TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

ACÓRDÃO

RECURSO ESPECIAL ELEITORAL Nº 0600957-30.2022.6.16.0000 – CURITIBA – PARANÁ
 

Relator: Ministro Raul Araújo

Recorrente: Thiago de Sousa Bagatin

Advogada: Ana Vitória Silveira Ribeiro – OAB: 101600/PR

Recorrente: Partido da Mobilização Nacional (PMN) – Estadual

Advogada: Juliana Bertholdi – OAB: 75052/PR

Recorrente: Federação Brasil da Esperança (FE BRASIL) – Estadual

Advogados: Luiz Eduardo Peccinin – OAB: 58101/PR e outros

Recorrido: Sérgio Fernando Moro

Advogados: Gustavo Bonini Guedes – OAB: 41756/PR e outros

 

ELEIÇÕES 2022. RECURSO ESPECIAL. RECURSOS ORDINÁRIOS. RRC. SENADOR. DEFERIMENTO NA INSTÂNCIA ORDINÁRIA. 1.INTERVENÇÃO DE TERCEIROS. AMICUS CURIAE. IMPOSSIBILIDADE. PEDIDO INDEFERIDO. MÉRITO. 2.CONDIÇÕES DE ELEGIBILIDADE. 2.1.FILIAÇÃO PARTIDÁRIA. TERRITORIALIDADE. VINCULAÇÃO À CIRCUNSCRIÇÃO DO CARGO ELETIVO. DESNECESSIDADE. INFORMATIZAÇÃO. CARÁTER NACIONAL DOS PARTIDOS POLÍTICOS. FILIAÇÃO PERANTE MÚLTIPLOS ÓRGÃOS PARTIDÁRIOS. ESCOLHA. POSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO  ART. 14, § 3º, V,  DA CF,  C/C ART. 9º DA LEI DAS ELEIÇÕES. 2.2.DOMICÍLIO ELEITORAL. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO DE TRANSFERÊNCIA DE DOMICÍLIO. INDEFERIMENTO PELO TRE DE DESTINO. MANUTENÇÃO DO VÍNCULO DOMICILIAR ANTERIOR. STATUS QUO. 3.INELEGIBILIDADE. NÃO CONFIGURAÇÃO. ALÍNEA Q. MAGISTRADO. EXONERAÇÃO. AUSÊNCIA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR STRICTO SENSU.  MENS LEGIS. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. JURISPRUDÊNCIA ITERATIVA. 4.CONCLUSÃO. PREENCHIMENTO DAS CONDIÇÕES DE ELEGIBILIDADE. NÃO INCIDÊNCIA DE  CAUSA  DE  INELEGIBILIDADE  DO ART. 1º, I, Q, DA LC Nº 64/90. ACÓRDÃO REGIONAL. ACERTO. RECURSOS ESPECIAL E ORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. SEGUNDO RECURSO ORDINÁRIO. ERRO GROSSEIRO. NÃO CONHECIMENTO.

1.   Preliminar: É inviável o acolhimento do pedido de ingresso de terceiro, ante a incompatibilidade da figura do amicus curiae com a celeridade tipicamente reclamada pelos feitos eleitorais (art. 5º da Res.-TSE nº 23.478/2016). Precedente.

2.  Na espécie, o Tribunal local, ao rejeitar as impugnações apresentadas, deferiu o RRC do candidato ao fundamento de que foram satisfeitas as condições de elegibilidade de (I) filiação partidária e de (II) domicílio eleitoral, ao tempo em que não se verificou a incidência da suscitada causa de inelegibilidade delineada no art. 1º, I, q, da LC nº 64/1990.

3.   Os recursos manejados ancoram-se, essencialmente, na ausência de preenchimento das preditas condições de elegibilidade, ante a pretensa falta de higidez na relação do candidato recorrido com a agremiação pela qual se sagrou eleito, considerando a existência de pedido de transferência de domicílio eleitoral para outra unidade da Federação, bem como o seu ulterior cancelamento pelo Tribunal regional de destino, havendo, ainda, suposta incidência do candidato na hipótese de inelegibilidade prevista no art. 1º, I, q, da LC nº 64/1990, ante o seu pedido de exoneração da magistratura na alegada pendência de resolução de expedientes disciplinares.

4.   Um dos recursos ordinários não há de ser conhecido. Não obstante o aresto regional tenha se debruçado tanto sobre condições de elegibilidade quanto sobre causa de inelegibilidade, seu objeto versa somente sobre capítulo específico do acórdão, qual seja, condição de elegibilidade (filiação partidária), cenário que desafia a interposição de recurso especial –, e não de recurso ordinário, como manejado pela parte, conforme o  art. 63, II, da Res.-TSE nº 23.609/2019.

5.  A jurisprudência deste Tribunal Superior perfilha sentido de ser manifestamente incabível o recurso ordinário interposto exclusivamente para impugnar a parte do acórdão que tratou da condição de elegibilidade, de forma que sua interposição é considerada erro grosseiro, sendo inaplicável o princípio da fungibilidade. Precedente.

6.   No mérito, argui-se que o requerimento de transferência de domicílio realizado pelo candidato tem o condão de, per si, romper seu vínculo domiciliar anterior, fato que seria obstativo do atendimento à condição de elegibilidade de domicílio eleitoral no Estado de origem, notadamente porquanto a comunicação de desligamento feita ao partido anterior teria sido realizada a destempo, em violação ao art. 21 da Lei nº 9.096/1995. Ainda, o candidato filiou-se perante órgão nacional do partido pelo qual se sagrou eleito, em situação em que buscava modificar sua situação domiciliar.

7.   O quadro, portanto, é de coexistência de filiações partidárias, situação especificamente prevista em lei eleitoral e que tem, portanto, solução própria, com a prevalência da relação partidária mais recente, por força do art. 22 da Lei nº 9.096/1995, sendo despicienda a comunicação de desfiliação prevista no art. 21 da Lei nº 9.096/1995. Precedente.

8.    A Res.-TSE nº 23.659/2021, – que versa sobre cadastro eleitoral –, ao regulamentar o instituto do domicílio eleitoral, estatui que para fins de fixação do domicílio é imprescindível que a operação de transferência tenha sido devidamente concluída.

9.   A não perfectibilização da transferência requerida pelo candidato torna de rigor a conclusão de que o domicílio eleitoral a ser considerado por esta Justiça especializada é o de origem, sob pena de se assentir com a lógica de que o candidato não fixou qualquer vínculo de nenhuma ordem em lugar algum – o que não se admite. É dizer: há a manutenção do vínculo originário. Inteligência do art. 56, II, da Res.-TSE nº 23.659/2021.

10.   A tese de que a filiação deve, necessariamente, ser processada perante o órgão partidário do domicílio eleitoral do eleitor não encontra ressonância na atual sistemática eleitoral. O art. 88, parágrafo único, do CE, além de fazer remissão expressa às eleições proporcionais – o que não ocorre no caso –, perfaz normativo preexistente à Constituição que não encontra campo de incidência quando se leva em conta o teor do art. 14, § 3º, V da CF c/c art. 9º da Lei das Eleições: dispositivos que desvinculam a filiação aos limites territoriais da circunscrição – ao contrário da redação dos mesmos artigos que expressamente relaciona a territorialidade ao domicílio eleitoral. Destarte, o regime jurídico da Lei nº 9.096/1995 não impõe que a inscrição da filiação se dê, necessariamente, junto ao órgão partidário correspondente ao seu domicílio eleitoral (art. 3º, caput, § 1º, da Res.-TSE 23.596/2019).

11.   Não  há  falar  na  incidência  da  causa  de  inelegibilidade  delineada  no  art. 1º, I, q,  da   LC  nº 64/1990. Articula-se tal tese por força do pedido de exoneração da magistratura federal formulado pelo recorrido, ainda na pendência de pretensos expedientes disciplinares instaurados no CNJ.

12.   Os preditos expedientes correram sob a forma de Pedido de Providências e de Reclamação Disciplinar. É forçosa, portanto, a conclusão pela ausência de instauração de Processo Administrativo Disciplinar, elementar reclamada pela legislação eleitoral para a configuração do impedimento temporário. Isso porque não é qualquer espécie de procedimento disciplinar que leva à aplicação de penalidades ao magistrado.

13.   É iterativa a jurisprudência deste Tribunal Superior no sentido de que normas delineadas na Lei de Inelegibilidade (LC nº 64/1990), por serem de ordem restritiva, também devem ser interpretadas restritivamente, sob pena de se incorrer em indevida analogia, desnaturando o comando legal. Precedentes.

14.   Inexistência de malferimento à mens legis, visto que a norma impugnada imbrica-se com a noção de alijar da vida política membro do Poder Judiciário que, ardilosamente, procura evadir-se do desfecho de processo administrativo. No caso, é público e notório que o desligamento da atividade judicante se deu para início dos preparativos de futura assunção a cargo público no Executivo Federal. Tal fato, aliado a uma interpretação restritiva do termo Processo Administrativo Disciplinar, não leva a outra conclusão senão à de que não houve a configuração da causa de inelegibilidade.

15.    Inviável o acolhimento do pedido subsidiário de aplicação do princípio da anualidade (art. 16 da CF), seja porque a matéria de fundo é aqui analisada pela primeira vez, seja porque as antigas consultas administrativas não se prestam como precedentes, não havendo falar, portanto, em overruling. Precedentes.

16.  Uma vez satisfeitas as condições de elegibilidade de (I) domicílio eleitoral e de (II) filiação partidária, bem como não havendo falar na incidência da causa de inelegibilidade prevista no art. 1º, I, q, da LC nº 64/1990, a manutenção do aresto regional é medida que se impõe.

17.  Recursos especial e ordinário a que se negam provimento. Não conhecimento do segundo recurso ordinário.

 

Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, preliminarmente, por unanimidade, em indeferir o pedido de ingresso nos autos, como amicus curiae, formulado por terceiro interessado, e no mérito, negar provimento ao recurso ordinário interposto pela Federação Brasil da Esperança e ao recurso especial interposto por Thiago de Sousa Bagatin, e não conhecer do recurso ordinário interposto pelo Partido da Mobilização Nacional (PMN) Estadual, nos termos do voto do relator.

 

Brasília, 15 de dezembro de 2022.

 

MINISTRO RAUL ARAÚJO – RELATOR

 

 

RELATÓRIO

 

 

O SENHOR MINISTRO RAUL ARAÚJO: Senhor Presidente, na origem, trata-se de Requerimento de Registro de Candidatura (RRC) de Sérgio Fernando Moro ao cargo de senador pelo Estado do Paraná nas eleições de 2022.

Foram apresentadas seis impugnações à sua pretensão: de Luiz Henrique Dias da Silva (ID 158294384), Oduwaldo de Souza Calixto (ID 158294817), Thiago de Sousa Bagatin (ID 158294831), Eneida Desiree Salgado (ID 158294834), Federação Brasil da Esperança – Estadual (ID 158294851) e do Partido da Mobilização Nacional – Estadual (ID 158294898).

As impugnações ancoram-se, essencialmente, na pretensa ausência de preenchimento das condições de elegibilidade relativas ao domicílio eleitoral e à filiação partidária, bem como na suposta incidência da causa de inelegibilidade delineada no art. 1º, I, q, da Lei Complementar nº 64/1990 (inelegibilidade de magistrado por exoneração da função na pendência de processo administrativo disciplinar).

O Tribunal Regional Eleitoral do Paraná rejeitou todas as impugnações e deferiu o pedido de registro de candidatura, por reputar preenchidas as preditas condições de elegibilidade nos 6 meses anteriores ao pleito. O Tribunal local concluiu, ainda, pela não incidência da arguida causa de inelegibilidade, nos termos do acórdão assim ementado (ID 158294985):

REGISTRO DE CANDIDATURA. IMPUGNAÇÃO. CONDIÇÕES DE ELEGIBILIDADE. DOMICÍLIO ELEITORAL NA CIRCUNSCRIÇÃO E FILIAÇÃO PARTIDÁRIA DEFERIDA 6 MESES ANTES DO PLEITO. REQUISITOS PREENCHIDOS. INELEGIBILIDADE. ART. 1º, I, “Q”, LC 64/90. AUSÊNCIA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR STRICTO SENSU NO MOMENTO DO PEDIDO DE EXONERAÇÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. REGISTRO DEFERIDO.

1. Súmula 39/TSE: “Não há formação de litisconsórcio necessário em processos de registro de candidatura.”

2. Requerimento de transferência do domicílio eleitoral para outra circunscrição negado por decisão definitiva da Justiça Eleitoral. Prevalência do domicílio anterior, inclusive para fins de atendimento do prazo mínimo para registro de candidatura.

3. A filiação partidária não se submete ao requisito de territorialidade (na circunscrição do pleito), possuindo caráter nacional. Inteligência dos arts. 14, § 3º, V, CF c.c. art. 9º da Lei 9.504/97.

4. Não incumbe à Justiça Eleitoral valorar a conduta pretérita de candidato fora das hipóteses previstas na regulamentação contida em Lei Complementar. Súmula 13/TSE: “Não é autoaplicável o § 9º do art. 14 da Constituição, com a redação da Emenda Constitucional de Revisão nº 4/1994.”

5. Para configuração da inelegibilidade prevista no art. 1º, I, “q”, da Lei Complementar 64/90 é necessário que, ao tempo do pedido de exoneração do cargo, o magistrado ou membro do Ministério Público esteja respondendo a processo administrativo disciplinar stricto sensu, isto é, aquele do qual possa resultar aplicação de sanção administrativa.

6. A interpretação das normas que restrinjam direitos políticos, integrantes que são do rol das garantias fundamentais, deve buscar a literalidade ao limitar-se às hipóteses expressamente contidas na legislação, vedada sua ampliação analógica.

7. Impugnações rejeitadas. Registro Deferido.

Desse acórdão, foram opostos embargos de declaração pelo candidato impugnado (ID 158294994) e interposto recurso ordinário pelo PMN – Estadual (ID 158294999).

Sobreveio a rejeição do recurso integrativo (ID 158295040).

Seguiu-se a interposição de três recursos: dois recursos ordinários e um recurso especial.

No primeiro – recurso ordinário interposto pela Federação Brasil da Esperança (ID 158295047) –, sustenta-se que o candidato Sérgio Fernando Moro não cumpriu a condição de elegibilidade de filiação partidária, porquanto não detinha vínculo com o partido União Brasil (UNIÃO) até o prazo de 2.4.2022, prazo fatal para sua filiação (6 meses antes do pleito), havendo violação ao art. 14, § 3º, V, da Constituição Federal e ao art. 9º da Lei das Eleições (9.504/1997), bem como ao entendimento sufragado por este Tribunal Superior nas Consultas nºs 952 e 1.231.

Reclama do desacerto operado pelo Tribunal local ao concluir que “direitos políticos somente podem ser restringidos quando expressamente previstos na legislação [...]” (ID 158295047, fl. 5).

No ponto, argui que o acórdão regional negou vigência  aos  arts. 19 a 22  da  Lei  dos  Partidos  Políticos (Lei nº 9.096/1995) e que, ao declarar a superação da orientação jurisprudencial exarada em suas consultas, o TRE/PR acabou por violar, também, o art. 30 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), ao afastar o caráter vinculante das consultas.

Acrescenta que o candidato tão somente se filiou junto ao UNIÃO de São Paulo –, e não ao UNIÃO do Paraná.

Aduz que o regime jurídico da Lei nº 9.096/1995 impõe que a vinculação da filiação se dê junto ao órgão partidário correspondente a seu domicílio eleitoral.

Alega que para perfectibilizar a mudança partidária, é necessária a comunicação escrita ao órgão partidário municipal, bem  como  ao  juiz  eleitoral,  nos  termos  do  art. 21  da  Lei  dos  Partidos  Políticos  e  do  art. 24  da  Res.-TSE nº 23.596/2019, sendo que, no caso, não houve comunicação ao partido ao qual o candidato estava anteriormente filiado (Podemos – PODE – de Curitiba/PR) a tempo oportuno, tampouco ao cartório eleitoral, não havendo falar em cancelamento da primeira filiação (art. 22, V, da Lei nº 9.096/1995), uma vez que a comunicação ocorreu somente em 5.4.2022 – isto é, após o prazo legal de encerramento das filiações.

Registra que sua filiação junto ao PODE somente foi cancelada em 23.4.2022, fato que obstou a regularidade da segunda filiação, junto ao UNIÃO de Curitiba, cadastrada em 1º.4.2022.

Articula que a coexistência de filiações não dispensa o filiado de respeitar as formalidades delineadas no art. 21 da Lei dos Partido Políticos.

Chama a atenção para o fato de que o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, ao cancelar a transferência do título eleitoral do candidato, tão somente deliberou sobre o pedido de transferência de domicílio eleitoral –, e não sobre sua filiação partidária, atestando, ainda, que, na data de 9.6.2022, o recorrido ainda estava filiado junto ao UNIÃO de São Paulo.

Destaca ser inverídico que Sérgio Fernando Moro se filiou em 30.3.2022 ao UNIÃO em Curitiba/PR, visto que houve a alteração do local de filiação tão somente após o prazo disposto no art. 9º da Lei das Eleições, sendo incorreta a fundamentação acerca da automatização do sistema FILIA, uma vez que, em sua ótica, a filiação é vinculada ao órgão partidário em que operada, e não à decisão de transferência de domicílio.

Assevera que a filiação do candidato em SP também é nula por arrastamento.

Registra que, conforme a Consulta nº 1.321, este Tribunal Superior entende que tanto a filiação partidária quanto o domicílio eleitoral devem estar validados no prazo delineado no art. 9º na circunscrição em disputa.

Ressalta que o Tribunal Superior Eleitoral, por meio da Consulta nº 952, concluiu que a filiação deve ser comunicada e processada perante o órgão partidário do domicílio eleitoral do filiado, ainda que feita perante o órgão nacional, sendo desacertada a conclusão de que o cancelamento da transferência de domicílio do candidato para São Paulo implicou o lançamento automático e retroativo de seu nome no quadro de filiados do órgão partidário do Paraná.

Consigna que o recorrido não obedeceu às disposições estatutárias do UNIÃO, a fim de perfectibilizar sua filiação, uma vez que o normativo interno da grei dispõe que, em caso de transferência de domicílio eleitoral, o filiado deverá comunicar tal mudança a ambas comissões executivas municipais (a de origem e a de destino), não havendo falar em filiação de caráter nacional, tampouco em transferência de registro automática com a transferência de domicílio eleitoral.

Invoca,  ainda,  a  incidência  sobre  o  recorrido  da  causa  de  inelegibilidade  disposta  no  art. 1º, I, q,  da  LC nº 64/1990 (inelegibilidade de magistrado por exoneração da função na pendência de processo administrativo disciplinar).

Externaliza irresignação relativa à conclusão regional de que o procedimento disciplinar a que se refere a Lei de Inelegibilidade deve ser interpretado restritivamente, sendo, em sua ótica, de rigor o afastamento da interpretação literal.  

No ponto, anota que havia em desfavor do recorrido 31 expedientes no Conselho Nacional de Justiça, todos arquivados. Sustenta que o candidato ardilosamente pediu exoneração de seu cargo de juiz federal com o intuito de obstar o avanço das investigações que recaíam sobre si, havendo venire contra factum proprium. 

O segundo apelo, a seu turno, é o recurso especial interposto por Thiago de Sousa Bagatin, candidato a deputado federal (ID 158295056), com esteio no art. 121, § 4º, I, da CF, no qual articula ocorrência de violação ao art. 14, § 3º, V, da CF, bem como ao art. 9º da Lei nº 9.504/1997.

Salienta ser incontroverso que o impugnado solicitou transferência de domicílio para o Município de São Paulo, bem como seu cancelamento, por força do art. 56 da Res.-TSE nº 23.659/2021.

Assevera que a filiação de Sérgio Fernando Moro ao UNIÃO foi operada quando seu domicílio eleitoral ainda estava em São Paulo.

Acentua pretensa incongruência no acórdão recorrido, ao fixar que a filiação impugnada foi realizada pelo diretório nacional do predito partido ao mesmo tempo em que também crava que compete à zona eleitoral em que inscrito o filiado o controle inicial da filiação.

Não nega que a filiação pode ser feita por órgão local, regional ou nacional, todavia, sustenta que, à época da pretensa filiação, o candidato recorrido simplesmente não tinha domicílio eleitoral, uma vez que a transferência de seu domicílio para São Paulo foi cancelada.

Nesse sentido, conclui que o candidato – entre as datas do pedido de transferência de domicílio para São Paulo até a do subsequente cancelamento – não preenchia a condição de elegibilidade, não havendo falar, por conseguinte, em sua filiação partidária.

A terceira – e última – irresignação é proveniente do Partido da Mobilização Nacional (PMN) – Estadual (ID 158295059), no qual a grei tão somente ratifica o recurso ordinário anterior, reiterando a alegação de que o recorrido não preencheu a condição de elegibilidade de filiação partidária, uma vez que não realizada tempestivamente (até 2.4.2022) no Estado do Paraná, considerando que houve formalização de tal condição em 30.3.2022 no Estado de São Paulo, situação que perdurou até 8.6.2022, há menos de 4 meses do pleito.

Tal como os demais recorrentes, sustenta que o candidato não realizou a transferência de sua filiação em tempo hábil.

Reclama do pretenso desacerto do TRE/PR, ao concluir que a condição de filiado não se submete ao requisito da territorialidade (circunscrição do pleito), bem como que a filiação imbrica-se com o domicílio eleitoral.

Também pugna pela prevalência do entendimento firmado em 2006 por  este  Tribunal  Superior  na  Consulta nº 12-31 (que entendeu que a filiação partidária se submete ao requisito da territorialidade), sendo forçoso o indeferimento do registro porquanto o candidato impugnado se filiou ao UNIÃO em São Paulo por mais de 2 meses, ficando lá filiado, ao menos, até 8.6.2022 (menos de 4 meses antes do pleito).

De igual modo, sustenta que o impugnado Sérgio Fernando Moro não possui filiação no Estado do Paraná nos 6 meses que antecederam as eleições de 2022.

Rememora que o art. 88, parágrafo único, do Código Eleitoral expressamente dispõe que a filiação partidária deve se operar na circunscrição em que o candidato tenciona concorrer, ainda que indique que tal condição é válida ao sistema proporcional.

Destarte, defende que tal dispositivo deve ser interpretado em conformidade com a Lei Maior, de modo a estender tal aplicação também às eleições majoritárias – hipótese do feito, bem como interpretado de forma sistemática, em conjunto com o art. 9º da Lei das Eleições e art. 20 da Lei dos Partido Políticos, no sentido de que

[...] o tempo de filiação na circunscrição que o candidato irá concorrer deve ser no mínimo de 6 (seis) meses, sem prejuízo da necessidade de observância prazo superior que eventualmente esteja previsto no estatuto do partido. (ID 158295059, fl. 14)

Irresigna-se com a conclusão regional pelo caráter nacional da filiação partidária do recorrido, uma vez que, em sua ótica, a filiação deve ser circunscrita a determinada localidade, à míngua de previsão legal em sentido contrário.

Critica a interpretação que conferiu à filiação partidária, por extensão, caráter nacional, em analogia ao raciocínio adotado aos partidos políticos (art. 17, I, da CF e art. 5º da Lei dos Partidos Políticos).

Chama atenção para precedente deste Tribunal Superior (REspe nº 109-09/SP, julgado em 2012), em que se concluiu pela necessidade de observância do domicílio eleitoral e da filiação na mesma circunscrição onde se tenciona candidatar, havendo, por conseguinte, rejeição da tese de caráter nacional da filiação.

Alega inexistir precedentes do TSE no sentido de que não se exige que o candidato tenha filiação por tempo mínimo na circunscrição em que deseje concorrer e que, em caso de viragem jurisprudencial, não há de se aplicar tal entendimento ao presente caso por força do princípio da anualidade eleitoral.

Desaprova a conclusão pela superação do caráter local da filiação em decorrência da criação do Sistema FILIA, ao argumento do advento das comunicações eletrônicas, tal como concluiu o TRE/PR, até porque a resolução que dispõe sobre o referido sistema categoriza as filiações conforme a circunscrição.

Ao final, todos os recorrentes tencionam a procedência de seus respectivos recursos, a fim de que, uma vez operada a reforma do aresto regional, seja o registro de candidatura do recorrido indeferido.

Sérgio Fernando Moro apresentou contrarrazões (ID 158295071).

A Procuradoria-Geral Eleitoral se manifestou pelo não conhecimento do recurso ordinário do PMN, bem como pelo desprovimento dos recursos da Federação Brasil da Esperança e de Thiago de Sousa Bagatin (ID 158311146).

Em 9.12.2022, Fábio de Oliveira Ribeiro, em petição avulsa, formulou pedido de ingresso no feito na condição de amicus curiae (ID 158493441).

É o relatório.

 

 

VOTO

 

 

O SENHOR MINISTRO RAUL ARAÚJO (relator): Senhor Presidente, preliminarmente, registre-se ser inviável o acolhimento do pedido de ingresso de terceiro, ante a incompatibilidade da figura do amicus curiae com a celeridade tipicamente reclamada pelos feitos eleitorais.

A Res.-TSE nº 23.478/2016 – que fixa as diretrizes de aplicação do CPC nesta Justiça Especializada –, expressamente veda a possibilidade de participação do amicus curiae na seara eleitoral. Confira-se:

Art. 5º Não se aplica aos feitos eleitorais o instituto do Amicus Curiae de que trata o art. 138 da Lei nº 13.105, de 2015.

A jurisprudência deste Tribunal Superior também é iterativa nesse sentido:

AGRAVO INTERNO. CAUTELAR INOMINADA. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2018. PRESIDENTE E VICE–PRESIDENTE DA REPÚBLICA. INTERVENÇÃO DE TERCEIRO. ELEITOR. INTERESSE JURÍDICO. INEXISTÊNCIA. AGRAVO DESPROVIDO.

[...]

3. O ingresso de terceiro nos feitos eleitorais deve ser visto com muita parcimônia, sob pena de tumulto à marcha procedimental e de eternização dos conflitos, com retrocesso incompatível com o sistema de preclusão e com a rápida solução do litígio, a considerar a temporariedade dos mandatos e a estabilidade democrática.

4. Não se aplica aos feitos eleitorais o instituto do amicus curiae de que trata o art. 138 da Lei nº 13.105, de 2015 (Resolução–TSE nº 23.478/2016, art. 5º).

[...]

6.  Agravo interno a que se nega provimento.

(AgR-AC nº 0600628-67/DF, rel. Min. Og Fernandes, julgado em 12.12.2019, Dje de 2.9.2020)

Assim, o indeferimento do pedido formulado Fábio de Oliveira Ribeiro é medida que se impõe.

Avançando, os recursos interpostos pela Federação Brasil da Esperança e por Thiago de Sousa Bagatin são tempestivos. O acórdão recorrido foi publicado em 17.10.2022, segunda-feira (ID 158295045), tendo os presentes recursos sido interpostos, respectivamente, em 19.10.2022 (ID 158295047) e 20.10.2022 (ID 158295056), bem como subscritos por advogados devidamente habilitados nos autos (IDs 158294852 e 158294832).

A irresignação do PMN (ID 158295059), no entanto, não há de ser conhecida, uma vez que seu objeto versa somente sobre condição de elegibilidade (filiação partidária), cenário que desafia a interposição de recurso especial - e não de recurso ordinário, como manejado pela parte.

É o que dispõe o art. 63, II, da Res.-TSE nº 23.609/2019, in verbis:

Art. 63. Dos acórdãos proferidos pelos tribunais regionais eleitorais no exercício de sua competência originária cabem os seguintes recursos para o Tribunal Superior Eleitoral, no prazo de 3 (três) dias (Lei Complementar nº 64/1990, art. 11, § 2º):

[...]

II - recurso especial, quando versar sobre condições de elegibilidade (Constituição Federal, art. 121, § 4º, I e II) .

Destarte, ainda que o acórdão regional também tenha se debruçado sobre causa de inelegibilidade, é forçosa a conclusão de que – na hipótese em que a parte somente tencione impugnar capítulo específico atinente à condição de elegibilidade –, o recurso especial é o único cabível. Nesse sentido:

ELEIÇÕES 2022. RECURSOS ORDINÁRIOS. RRC. CANDIDATO. DEPUTADO FEDERAL. DEFERIMENTO NA INSTÂNCIA ORDINÁRIA. CAUSA DE INELEGIBILIDADE PREVISTA NO ART. 1º, I, L, DA LC Nº 64/1990. AUSÊNCIA DE REQUISITOS. FALTA DE CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE DO ART. 14, § 3º, II, DA CF. NÃO CABIMENTO DE RECURSO ORDINÁRIO PARA IMPUGNAR EXCLUSIVAMENTE A PARTE DO ACÓRDÃO QUE TRATOU DA CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE. ERRO GROSSEIRO. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. DESPROVIMENTO DO RECURSO ORDINÁRIO DE WANDERLEY DE MORAES FARIA E NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO ORDINÁRIO DO MPE.

1. O TRE/ES afastou a causa de inelegibilidade do art. 1º, I, l, da LC nº 64/1990, bem como concluiu estar presente a condição de elegibilidade do art. 14, § 3º, II, da CF, e deferiu o registro de candidatura ao cargo de deputado federal. Desse acórdão foram interpostos dois recursos ordinários.

[...]

3. É manifestamente incabível o recurso ordinário interposto exclusivamente para impugnar a parte do acórdão que tratou da condição de elegibilidade, de forma que sua interposição é considerada erro grosseiro, sendo inaplicável o princípio da fungibilidade. Precedentes.

4. Negado provimento ao recurso ordinário do candidato impugnante e não conhecido o recurso ordinário do MPE.

(RO-El nº 0600778-21/ES, de minha relatoria, PSESS de 13.10.2022 – grifos acrescidos)

Assim, uma vez operado quadro de erro grosseiro, descabe falar em aplicação do princípio da fungibilidade, tornando de rigor o não conhecimento do recurso do PMN.

Com relação aos demais recursos, ainda que satisfeitos os requisitos para seu conhecimento, não há como acolher a pretensão das partes.

Explico.

A controvérsia cinge-se a saber se (I) é hígida (ou não) a relação do candidato recorrido com o partido UNIÃO, agremiação pela qual foi eleito senador pelo Estado do Paraná, considerando seu pedido de transferência de domicílio eleitoral para São Paulo e o seu ulterior cancelamento pelo TRE/SP, bem como se (II) incide sobre o candidato a hipótese de inelegibilidade delineada no art. 1º, I, q, da LC nº 64/1990, ante o seu pedido de exoneração da magistratura na pretensa pendência de resolução de expedientes disciplinares.

De início, por pertinente, faz-se necessário esclarecer a ordem cronológica dos fatos:

a) 15.11.2011 – domicílio eleitoral do recorrido em Curitiba/PR;

b) 19.11.2018 – exoneração, a pedido, do cargo de juiz federal;

c) 10.11.2021 – filiação ao PODE;

d) 30.3.2022 – filiação ao UNIÃO;

e) 31.3.2022 – requerimento de mudança de domicílio eleitoral para SP;

f) 2.4.2022 – último dia para filiação (6 meses antes do pleito);

g) 5.4.2022 – comunicação de desligamento do PODE;

h) 23.4.2022 – cancelamento da filiação ao PODE; e

i) 7.6.2022 – indeferimento da transferência de domicílio eleitoral pelo TRE/SP.

Os recorrentes sustentam, em síntese, que o requerimento de transferência de domicílio realizado pelo candidato (de Curitiba/PR para São Paulo/SP) tem o condão de, por si só, romper seu vínculo domiciliar anterior, fato que seria obstativo do atendimento à condição de elegibilidade de domicílio eleitoral no Estado do Paraná, notadamente porquanto a comunicação de desligamento feita ao partido anterior teria sido realizada a destempo.

Articula-se, para tanto, violação ao art. 21 da Lei dos Partidos Políticos, que assim dispõe:

Art. 21. Para desligar-se do partido, o filiado faz comunicação escrita ao órgão de direção municipal e ao Juiz Eleitoral da Zona em que for inscrito.

Parágrafo único. Decorridos dois dias da data da entrega da comunicação, o vínculo torna-se extinto, para todos os efeitos.

Ante a literalidade do predito dispositivo, tencionam os recorrentes que esta Justiça especializada conclua pela irregularidade da filiação do impugnado junto ao UNIÃO, não havendo falar em cancelamento da primeira filiação (art. 22, V, da Lei nº 9.096/1995), uma vez que a comunicação ocorreu somente em 5.4.2022 – isto é, após o prazo legal de encerramento das filiações.

No entanto, tenho que a interpretação ambicionada pelas partes não há de ser aplicada na espécie, uma vez que destinada à situação distinta da que ora se apresenta.

Isso porque, no caso, não se trata de hipótese em que um filiado tenciona romper seu vínculo sem, no entanto, perseverar em outros projetos políticos.

Ao revés, a situação que ora se apresenta é distinta: trata-se de filiado que, malgrado não tenha comunicado a tempo sua saída à grei de origem, optou por continuar na vida político-partidária, ainda que, para tanto, filiando-se a outro partido.

É dizer: houve coexistência de filiações partidárias, situação especificamente prevista em lei eleitoral e que tem, portanto, solução própria.

Trata-se do art. 22, parágrafo único, da Lei nº 9.096/1995 (Lei dos Partidos Políticos), que expressamente dispõe que, em caso de duplicidade de filiações, deverão ser cancelados todos os vínculos anteriores, devendo prevalecer a filiação mais recente. Confira-se:

Art. 22. O cancelamento imediato da filiação partidária verifica-se nos casos de:

[...]

Parágrafo único.  Havendo coexistência de filiações partidárias, prevalecerá a mais recente, devendo a Justiça Eleitoral determinar o cancelamento das demais.

Assim,

[...] no caso em que o interessado almeja a desfiliação para posterior ingresso em outro partido, tornou-se desnecessário atualmente adotar o procedimento [do] art. 21, bastando-lhe filiar-se diretamente ao novo partido [...].

(Medeiros, MARCILIO NUNES, Legislação eleitoral comentada e anotada. 3a ed. rev. atual. e ampl. – São Paulo: JusPodivm, 2021)

Nesse mesmo sentido, aliás, é a jurisprudência deste Tribunal Superior, assertiva no sentido de ser despicienda a comunicação de desfiliação prevista no art. 21 da Lei nº 9.096/1995, devendo tal dispositivo ser interpretado de forma conjugada com demais artigos correlatos:

RECURSO ESPECIAL. FILIAÇÃO PARTIDÁRIA. COEXISTÊNCIA. INVIABILIDADE CONCRETA DE APURAÇÃO DO VÍNCULO MAIS RECENTE. OBSERVÂNCIA DA MANIFESTAÇÃO DO ELEITOR. POSSIBILIDADE. NÃO PROVIMENTO.

SÍNTESE DO CASO

1.  O Tribunal a quo deu provimento ao recurso eleitoral interposto por Divino Magno de Sousa Abreu, para reconhecer sua filiação partidária ao partido Podemos, desde 4.4.2020, cancelando, por conseguinte, sua filiação no partido Cidadania, realizada no mesmo dia.

2.   Na origem, após verificada a duplicidade de filiações partidárias com a mesma data, o juízo eleitoral adotou as providências do art. 23 da Res.–TSE 23.596, oportunidade em que o filiado manifestou interesse em permanecer filiado ao Podemos, tendo o órgão ministerial oficiante perante a Zona Eleitoral se manifestado pelo deferimento do pedido.

ANÁLISE DO RECURSO ESPECIAL

[...]

5.  Segundo o parágrafo único do art. 22 da Lei 9.096/95, com a redação conferida pela Lei 12.891/2013, "havendo coexistência de filiações partidárias, prevalecerá a mais recente, devendo a Justiça Eleitoral determinar o cancelamento das demais".

6.   A evolução legislativa, doutrinária e jurisprudencial aponta para a necessidade de aproveitamento da filiação partidária sempre que possível, observando–se o critério cronológico e independentemente de ter ocorrido comunicação de desfiliação nos termos do art. 21 da Lei 9.096/95.

[...]

CONCLUSÃO

Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, a que se nega provimento.

(REspEl nº 0600005-03/GO, rel. Min. Sérgio Banhos, julgado em 13.10.2020, DJe de 5.11.2020)

Assim, é forçosa a constatação de que o recorrido está regularmente filiado ao UNIÃO desde de 3.3.2022, portanto, por tempo suficiente à satisfação da condição de elegibilidade de filiação partidária, uma vez que a efetivação do ato filiatório ocorre internamente, independentemente de ulterior comunicação formal à Justiça Eleitoral.

Continuando, como se sabe, o domicílio eleitoral perfaz condição de elegibilidade umbilicalmente vinculada à circunscrição exigida para o cargo em disputa. No caso, o recorrido sagrou-se eleito senador pelo Estado do Paraná, razão pela qual deve, necessariamente, possuir domicílio nesse estado.

Aliás, é o que se extrai do art. 14, § 3º, da CF:

Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei [...].

§ 3º São condições de elegibilidade, na forma da lei:

[...]

IV - o domicílio eleitoral na circunscrição;

V - a filiação partidária; (Grifos acrescidos) 

No ponto, faz-se pertinente esclarecer que a possibilidade de o candidato optar – caso tenha mais de um domicílio – não equivale a dizer que a ele será lícito possuir diversos domicílios eleitorais. Assim, deve o candidato, no ato de formalização de seu registro, declarar qual será, de fato, o domicílio que atenderá como condição de elegibilidade.

Pela relevância, cito o art. 42, parágrafo único, do CE, in verbis:

Art. 42.

[...]

Parágrafo único. Para o efeito da inscrição, é domicílio eleitoral o lugar de residência ou moradia do requerente, e, verificado ter o alistando mais de uma, considerar-se-á domicílio qualquer delas.

Nesse sentido, é imperioso destacar que o conceito de domicílio para fins eleitorais é mais elástico do que aquele classicamente estudado em Direito Civil. Isso porque, nesta Justiça especializada, estão aptos a serem considerados os vínculos de ordem social, afetiva, política, profissional, entre outros. Confira-se:

Res.-TSE nº 23.659/2021:

Art. 23. Para fins de fixação do domicílio eleitoral no alistamento e na transferência, deverá ser comprovada a existência de vínculo residencial, afetivo, familiar, profissional, comunitário ou de outra natureza que justifique a escolha do município.

Dito isso, rememore-se que o pedido de transferência de domicílio eleitoral formulado por Sérgio Fernando Moro foi indeferido pelo TRE/SP.

Tal cenário – ao contrário do indicado por um dos recorrentes – não deflagra quadro de inexistência de domicílio eleitoral. Ao revés, denota que o domicílio de origem, na verdade, continuou servindo como tal para fins eleitorais, não havendo desnaturação alguma da condição de elegibilidade.

No ponto, registre-se que a Res.-TSE nº 23.659/2021, que versa sobre cadastro eleitoral, ao regulamentar o instituto do domicílio eleitoral, estatuiu que para que haja a fixação do domicílio é imprescindível que a operação de transferência tenha sido “devidamente concluída”, o que, como já dito, não ocorreu, ante a negativa do Tribunal regional paulista.

Eis o teor do dispositivo:

Art. 23 § 1º A fixação do domicílio eleitoral, inclusive para fins de candidatura, retroagirá à data em que requerida a operação de alistamento ou transferência que tenha sido devidamente concluída, independentemente da data em que seja processado o lote do RAE ou venham a ser consideradas satisfeitas eventuais diligências. (Grifos acrescidos)

Ora, a não perfectibilização da transferência requerida pelo candidato torna de rigor a conclusão de que o domicílio eleitoral a ser considerado por esta Justiça especializada é, de fato, o de Curitiba/PR,  tal  como  concluiu  o  Tribunal a quo.

Anuir com a conclusão pela ausência de domicílio eleitoral do candidato implicaria assentir na lógica de que ele não tem qualquer vínculo de nenhuma ordem em lugar algum, raciocínio o qual, a meu sentir, não parece ser dotado de razoabilidade.

Há, inclusive, comando resolutivo com expressa orientação no sentido de que, não havendo transferência de domicílio, há a manutenção do vínculo originário. Trata-se do art. 56, II, da predita resolução:

Art. 56. Indeferida a operação, será, imediatamente:

[...]

II - cancelada a transferência ou revisão, hipótese em que serão mantidos os dados da inscrição conforme o último RAE [requerimento de alistamento eleitoral] deferido. (Grifos acrescidos)

É dizer: a condição de elegibilidade constitucional de domicílio eleitoral foi plenamente satisfeita pelo candidato.

Com relação à tese de que a filiação deve ser processada perante o órgão partidário do domicílio eleitoral do filiado, ainda que feita perante o órgão nacional, tal orientação não encontra ressonância na atual sistemática eleitoral.

O art. 88, parágrafo único, do CE, além de fazer remissão expressa às eleições proporcionais – o que não ocorre no caso –, perfaz normativo preexistente à Constituição que não encontra campo de incidência quando se leva em conta o teor do citado art. 14, § 3º, V da Carta Magna, o qual, por sua vez, foi reforçado pelo art. 9º da Lei das Eleições: dispositivos que desvinculam a filiação aos limites territoriais da circunscrição – ao contrário da redação dos mesmos artigos que expressamente os relaciona ao domicílio eleitoral.

Destaca-se que não se desconhece a existência de dois julgados antigos deste Tribunal Superior em que esta Corte perfilhou sentido pela deferência à municipalidade do controle dos atos partidários atinentes à filiação.

Trata-se das Ctas nºs 1.231/DF (julgada em 2006, conclusiva da necessidade de comprovação de filiação na circunscrição reclamada pelo cargo a que se tenciona concorrer) e 952/DF (julgada em 2003, conclusiva da necessidade de o diretório nacional comunicar a lista de filiados ao Juízo eleitoral da zona do filiando).

Todavia, diversamente do sustentado pelas partes, não há mais falar no fato de a filiação ser comunicada pelo órgão partidário ao Juízo eleitoral do domicílio do eleitor, até mesmo porque tal ideia não se imbrica com o argumento que a filiação partidária deva se operar, necessariamente, no âmbito municipal.

Ao contrário, atualmente, com a otimização dos sistemas informáticos, o quadro que se tem é que, uma vez realizado o procedimento interno de filiação, os dados terão de ser enviados pelos respectivos órgãos partidários diretamente ao sistema eletrônico da Justiça Eleitoral, o qual, a seu turno, caberá transmitir tais dados aos juízes eleitorais.

É o que se extrai do art. 11 da Res.-TSE nº 23.596/2019, in verbis:

Art. 11. Deferido internamente o pedido de filiação, o partido político, por seus órgãos de direção municipais, regionais ou nacional, deverá inserir os dados do filiado no sistema eletrônico da Justiça Eleitoral, que automaticamente enviará aos juízes eleitorais, para arquivamento, publicação e cumprimento dos prazos de filiação partidária para efeito de candidatura a cargos eletivos, a relação dos nomes de todos os seus filiados, da qual constará a data de filiação, o número dos títulos eleitorais e das seções em que estão inscritos

Tal comunicação é de índole eminentemente administrativa, que objetiva otimizar as anotações, organização e controle da Justiça Eleitoral, para fins de “arquivamento, publicação e cumprimento dos prazos de filiação partidária para efeito de candidatura a cargos eletivos [...]” (art. 19 da Lei nº 9.096/1995), não havendo que se interpretar os campos de “Unidade da Federação (UF)” e “Município” – constantes das certidões de filiação emitidas pelo Sistema FILIA –, como limites circunscricionais de validade do ato de filiação, até mesmo porque, ante a atual sistemática de filiação, como já visto, não há mais necessidade de os partidos remeterem as listas de seus filiados aos Juízos eleitorais.

Convém, no ponto, citar o teor do aresto regional que consignou que, com a mudança domiciliar do filiado, seu nome comporá, automaticamente, o rol de filiados na nova zona eleitoral,  por  força  do  que  dispõe  o  art. 31  da  Res.-TSE nº 23.596/2019 (ID 158294985):

Por essa razão, nas certidões constantes dos ids.  43029459, 43050661 e 43056927, emitidas de forma automática por meio de acesso público ao sistema FILIA, anteriormente à reversão da inscrição eleitoral do impugnado ao Paraná, constam como “UF” e “Município”, respectivamente, SP e São Paulo, ao passo em que as certidões de ids. 43030726, 43050664, 43050660 e 43056928, emitidas posteriormente à reversão da inscrição eleitoral, trazem, nos mesmos campos, as informações de “PR” e “Curitiba”.

Tais anotações não se referem à circunscrição em que realizada ou válida a filiação partidária, mas sim à localização da inscrição eleitoral (domicílio) do filiado.

É a conclusão que decorre da leitura do art. 31 da Resolução TSE 23.596/19.

Nesse desencadear de ideias, há diversos dispositivos eleitorais que chancelam a conclusão pela desnecessidade de regionalização da filiação, até mesmo ante o próprio caráter nacional dos partidos políticos (art. 17, I, da CF).

É o caso do art. 19 da Lei  dos  Partidos  Políticos,  do  art. 9º  da  Lei  das  Eleições  e  dos  arts. 3º, 4º e 31  da Res.-TSE nº 23.596/2019 (que dispõe sobre filiação partidária), a saber:

Lei nº 9.096/1995

Art. 19.  Deferido internamente o pedido de filiação, o partido político, por seus órgãos de direção municipais, regionais ou nacional, deverá inserir os dados do filiado no sistema eletrônico da Justiça Eleitoral, que automaticamente enviará aos juízes eleitorais, para arquivamento, publicação e cumprimento dos prazos de filiação partidária para efeito de candidatura a cargos eletivos, a relação dos nomes de todos os seus filiados, da qual constará a data de filiação, o número dos títulos eleitorais e das seções em que estão inscritos. (Redação dada pela Lei nº 13.877, de 2019)

Lei nº 9.504/1995

Art. 9º  Para concorrer às eleições, o candidato deverá possuir domicílio eleitoral na respectiva circunscrição pelo prazo de seis meses e estar com a filiação deferida pelo partido no mesmo prazo. 

Res.-TSE nº 23.596/2019

Art. 3º A filiação partidária poderá ser requerida a qualquer órgão partidário, observadas as regras do estatuto do partido político.

§ 1º Consideram-se órgãos partidários, para fins desta resolução, os constituídos nos âmbitos nacional, estadual ou regional e municipal ou zonal;

Art. 4º, § 2º Observadas as disposições estatutárias, qualquer órgão partidário poderá registrar as filiações no sistema FILIA.

Art. 31. A transferência de domicílio eleitoral do eleitor filiado será informada pelo FILIA aos administradores nacionais, estaduais/regionais e municipais/zonais de origem e de destino cadastrados no sistema.

Parágrafo único. O nome do filiado comporá, automaticamente, o registro oficial de filiados do partido no novo município/zona. (Grifos acrescidos)

Da leitura conjugada dos preditos dispositivos, conclui-se pela desnecessidade de nova formalização do ato partidário.

Com efeito, não bastasse o fato de as consultas ora sub examine externalizarem tão somente a orientação interpretativa deste Tribunal Superior que vigia à época – momento no qual as greis informavam localmente sua lista de filiados e que ainda principiava a formalização eletrônica do sistema de filiação –, torna-se de rigor afastar a aplicação das preditas consultas por não (I) serem dotadas de força vinculante, até mesmo porquanto exaradas antes do vigor do art. 30 da LINDB, bem como por (II) não advirem da função judicante do Tribunal, sendo, portanto, imprestáveis enquanto paradigmas. Nesse sentido:

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. DEPUTADO ESTADUAL ELEITO. JUSTA CAUSA PARA DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA RECONHECIDA PELA INSTÂNCIA ORDINÁRIA COM FUNDAMENTO NO ART. 17, §§ 3º E 5º, DA CF. CLÁUSULA DE BARREIRA NÃO ALCANÇADA PELO PARTIDO AO QUAL FOI ELEITO O REQUERENTE. DECISÃO AGRAVADA. INCIDÊNCIA DOS ENUNCIADOS NºS 27 E 28 DA SÚMULA DO TSE. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DE TODOS OS FUNDAMENTOS. REITERAÇÃO DE TESES. ÓBICE SUMULAR Nº 26 DO TSE. NEGADO PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO.

[...]

4. Na linha da jurisprudência deste Tribunal, as respostas em processos administrativos de consulta não ostentam caráter vinculante e não servem como paradigma para a interposição de recurso, pois não derivam da função judicante da Corte. Precedentes.

5. Negado provimento ao agravo interno.

(AgR-AREspE nº 0600151-53/AL, rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 4.6.2021, DJe de 22.6.2021)

Por bem resumir a questão que ora se debate, cita-se trecho do aresto regional (ID 158294985):

Argumentam que a filiação partidária deve se dar na circunscrição, invocando como precedentes duas consultas do TSE, e que o artigo 30 da LINDB torna vinculantes a resposta a consultas.

[...]

Note-se que o artigo 14, § 3º, IV, exige de forma explícita que o domicílio eleitoral seja na circunscrição, ao passo que não inclui a mesma especificidade quanto à filiação partidária.

Todavia, os impugnantes socorrem-se de duas consultas assim respondidas pelo TSE:

CONSULTA. PARTIDO POLITICO. COMISSÃO EXECUTIVA NACIONAL. SECRETÁRIO-GERAL. LEGITIMIDADE DO CONSULENTE. INSCRIÇÃO ELEITORAL. TRANSFERÊNCIA. DOMICÍLIO. PRAZO. FILIAÇÃO PARTIDÁRIA. TERRITÓRIO NACIONAL. VALIDADE.

(...)

2. Como bem sintetizado pela AESP, "se a candidatura é de cunho municipal, o domicílio e filiação devem ser aí comprovados. Se a candidatura é a cargo eletivo estadual, a circunscrição é o Estado (...), se a candidatura é a mandato presidencial, por óbvio, válido será o domicílio e a filiação em qualquer município do território nacional" (fl. 40).

3. Resposta no sentido de que é necessária a observância do domicílio eleitoral e da filiação partidária um ano antes do pleito na localidade da realização das eleições, observadas as regras acerca de circunscrição eleitoral acima postas.

[TSE, CTA nº 1231/DF, rel. Min. José Delgado, DJ 04/07/2006, não destacado no original]

CONSULTA. FILIAÇÃO PARTIDÁRIA EFETUADA EM DIRETÓRIO NACIONAL. NECESSIDADE DE COMUNICAÇÃO AO JUIZ ELEITORAL. ART. 19 DA LEI Nº 9.096/95.

Prevê a lei que o partido encaminhe a relação dos filiados à Justiça Eleitoral no prazo legal, seja por meio de seu órgão de direção nacional - em que foi feita a filiação -, seja pelo municipal.

Exegese do art. 19 da Lei nº 9.096/95.

[TSE, CTA nº 952, rel. Min. Ellen Gracie, DJ 07/11/2003, não destacado no original]

A consulta 952 é manifestamente inaplicável à hipótese: como já dito, com o advento do sistema FILIA, já não se há de falar em “comunicação ao juiz eleitoral”, cujo papel era apenas anotar a filiação havida, o que hoje é feito de forma totalmente digital.

Na consulta 1231, por sua vez, aquela c. Corte expressamente aderiu à tese de que a filiação partidária também deveria se dar na circunscrição.

Sem aqui insistir na inadequação constitucional de tal entendimento, mister pontuar que, ao tempo em que prolatada, era assente na jurisprudência o papel meramente opinativo das respostas às consultas.

Nesse sentido:

A resposta atribuída à consulta eleitoral não tem natureza jurisdicional, nem efeito vinculante.

[TSE, Rp nº 226435/DF, rel. Min. Joelson Dias, PSESS 02/09/2010, unânime]

A função consultiva da Justiça Eleitoral não possui caráter vinculante - já que as respostas são sempre em tese - e visa, apenas, orientar os atores do processo eleitoral.

[TSE, CTA nº 23854/DF, rel. Min. Luciana Lóssio, DJE 02/08/2016, unânime]

Todavia, a Lei nº 13.655/2018 promoveu alteração relevante na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, incluindo a seguinte previsão:

Art. 30.  As autoridades públicas devem atuar para aumentar a segurança jurídica na aplicação das normas, inclusive por meio de regulamentos, súmulas administrativas e respostas a consultas. (Incluído pela Lei nº 13.655, de 2018)

Parágrafo único.  Os instrumentos previstos no caput deste artigo terão caráter vinculante em relação ao órgão ou entidade a que se destinam, até ulterior revisão. (Incluído pela Lei nº 13.655, de 2018)

Ocorre que essa questão está longe de estar pacificada no âmbito do TSE, havendo decisões ora reconhecendo a natureza vinculante da resposta às consultas, ora rejeitando-a.

[...]

Não bastasse a existência de efetivo dissenso na jurisprudência do TSE quanto ao caráter vinculante das respostas às consultas, há outra questão mais evidente: por óbvio, somente as consultas respondidas pelo TSE após o advento da Lei nº 13.655/2018 seriam aptas a receber o atributo da vinculatividade.

É da natureza das normas jurídicas regularem o futuro, não o passado. Não se admite, no direito pátrio, que leis sejam editadas visando alterar a percepção do passado. (Grifos acrescidos)

Destarte, milita a favor da ausência de delimitação territorial do ato de filiação partidária o fato de (I) a própria CF não ter estabelecido qualquer vinculação entre filiação partidária e a circunscrição do cargo a que se tenciona concorrer (como o fez, por exemplo, com relação ao domicílio eleitoral), bem como o fato de (II) ser lícito ao recorrido filiar-se ao órgão partidário nacional –, o que efetivamente ocorreu, tendo em vista que Sérgio Fernando Moro se filiou junto ao Diretório Nacional do UNIÃO, na presença, inclusive, do presidente nacional da grei.

Noutras palavras: havendo alteração de domicílio, o filiado continua a ostentar tal condição de forma automática.

Assim leciona o ilustre doutrinador Rodrigo López Zilio, ao noticiar o deferimento de registro a candidata que detinha prazo mínimo de filiação, não obstante tal prazo ter sido computado levando-se em consideração diversas circunscrições municipais, justamente em deferência ao caráter nacional dos partidos políticos (Zilio, RODRIGO LÓPEZ, Direito Eleitoral, 8ª ed. rev. amp. e atual., São Paulo: Editora Juspodivm, 2022, pág. 213).

Por elucidativo, cito trecho do acórdão regional (ID 158294985):

Dessa forma, apesar de ter sido, ao que tudo indica, preenchida e assinada no Município de São Paulo, para onde o impugnado havia solicitado a transferência de sua inscrição eleitoral, a ficha de filiação ao partido União Brasil foi firmada junto a membro-presidente do Diretório Nacional da referida agremiação, o que, por si só, afasta a alegação contida nas Impugnações de que a filiação partidária foi feita junto à circunscrição eleitoral da capital paulista.

De outra sorte, consagra, a Constituição Federal, em seu art. 17, o princípio da autonomia partidária, nos seguintes termos:

Art. 17. É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, resguardados a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais da pessoa humana e observados os seguintes preceitos:       

I - caráter nacional;

II - proibição de recebimento de recursos financeiros de entidade ou governo estrangeiros ou de subordinação a estes;

III - prestação de contas à Justiça Eleitoral;

IV - funcionamento parlamentar de acordo com a lei.

§ 1º É assegurada aos partidos políticos autonomia para definir sua estrutura interna e estabelecer regras sobre escolha, formação e duração de seus órgãos permanentes e provisórios e sobre sua organização e funcionamento e para adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligações nas eleições majoritárias, vedada a sua celebração nas eleições proporcionais, sem obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal, devendo seus estatutos estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária.

(...)

(Destaquei)

Regulamentando o funcionamento dos partidos políticos, a Lei 9.096/95, no capítulo destinado à filiação partidária, assim dispõe:

Art. 17. Considera-se deferida, para todos os efeitos, a filiação partidária, com o atendimento das regras estatutárias do partido.

(...)

Art. 19.  Deferido internamente o pedido de filiação, o partido político, por seus órgãos de direção municipais, regionais ou nacional, deverá inserir os dados do filiado no sistema eletrônico da Justiça Eleitoral, que automaticamente enviará aos juízes eleitorais, para arquivamento, publicação e cumprimento dos prazos de filiação partidária para efeito de candidatura a cargos eletivos, a relação dos nomes de todos os seus filiados, da qual constará a data de filiação, o número dos títulos eleitorais e das seções em que estão inscritos.

(Destaquei)

Disciplinando a matéria, o Estatuto do partido União Brasil, disponível em https://uniaobrasil.org.br/wp-content/uploads/2022/04/Uniao-Brasil-Estatuto-aprovado-em-Convencao-do-dia-06-de-outubro-1.pdf, assim prevê:

Art. 6º. A filiação far-se-á:

I - perante a Comissão Executiva Nacional ou as Comissões Executivas Estaduais, ou diretamente junto as Comissões Executivas Municipais em que o filiado for eleitor, observados os seguintes procedimentos;

a) será emitida ficha em 03 (três) vias se a filiação se fizer junto à Comissão Executiva Nacional; nessa hipótese, este órgão arquivará a primeira via e remeterá as demais à Comissão Executiva Estadual correspondente, que ficará com a segunda via para seus arquivos e encaminhará a terceira via à Comissão Executiva Municipal responsável pela efetivação, ou não, do pedido de filiação junto ao cartório eleitoral competente;

b) será emitida ficha em 02 (duas) vias se a filiação se fizer junto à Comissão Executiva Estadual; nessa hipótese, este órgão Estadual arquivará a primeira via e remeterá a segunda à Comissão Executiva Municipal responsável pela efetivação, ou não, do pedido de filiação junto ao cartório eleitoral competente;

c) será emitida ficha em 01 (uma) via se a filiação se fizer junto à Comissão Executiva Municipal, ficando esta responsável pela efetivação, ou não, do pedido de filiação junto ao cartório eleitoral competente.

II - via internet, através de sítio eletrônico ou aplicativo do Partido, cujo procedimento deverá ser regulado por meio de Resolução da Comissão Executiva Nacional.

(Destaquei)

Não bastassem as previsões acima, a Resolução TSE 23.596/2019, que “dispõe sobre a filiação partidária, institui o Sistema de Filiação Partidária (FILIA), disciplina o encaminhamento de dados pelos partidos políticos à Justiça Eleitoral e dá outras providências”, prevê expressamente que:

Art. 3º A filiação partidária poderá ser requerida a qualquer órgão partidário, observadas as regras do estatuto do partido político.

§ 1º Consideram-se órgãos partidários, para fins desta resolução, os constituídos nos âmbitos nacional, estadual ou regional e municipal ou zonal;

(...)

(Destaquei)

Dessa forma, é possível ver claramente que o impugnado requereu sua filiação partidária junto ao Diretório Nacional do partido União Brasil, como lhe é facultado pela lei e pelo estatuto da agremiação, sendo acolhido seu pedido pela grei partidária.

Por expressa previsão legal, insculpida tanto na lei eleitoral (art. 19 da Lei 9.096/95) quanto na Resolução do Tribunal Superior Eleitoral que regulamenta os procedimentos para anotações de filiação partidária no sistema FILIA (art. 4º, §§ 1º e 2º, e art. 11, ambos da Resolução TSE 23.596/19), inserida a filiação no sistema da Justiça Eleitoral por qualquer de seus usuários habilitados, são automaticamente informados ao juízo eleitoral da inscrição do interessado os dados necessários, para fins de “arquivamento, publicação e cumprimento dos prazos de filiação partidária para efeito de candidatura a cargos eletivos”.

Por óbvio, tal comunicação é feita eletronicamente e corresponde ao registro digital, nos assentamentos da Justiça Eleitoral, dos dados da filiação ocorrida.

Pelas normas de organização administrativa da Justiça Eleitoral, incumbe à Zona Eleitoral em que inscrito o filiado o controle inicial da filiação, ainda que tenha sido esta inserida no sistema por usuário integrante dos Diretórios Nacional ou Estadual da agremiação partidária.

Por essa razão, nas certidões constantes dos ids.  43029459, 43050661 e 43056927, emitidas de forma automática por meio de acesso público ao sistema FILIA, anteriormente à reversão da inscrição eleitoral do impugnado ao Paraná, constam como “UF” e “Município”, respectivamente, SP e São Paulo, ao passo em que as certidões de ids. 43030726, 43050664, 43050660 e 43056928, emitidas posteriormente à reversão da inscrição eleitoral, trazem, nos mesmos campos, as informações de “PR” e “Curitiba”.

Tais anotações não se referem à circunscrição em que realizada ou válida a filiação partidária, mas sim à localização da inscrição eleitoral (domicílio) do filiado.

É a conclusão que decorre da leitura do art. 31 da Resolução TSE 23.596/19:

Art. 31. A transferência de domicílio eleitoral do eleitor filiado será informada pelo FILIA aos administradores nacionais, estaduais/regionais e municipais/zonais de origem e de destino cadastrados no sistema.

Parágrafo único. O nome do filiado comporá, automaticamente, o registro oficial de filiados do partido no novo município/zona.

Conforme asseverado anteriormente, embora não tenha, na verdade, havido transferência de domicílio do impugnado, para o sistema FILIA qualquer movimentação de inscrição entre uma zona eleitoral e outra é tratada da mesma maneira.

Feita essa explicação – à luz dos dispositivos constitucionais, legais e resolutivos que regulam a matéria –, é forçosa a constatação de que não prospera o argumento do recorrente de que o regime jurídico da Lei nº 9.096/1995 impõe que a vinculação da filiação se dê, necessariamente, junto ao órgão partidário correspondente a seu domicílio eleitoral.

Em tempo, com relação à incidência da causa de inelegibilidade prevista na alínea q, da LC nº 64/1990, melhor sorte não socorre a parte.

Como se sabe, as normas delineadas na Lei de Inelegibilidade, por serem de ordem restritiva, também devem ser interpretadas restritivamente, sob pena de se incorrer em indevida analogia, desnaturando o comando legal.

Aliás, é iterativa a jurisprudência deste Tribunal Superior nesse sentido:

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. DESINCOMPATIBILIZAÇÃO. AUSÊNCIA DE VÍNCULO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 30 DO TSE. DESPROVIMENTO.

1. A existência de contrato privado com permissionário de serviço público de transporte de pessoas, no caso, motorista auxiliar em táxi, não constitui hipótese de necessária desincompatibilização. As causas de inelegibilidade devem ser interpretadas restritivamente. Incidência da Súmula 30 do TSE.

2. Agravo Regimental desprovido.

(AgR-REspEl nº 0600476-43/MG, rel. Min. Alexandre de Moraes, PSESS de 4.12.2020)

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RCED. CARGO DE VICE–PREFEITO. SUPOSTA INELEGIBILIDADE CONSTITUCIONAL. IMPROCEDÊNCIA NA INSTÂNCIA ORDINÁRIA. MERA SUBSTITUIÇÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO DE INELEGIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. REELEIÇÃO PARA O MESMO CARGO. DESNECESSIDADE DE DESINCOMPATIBILIZAÇÃO. DECISÃO DA CORTE LOCAL AMPARADA  NA  JURISPRUDÊNCIA  DO  TSE.  ÓBICE  SUMULAR Nº 30 DO TSE. AGRAVO NÃO CONHECIDO.

[...]

2. A Corte local julgou improcedente o pedido formulado na inicial, porquanto a assunção da vice–prefeita ao cargo de chefe do Poder Executivo ocorreu a título precário, sendo caso de mera substituição, e não de sucessão, não configurando, portanto, hipótese de inelegibilidade constitucional, a qual deve ser interpretada restritivamente. Destacou, ainda, que, para concorrer ao mesmo cargo (vice–prefeito), não é necessária a desincompatibilização.

3. "[...] as inelegibilidades devem ser interpretadas restritivamente, a fim de que não alcancem situações não expressamente previstas pela norma" (REspe nº 192–57/AL, rel. Min. Luís Roberto Barroso, julgado em 13.6.2019, DJe 12.8.2019), abrangendo a regra prevista no § 6º do art. 14 da Constituição Federal apenas o titular do cargo do Poder Executivo.

[...]

6. Agravo em recurso especial não conhecido.

(AgR-AREspE nº 0601051-90/PR, rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 2.9.2022, DJe de 26.9.2022)

No ponto, por pertinente, confira-se o teor do dispositivo de inelegibilidade:

Art. 1º São inelegíveis:

[...]

I - para qualquer cargo:

[...]

q) os magistrados [...] que forem aposentados compulsoriamente por decisão sancionatória, que tenham perdido o cargo por sentença ou que tenham pedido exoneração ou aposentadoria voluntária na pendência de processo administrativo disciplinar, pelo prazo de 8 (oito) anos; (Grifos acrescidos)

Argumenta-se a incidência da predita causa de inelegibilidade em atenção ao incontroverso pedido de exoneração da magistratura federal formulado pelo recorrido em 19.11.2018, conforme Ato nº 428 da Presidência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, ainda no curso de pretensos expedientes disciplinares instaurados no CNJ.

Tais expedientes, conforme anotado pelo Tribunal local, correram sob a forma de Pedido de Providências e de Reclamação Disciplinar, parte dos quais, todavia, foram ulteriormente arquivados por força do pedido de exoneração do impugnado.

No ponto, no entanto, adianto que perfilho o mesmo entendimento sufragado pelo Tribunal de origem, por considerar que “não é qualquer espécie de procedimento disciplinar que leva à aplicação de penalidades ao magistrado” (ID 158294958).

A meu sentir, a mens legis do dispositivo tido por impugnado imbrica-se com a noção de alijar da vida política membro do Poder Judiciário que, ardilosamente, procura evadir-se do desfecho de processo administrativo que objetiva perquirir eventual falta funcional.

Destaca-se, no entanto, não ser esse o caso dos autos. E assim compreendo com esteio em duas razões principais.

A primeira, porquanto inexiste em desfavor do impugnado o expediente próprio denominado de Processo Administrativo Disciplinar – elementar da causa de inelegibilidade prevista na alínea Q. Conforme noticiado pelo próprio recorrente, o que se tem é tão somente a existência de procedimentos destituídos de caráter penalizante, por serem, no máximo, de eventual ordem preparatória.

Perfilhar o entendimento do recorrente para se concluir pela restrição do jus honorum do impugnado implicaria, necessariamente, anuir com a possibilidade de que todo e qualquer protocolo de petição noticiando pretenso desvalor funcional de agente público tenha aptidão suficiente para obstar seu direito de concorrer a cargo eletivo, o que, com todas as vênias, considero não ser um raciocínio acertado.

Há de se ter justa causa apta a deflagrar expediente de cunho penalizante, um mínimo de suporte indiciário - o que não se extrai dos autos.

O mero inconformismo ou desavença diretamente derivados da estrita atuação jurisdicional, notadamente na possibilidade de serem motivados por paixões e interesses extra-jurídicos, não podem, a meu sentir, ter o condão de atrair a predita causa restritiva, sob pena de grave desvirtuamento do comando legal.

Da própria literalidade do dispositivo tido por violado (art. 1º, I, q, da LC nº 64/1990), extrai-se que, para que se configure o impedimento temporário da capacidade eleitoral passiva, faz-se necessária a pendência de conclusão de processo administrativo disciplinar – espécie de expediente com condão propriamente punitivo e, por isso, instruído com atenção aos princípios do contraditório e ampla defesa – não à toa, o eleito pelo legislador para obstar pretensões eleitorais de maus agentes públicos.

Por elucidativo, cita-se trecho do acórdão regional, que bem analisou a natureza dos expedientes instaurados no CNJ (ID 158294985):

Em 2011, o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução 135, que “dispõe sobre a uniformização de normas relativas ao procedimento administrativo disciplinar aplicável aos magistrados, acerca do rito e das penalidades, e dá outras providências”. Dentre suas disposições, destacam-se:

Art. 13. O processo administrativo disciplinar poderá ter início, em qualquer caso, por determinação do Conselho Nacional de Justiça, acolhendo proposta do Corregedor Nacional ou deliberação do seu Plenário, ou por determinação do Pleno ou Órgão Especial, mediante proposta do Corregedor, no caso de magistrado, de primeiro grau, ou ainda por proposta do Presidente do Tribunal respectivo, nas demais ocorrências.

(...)

§ 5º Determinada a instauração do processo administrativo disciplinar, pela maioria absoluta dos membros do Tribunal ou do respectivo Órgão Especial, o respectivo acórdão será acompanhado de portaria que conterá a imputação dos fatos e a delimitação do teor da acusação, assinada pelo Presidente do Órgão.

(...)

Art. 21. A punição ao magistrado somente será imposta pelo voto da maioria absoluta dos membros do Tribunal ou do Órgão Especial.

Vê-se claramente, portanto, que não é qualquer espécie de procedimento disciplinar que leva à aplicação de penalidades ao magistrado. A norma insculpida no art. 21 da Resolução CNJ 135/11, aliás, é clara ao exigir o voto da maioria absoluta dos membros do Tribunal Pleno ou de seu Órgão Especial para tanto. O mesmo quórum qualificado é exigido para a instauração do próprio processo administrativo disciplinar (art. 13, § 5º).

Desnecessário dizer, mas tais garantias visam resguardar a atividade jurisdicional de interferências indevidas e casuísticas, legando ao órgão colegiado, pela maioria absoluta de sua composição, a decisão sobre a punição de juízes.

[...]

Não se coaduna com o Estado Democrático de Direito, portanto, qualquer interpretação que leve à conclusão de que a simples existência de um procedimento administrativo disciplinar genérico seja capaz de restringir direitos políticos, sendo incabível a ampliação interpretativa da regra para alcançar hipóteses ou situações não descritas no comando legal.

Conforme já anotado, na interpretação de norma de caráter restritivo, que limita o ius honorum de quem pretende concorrer a cargos eletivos, deve o intérprete reverenciar o método da interpretação estrita, garantindo a máxima efetividade ao direito fundamental regulamentado pelo legislador

[...]

Conclui-se, pois, que Processo Administrativo Disciplinar, para fins de atração da inelegibilidade descrita na mencionada alínea “q”, é aquele instaurado para apuração de descumprimento de dever funcional, submetido ao devido processo legal, em que sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa, e do qual possa resultar aplicação de penalidade administrativa legalmente prevista, pelo órgão competente.

Dessa forma, em relação aos expedientes em trâmite perante o CNJ, somente a existência do processo administrativo disciplinar descrito na Seção V (arts. 73 a 77) da Resolução CNJ 67/09 está apto a tornar inelegível magistrado que, após sua instauração, na forma do art. 13, § 5º, da Resolução CNJ 135/11, vier a pedir exoneração do cargo ou aposentadoria voluntária.

Não é o caso do impugnado.

Segundo consta dos autos, contra si tramitavam, ao tempo de sua exoneração, somente Reclamações Disciplinares, que, a teor do contido na Seção IV (arts. 67-72) do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, não se prestam a aplicar penalidade administrativa ao magistrado, servindo somente de instrumento investigativo, iniciado por mera representação de cidadão, e que, ao seu final, podem culminar na proposta, pelo Corregedor Nacional de Justiça, de instauração - aí sim - de processo administrativo disciplinar, pelo voto da maioria absoluta dos membros do Conselho.

Por essa razão, a certidão de id. 43025845, expedida pelo Conselho Nacional de Justiça, é hígida, asseverando a inexistência de “procedimento autuado sob a classe processo administrativo disciplinar (PAD), previsto nos artigos 73 a 77 do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, em desfavor de Sergio Fernando Moro até 16 de novembro de 2018”. (Grifos acrescidos)

A segunda razão é de ordem externa. Rememore-se que, conforme destacado no próprio Código de Processo Civil (art. 374, I), independem de provas os fatos públicos e notórios. Nesse norte, é de conhecimento geral que a razão pela qual optou o recorrido por seu afastamento definitivo da atividade jurisdicional foi de caráter eminentemente político (e não de cunho funcional-disciplinar), a fim de poder se dedicar a futuro cargo público no Executivo Federal.

Isso porque o recorrido foi convidado pelo então recém-eleito Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, a exercer cargo na equipe de transição, a fim de, ulteriormente, assumir o cargo de Ministro da Justiça e Segurança Pública.

Tal fato foi amplamente divulgado em diversos meios de comunicação. Exemplificativamente:

https://g1.globo.com/pr/parana/noticia/2018/11/16/presidente-do-trf-4-assina-exoneracao-de-sergio-moro.ghtml

https://www.trf4.jus.br/trf4/controlador.php?acao=noticia_visualizar&id_noticia=14081

https://www.conjur.com.br/2018-nov-16/sergio-moro-pedido-exoneracao-expedido-trf

https://brasil.elpais.com/brasil/2018/11/16/politica/1542391199_486982.html

Ao contrário do sustentado pelo recorrente, há, sim, de se privilegiar a interpretação mais restritiva ao comando de inelegibilidade, sob pena de se ampliar indevidamente seu espectro de incidência, sendo, por conseguinte, descabido cravar a “[...] ausência de mínima aptidão ética e moral do recorrido para o exercício de um cargo eletivo [...]”  (ID 158295047, fl. 45).

Dessa forma, à míngua de “procedimento autuado sob a classe processo administrativo disciplinar (PAD), previsto nos artigos 73 a 77 do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, e m  desfavor  de  Sergio  Fernando  Moro até 16 de novembro de 2018” (ID 158294985), não há falar na incidência da inelegibilidade delineada  no  art. 1º, I, q,  da  LC nº 64/1990.

Com relação ao pedido subsidiário de aplicação do princípio da anualidade (art. 16 da CF), inviável seu acolhimento, seja porque a matéria de fundo é aqui analisada pela primeira vez (EDs-REspE nº 0601193-81/AP. rel. Min. Sérgio Silveira Banhos), seja porque as antigas consultas administrativas não se prestam como precedentes, não havendo falar, portanto, em overruling (RO nº 0601236-07/DF, rel. designado Min. Edson Fachin).

Assim, por reputar que Sérgio Fernando Moro preencheu satisfatoriamente as condições  de  elegibilidade  de (I) domicílio eleitoral e de (II) filiação partidária, exigidas pelas legislações constitucional e legal, bem como não incidiu na causa de inelegibilidade prevista no art. 1º, I, q, da LC nº 64/1990, tenho por acertada a conclusão regional que deferiu seu registro de candidatura, devendo o acórdão recorrido, por isso, ser mantido por seus próprios e escorreitos fundamentos.

Ante o exposto, nega-se provimento ao recurso ordinário interposto pela Federação Brasil da Esperança e ao recurso especial recurso especial interposto por Thiago de Sousa Bagatin, ao tempo em que não se conhece do recurso interposto pelo Partido da Mobilização Nacional (PMN) – Estadual, ante a ocorrência de erro grosseiro.

É como voto.

 

 

EXTRATO DA ATA

 

 

REspEl nº 0600957-30.2022.6.16.0000/PR. Relator: Ministro Raul Araújo. Recorrente: Thiago de Sousa Bagatin (Advogada: Ana Vitória Silveira Ribeiro – OAB: 101600/PR). Recorrente: Partido da Mobilização Nacional (PMN) – Estadual (Advogada: Juliana Bertholdi – OAB: 75052/PR). Recorrente: Federação Brasil da Esperança (FE BRASIL) – Estadual/PR (Advogados: Luiz Eduardo Peccinin – OAB: 58101/PR e outros). Recorrido: Sérgio Fernando Moro (Advogados: Gustavo Bonini Guedes – OAB: 41756/PR e outros).

Usaram da palavra, pela recorrente Federação Brasil da Esperança (FE BRASIL) Estadual, o Dr. Luiz Eduardo Peccinin, pelo recorrente Partido da Mobilização Nacional (PMN) Estadual, a Dra. Juliana Bertholdi, e, pelo recorrido Sérgio Fernando Moro, o Dr. Gustavo Bonini Guedes.

Decisão: Preliminarmente, o Tribunal, por unanimidade, indeferiu o pedido de ingresso nos autos, como amicus curiae, formulado por terceiro interessado, e no mérito, negou provimento ao recurso ordinário interposto pela Federação Brasil da Esperança e ao recurso especial interposto por Thiago de Sousa Bagatin, e não conheceu do recurso ordinário interposto pelo Partido da Mobilização Nacional (PMN) Estadual, nos termos do voto do relator. 

Acórdão publicado em sessão.

Composição: Ministros Alexandre de Moraes (presidente), Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.

Vice-Procurador-Geral Eleitoral: Paulo Gustavo Gonet Branco. 

SESSÃO DE 15.12.2022.