta a soma das circunstâncias fáticas do caso a denotar o incontroverso objetivo de burlar o mínimo de isonomia entre homens e mulheres que o legislador pretendeu assegurar no art. 10, § 3º, da Lei 9.504/97” REspe 060046112 (Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, DJe de 5/8/2020), não se tem, no caso, elementos aptos a caracterizar a fraude na cota de gênero.

 

Por fim, cumpre registrar que as premissas fáticas contidas no acórdão regional não se assemelham ao que foi decidido no paradigma invocado pelos Recorrentes (REspe 193–92/PI), no qual a fraude na cota de gênero foi reconhecida com base em acervo probatório robusto, inexistente na espécie.

 

Além disso, o dissídio jurisprudencial está prejudicado, pois, na hipótese, a tese propugnada nas razões recursais demanda a revisão do contexto fático–probatório, providência inviável nesta sede (AREspe 0601161–38/GO, minha relatoria, DJe de 3/8/2021).

 

Ante o exposto, NEGO SEGUIMENTO ao Agravo, nos termos do art. 36, § 6º, do RITSE.

 

Publique-se. Intime-se.

 

Brasília, 27 de junho de 2022.

 

 

Ministro ALEXANDRE DE MORAES
Relator