index: REPRESENTAÇÃO (11541)-0601469-57.2022.6.00.0000-[Cargo - Presidente da República, Propaganda Política - Propaganda Eleitoral - Divulgação de Notícia Sabidamente Falsa, Propaganda Política - Propaganda Eleitoral - Redes Sociais]-DISTRITO FEDERAL-BRASÍLIA

Brasão da República
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

 

REPRESENTAÇÃO (11541)  Nº 0601469-57.2022.6.00.0000 (PJe) - BRASÍLIA - DISTRITO FEDERAL

 

Relator: Ministro Paulo de Tarso Vieira Sanseverino

Representante: Coligação Brasil da Esperança

Advogados(as): Eugênio José Guilherme de Aragão e outros(as)

Representados: Carlos Nantes Bolsonaro e outros

 

DECISÃO

 

Trata-se de representação, com pedido liminar, ajuizada pela Coligação Brasil da Esperança em desfavor de Carlos Nantes Bolsonaro e outros, por suposta divulgação de conteúdo manifestamente inverídico e descontextualizado em prejuízo à honra e à imagem do candidato Luiz Inácio Lula da Silva.

 

Na petição inicial, a representante alega, em síntese, que (ID 158236810): 

 

a) os representados alteraram a legenda de vídeo original que traduzia a fala do candidato Lula, trocando o vocábulo asfalto por assalto, a fim de propagar na Internet a falsa informação de que o ex-presidente defende a ideia de que a população merece ser assaltada – enquanto, originalmente, a fala fazia alusão à necessidade de asfalto para a população que não tem acesso a veículos automotores (p. 5 e 18);

 

b) nos dias 10 e 11.10.2022, os representados propagaram a referida fake news, demonstrando “verdadeira rede articulada” em apoio ao bolsonarismo;

 

c) “Flávio Bolsonaro publicou em seu Twitter, Instagram e Facebook que ‘o ladrão’ relativizava assaltos, defendia o aborto e achava normal jovens roubarem celulares para comprar bebidas alcoólicas” (p. 7). Nesse sentido, republicou o vídeo impugnado – com mais de 86.000 curtidas no Instagram e 3.700 interações no Twitter;

 

d) os demais representados replicaram o vídeo descontextualizado com comentários desinformadores, com alto índice de alcance na Internet;

 

e) as publicações contrariam os arts. 9º-A, 22, inciso X, e 27 da Res.-TSE nº 23.610/2019.

 

Requer a tutela provisória de urgência para que: i) seja determinada a realização de diligências para identificação dos responsáveis pelos perfis de rede social indicados na petição inicial; ii) seja imposta aos representados e às redes sociais Twitter, Instagram, Facebook, TikTok e Kwai a remoção das publicações impugnadas, sob pena de multa; iii) os representados sejam proibidos de divulgar novas publicações com idêntico teor; iv) os autos sejam encaminhados ao Ministério Público Eleitoral para apuração da responsabilidade penal, abuso de poder e uso indevido dos meios de comunicação.

 

Ao final, postula a procedência da representação a fim de que, com a confirmação da tutela provisória, as publicações sejam removidas, os representados sejam proibidos de veicular os conteúdos inverídicos impugnados, bem como sejam condenados ao pagamento de multa.

 

É o relatório. Decido.   

 

A representante pretende, em sede de tutela provisória de urgência, a imediata remoção de publicações realizadas pelos representados em perfis de redes sociais por divulgação de fatos manifestamente inverídicos e gravemente descontextualizados, sugerindo que o candidato Luiz Inácio Lula da Silva apoiaria ou consentiria com práticas criminosas.

 

Analiso a tutela provisória de urgência para deferi-la em parte.

 

Para a concessão de tutelas provisórias de urgência, é indispensável a presença concomitante da plausibilidade do direito alegado (fumus boni iuris) e do perigo na demora da prestação jurisdicional (periculum in mora).

 

O preceito normativo previsto no art. 27, § 1º, da Res.-TSE nº 23.610/2019 estabelece que “a livre manifestação do pensamento de pessoa eleitora identificada ou identificável na internet somente é passível de limitação quando ofender a honra ou a imagem de candidatas, candidatos, partidos, federações ou coligações, ou divulgar fatos sabidamente inverídicos, observado o disposto no art. 9º-A desta Resolução(destaquei).

 

Afirma a doutrina de Diogo Rais (apud Zilio, 2022, p. 497), que fake news abrangeum conteúdo falso em um contexto verdadeiro, ou conteúdo verdadeiro em um contexto falso, mas que seja capaz de gerar algum dano efetivo ou potencial em busca de alguma vantagem”.

 

Na hipótese dos autos, em análise superficial, típica dos provimentos cautelares, verifica-se que as publicações impugnadas transmitem desinformação e sugerem situações gravemente descontextualizadas, prejudiciais à integridade do próprio processo eleitoral, bem como à honra e à imagem de candidato ao cargo de presidente da República.

 

A plausibilidade jurídica do argumento de que o vídeo impugnado contém desinformação e traz conteúdo gravemente descontextualizado é embasada na verificação do vídeo original, hospedado no endereço https://www.youtube.com/watch?v=C7Im8oh3Vwg e colacionado na inicial. Verifica-se que, na fala original, Lula estava discursando sobre a necessidade de diálogo com entes federados e municipais, caso eleito. No meio do seu discurso fez o seguinte comentário (ID 158236810, p. 6):

Muitas coisas que você faz é para uma pequena parte da cidade. Uma grande rodovia é muito importante para quem tem carro. E para o povo que anda a pé? Será que um asfaltozinho na rua que ele mora não é melhor, não é imprescindível? Eu tenho dito que, se ganhando as eleições, na primeira semana, eu quero convocar uma reunião de governadores eleitos para que a gente discuta a relação entre os entes federados e depois convocar uma com os prefeitos das cidades, porque não é possível imaginar um presidente governar um país sem conversar com governadores. (destaquei)

 Como se vislumbra, os representados se aproveitam de um fato verídico – trecho de um discurso de campanha sobre a necessidade de diálogo com entes federados e municipais – a fim de descontextualizá-lo ao alterar a palavra “asfaltozinho” para “assaltozinho” e disseminar na Internet a sugestão de que o candidato Luiz Inácio Lula da Silva apoiaria ou consentiria com práticas criminosas.

 

Portanto, evidenciada a plausibilidade do direito, diante da veiculação de informação sabidamente falsa ou descontextualizada, de modo que a jurisprudência deste Tribunal Superior adota a orientação de que, embora seja reconhecido que a livre circulação de pensamentos, opiniões e críticas fortalece o Estado Democrático de Direito e a democratização do debate eleitoral, a intervenção desta Justiça especializada é permitida para “coibir práticas abusivas ou divulgação de notícias falsas, de modo a proteger a honra dos candidatos e garantir o livre exercício do voto” (AgR-REspEl no 0600396-74/SE, rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 21.3.2022 – destaquei).

 

Ademais, o perigo na demora da prestação jurisdicional também foi suficientemente demonstrado, pois, como afirmado na petição inicial, as publicações foram divulgadas no período crítico do processo eleitoral, em perfis com alto número de seguidores, de forma a gerar elevado número de visualizações, o que possibilita, em tese, a ocorrência de repercussão negativa de difícil reparação à integridade do processo eleitoral, que se encontra submetido ao segundo turno de votação, e à imagem do candidato atingido.

 

Assim, nesse juízo perfunctório, o pedido cautelar de suspensão das publicações em perfis de redes sociais deve ser deferido, encontrando amparo no art. 30, § 2º, da Res.-TSE nº 23.610/2019. 

 

Ante o exposto, DEFIRO PARCIALMENTE o pedido de tutela de urgência para determinar que as empresas provedoras de aplicação Twitter, Instagram, Facebook, TikTok e Kwai removam as publicações localizadas nas URLs indicadas às páginas 28 e 29 da petição inicial (ID 158236810), no prazo de 24 horas, sob pena de incidência de multa diária, no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), em caso de descumprimento.

 

Outrossim, indefiro o pedido de diligências em relação aos perfis não identificados. As representações possuem rito célere e a identificação do usuário ofensor é matéria destinada ao momento da propositura da ação. Nesse sentido: AgR-AC nº 1384-43/DF, rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJe de 17.8.2010; Rp nº 0601686-42/DF, rel. Min. Edson Fachin, DJe de 3.11.2020.

 

Considerando que, nos termos dos arts. 9º e 9º-A da Res.-TSE nº 23.610/2019, a divulgação de fatos sabidamente inverídicos ou gravemente descontextualizados pode ensejar a apuração de responsabilidade penal, abuso de poder e uso indevido dos meios de comunicação, NOTIFIQUE-SE o Ministério Público Eleitoral para que, tomando conhecimento dos fatos citados na inicial, proceda como entender de direito.

 

Citem-se os representados adequadamente identificados para que, querendo, apresentem defesa no prazo legal de 2 (dois) dias, nos termos do art. 18 da Res.-TSE nº 23.608/2019.

 

Após o transcurso do prazo, com ou sem resposta, intime-se o Ministério Público Eleitoral (MPE) para manifestação, no prazo de 01 (um) dia, com posterior e imediata nova conclusão a esta relatoria.

 

Publique-se.

 

Brasília, 15 de outubro de 2022.

 
Ministro PAULO DE TARSO VIEIRA SANSEVERINO
Relator