TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

ACÓRDÃO

RECURSO ESPECIAL ELEITORAL  Nº 0605310-76.2018.6.26.0000 – SÃO PAULO – SÃO PAULO
 

Relator: Ministro Sérgio Banhos

Recorrente: Google Brasil Internet Ltda.

Advogados: Eduardo Mendonça – OAB: 130532/RJ e outros

Recorrente: Coligação São Paulo do Trabalho e de Oportunidades

Advogados: Marcelo Santiago de Pádua Andrade – OAB: 182596/SP e outros

Recorrente: Jilmar Augustinho Tatto

Advogados: Jéssica Guedes Santos – OAB: 57719/DF e outros

Recorrida: Coligação AceleraSP 

Advogados: Tatiane de Oliveira Flores – OAB: 346230/SP e outros

 

ELEIÇÕES 2018. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL. ART. 57-C, § 3º, DA LEI 9.504/97. IMPULSIONAMENTO DE CONTEÚDOS. LINK PATROCINADO. PRIORIZAÇÃO PAGA. APLICAÇÃO DE BUSCA NA INTERNET. CANDIDATO ADVERSÁRIO. NOME. UTILIZAÇÃO. PALAVRA-CHAVE. FERRAMENTA GOOGLE ADS.

SÍNTESE DO CASO

1. Trata-se de recursos especiais interpostos em face de acórdão regional que, por unanimidade, rejeitou as questões preliminares e, por maioria, deu parcial provimento ao apelo apresentado pelos segundos recorrentes, a fim de reformar, em parte, decisão do juiz auxiliar que julgou procedente representação ajuizada em seu desfavor, apenas para reduzir para R$ 10.000,00 o valor da multa aplicada, mantido o reconhecimento da prática de propaganda eleitoral irregular na internet, consistente no impulsionamento de conteúdo com infração ao disposto no art. 57-C, § 3º, da Lei 9.504/97.

QUESTÕES PRÉVIAS

2. Não há falar em ilegitimidade ativa na espécie, pois o art. 96 da Lei 9.504/97 confere às coligações partidárias a legitimidade para a propositura de representações relativas ao descumprimento do citado diploma legal, inclusive no que se refere às normas que versam sobre propaganda eleitoral irregular.

3. O interesse jurídico da coligação autora é evidente, pois a representação ajuizada por ela não versa sobre direito de personalidade em específico, mas, sim, visa a impedir o uso do nome do seu candidato a senador como palavra-chave de mecanismo de impulsionamento pago de propaganda eleitoral de outro candidato na internet, em suposto prejuízo à sua campanha, com pedido de imposição da multa prevista no art. 57-C, § 2º, da Lei das Eleições.

MÉRITO

4. O Tribunal de origem reconheceu que o impulsionamento de propaganda eleitoral contratado pelo candidato recorrente cumpriu os requisitos formais estabelecidos no art. 57-C da Lei 9.504/97, mas assentou a ilicitude da conduta por vislumbrar a ocorrência de abuso de direito, tendo em vista o uso do nome de candidato adversário como palavra-chave de mecanismo de priorização paga de conteúdos em aplicação de busca na internet (link patrocinado), o que configuraria a intenção de, por intermédio de ferramenta lícita, captar ilicitamente eleitores interessados em informações alusivas ao candidato oponente, causando-lhe prejuízo no que tange ao alcance e à repercussão da sua propaganda eleitoral.

5. De acordo com o acórdão regional, a pesquisa efetuada na plataforma de busca Google com o nome de candidato adversário na disputa para o cargo de senador apresentava, no topo da primeira página de resultado, anúncio pago alusivo ao candidato contratante do impulsionamento de conteúdos, no qual havia um link patrocinado para a sua página de propaganda eleitoral.

6. A utilização do nome de candidato adversário como palavra-chave para o fim de impulsionamento de propaganda eleitoral na modalidade de priorização paga de conteúdos em plataforma de busca na internet (links patrocinados), por si só, não infringe o disposto no art. 57-C da Lei 9.504/97.

7. Conquanto os links patrocinados sejam exibidos de forma prioritária nas listagens de resultados dos buscadores da internet, os resultados orgânicos (não patrocinados) também são apresentados ao usuário na lista de achados da pesquisa. Tal compreensão é corroborada pelo voto do relator na Corte de origem, no qual ficou consignado que, em pesquisa efetuada no Google, o anúncio pago e questionado nos autos apareceu no topo da primeira página de resultados, além de diversos itens atinentes ao candidato adversário cujo nome foi utilizado como palavra-chave do mecanismo de priorização paga de conteúdo.

8. É insubsistente o fundamento do acórdão recorrido de que o anúncio patrocinado, no caso dos autos, teria aptidão para prejudicar o candidato cujo nome foi utilizado como palavra-chave para o fim de priorização paga de conteúdos. Isso porque, a despeito do destaque conferido ao link patrocinado e como se infere do acórdão regional, os resultados orgânicos que diziam respeito ao candidato adversário foram exibidos na listagem de achados da pesquisa, de forma que o eleitor tinha plena liberdade para clicar ou não no resultado patrocinado, assim como para acessar qualquer outra página entre as listadas no resultado da pesquisa, não havendo, no acórdão recorrido, elementos que permitam cogitar eventual omissão de resultados referentes ao citado candidato nem mesmo hipotético redirecionamento automático para a página de campanha do contratante do impulsionamento de conteúdo.

9. O Tribunal Superior Eleitoral, em diversas ocasiões, reafirmou o entendimento de que o art. 242 do Código Eleitoral deve ser interpretado com a cautela necessária, tendo em vista o contexto histórico autoritário no qual foi editado e a circunstância de que a função da propaganda eleitoral é, precisamente, gerar estados mentais, emocionais ou passionais nos seus destinatários. De qualquer sorte, tal dispositivo legal não tem aplicabilidade no caso em exame, tendo em vista que:

a) conforme reconhecido no acórdão recorrido, o link patrocinado cumpriu os requisitos formais previstos na legislação de regência, entre os quais a identificação inequívoca como anúncio pago e como propaganda eleitoral, o que enfraquece a tese de que teria havido captação da atenção do eleitor de forma artificial e sem o seu conhecimento prévio;

b) o aresto regional não explicita em que consistiria o estado mental que teria sido criado no eleitor em virtude do impulsionamento questionado, tampouco há no acórdão elementos que permitam vislumbrar a capacidade de mero link patrocinado para gerar estados mentais, emocionais ou passionais no eleitor.

10. A utilização do nome de candidato adversário como palavra-chave de mecanismo de priorização paga de resultados em aplicações de busca na internet não se enquadra no disposto no art. 248 do Código Eleitoral, segundo o qual “ninguém poderá impedir a propaganda eleitoral, nem inutilizar, alterar ou perturbar os meios lícitos nela empregados”. Com efeito, apenas ao acessar algum dos resultados orgânicos da busca é que se poderia falar em eventual acesso a propaganda eleitoral de candidato, caso existente na página acessada. Até então, o que se tem disponível são meios de acesso a páginas que contenham informações sobre determinada pessoa, seja ela candidato ou não, sejam os dados referentes ao pleito ou não. Ademais, cabe reiterar que a exibição, em destaque, de link patrocinado e identificado como tal não tem o condão de interferir nos resultados não patrocinados, inclusive os que possam conter propaganda eleitoral, os quais continuam visíveis na listagem de achados da pesquisa apresentada pela ferramenta de busca, podendo o eleitor interessado acessar qualquer uma das páginas disponíveis.

11. A regra, em regime democrático, é a livre circulação de ideias, assegurando-se ao eleitor o pleno direito de se informar sobre as campanhas eleitorais. Sob essa perspectiva, a apresentação de alternativas ao eleitor, a fim de que ele, se assim desejar, conheça outro candidato não pode ser vista, por via de regra, como forma de prejudicar a campanha eleitoral de outros candidatos, mas, sim, como maneira de ampliar o debate político e embasar a escolha consciente do eleitor.

12. Não obstante o impulsionamento de conteúdos seja, em caráter excepcional, permitido pelo art. 57-C da Lei 9.504/97, inclusive na hipótese de utilização do nome de candidato adversário como palavra-chave de mecanismo ou serviço de priorização paga de resultados em aplicações de busca na internet, cumpre advertir que o eventual desvirtuamento da referida ferramenta, em detrimento da isonomia entre os candidatos, poderá caracterizar, além de propaganda eleitoral irregular, abuso do poder econômico, apurado e punido na forma do art. 22 da Lei Complementar 64/90.

CONCLUSÃO

Recursos especiais a que se dá provimento.

 

Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por maioria, em dar provimento aos recursos especiais eleitorais, a fim de julgar improcedente a representação e tornar insubsistente a multa aplicada, nos termos do voto do relator.

 

Brasília, 8 de outubro de 2020.

 

MINISTRO SÉRGIO BANHOS – RELATOR

 

 

RELATÓRIO

 

 

O SENHOR MINISTRO SÉRGIO BANHOS: Senhor Presidente, a sociedade empresarial Google Brasil Internet Ltda. (ID 517783, ratificado por meio do ID 517793), assim como Jilmar Augustinho Tatto e a Coligação São Paulo do Trabalho e de Oportunidades (ID 517795) interpuseram recursos especiais eleitorais em face de acórdão do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (ID 517774) que, por unanimidade, rejeitou as questões preliminares e, por maioria, deu parcial provimento ao recurso dos segundos recorrentes para reformar, em parte, a decisão individual do juiz auxiliar que julgou procedente a representação ajuizada pela Coligação Acelera SP, apenas para reduzir para R$ 10.000,00 o valor da multa aplicada pela prática  de  propaganda  eleitoral irregular na internet, consistente no impulsionamento de conteúdo com infração ao art. 57-C, § 3º, da Lei 9.504/97.

Eis a ementa do acórdão recorrido (ID 517774):

RECURSO ELEITORAL – REPRESENTAÇÃO – PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR – PROPAGANDA PAGA NA INTERNET – IMPULSIONAMENTO DE CONTEÚDO – REALIZAÇÃO DE PROPAGANDA ELEITORAL POR MEIO DE PRIORIZAÇÃO PAGA DE RESULTADOS EM MECANISMO DE BUSCA – IMPULSIONAMENTO QUE, APESAR DE CONTRATADO POR MEIO FORMALMENTE LÍCITO (GOOGLE ADS), FERE SUBSTANCIALMENTE A LEI ELEITORAL – UTILIZAÇÃO DO NOME DE ADVERSÁRIO POLÍTICO COMO PALAVRA-CHAVE PARA DIRECIONAR A PESQUISA NO MECANISMO DE BUSCA E CAPTURAR SEUS PRETENSOS ELEITORES, COM NOTÓRIA REPERCUSSÃO NEGATIVA EM SUA PROPAGANDA – CANDIDATO QUE, EM EVIDENTE ABUSO DE DIREITO, FEZ USO DE MODALIDADE LÍCITA DE PROPAGANDA PARA, POR MEIO DE UM CLARO ESTRATAGEMA, DESVIAR EM SEU PROVEITO O ESPAÇO DA CANDIDATURA ADVERSÁRIA – O IMPULSIONAMENTO, DENTRE OUTROS REQUISITOS, SOMENTE PODE SER FEITO EM BENEFÍCIO DA CANDIDATURA CONTRATANTE, VEDANDO-SE, POR CONSEQUÊNCIA, SUA UTILIZAÇÃO EM PREJUÍZO DAS CANDIDATURAS ADVERSÁRIAS – INFRINGÊNCIA AO ART. 57-C, § 3º, DA LEI DAS ELEIÇÕES – VALOR DA MULTA REDUZIDO PARA R$ 10.000,00, EM ATENÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE, E À INEXISTÊNCIA DE REINCIDÊNCIA – DECISÃO MONOCRÁTICA REFORMADA, EM PARTE, TÃO SOMENTE PARA REDUZIR A MULTA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

Opostos embargos de declaração por Jilmar Augustinho Tatto e pela Coligação São Paulo do Trabalho e de Oportunidades (ID 517780), foram eles rejeitados em acórdão assim ementado (ID 517786):

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – RECURSO ELEITORAL – REPRESENTAÇÃO – PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR – PROPAGANDA PAGA NA INTERNET – IMPULSIONAMENTO DE CONTEÚDO – REALIZAÇÃO DE PROPAGANDA ELEITORAL POR MEIO DE PRIORIZAÇÃO PAGA DE RESULTADOS EM MECANISMO DE BUSCA – IMPULSIONAMENTO QUE, APESAR DE CONTRATADO POR MEIO FORMALMENTE LÍCITO (GOOGLE ADS), FERE SUBSTANCIALMENTE A LEI ELEITORAL – UTILIZAÇÃO DO NOME DE ADVERSÁRIO POLÍTICO COMO PALAVRA-CHAVE PARA DIRECIONAR A PESQUISA NO MECANISMO DE BUSCA E CAPTURAR SEUS PRETENSOS ELEITORES, COM NOTÓRIA REPERCUSSÃO NEGATIVA EM SUA PROPAGANDA – CANDIDATO QUE, EM EVIDENTE ABUSO DE DIREITO, FEZ USO DE MODALIDADE LÍCITA DE PROPAGANDA PARA, POR MEIO DE UM CLARO ESTRATAGEMA, DESVIAR EM SEU PROVEITO O ESPAÇO DA CANDIDATURA ADVERSÁRIA – O IMPULSIONAMENTO, DENTRE OUTROS REQUISITOS, SOMENTE PODE SER FEITO EM BENEFÍCIO DA CANDIDATURA CONTRATANTE, VEDANDO-SE, POR CONSEQUÊNCIA, SUA UTILIZAÇÃO EM PREJUÍZO DAS CANDIDATURAS ADVERSÁRIAS – INFRINGÊNCIA AO ART. 57-C, § 3º, DA LEI DAS ELEIÇÕES – VALOR DA MULTA REDUZIDO PARA R$ 10.000,00, EM ATENÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE, E À INEXISTÊNCIA DE REINCIDÊNCIA – DECISÃO MONOCRÁTICA REFORMADA, EM PARTE, TÃO SOMENTE PARA REDUZIR A MULTA – RECURSO ELEITORAL PARCIALMENTE PROVIDO – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – ALEGAÇÃO DE OCORRÊNCIA DE OMISSÃO QUANTO A ARGUMENTOS SUSCITADOS PELAS PARTES – INOCORRÊNCIA DE VÍCIOS NO ACÓRDÃO – A OMISSÃO QUE ENSEJA EMBARGOS DE DECLARAÇÃO É AQUELA RELATIVA À QUESTÃO ESSENCIAL À CONCLUSÃO DO JULGADO, E NÃO AQUELA QUE REFERENTE A ARGUMENTOS DAS PARTES, OS QUAIS PODEM SER REJEITADOS IMPLICITAMENTE – QUESTÕES SUFICIENTEMENTE DECIDIDAS NO ACÓRDÃO – A ALEGADA INCOERÊNCIA ENTRE O JULGADO E ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL, OU ENTRE O JULGADO E A PROVA DOS AUTOS, NÃO É VÍCIO, MAS PRETENSÃO DE REAVALIAÇÃO DA PROVA E REDISCUSSÃO DE MATÉRIA, O QUE É INADMISSÍVEL NESTA SEDE – EVENTUAL IRRESIGNAÇÃO COM O RESULTADO DO JULGAMENTO DEVE SER VEICULADA NA VIA ADEQUADA – O PREQUESTIONAMENTO NÃO CONSISTE EM HIPÓTESE SUFICIENTE, POR SI SÓ, PARA AUTORIZAR O PROVIMENTO DOS EMBARGOS, TENDO EM VISTA A ANÁLISE SATISFATÓRIA DOS PONTOS RELEVANTES E NECESSÁRIOS PARA CHEGAR À DECISÃO DO CASO CONCRETO – EMBARGOS REJEITADOS.

O Presidente do Tribunal de origem negou seguimento aos recursos especiais (ID 517798), sobrevindo a interposição de agravos nos próprios autos (IDs 517801 e 517805).

Por decisão de 26.8.2019 (ID 14764188), dei provimento aos agravos, a fim de determinar a reautuação do feito como recurso especial.

A sociedade empresarial Google Brasil Internet Ltda. alega, em síntese, que:

a) tem interesse jurídico para interpor recurso especial, na condição de terceiro prejudicado, nos  termos  do  art. 996 do Código de Processo Civil, pois, além de ter figurado como representada nos autos e ter sido destinatária da ordem de remoção do conteúdo impugnado, o acórdão recorrido afeta a sua relação jurídica com o candidato que contratou o impulsionamento de conteúdo, por limitar a possibilidade de contratação desse serviço na sua plataforma de busca;

b) é relevante que possa apresentar argumentos jurídicos e a sua experiência em outros países, pois é a primeira vez que este Tribunal Superior analisa a questão atinente à funcionalidade do impulsionamento de conteúdo na internet;

c) não há necessidade de reexame fático-probatório, pois os fatos estão descritos no acórdão recorrido e é eminentemente jurídica a matéria recursal, qual seja, analisar se o impulsionamento de conteúdo previsto no art. 57-C da Lei 9.504/97 pode ser proibido quando direcionado a pesquisas feitas em mecanismo de busca na internet, usando o nome de outro candidato como palavra-chave;

d) o acórdão regional violou os arts. 26, § 2º, 57-B, § 3º, e 57-C, caput e § 3º, da Lei 9.504/97, pois, conquanto utilize nome de candidato adversário como palavra-chave no mecanismo de buscas na internet, o impulsionamento contratado na espécie preenche todos os requisitos legais e (i) visa à promoção da candidatura do contratante, (ii) não incorre em propaganda eleitoral negativa, pois apenas apresenta informação que permite aos eleitores comparar os candidatos, o que é inerente ao debate democrático, bem como (iii) cumpre o objetivo de atingir novos eleitores dentre aqueles que estão buscando informações sobre a eleição;

e) a propaganda impulsionada, na espécie, não tem repercussão negativa sobre a publicidade de outros candidatos, tampouco capta indevidamente eleitores, os quais não são direcionados para nenhuma página específica, tratando-se apenas de resultado de pesquisa adicional, identificado como anúncio pago, e que conserva a liberdade do eleitor de acessar ou não acessar as páginas envolvidas. Ademais, os resultados alusivos ao candidato procurado originalmente não são removidos, e outros tipos de propaganda não são afetados;

f) a propaganda impugnada nos presentes autos não afronta a higidez do processo eleitoral, nem afeta a igualdade entre os candidatos, tampouco viola a honra ou a imagem de candidato adversário;

g) o Tribunal de origem aplicou indevidamente o art. 242 do Código Eleitoral, pois tal dispositivo legal está em desacordo com a liberdade de expressão e com o regime democrático consagrados na Constituição, assim como não incide no caso, pois o impulsionamento de conteúdos impugnado nos autos é forma legítima de propaganda e não revela nenhum tipo de artifício que apele, de forma excessiva ou grosseira, a estados emocionais ou passionais do eleitor;

h) o acórdão regional violou o art. 248 do Código Eleitoral, pois o impulsionamento de conteúdos contratado não impede que o eleitor acesse as páginas do candidato objeto da pesquisa na ferramenta de busca, tampouco altera ou perturba outro meio de propaganda;

i) o Tribunal Eleitoral do México, analisando caso das eleições presidenciais de 2018, realizadas naquele país, concluiu ser lícito o impulsionamento de resultado de pesquisa na internet em que se utilize o nome de candidato adversário como palavra-chave.

Requer o conhecimento e o provimento do recurso especial, a fim de que seja reformado o acórdão regional para julgar improcedente a representação, reconhecendo-se a licitude da propaganda impulsionada com a ferramenta digital Google Ads e com uso de palavra-chave consistente no nome de outro candidato.

Por sua vez, os recorrentes Jilmar Augustinho Tatto e Coligação São Paulo do Trabalho e de Oportunidades sustentam, em síntese, que:

a) o acórdão regional contrariou os arts. 17 do Código de Processo Civil, 16 do Código Civil e 5º, X, da Constituição da República, pois a Coligação Acelera SP não tem legitimidade ativa ad causam para ajuizar a representação, nem interesse de agir para a defesa de direito de personalidade atinente ao nome do candidato a senador José Ricardo Alvarenga Tripoli, configurando-se hipótese de substituição processual não prevista em lei, de forma que a demanda deve ser extinta, sem resolução de mérito, por ausência de condições da ação;

b) houve ofensa aos arts. 26, § 2º, 57-C, caput, §§ 2º e 3º, da Lei 9.504/97, 242 e 248 do Código Eleitoral e 5º, IV e IX, da Constituição da República, pois a ferramenta utilizada para impulsionamento de propaganda eleitoral é formalmente lícita e foram cumpridas todas as exigências legais;

c) a priorização de conteúdo contratada não impediu o acesso à propaganda eleitoral do candidato adversário, porventura existente na internet, nem houve imposição de publicidade do recorrente, pois o acesso ao conteúdo a ele favorável dependia da opção livre do eleitor quanto a clicar ou não no link patrocinado disponível, caso quisesse aceitar o convite do anúncio para conhecer outra candidatura;

d) a priorização de conteúdo ocorre apenas na página de busca, que pertence ao provedor da aplicação, e não aos candidatos;

e) não há vedação legal de que nomes de candidatos adversários sejam usados como palavras-chaves para a priorização de conteúdo contratada com base no art. 57-C da Lei 9.504/97, de forma que a imposição judicial de restrição ao negócio jurídico firmado entre o candidato e o provedor de aplicações de internet viola a liberdade de expressão do candidato e o direito do eleitor de se informar;

f) o Tribunal de origem interpretou de forma equivocada o art. 242 do Código Eleitoral, na medida em que o eleitor, ao se deparar com o anúncio pago, não é surpreendido nem submetido coercitivamente à propaganda do candidato contratante, cabendo ao internauta decidir se acessa ou não o conteúdo;

g) a hipótese dos autos não se amolda ao art. 248 do Código Eleitoral, já que a conduta de dar visibilidade à campanha eleitoral do contratante não é antijurídica e está de acordo com a finalidade da priorização de resultados em ferramentas de busca. Ademais, o uso de tal ferramenta não altera nem perturba a propaganda do candidato adversário, que permanece intacta na internet;

h) em caso similar relacionado às eleições presidenciais de 2018 realizadas no México, o Poder Judiciário daquele país concluiu pela legalidade do impulsionamento de resultado de pesquisa na internet por meio do Google Ads, em que se utilize o nome de candidato adversário como palavra-chave, por estar a conduta albergada pela liberdade de expressão;

i) o acórdão regional violou os arts. 5º, II e XXXIX, da Constituição da República e 57-C, §§ 2º e 3º, da Lei 9.504/97, pois, ainda que se entenda pela ocorrência de uso indevido do nome do candidato adversário ou que a propaganda seja ilícita à luz dos arts. 242 e 248 do Código Eleitoral, não é possível a aplicação de sanção pecuniária por falta de previsão legal, tendo a multa sido imposta com base em critérios não contemplados no art. 57-C e mediante interpretação extensiva do seu § 2º, o qual não incide na espécie, por terem sido cumpridos os requisitos legais para a contratação do impulsionamento de conteúdo;

j) o Tribunal de origem afrontou os arts. 57-C, § 2º, da Lei 9.504/97, 5º, LIV e XLV, da Constituição da República e 71 do Código Penal, porquanto não levou em conta os fatos discutidos neste feito e na Representação 0605327-15.2018.6.26.0000, a fim de que seja aplicada apenas ao candidato – poupando-se a coligação – uma única multa, fixada no mínimo legal e majorada em 1/6, tendo em vista que são excessivas e desproporcionais as sanções pecuniárias fixadas em cada uma das citadas demandas, as quais tratam de condutas similares e configuram a hipótese de continuidade delitiva. Caso assim não se entenda, a multa deve ser fixada no mínimo legal;

k) a multa imposta aos recorrentes foi fixada em quantia superior ao mínimo legal em virtude da utilização de impulsionamento de conteúdo para supostamente prejudicar candidatura adversária, assim como do uso de tal expediente no provedor líder mundial do mercado de buscadores de internet. Todavia, a primeira circunstância indicada seria elementar do tipo infracional e, por isso, não poderia ser considerada no primeiro momento para caracterização da ilicitude e, depois, para majoração da pena imposta. Ademais, não se poderia entender que a opção pela líder do mercado seja fator agravante da conduta, pois o meio empregado é o mesmo do qual se valem os demais candidatos, tendo o Tribunal de origem presumido a eficácia e o alcance da conduta.

Requerem o conhecimento e o provimento do recurso especial, a fim de que seja reformado o acórdão regional para julgar improcedente a representação ou, caso assim não se entenda, para afastar a multa aplicada ou reduzi-la ao valor mínimo legal.

A Coligação Acelera SP, embora intimada a apresentar contrarrazões aos agravos nos próprios autos e aos recursos especiais (IDs 517803 e 517807), manifestou-se apenas em relação ao agravo de Jilmar Augustinho Tatto e da Coligação São Paulo do Trabalho e de Oportunidades (ID 517810), pugnando pela manutenção da negativa de seguimento ao apelo especial, por demandar o reexame do conjunto fático-probatório.

A douta Procuradoria-Geral Eleitoral, no parecer ofertado em relação ao agravo (ID 13661688), opinou pela fixação de tese relativa ao impulsionamento de conteúdos na internet. Ademais, manifestou-se pelo provimento do recurso especial da Google Brasil Internet Ltda. e pelo conhecimento parcial do apelo de Jilmar Augustinho Tatto e da Coligação São Paulo do Trabalho e de Oportunidades e, nessa extensão, pelo seu provimento.

É o relatório.

 

VOTO

 

O SENHOR MINISTRO SÉRGIO BANHOS (relator): Senhor Presidente, os recursos especiais são tempestivos.

O acórdão regional referente ao julgamento do recurso em representação foi publicado em sessão no dia 19.9.2018 (ID 517774), quarta-feira, e o apelo de Google Brasil Internet Ltda. foi interposto em 22.9.2018 (ID 517783), sábado, em petição assinada eletronicamente por advogado habilitado nos autos (IDs 517708).

Por outro lado, o aresto alusivo ao exame dos embargos de declaração foi publicado em sessão no dia 24.9.2018 (ID 517786), segunda-feira, e o recurso especial de Jilmar Augustinho Tatto e da Coligação São Paulo do Trabalho e de Oportunidades foi apresentado em 27.9.2018 (ID 517795), quinta-feira, em peça assinada eletronicamente por advogado habilitado nos autos (IDs 517726 e 517727).

I – Questões prévias

I.1 – Legitimidade ativa ad causam e interesse de agir da Coligação Acelera SP

Os recorrentes Jilmar Augustinho Tatto e Coligação São Paulo do Trabalho e de Oportunidades apontam ofensa aos arts. 17 do Código de Processo Civil, 16 do Código Civil e 5º, X, da Constituição da República, sob o argumento de que a Coligação Acelera SP não teria legitimidade ativa ad causam para o ajuizamento da representação, tampouco interesse de agir para a defesa de direito de personalidade atinente ao nome do candidato a senador José Ricardo Alvarenga Tripoli.

Sustentam que o Tribunal a quo acolheu hipótese de substituição processual não prevista em lei, de modo que a representação deveria ser extinta, sem resolução de mérito, por ausência de condições da ação.

Todavia, não assiste razão aos recorrentes citados.

De plano, verifica-se que as questões jurídicas de que tratam os arts. 16 do Código Civil e 5º, X, da Constituição da República não foram objeto de análise e decisão pela Corte de origem, a despeito da oposição de embargos de declaração, circunstância que impede a sua análise nesta instância especial, em virtude da ausência de prequestionamento, nos termos do verbete sumular 72 deste Tribunal Superior.

De outra parte, anoto que o art. 96 da Lei 9.504/97 atribui às coligações partidárias a legitimidade para o ajuizamento de representações relativas ao descumprimento do citado diploma legal, o que inclui as normas que versam sobre propaganda eleitoral irregular, tal como ocorre no caso em exame.

Ademais, o interesse jurídico da Coligação Acelera SP é evidente, pois a representação tem como objetivo fazer cessar conduta supostamente prejudicial à campanha do seu candidato José Ricardo Alvarenga Tripoli, cujo nome foi utilizado como palavra-chave de mecanismo de impulsionamento de propaganda eleitoral contratado pelo recorrente Jilmar Augustinho Tatto, seu adversário na disputa pelo cargo de senador.

Ainda quanto ao ponto e como bem assinalado pelo Tribunal de origem, a representação proposta pela Coligação Acelera SP não versa sobre direito de personalidade em específico, mas, sim, tem como objetivo impedir o uso do nome do candidato Ricardo Tripoli em suposto prejuízo da sua campanha e para promoção da candidatura dos segundos recorrentes, com pedido de aplicação da multa prevista no art. 57-C, § 2º, da Lei 9.504/97.

Portanto, não há falar em ilegitimidade ativa, tampouco em ausência de interesse processual da Coligação Acelera SP para o ajuizamento da representação por propaganda eleitoral irregular, na espécie.

I.2 – Legitimidade e interesse recursal da Google Brasil Internet Ltda.

A sociedade empresarial Google Brasil Internet Ltda. alega que tem legitimidade para interpor recurso especial na espécie, como terceiro prejudicado, a despeito de não ser sucumbente, pois figurou como representada nos autos, foi destinatária da ordem de remoção do conteúdo impugnado e o acórdão recorrido afeta a sua relação jurídica com o candidato que contratou o impulsionamento de conteúdos, por limitar a possibilidade de contratação desse serviço na sua plataforma de busca.

Sustenta, ademais, ser relevante que possa apresentar argumentos jurídicos e a sua experiência em outros países, em especial porque seria a primeira vez que a questão atinente à funcionalidade de impulsionamento de conteúdos na internet é analisada pelo Tribunal Superior Eleitoral.

Destaco o teor do art. 996 do Código de Processo Civil:

Art. 996. O recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério Público, como parte ou como fiscal da ordem jurídica.

Parágrafo único. Cumpre ao terceiro demonstrar a possibilidade de a decisão sobre a relação jurídica submetida à apreciação judicial atingir direito de que se afirme titular ou que possa discutir em juízo como substituto processual.

Conforme reconhecido nas razões do recurso especial, a representação foi julgada improcedente com relação à Google Brasil Internet Ltda., de forma que ela não é sucumbente.

De qualquer sorte, entendo presente o interesse jurídico da Google Brasil Internet Ltda. na espécie, a legitimá-la para a interposição de recurso especial na qualidade de terceiro prejudicado, pois o acórdão recorrido, ao considerar como ato ilícito o uso do nome de candidato adversário como palavra-chave de mecanismo de priorização paga de resultados, afeta a utilização da ferramenta disponibilizada pela empresa (Google Ads) para o impulsionamento de conteúdo na aplicação de pesquisa na internet.

Nesse sentido foi o parecer da douta Procuradoria-Geral Eleitoral, in verbis (ID 13661688, p. 13):

46. Desta forma, verifica-se o efetivo interesse jurídico da Google em submeter a questão ao Tribunal Superior Eleitoral, haja vista tratar-se da disciplina da atividade comercial que exerce. Isso porque, embora não tenha sido proibida pelo TRE/SP a utilização da ferramenta, a prevalecer o entendimento fixado pela Corte Regional, fica reduzido o alcance do mecanismo de impulsionamento Google Ads na seara eleitoral.

Desse modo, conheço do recurso especial interposto pela Google Brasil Internet Ltda.

II – Mérito

Diante da semelhança existente entre as razões de mérito deduzidas em ambos os recursos especiais, examino-os em conjunto.

No caso, o Tribunal de origem entendeu que os recorrentes Jilmar Augustinho Tatto e Coligação São Paulo do Trabalho e de Oportunidades contrataram impulsionamento pago de propaganda eleitoral na internet com infração ao art. 57-C, § 3º, da Lei 9.504/97, razão pela qual confirmou o juízo de procedência da representação e reformou parcialmente a decisão do relator, apenas a fim de reduzir para R$ 10.000,00 o valor da multa aplicada.

Antes de adentrar a análise do caso concreto, cumpre delinear o quadro normativo e jurisprudencial formado a respeito do tema do impulsionamento pago de conteúdos de propaganda eleitoral na internet, assim como explicitar o modo de funcionamento da ferramenta ou serviço em questão, a fim de possibilitar a adequada compreensão da controvérsia.

Inicialmente, anoto que a redação original do art. 57-C da Lei 9.504/97, introduzido pela Lei 12.034/2009, vedava a veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet, sem fazer nenhuma ressalva a respeito de mecanismos de impulsionamento de conteúdos.

Com a edição da Lei 13.488/2017, a veiculação de propaganda eleitoral paga na internet passou a ser permitida somente na modalidade prevista no art. 57-C, caput e § 3º, da Lei 9.504/97, o qual autoriza a contratação de impulsionamento de conteúdos dessa natureza, desde que identificado de forma inequívoca como tal e contratado exclusivamente por candidatos, partidos políticos, coligações partidárias e seus representantes, apenas com a finalidade de promover ou beneficiar candidatos ou suas agremiações.

Eis o teor do art. 57-C, caput e §§ 2º e 3º, da Lei 9.504/97, com a redação dada pela Lei 13.488/2017:

Art. 57-C. É vedada a veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na Internet, excetuado o impulsionamento de conteúdos, desde que identificado de forma inequívoca como tal e contratado exclusivamente por partidos, coligações e candidatos e seus representantes.

[...]

§ 2º A violação do disposto neste artigo sujeita o responsável pela divulgação da propaganda ou pelo impulsionamento de conteúdos e, quando comprovado seu prévio conhecimento, o beneficiário, à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 30.000,00 (trinta mil reais) ou em valor equivalente ao dobro da quantia despendida, se esse cálculo superar o limite máximo da multa.

§ 3º O impulsionamento de que trata o caput deste artigo deverá ser contratado diretamente com provedor da aplicação de Internet com sede e foro no país, ou de sua filial, sucursal, escritório, estabelecimento ou representante legalmente estabelecido no país e apenas com o fim de promover ou beneficiar candidatos ou suas agremiações. (Grifo nosso.)

No ponto, cumpre assinalar, em observância ao comando contido na parte final do § 3º do art. 57-C da Lei das Eleições, de acordo com o qual o impulsionamento de conteúdos na internet somente pode ser contratado com o objetivo de promover ou beneficiar candidatos ou suas agremiações, que a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral para as Eleições de 2018 firmou o entendimento de que tal impulsionamento de conteúdo não pode ser usado para a divulgação de propaganda eleitoral negativa ou de críticas a adversários.

Nesse sentido, cito os seguintes julgados:

ELEIÇÕES 2018. PRESIDENTE DA REPÚBLICA. RECURSO INOMINADO EM REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL NEGATIVA. FACEBOOK. IMPULSIONAMENTO. VEDAÇÃO LEGAL. MULTA. INCIDÊNCIA. RECURSO DESPROVIDO.

1. É permitido o impulsionamento de conteúdo na Internet, desde que identificado de forma inequívoca como tal e contratado exclusivamente por partidos, coligações, candidatos e seus representantes com o fim de promover ou beneficiar candidatos ou suas agremiações.

2. No caso, a recorrente contratou impulsionamento de conteúdo com a finalidade de criticar os candidatos da coligação opositora.

3. Recurso inominado desprovido.

(R-Rp 0601596-34, rel. Min. Sérgio Banhos, PSESS em 27.11.2018, grifo nosso.)

ELEIÇÕES 2018. PRESIDENTE DA REPÚBLICA. RECURSO INOMINADO EM REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL. PESSOA JURÍDICA. VEDAÇÃO LEGAL. MULTA. INCIDÊNCIA. BIS IN IDEM. NÃO CONFIGURAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO.

1. Não há falar em bis in idem com a Rp nº 0608814-90/SP ou em perda de objeto desta demanda, pois não há identidade entre as partes, causa de pedir e pedido.

2. Desde que identificado de forma inequívoca e contratado exclusivamente por partidos, coligações, candidatos e seus representantes, é permitido o impulsionamento de conteúdo na Internet com o fim de promover ou beneficiar candidatos ou suas agremiações.

3. É vedada às pessoas jurídicas a veiculação de propaganda eleitoral na Internet.

4. No caso, a pessoa jurídica contratou impulsionamento para divulgar mensagem com apologia à candidatura de Jair Bolsonaro e críticas ao partido político do candidato adversário, configurado, portanto, o nítido caráter eleitoral da publicação.

5. Recurso inominado desprovido.

(R-Rp 0601589-42, rel. Min. Sérgio Banhos, PSESS em 27.11.2018, grifo nosso.)

Tal como realçado no voto condutor do acórdão proferido no julgamento do R-Rp 0601596-34, citado acima, “a norma não proíbe a veiculação, na propaganda eleitoral, de críticas aos adversários políticos, mas, sim, o seu impulsionamento”.

Além disso, por consectário lógico da permissão de impulsionamento pago de propaganda eleitoral na internet, observados os requisitos estabelecidos no art. 57-C da Lei das Eleições, os custos com a contratação desse mecanismo ou serviço foram incluídos entre os gastos eleitorais sujeitos a registro na prestação de contas.

Quanto ao tema, o art. 26 da Lei 9.504/97, com a redação dada pela Lei 13.488/2017, estabelece que:

Art. 26. São considerados gastos eleitorais, sujeitos a registro e aos limites fixados nesta lei:

[...]

XV – custos com a criação e inclusão de sítios na Internet e com o impulsionamento de conteúdos contratados diretamente com provedor da aplicação de Internet com sede e foro no país;

[...]

§ 2º Para os fins desta lei, inclui-se entre as formas de impulsionamento de conteúdo a priorização paga de conteúdos resultantes de aplicações de busca na Internet.

Observe-se que o § 2º do art. 26 da Lei 9.504/97, acrescentado pela Lei 13.4288/2017, incluiu, entre as formas permitidas de impulsionamento de propaganda eleitoral, a priorização paga de conteúdos resultantes de aplicações de busca na internet.

No que se refere à priorização paga de conteúdos, em específico, verifica-se que as aplicações de busca na internet apresentam, em regra, dois conjuntos de resultados, identificados, conforme o caso, como “orgânicos” ou “patrocinados”1

Os resultados orgânicos, também denominados naturais, algorítmicos ou não patrocinados, são selecionados e ordenados pelos motores de busca por intermédio de algoritmos baseados em vários fatores (relevância do conteúdo, número de links, entre outros) e independem de pagamento ao provedor da aplicação de busca na internet para serem apresentados nas páginas de resultados das pesquisas.

Por seu turno, os links patrocinados são anúncios pagos exibidos em destaque na página de resultado da pesquisa, em virtude de alguém interessado em aumentar a visibilidade do seu website ter ofertado, ao provedor da aplicação de busca na internet, lances por palavras-chaves previamente escolhidas e associadas ao seu sítio e que tenham sido utilizadas pelo internauta na pesquisa.

Na hipótese de contratação de anúncio pago, a remuneração do provedor da aplicação de busca na internet será efetuada de acordo com o número de cliques de usuários no link patrocinado.

Ademais e sem olvidar a existência de outros provedores de aplicações de busca na internet, cumpre anotar que, “para determinação desse valor por clique, acontece uma espécie de leilão entre os anunciantes que é intermediado pelo Google (e em seu beneficio). Quanto maior for o lance, mais provável será a exibição da publicação e em melhor posição ela estará2.

De modo geral, os links patrocinados são identificados como tal nas páginas de resultados dos buscadores de internet por intermédio de termos como “anúncio”, “anúncios relacionados”, “resultado patrocinado” e outras expressões assemelhadas.

Além disso, os links patrocinados são apresentados com destaque em relação aos resultados orgânicos, figurando no topo da listagem ou em outro espaço reservado a esse tipo de publicidade, na hipótese em que o internauta tenha inserido, na pesquisa, palavra-chave predeterminada pelo contratante do anúncio pago3.

Como assinala Juliana Abrusio, “é indiscutível que a ordem de aparição na qual os links são listados tem relevante valor comercial devido à tendência dos usuários acessarem as primeiras ocorrências apresentadas, especialmente pela comodidade de procurar pelos primeiros itens indexados. Justamente por esse motivo, muitos provedores, mediante pagamento, oferecem uma posição estratégica, para resultados de busca de determinado termo previamente cadastrado pelo anunciante junto ao site4.

Ainda quanto ao ponto, observo que, embora os links patrocinados sejam exibidos em posição privilegiada na página de resultado da busca na internet, os resultados orgânicos também são apresentados ao usuário na listagem de achados da pesquisa.

Feitas tais considerações, passo à análise do caso concreto.

Conforme dito anteriormente, o art. 57-C, caput e § 3º, da Lei das Eleições permite a contratação do impulsionamento de conteúdo de propaganda eleitoral na internet somente com o fim de beneficiar ou promover candidatos ou suas agremiações, razão pela qual a jurisprudência deste Tribunal Superior se firmou no sentido de que é vedada a utilização de tal mecanismo ou serviço para a veiculação de críticas a adversários ou de propaganda eleitoral negativa.

Todavia, o presente caso guarda a particularidade de que não houve impulsionamento de críticas ou ofensas a adversários, tampouco ocorreu divulgação de fato inverídico ou de propaganda eleitoral negativa, cingindo-se a irregularidade apontada pelo Tribunal de origem ao uso do nome de candidato adversário como expressão de busca em ferramenta digital de priorização de resultado em página de busca na internet, com suposto prejuízo à candidatura do oponente.

Destaco o seguinte trecho do voto condutor do acórdão recorrido (ID 517774):

Feitas essas considerações iniciais, necessárias frente a novidade e importância do tema, verifica-se que a presente representação objetiva o reconhecimento de irregularidade na veiculação de propaganda paga na internet na modalidade de resultados patrocinados em mecanismos de busca.

No caso dos autos, este magistrado, ao realizar, em 08.09.2018, a busca do nome do candidato Ricardo Tripoli no dispositivo de busca Google, obteve, no topo da primeira página de resultados, além de diversos sítios relacionados ao candidato, o seguinte conteúdo patrocinado:

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E, ao clicar no aludido conteúdo, este magistrado foi direcionado a URL https://jilmartatto.com.br/2018/09/01/conheca-jilmar-tatto-o-melhor-candidato-a-senador/, que tem o seguinte texto:

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por jilmarta | set 1, 2018 | Sem categoria | o Comentários

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(...)

Logo, verifica-se que os recorrentes, apesar de utilizarem ferramenta permitida pela lei, vêm se utilizando do nome do candidato Ricardo Tripoli para, de forma indevida, ser encontrado no mecanismo de buscas Google.

De fato, conforme reconhecido pelo Google, o impulsionamento objeto dos autos atende aos requisitos formais estabelecidos na lei, sendo formalmente lícito, pois foi (i) contratado por candidato; (ii) proporcionado por uma ferramenta digital (Google Ads) disponibilizada pelo próprio provedor da aplicação de internet; (iii) além de constar do conteúdo patrocinado a expressão “Propaganda Eleitoral” e o CNPJ do contratante.

Ocorre que, ante as peculiaridades do caso concreto, o impulsionamento, apesar de contratado por meio formalmente lícito, fere substancialmente a lei eleitoral.

Com efeito, o candidato Jilmar Tatto, em evidente abuso de direito, fez uso de modalidade lícita de propaganda para, por meio de um claro estratagema, desviar em seu proveito o espaço da candidata adversária.

Dispõem o citado art. 57-C, § 3º, da Lei das Eleições que o impulsionamento, dentre outros requisitos, somente pode ser feito em benefício da candidatura contratante, vedando-se, por consequência, sua utilização em prejuízo das candidaturas adversárias.

E, no caso, é evidente que o conteúdo impulsionado se utilizou do interesse dos eleitores na candidatura adversária para atrair a atenção para a candidatura do recorrente Jilmar Tatto, prejudicando, inequivocamente, o alcance e a repercussão da propaganda eleitoral do candidato Ricardo Tripoli.

De fato, o eleitor, ao buscar o nome de Ricardo Tripoli no mecanismo de busca Google, intenciona obter informações acerca de sua candidatura ao Senado, e não de seus adversários. No entanto, em razão do artifício utilizado pelos recorrentes, ao realizar a consulta, o primeiro resultado a aparecer para o eleitor é o nome de Jilmar Tatto, a demonstrar que o conteúdo impulsionado se utiliza do nome do adversário para capturar seus pretensos eleitores, com notória repercussão negativa em sua propaganda.

A respeito, mister a transcrição da perspicaz análise do representante do Ministério Público Eleitoral, que utiliza excertos do parecer apresentado na Representação nº 0605243-37.2018.6.26.0000 (ID 1064075, p. 6):

É evidente que se um grupo de eleitores – meticulosamente escolhidos pela campanha de Jilmar Tatto – pesquisassem o nome da representante, seriam direcionados para resultados do seu site de campanha.

Ou seja, esse anúncio do representado não age em benefício puro de sua candidatura, divulgando sua plataforma, mas visa, de uma vez só, desviar a atenção da campanha da sua adversária ao Senado, e diminuir a visualização do conteúdo por ela produzido e disponibilizado na internet.

O uso de mecanismos de SEO e SEM* para aumentar sua visibilidade deve ser limitado à difusão das próprias ideias, não como uma forma de invadir o espaço virtual das demais candidaturas.

Se isso fosse válido, grandes campanhas poderiam soterrar os resultados de buscas dos adversários com menos recursos pelo uso de anúncios pagos e impulsionamento de links. (...)

O que se tem é nítida tentativa de desvio de atenção, prejudicando o conteúdo direto da candidatura procurada pelo eleitor. Pois o anuncio só é veiculado a quem ativamente procura por informações da candidatura de Mara Gabrilli e é direcionado à página política de Jilmar Tatto. (...)

Apesar de atendidos os requisitos formais da divulgação, ao posicionar o anúncio acima do conteúdo orgânico da candidatura, a prática viola a legislação eleitoral, ao interferia na difusão da plataforma adversária de maneira artificiosa.

* “SEO” é a sigla para “Search Engine Optmization”, que significa “otimização para mecanismos de busca”, ou otimização de sites. SEO é o conjunto de estratégias com o objetivo de potencializar e melhorar o posicionamento de um site nas páginas de resultados naturais (e orgânicos) nos sites de busca. “SEM” é uma forma de marketing na internet, que tem objetivo de promover websites pelo aumento da sua visibilidade nas páginas de resultados (SERPs), através do uso de publicidade paga, fazendo com que a empresa fique nas primeiras posições dos resultados de busca por palavras-chave relacionadas.

Destarte, resta evidente que, apesar de lícita na forma, a propaganda impugnada é ilícita por seu conteúdo, pois feita com notória finalidade de prejudicar a candidatura de Ricardo Tripoli, ferindo o disposto no art. 57-C, § 3º, in fine, da Lei das Eleições, repetido pelo art. 24, § 3º, da Res. TSE 23.551/17.

Ademais, a utilização indevida do nome do candidato adversário para direcionar a pesquisa no mecanismo de busca para o nome do recorrente Jilmar Tatto corresponde a meio publicitário destinado “a criar, artificialmente, na opinião pública, estados mentais, emocionais ou passionais”, expediente que encontra vedação no art. 242 do Código Eleitoral.

Isso porque, ao utilizar a palavra-chave “Ricardo Tripoli” para, por meio de publicidade paga, direcionar a pesquisa do mecanismo de busca para o site de Jilmar Tatto, os recorrentes direcionam e capturam, de forma artificial e sem prévio conhecimento, a atenção do eleitor para sua candidatura, criando nele estado mental, o que é vedado pela legislação.

Da mesma forma, a conduta ainda se amolda ao tipificado no art. 248 do Código Eleitoral, pois, ao assim agir, os recorrentes, além de aumentar a visibilidade de sua campanha, alteram e perturbam a campanha eleitoral do candidato da recorrida.

Em razão do disposto, era mesmo de rigor o reconhecimento da irregularidade da propaganda veiculada, por violação no disposto no art. 57-C, § 3º, da Lei das Eleições, com a confirmação da liminar para determinar a exclusão permanente da propaganda.

Depreende-se do aresto regional que a Corte de origem reconheceu que o impulsionamento de propaganda eleitoral contratado na espécie cumpriu os requisitos formais estabelecidos no art. 57-C da Lei 9.504/97, mas assentou a ilicitude da conduta por vislumbrar a ocorrência de abuso de direito, tendo em vista que o candidato a senador Jilmar Tatto usou o nome do seu adversário Ricardo Tripoli como palavra-chave em mecanismo de priorização paga de conteúdo (Google Ads) em aplicação de busca na internet, qual seja, a Pesquisa Google.

Ainda de acordo com o Tribunal a quo, a conduta impugnada configurou a intenção do candidato contratante do impulsionamento de, por intermédio de ferramenta lícita, captar ilicitamente os eleitores interessados em informações atinentes ao seu adversário, o que teria causado prejuízo ao alcance e à repercussão da propaganda eleitoral do candidato oponente.

De antemão, ressalto que as premissas fáticas consignadas no acórdão recorrido permitem a revaloração jurídica dos fatos analisados pelo Tribunal de origem, providência que é admitida em sede de recurso especial eleitoral5.

A questão controvertida nos recursos especiais apresentados nos autos reside, primordialmente, em saber se é lícita a utilização do nome de candidato adversário como palavra-chave para o fim de impulsionamento de propaganda eleitoral na modalidade de priorização paga de conteúdos em aplicação de busca na internet (links patrocinados).

A propósito do tema, observo que a Justiça Comum tem entendido configurar prática de concorrência desleal e de desvio de clientela a utilização de expressões designativas de sociedade empresária concorrente como palavra-chave em links patrocinados.

A fim de mais bem contextualizar a questão, destaco as conclusões de estudo publicado na Revista da Associação Brasileira da Propriedade Intelectual (ABPI), no sentido de que os “nossos tribunais vêm solidificando o entendimento de que o uso de sinal distintivo de concorrente como palavra-chave de link patrocinado caracteriza ato de concorrência desleal6.

A respeito do tema, cito julgado do Superior Tribunal de Justiça7que manteve o entendimento das instâncias ordinárias no sentido de estar caracterizada a prática de concorrência desleal, por uso indevido de marca e por desvio de clientela, no caso em que uma empresa do ramo de comércio eletrônico, entre outros fatos adotados em conjunto como razões de decidir8, contratara a veiculação de link patrocinado no buscador Google, a fim de que fosse exibido, em destaque, o nome dela todas as vezes em que alguém fizesse pesquisa com palavras-chaves correspondentes a termos designativos de determinada sociedade empresária concorrente.

No julgado citado, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça assinalou a “necessidade premente de regulamentação do mercado de links patrocinados em razão dos abusos cometidos nesta seara, em decorrência do uso não autorizado de palavras-chaves associadas a marcas que gozam de maior prestígio”.

Contudo, a orientação jurisprudencial acima referida, que vem sendo adotada a respeito da questão dos links patrocinados no âmbito do direito privado, não pode ser aplicada ao impulsionamento pago de conteúdos de propaganda eleitoral permitido pela legislação eleitoral, tendo em vista a natureza de direito público de que se revestem as normas de direito eleitoral.

Tal como assinala José Jairo Gomes, enquanto no âmbito privado prevalecem interesses e negócios particulares, “na esfera pública, avultam o bem comum, a ordem pública, os interesses da coletividade em seu conjunto. Por isso mesmo, aí reinam a transparência e a amplitude de informação9.

Ainda de acordo com o renomado eleitoralista, “é natural que todo cidadão possua o direito de ser informado acerca da vida política do país, dos governantes, dos negócios públicos, bem como de manifestar sua opinião10.

Com efeito, a liberdade de informação ostenta fundamental importância para o funcionamento da democracia representativa e, aplicada ao processo eleitoral, assegura aos eleitores o direito de conhecer as opiniões, ideias, plataformas e projetos políticos dos candidatos e das agremiações que disputam o pleito, a fim de que o direito ao voto possa ser exercido de forma consciente e responsável.

Como assinala a doutrina especializada, “para que o debate democrático possa alcançar resultado eficaz, ao cidadão deve ser reconhecido e garantido o direito de obter informações sobre os assuntos de seu interesse, assim como expressar suas ideias e opiniões de forma que efetivamente contribua para a solução das questões que afligem a sociedade11.

Desse modo, a análise da questão controvertida, atinente ao impulsionamento de propaganda eleitoral por meio de mecanismo ou serviço de priorização paga de resultados em aplicações de busca na internet, deve ter em conta que os eleitores têm o direito, de índole constitucional, de ser munidos de informações amplas, precisas e suficientes para fundamentar a decisão eleitoral a ser tomada no pleito.

Não fosse assim, haveria sensível prejuízo ao debate de ideias e enfraquecimento do processo democrático, a exemplo do que ocorreria caso os eleitores tivessem acesso apenas a informações de candidatos ou partidos políticos com os quais porventura compartilhassem opiniões ou por quem nutrissem simpatia.

A propósito, cabe ressaltar que, de acordo com as instruções sobre a propaganda eleitoral, editadas por este Tribunal Superior para as Eleições de 2018, o impulsionamento de conteúdo consiste, precisamente, em mecanismo ou serviço que incremente o alcance e a divulgação da informação para atingir usuários que, normalmente, não teriam acesso ao seu conteúdo.

É o que estabelece o inc. XIII do art. 32 da Res.-TSE 23.551, in verbis:

Art. 32. Para o fim desta resolução, considera-se:

[...]

XIII - impulsionamento de conteúdo: o mecanismo ou serviço que, mediante contratação com os provedores de aplicação de internet, potencializem o alcance e a divulgação da informação para atingir usuários que, normalmente, não teriam acesso ao seu conteúdo; (grifo nosso.)

Tal como dito anteriormente, a priorização paga de conteúdos em motores de busca na internet é uma das formas de impulsionamento permitidas pela legislação eleitoral em vigor, especificamente pelos arts. 26, § 2º, e 57-C, § 3º, da Lei 9.504/97, como exceção à regra geral que proíbe a divulgação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet.

Todavia, a legislação eleitoral e as normas regulamentares editadas por este Tribunal Superior a respeito do tema não estabeleceram regras ou critérios que orientassem a escolha das palavras-chaves a serem utilizadas nos multicitados mecanismos de priorização paga de resultados de busca na internet.

Foi nesse contexto que, no caso em exame, a Corte de origem assentou o entendimento de que:

a)  o impulsionamento impugnado, apesar de ser formalmente lícito, é ilícito quanto ao seu conteúdo, por abuso de direito, em razão de utilizar o nome de candidato adversário com o objetivo de prejudicar a candidatura do opositor, infringindo o disposto nos arts. 57-C, § 3º, da Lei 9.504/97 e 24, § 3º, da Res.-TSE 23.551;

b)    a utilização indevida do nome de candidato adversário para, em ferramenta de busca na internet, direcionar a pesquisa ao nome do recorrente equivale a meio publicitário destinado “a criar, artificialmente, na opinião pública, estados mentais, emocionais ou passionais”, (ID 517786) o que é vedado pelo art. 242 do Código Eleitoral, assim como infringe o art. 248 desse diploma legal, pois, além de aumentar a visibilidade da candidatura do contratante do impulsionamento, altera e perturba a campanha eleitoral do candidato oponente.

Cabe ressaltar que o Tribunal a quo não apontou que, na espécie, o link patrocinado tivesse sido usado para impulsionar propaganda eleitoral negativa, crítica ou afirmação ofensiva à imagem do candidato Ricardo Tripoli, seja no anúncio pago, seja na página do candidato Jilmar Tatto, que poderia ser acessada por meio do hiperlink citado.

Ademais, a Corte de origem assentou a irregularidade material do impulsionamento de conteúdo com base no entendimento de que o recorrente Jilmar Tatto incorreu em abuso de direito ao se valer de modalidade lícita de propaganda eleitoral para desviar, em seu proveito, o espaço virtual do candidato adversário Ricardo Tripoli, causando-lhe prejuízo dessa forma.

Todavia, diante das circunstâncias fáticas descritas no acórdão regional, entendo que não houve ilicitude no impulsionamento de conteúdo contratado na espécie.

Além de a contratação do impulsionamento de propaganda eleitoral ter cumprido os requisitos formais estabelecidos na legislação eleitoral, conforme reconhecido pela Corte de origem, verifica-se que, na situação específica dos autos, a utilização do nome de candidato adversário como palavra-chave do mecanismo de priorização paga de resultados de busca na internet não infringe o disposto no art. 57-C da Lei 9.504/97.

De acordo com o acórdão regional, a pesquisa efetuada na plataforma de busca Google com o nome do candidato a senador Ricardo Tripoli apresentava, no topo da primeira página de resultado, anúncio pago referente ao adversário Jilmar Tatto, no qual havia um link patrocinado para a página de propaganda eleitoral desse candidato.

A propósito, reproduzo novamente trecho do voto condutor do acórdão regional, no qual estão descritos os fatos da causa (ID 517747):

No caso dos autos, este magistrado, ao realizar, em 08.09.2018, a busca do nome do candidato Ricardo Tripoli no dispositivo de busca Google, obteve, no topo da primeira página de resultados, além de diversos sítios relacionados ao candidato, o seguinte conteúdo patrocinado:

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E, ao clicar no aludido conteúdo, este magistrado foi direcionado a URL https://jilmartatto.com.br/2018/09/01/conheca-jilmar-tatto-o-melhor-candidato-a-senador/, que tem o seguinte texto:

Conheça Jilmar Tatto, o melhor candidato a senador!

por jilmarta | set 1, 2018 | Sem categoria | o Comentários

Conheça Jilmar Tatto, o melhor candidato a senador!

Estava procurando por Ricardo Tripoli no Google? Temos uma opção melhor e mais alinhada com o que o povo de São Paulo precisa. Conheça jilmar Tatto, o senador do Lula. Criador do Bilhete Único, Corredores de Ônibus, Ciclovias e muito mais… Veja algumas propostas de Jilmar no texto abaixo.

(...)

Logo, verifica-se que o representado Jilmar Tatto, apesar de utilizar ferramenta permitida pela lei, vem se utilizando do nome do candidato Ricardo Tripoli para, de forma indevida, ser encontrado no mecanismo de buscas Google.

Embora o Tribunal Regional Eleitoral paulista tenha concluído que o impulsionamento de conteúdo verificado na espécie teria utilizado o eventual interesse de eleitores na candidatura de Ricardo Tripoli para atrair a atenção para o seu adversário Jilmar Tatto, observa-se que os elementos fáticos descritos no acórdão regional não permitem afirmar que tenha havido prejuízo à propaganda eleitoral do candidato cujo nome foi utilizado como palavra-chave.

Com efeito, embora os links patrocinados sejam exibidos de forma prioritária nas listagens de resultados dos buscadores na internet, os resultados orgânicos também são apresentados ao usuário na lista de achados da pesquisa, de sorte que a existência do anúncio pago não elimina os links não patrocinados e, por conseguinte, não impede o acesso às páginas respectivas.

Tal compreensão é corroborada pelo voto do relator na Corte de origem, segundo no qual, na pesquisa por ele realizada pelo nome de Ricardo Tripoli na plataforma de busca Google, obteve-se o conteúdo patrocinado “no topo da primeira página de resultados, além de diversos sítios relacionados ao candidato” (ID 517747, grifo nosso).

Na situação acima descrita, o eleitor que tenha deparado com o anúncio pago – devidamente identificado como tal e como propaganda eleitoral, como se infere do acórdão regional – no resultado da sua busca na internet tem plena liberdade para clicar ou não no link patrocinado, assim como para acessar qualquer outra página entre as listadas no resultado da pesquisa, inclusive os resultados orgânicos alusivos ao candidato pesquisado.

Conforme bem pontuado no parecer da douta Procuradoria-Geral Eleitoral, eventual propaganda do candidato cujo nome foi utilizado como palavra-chave para o fim de impulsionamento de conteúdo continua disponível a quem tiver interesse em acessá-la, por meio dos itens listados no resultado da busca.

Por outro lado, embora seja consabido que os usuários tendem a clicar nos primeiros itens exibidos na listagem de resultados da busca na internet, não se pode olvidar que, a despeito de serem poderosas ferramentas de marketing, os links patrocinados ainda são vistos com desconfiança por parcela dos internautas12, a qual, embora seja superável por meio da disponibilização de informações sobre a confiabilidade do anunciante, pode interferir na decisão de acessar ou não o conteúdo patrocinado.

Observo que, na circunstância assinalada no acórdão regional, de que “o eleitor, ao buscar o nome de Ricardo Tripoli no mecanismo de busca Google, intenciona obter informações acerca de sua candidatura, e não de seus adversários”, permite-se inferir que o link patrocinado seria, provavelmente, ignorado em tal hipótese.

Diante dessas considerações, é insubsistente o fundamento do acórdão recorrido de que o anúncio patrocinado, no caso dos autos, teria aptidão para prejudicar o candidato adversário cujo nome foi utilizado como palavra-chave para o fim de priorização paga de conteúdos, pois, de acordo com o aresto regional e a despeito do destaque conferido ao link patrocinado, os resultados que lhe dizem respeito foram exibidos na listagem de achados da pesquisa.

Ademais, o acórdão regional não apresenta nenhuma informação que permita cogitar eventual omissão de resultados referentes ao candidato adversário nem mesmo hipotético redirecionamento automático para a página de campanha do contratante do impulsionamento de conteúdos.

Nessa ordem de ideias, é de rigor afastar também o fundamento do aresto regional de que, ao utilizar o nome de candidato adversário como palavra-chave para o impulsionamento de propaganda eleitoral, os recorrentes teriam captado de forma artificial e sem prévio conhecimento a atenção dos eleitores para a sua candidatura, criando neles estado mental e incidindo, assim, na vedação contida no art.. 242 do Código Eleitoral.

Isso porque, em diversas ocasiões, este Tribunal Superior reafirmou o entendimento de que o art. 242 do Código Eleitoral deve ser interpretado com a cautela necessária, tendo em vista o contexto histórico autoritário em que tal dispositivo foi editado e a circunstância de que a função da propaganda eleitoral é, precisamente, gerar estados mentais, emocionais ou passionais nos seus destinatários.

Conforme assinalado no voto do Min. Carlos Orbach no R-Rp 0601298-42, red. para o acórdão Min. Edson Fachin, PSESS em 25.10.2018, “é óbvio que a função da propaganda – ou pelo menos da boa propaganda – é exatamente gerar nos seus destinatários os mais variados estados mentais, emocionais ou passionais, o que impõe ao intérprete especiais cautelas na exegese do art. 242 do Código Eleitoral de 1965”.

De qualquer sorte, entendo que o art. 242 do Código Eleitoral não se aplica ao presente caso, pois, de acordo com o acórdão regional, o link patrocinado questionado nos autos cumpriu todos os requisitos formais estabelecidos na legislação de regência, inclusive no que diz respeito à sua identificação como anúncio pago e como propaganda eleitoral.

Tal circunstância enfraquece a tese de que teria havido captação da atenção do eleitor de forma artificial e sem o seu conhecimento prévio, pois se permite inferir que o link patrocinado foi exibido com a transparência necessária e de forma inequívoca, de sorte que era possível ao eleitor verificar que se tratava de conteúdo patrocinado e de propaganda de outro candidato.

Ademais, o acórdão regional não explicita em que consistiria o estado mental que teria sido criado no eleitor em virtude do impulsionamento questionado nos autos, cingindo-se a afirmar a tese, já refutada linhas atrás, de que o contratante do link patrocinado teria direcionado e capturado a atenção do eleitor de forma artificial e sem prévio conhecimento deste.

Com efeito, não há elementos no aresto recorrido que permitam vislumbrar a capacidade de mero link patrocinado para gerar estados mentais, emocionais ou passionais no eleitor, especialmente no contexto verificado, em que foram atendidos os requisitos formais estabelecidos na legislação eleitoral e o anúncio pago foi inequivocamente identificado como tal.

Por outro lado, a Corte de origem assentou a ilicitude do impulsionamento contratado também com base na compreensão de que a conduta dos segundos recorrentes, além de aumentar a visibilidade da sua candidatura, teria alterado e perturbado a campanha eleitoral do candidato cujo nome foi utilizado como palavra-chave para o fim de impulsionamento da propaganda, o que, no entender do Tribunal a quo, se amoldaria ao art. 248 do Código Eleitoral, segundo o qual “ninguém poderá impedir a propaganda eleitoral, nem inutilizar, alterar ou perturbar os meios lícitos nela empregados”.

Tal fundamento do acórdão regional parece partir da premissa equivocada de que os resultados orgânicos apresentados em página de busca na internet, referentes ao candidato cujo nome foi usado como palavra-chave da pesquisa, poderiam ser considerados propaganda eleitoral desse candidato.

Todavia, entendo que apenas ao acessar algum dos resultados orgânicos da busca é que se poderia falar em eventual acesso a propaganda eleitoral de candidato, caso existente na página acessada. Até então, o que se tem disponível são meios de acesso a páginas que contenham informações sobre determinada pessoa, seja ela candidato ou não, sejam os dados referentes ao pleito ou não.

Por outro lado, anoto que a priorização paga do conteúdo de propaganda eleitoral de candidato na página de resultados de buscadores de internet, em princípio, não impede a propaganda eleitoral de outros postulantes, tampouco inutiliza, altera ou perturba meios lícitos nela empregados, de sorte que não há falar em incidência do art. 248 do Código Eleitoral.

Quanto ao ponto, reitero que a exibição, em destaque, de link patrocinado devidamente identificado como tal não tem o condão de interferir nos resultados orgânicos ou não patrocinados, inclusive os que possam conter propaganda eleitoral, os quais continuam visíveis na listagem de achados da pesquisa apresentada pelo buscador de internet, podendo o eleitor interessado acessar qualquer uma das páginas disponíveis.

Ademais, é consabido que a regra em regime democrático é a livre circulação de ideias, assegurando-se ao eleitor o pleno direito de se informar sobre as campanhas eleitorais.

Sob essa perspectiva, a apresentação de alternativas ao eleitor, a fim de que ele, se assim desejar, conheça outro candidato não pode ser vista, nas circunstâncias dos autos, como forma de prejudicar a campanha eleitoral de outros postulantes, mas, sim, como maneira de ampliar o debate político e embasar a escolha consciente do eleitor.

Por fim, anoto que a Procuradoria-Geral Eleitoral, tendo em vista que a permissão de impulsionamento pago de conteúdos na internet é tema novo e com potencial de grande impacto em eleições futuras, manifestou-se pela fixação de tese a respeito do tema, nos seguintes termos (ID 13622138, pp. 20-21):

Diante do exposto, o Ministério Público Eleitoral manifesta-se:

a) pela fixação de tese relativa à utilização do impulsionamento pago de conteúdos na internet, em propaganda eleitoral, ainda que o contratante escolha para o direcionamento dos resultados palavras-chave vinculadas a outros candidatos, observadas as seguintes condições:

a.1) a contratação deve ser feita exclusivamente pelos partidos, coligações ou candidatos (art. 57-C da Lei nº 9.504/97);

a.2) o impulsionamento deve conter identificação inequívoca acerca de sua natureza, bem como identificação do CNPJ ou CPF do responsável, além da expressão “Propaganda Eleitoral” e outras informações legalmente previstas (art. 57-C da Lei nº 9.504/97 e art. 24, § 5º, da Resolução-TSE nº 23.551/2017);

a.3) os gastos com o impulsionamento constituem gastos eleitorais, sujeitos a registro e aos limites legais (art. 26, XV, da Lei das Eleições);

a.4) é vedado o direcionamento a links que levem a informações falsas, propaganda negativa ou depreciativa em relação a outros candidatos ou ainda a realização de associações não informativas (os candidatos não podem ser vinculados a determinado produto ou propaganda comercial, por exemplo); e

a.5) havendo mais de um contrato de impulsionamento de propaganda eleitoral que utilize as mesmas palavras-chave, o algoritmo utilizado pelo provedor de aplicação da internet para a “priorização paga de conteúdos resultante de aplicações de busca na internet” deve permitir a alternância na ordem de divulgação destes resultados, de forma que, independentemente do valor pago no momento da contratação, determinado link patrocinado não fique sempre nas primeiras colocações para o usuário que realizou a pesquisa.

Observo que não há nada a prover com relação aos itens a.1, a.2, a.3 e a.4 do parecer ministerial, pois as condições neles especificadas já foram contempladas nas normas eleitorais que regem a matéria (arts. 26, XV, e 57-C, caput e § 3º, da Lei 9.504/97, 24, caput e §§ 3º e 5º, da Res.-TSE 23.551 e 37, XII, da Res.-TSE 23.553) e na jurisprudência desta Corte Superior, segundo a qual o impulsionamento pago de propaganda eleitoral na internet somente é permitido para a veiculação de propaganda eleitoral positiva (AgR-AI 0602903-49, rel. Min. Sérgio Banhos, DJE de 20.9.2019; AgR-REspe 0602910-41, rel. Min. Jorge Mussi, DJE de 24.6.2019; AgR-AI 0608882-40, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJE de 18.6.2019; R-Rp 0601596-34, rel. Min. Sérgio Banhos, PSESS em 27.11.2018; e R-Rp 0601589-42, rel. Min. Sérgio Banhos, PSESS em 27.11.2018).

No que se refere ao item a.5 do parecer da douta Procuradoria-Geral Eleitoral, entendo que não cabe, em sede de recurso especial, fixar regra de caráter geral e abstrato a ser cumprida pelos provedores de aplicações de internet, consistente em que os algoritmos por eles utilizados para a priorização paga de conteúdos permitam a alternância na ordem de exibição dos resultados na hipótese de haver mais de um contrato de impulsionamento de propaganda eleitoral firmado por diferentes candidatos e que utilizem as mesmas palavras-chaves, a fim de que, independentemente do valor pago na contratação, determinado link patrocinado não figure sempre nas primeiras colocações para o usuário que realizou a busca.

Como se pode inferir, a fixação de tese na forma exposta pelo órgão ministerial, conquanto consentânea com o princípio da isonomia entre os candidatos, interferiria na elaboração dos algoritmos dos mecanismos de priorização paga de conteúdos em aplicações de busca na internet e na relação de custo-benefício do impulsionamento, expresso na correlação entre o valor do lance ofertado pelo contratante e a visibilidade do anúncio pago (link patrocinado).

Com efeito, a proposta do órgão ministerial mais bem se insere no âmbito do exercício da função normativa da Justiça Eleitoral, de modo que a sua análise seria mais adequada por ocasião da elaboração das instruções para o pleito vindouro.

A propósito, anoto que os arts. 105 da Lei 9.504/97 e 3º da Res.-TSE 23.472 preveem a realização de audiências públicas com o intuito de aprimoramento das minutas das instruções para a realização de eleições, devendo ser convidadas as instituições e as autoridades elencadas no inc. V da citada resolução13, assim como as demais pessoas e entidades que o relator considerar convenientes.

Na mesma direção, o art. 57-J da Lei das Eleições estabelece que “o Tribunal Superior Eleitoral regulamentará o disposto nos arts. 57-A a 57-I desta lei de acordo com o cenário e as ferramentas tecnológicas existentes em cada momento eleitoral e promoverá, para os veículos, partidos e demais entidades interessadas, a formulação e a ampla divulgação de regras de boas práticas relativas a campanhas eleitorais na Internet” (grifo nosso).

Assim, entendo que a proposta ministerial acima citada merece ser encaminhada à consideração do eminente relator das instruções para as eleições vindouras.

De qualquer sorte, cumpre lembrar que a regra geral estabelecida pelo art. 57-C da Lei 9.504/97 (vedação de qualquer tipo de propaganda paga na internet, com exceção do impulsionamento de conteúdos) tem como objetivo evitar a interferência do poder econômico e a introdução de interesses comerciais no debate eleitoral.

Dessa maneira, não obstante o impulsionamento pago de conteúdos na internet seja permitido, em caráter excepcional, pelo art. 57-C da Lei das Eleições, é de rigor reconhecer que eventual desvirtuamento de mecanismo ou serviço de priorização paga de conteúdos em aplicações de busca na internet, em detrimento da igualdade e da isonomia entre os candidatos – a exemplo da hipótese retratada pelo órgão ministerial, em que, a despeito de haver mais de um candidato contratante de impulsionamento de conteúdo com a mesma palavra-chave, determinado link patrocinado figure sempre nas primeiras posições para o usuário que realizou a pesquisa –, poderá caracterizar, em tese, além de propaganda eleitoral irregular, abuso do poder econômico, apurado e punido na forma do art. 22 da Lei Complementar 64/90.

Com base em tais considerações, entendo que a reforma do acórdão regional é medida que se impõe na espécie.

Pelo exposto, voto no sentido de dar provimento aos recursos especiais eleitorais interpostos por Google Brasil Internet Ltda. e por Jilmar Augustinho Tatto e pela Coligação São Paulo do Trabalho e de Oportunidades, a fim de julgar improcedente a representação e tornar insubsistente a multa aplicada aos segundos recorrentes.

_________________________________

1. ZHONGMING MA et al. Effect of sponsored search on consumer trust and choice. International Journal of Electronic Business Management, vol. 11, n. 4 (2013), p. 227-237. Disponível em: <https://pdfs.semanticscholar.org/c035/089752ad23b910ef355df4f3e69e59149 d9e.pdf>. Acesso em: 14 de outubro de 2019.

JANSEN, B. J. et al. Factors relating to the decision to click-on a sponsored link. Decision Support Systems, vol. 44, n. 1 (2007), p. 46-59. Disponível em: <http://www.bernardjjansen.com/uploads/2/4/1/8/24188166/jansen_factors_sponsored_link_clicks.pdf>. Acesso em: 14 de outubro de 2019.

 2. LIMA, Glaydson de Farias. Manual de direito digital: fundamentos, legislação e jurisprudência. Curitiba: Appris, 2016, p. 110.

 3. Quanto ao ponto, cito: “Nessas hipóteses, o link objeto de impulsionamento é exposto em caráter prioritário no resultado de pesquisas com o provedor de busca contratado, em espaço específico destinado à publicidade” (RAIS, Diogo, et al. Direito eleitoral digital. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018, p. 53).

 4. ABRUSIO, Juliana. O uso do link patrocinado como prática de conduta desleal no comércio da internet. Revista pensamento Jurídico, vol. 12, n. 1, jan.-jun. 2018. São Paulo: FADISP, p. 294-295. Disponível em: <https://fadisp.com.br/revista/ojs/index.php/pensamentoju ridico/article/view/131/172>. Acesso em: 14 de outubro de 2019.

 5. Nesse sentido: “A revaloração jurídica dos fatos delimitados no acórdão regional é admissível na seara especial, sem que isso contrarie o teor da Súmula nº 24 do TSE. Precedentes” (AgR-REspe 0603077-80, rel. Min. Edson Fachin, DJE de 3.10.2019).

 6. SOUZA, Daniel Adensohn de. et al. A jurisprudência sobre o uso de links patrocinados como instrumento de concorrência desleal. Revista da ABPI, n. 144, set.-out. 2016, p. 53-66. Disponível em: <https://www.dbba.com.br/wp-content/uploads/a933_jurisprudencia_sobre_uso_links.pdf>. Acesso em: 14 de outubro de 2019.

 7. STJ, REsp 1.606.781, Terceira Turma, red. para o acórdão Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, DJE de 10.10.2016.

 8. Destaco trecho do acórdão citado: “Na hipótese concretamente examinada, a constatação da prática de concorrência desleal não está amparada no simples uso da expressão ‘URBANO’, mas na conjugação desse fato com a utilização de cores e layout que apresentam enorme semelhança com os padrões adotados pela autora, com a declaração dos próprios idealizadores do site de que se valeram desse artifício para serem reconhecidos e com a contratação de links patrocinados adotando como palavra-chave a expressão ‘PEIXE URBANO’ e suas variações” (grifo nosso).

 9. GOMES, José Jairo. Direito eleitoral. 12ª ed. São Paulo: Atlas, 2016, p. 470.

10. Idem, p. 470.

11. SILVA, Henrique Neves da. Propaganda eleitoral na imprensa escrita e a liberdade editorial de apoio político. Tratado de direito eleitoral, v. 4. Propaganda eleitoral. Belo Horizonte: Fórum, 2018, p. 197.

12. Nesse sentido: ZHONGMING MA et al. Op. cit., p. 56; JANSEN, B. J. et al. Op. cit., p. 234.

13. Res.-TSE 23.472:

Art. 3º As instruções do Tribunal Superior Eleitoral serão expedidas com a observância das seguintes garantias e procedimentos:

[...]

IV - o relator, após manifestação dos órgãos técnicos da Justiça Eleitoral, elaborará a minuta da Instrução que será divulgada pelo sitio eletrônico do Tribunal na internet e convocará, com antecedência mínima de um mês, a realização de audiência pública para discussão da minuta;

V - para a audiência pública, sem prejuízo da presença de qualquer interessado e de acordo com as limitações físicas do espaço em que ela se realizará, serão convidados, mediante ofício encaminhado com cópia da minuta da instrução, todos os partidos políticos que possuem representação no Congresso Nacional, os Senhores Deputados Federais, os Senhores Senadores, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, o Advogado-Geral da União, o Procurador-Geral Eleitoral, os órgãos de classe diretamente interessados e as demais pessoas ou entidades que o relator considerar conveniente;

 

VOTO

 

O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN: Senhora Presidente, eminentes pares, cumprimento as sustentações orais dos ilustres advogados, do Senhor Vice-Procurador-Geral Eleitoral, cumprimento o eminente Ministro Relator. Estamos a examinar um caso que foi, seguramente, como sói acontecer, muito bem examinado pelo Ministro Sérgio Banhos, e que verte uma sensibilidade, uma circunstância inusual do ponto de vista da compreensão do sentido e do alcance do art. 57-C da Lei da Eleições.

Faço uma breve síntese, Senhora Presidente, apenas para bem posicionar a percepção que tenho. Ao propor o provimento do recurso especial – creio que é esta a conclusão de Sua Excelência Ministro Sérgio Banhos –, a rigor, está, portanto, acolhendo a tese da Google Brasil Internet Ltda. e da agravante, Coligação São Paulo do Trabalho e de Oportunidades, de Jilmar Augustinho Tatto.

E, fundamentalmente, dando abrigo ao núcleo da tese que o próprio Ministério Público Eleitoral sustentou e que está, em meu modo de ver, na parte final do item 2 do parecer da Procuradoria-Geral Eleitoral, aonde, neste alongado e acutíssimo parecer, o Doutor Humberto Jacques de Medeiros fez assentar a seguinte afirmação:

2. [...] são legítimos o impulsionamento de conteúdos e a priorização paga de conteúdos resultante de aplicações de busca na internet, ainda que o contratante escolha para o direcionamento dos resultados palavras-chave vinculadas a outros candidatos [...].

De modo que este é um caso interessante até por isso. Não creio que tenhamos controvérsias sobre os fatos. Basta, aliás, vermos o disposto no art. 57-C para daí depreendermos a presença dos elementos que estão neste tipo. Apenas para rememorar, me permito pontuar o teor do 57-C da Lei das Eleições, segundo o qual:

Art. 57-C.  É vedada a veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet, excetuado [...].

E o Ministro Sérgio Banhos sublinhou na voz a palavra “exceção” ao apresentar o seu voto – excetuado, portanto, há uma exceção, “excetuado o impulsionamento de conteúdos”.

Nós estamos diante de impulsionamento de conteúdos, quanto a isso não há dúvida alguma: “desde que identificado de forma inequívoca como tal”.

Basta verificar o teor do acórdão regional, do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, em trechos que o Ministro Relator reproduziu e, se tivermos até curiosidade de adentrar aos mecanismos de busca, não há dúvida alguma – e foi o que eu fiz – de que este tipo de impulsionamento aparece como anúncio.

Portanto, “desde que identificado de forma inequívoca como tal” também não me parece haver equívoco quanto à forma inequívoca de o impulsionamento ter sido identificado. Em outras palavras, não se trocou aqui Jesus por Genésio. Diretamente, se disse o que se estava a fazer. Portanto, houve o impulsionamento, houve identificação de forma inequívoca, e a terceira condição do art. 57-C: “contratado exclusivamente por partidos, coligações e candidatos e seus representantes”. Também é o caso, porque havia um candidato.

Então, a questão que se coloca é: nas palavras-chave de busca é possível o candidato vincular ou, digamos, catapultar o conteúdo impulsionado ou impulsionável, utilizando-se do nome do outro candidato, que é seu concorrente, que é adversário? E utilizando, especificamente, do nome, que é a identificação pessoal, não só do ponto de vista da identidade civil, mas do ponto de vista da própria identidade eleitoral de alguém que se apresenta.

Neste caso, e eu colho do acórdão regional este trecho que só reproduzo uma vez mais para deixar isso claro, embora o Ministro Relator bem explicitou, lá no acórdão regional, disse o relator:

No caso dos autos, este magistrado, ao realizar, em 08.09.2018, a busca do nome do candidato Ricardo Tripoli no dispositivo de busca Google, obteve, no topo da primeira página de resultados, além de diversos sítios relacionados ao candidato, o seguinte conteúdo patrocinado [portanto, impulsionamento pago, forma de anúncio].

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E prossegue naquilo que o eminente Ministro Relator trouxe à colação.

O que se coloca, portanto, aqui para saber, na espacialidade de um tribunal, que extrai nos limites e na unidade do sistema normativo, as possibilidades de densificação das normas para solução do caso concreto.

E eu estou me alongando um pouco, Presidente, porque gostaria de, o quanto possível, na linha das preocupações do eminente Ministro Relator, lançar luzes sobre o caso presente, porque com aproximadamente seis ou sete mil candidaturas que se avizinham nas eleições municipais deste ano no Brasil, nós, certamente, teremos temas desta ordem para examinar. E, portanto, a discussão de hoje pode ser um olhar que antecipa a discussão de amanhã.

E, nesta matéria, olhando especificamente o teor do art. 57-C, os requisitos ali exigidos não foram, explícita ou expressamente, descumpridos no caso concreto. Se tivessem sido, incidiria o § 2º:

Art. 57-C [...]

§ 2º A violação do disposto neste artigo sujeita o responsável pela divulgação da propaganda ou pelo impulsionamento de conteúdos e, quando comprovado seu prévio conhecimento, o beneficiário, à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 30.000,00 (trinta mil reais) [...].

Nada obstante, cumprido todos os requisitos, esse 57 também tem o B e o A, para ser, obviamente, os três dispositivos do mesmo artigo interpretados em conjunto. Houve falseamento dos dados? Que é um outro elemento que aparece anteriormente nesses dispositivos. Não houve. Houve conteúdo falso? Também não houve.

De modo que nós estamos, portanto, diante de uma situação que me parece bastante sensível e quiçá limítrofe entre uma certa, com algum eventual exagero, uma certa mercancia de induzimento, um flertar com a fraude ao sentido da lei e os limites objetivos de uma norma que, aparentemente, foi cumprida nos seus limites.

De modo que esta é a sensibilidade que eu vejo no caso presente e, por isso, Senhora Presidente e eminentes pares, eu vou juntar uma declaração de voto, porque essa é daquelas matérias que se nós, obviamente, pudéssemos, iríamos continuar debatendo isso mais para verticalizar o tema. Mas creio que, à luz do caso concreto e com as ressalvas e circunstâncias que vou fazer agora, como que num obiter dictum para assentar as preocupações que tenho, irei, aqui, neste momento, considerando as premissas fixadas pelo eminente Ministro Relator, qual seja: no Estado de Direito democrático aonde não há lei anterior que defina sanção e prévio limite, limitar a manifestação de vontade flerta com a censura.

Portanto, encontrando um equilíbrio in dubio no exame do caso presente, como eu estou dizendo nessa declaração de voto, eu vou acompanhar o eminente Ministro Relator, fundamentalmente, nos seguintes termos – estou a dizer: cumpre registrar, em primeiro lugar, que estamos em sede de recurso especial, vale dizer, a análise que não comporta reexame de fatos e provas ou mesmo a alteração da natureza da questão que ora se apresenta.

Houve uma representação por propaganda irregular e da sanção imposta: multa por propaganda irregular. E, portanto, são condições prévias que limitam o exame desta matéria. E prévias também são essas condições, no sentido de serem essenciais, porque daí se extrai limite dos elementos que, em tese, poderiam aproximar, casos como esse, da fraude à lei.

Ademais, entendo caber uma ressalva à dimensão terminológica adotada no acórdão regional – o acórdão fala em abuso do poder. Ainda que se possa ter uma relação de antecedente e consequente entre uma realidade e outra, o simples fato, não apenas de serem expressões distintas – fraude à lei e abuso de poder –, mas o conteúdo, evidentemente, revela que nós não estamos tratando de conceitos que se identificam. Não há identidade entre fraude à lei e abuso de poder e embora possa ser identificado uma relação de causa e consequência.

Ressalto ainda o parâmetro de densidade normativa que se está a avaliar. Feito dessa ordem, limitado à cognição de recurso especial, não comporta uma discussão alargada sobre caracterização de hipótese de abuso de poder. Trata-se, sem sombra de dúvida, de caso limítrofe cuja circunstância em abstrato, à luz de outros casos concretos, poderá voltar à análise de discussão por esta Corte sobre parâmetros diversos.

Feito essas considerações, Senhora Presidente, acompanho o notável voto do eminente Ministro Relator para afastar a condenação, por reconhecer que no feito não se identificou, à luz do caso concreto, violação direta à letra da lei de regência, art. 57-C, sobre propaganda eleitoral na internet, a justificar a imposição de multa.

Não o faço sem, contudo, e com ênfase, sublinhar a ressalva que o ilustre Ministro Relator fez em seu voto. Eventuais excessos podem e devem ser objeto de análise pelas vias adequadas e cuja sanção pode ser a retirada do conteúdo, além da imposição da multa do § 2º do art. 57.

Com essas observações, acompanho o eminente Ministro Relator.

 

DECLARAÇÃO DE VOTO

 

 

O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN: Senhora Presidente, trata-se de recursos especiais interpostos por Jilmar Augustinho Tatto e outra, e Google Brasil Internet Ltda.  contra acórdão proferido pelo TRE/SP em feito que versa sobre publicidade paga na internet, especificamente sobre impulsionamento pago utilizando como palavra-chave, entre outras, o nome do candidato adversário.

A Corte Regional entendeu que a conduta do recorrente fere a lei eleitoral apesar de o impulsionamento ser contratado por meio  formalmente lícito (Google ADS), por gerar repercussão negativa na propaganda do candidato oponente. O candidato recorrente ao fazer uso de modalidade lícita de propaganda por meio de “estratagema” teria incorrido, segundo o regional, em “evidente abuso de poder”.

Cabe, todavia, destacar que o presente feito chega a esta corte superior via Recurso Especial interposto contra acórdão do TRE/SP proferido em Representação por Propaganda Eleitoral irregular. É dizer, toda a sua instrução feito se deu tendo como parâmetro a análise da regularidade/irregularidade da propaganda eleitoral, e foi desenvolvida em observância ao procedimento previsto no art. 96, da Lei das Eleições. Trata-se, por oportuno, de procedimento mais célere que, a título de comparação, o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar 64/90 – utilizado na instrução e julgamento das ações para apuração de abuso de poder.

Bem definido, por oportuno, o escopo do presente feito.

O ilustre Ministro Relator, em seu voto, delimitou a questão controversa nos autos em testilha: “saber se é lícita a utilização do nome de candidato adversário como palavra-chave para o fim de impulsionamento de propaganda eleitoral na modalidade de priorização paga de conteúdos em aplicação de busca na internet (links patrocinados)” (p. 24).

No âmbito do julgamento a ser proferido por esta Corte nos estritos limites da análise que pode ser feita em sede de Recurso Especial, ou seja, a análise que não comporta reexame de fatos e provas e mesmo alteração da natureza da questão que ora se apresenta (propaganda irregular) e da sanção imposta (multa por propaganda irregular), tais definições prévias são essenciais.

E são essenciais porque podemos extrair, no limite, elementos que em tese poderiam se aproximar de casos de fraude à lei. E cabe ressalva à dimensão terminológica adotada no acórdão regional passível de indicar desacordo jurídico que demanda clareza em afastar eventual tratamento como sinonímias entre “fraude à lei” e “abuso de poder”. Não há identidade entre os institutos, embora eventualmente possa ser identificada uma relação de causa e consequência.

Ademais, cabe ressaltar o parâmetro de densidade normativa que se está a avaliar. Feito dessa ordem não comporta discussão sobre caracterização de hipótese de abuso de poder. Trata-se, sem sombra de dúvidas, de caso limítrofe que voltará a ser objeto de análise e discussão por essa Corte sob os diversos parâmetros.

Feitas estas breves ponderações, acompanho o notável voto do Min. Relator para afastar a condenação por reconhecer que no feito não se identifica violação direta à lei de regência sobre propaganda eleitoral na internet a justificar a imposição da sanção de multa. Não o faço sem, contudo, e com ênfase, sublinhar a ressalva que o i. Min. Relator faz em seu voto: eventuais excessos podem e devem ser objeto de análise caso a caso pelas vias adequadas.

É como voto.

 

VOTO

 

O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES: Bom dia, Presidente, bom dia Ministros. Eu inicio cumprimentando as sustentações orais dos advogados e do Doutor Humberto; também cumprimento o eminente relator, Ministro Sérgio Banhos, pela verticalidade do voto, agora seguido pelo voto do eminente Ministro Fachin. E já antecipo, eminente Presidente, que vou divergir.

Qual a hipótese? Eu, eleitor, quero mais informações sobre um candidato, que é o candidato que me interessa. Vou procurar esse candidato e num verdadeiro estelionato eleitoral, com todo o respeito às posições diversas, um verdadeiro estelionato eleitoral, financiado, pago, aparece, não só um outro candidato, mas também já aparece o outro candidato, com o dizer: “esse é o melhor candidato; esse fez isso”. E mais, aparece num espaço – como o próprio eminente Ministro Relator disse – num espaço privilegiado.
Quer dizer, eu, eleitor – e isso foi bem destacado pelo eminente subprocurador-geral –, tenho o direito ao mercado livre de ideias; mas eu, eleitor, tenho o direito de procurar o que eu quiser. Não é possível, com todo o respeito, não é legítimo que se imponha ao eleitor uma informação que ele não quer, não procurou e não deseja.

Aqui não se trata de disputa, confronto, aqui se trata de desrespeito ao eleitor. O eleitor está procurando informações sobre o seu candidato, ele não quer informações sobre outro candidato – se ele quiser, ele procura.
E qual o estelionato, a fraude à lei? Isso começou nos Estados Unidos, nas eleições nos Estados Unidos, e trouxeram para cá agora. Eu peço extrema reflexão sobre isso, porque, como disse o Ministro Fachin, as eleições municipais agora, nós vamos ter um abuso total disso.

Estão invadindo o eleitorado alheio, desviando, isso é um verdadeiro desvio de interesse, aqueles interessados numa informação acabam sendo desviados.

“Ah, mas ele pode não clicar, ele pode afastar”. Só que ele foi direcionado erroneamente. Dizer que isso não prejudica a candidatura, a outra candidatura, isso é um verdadeiro obstáculo entre o eleitor e as informações que ele procura do seu candidato. Coloca-se um obstáculo, não é um obstáculo intransponível, mas é um obstáculo. Ao se colocar um obstáculo, via ferramenta paga, a meu ver, houve desrespeito ao art. 57-C.
O que se fez aqui é uma propaganda eleitoral paga, um obstáculo eleitoral, uma propaganda negativa. Ou seja, o eleitor não consegue chegar diretamente as informações que está procurando, porque, no que clicou,  já apareceu a propaganda paga. Não é um impulsionamento. Impulsionamento é se eu procurasse, no caso aqui, o eleitor, o candidato Jilmar Tatto. Eu não procurei o candidato Jilmar Tatto. Aqui se procurou o candidato Ricardo Tripoli. Ao procurar o candidato Ricardo Tripoli, apareceu uma propaganda paga do outro candidato. Não se está aqui a impulsionar, está-se a invadiu um espaço de outra candidatura com propaganda paga. Não é impulsionamento, é uma forma desviada de propaganda paga.

Imagina agora, eleições municipais, você procura um candidato a prefeito, os outros dez candidatos vão utilizar isso – só vai aparecer os outros candidatos, um vai bloquear a informação do outro. O prejuízo é ao eleitor. “Ah, o eleitor tem que ter direito ao maior número de informações.” Tem. Só que o eleitor não é criança. O eleitor quer saber do candidato A, ele procura o candidato A; quer saber do candidato B, procura o candidato B.
“Ah, mas ele quer saber do A, vamos colocar o B, o C, o D. E, todos, antes, não é? Porque, como pagou, é privilegiado. Isso é, a meu ver, uma forma de propaganda absolutamente irregular. É prejudicial, aí sim, ao livre debate e às livres informações que o eleitor quer. Quantos e quantos eleitores – não só nesse caso, mas em casos semelhantes – acabam desistindo de procurar as informações? Ele está procurando informações sobre o candidato, no caso Ricardo Tripoli, começa a pipocar e aparece Jilmar Tatto. Não foi o que ele procurou, ele tenta de novo, aparece de novo; ele desiste. Dizer que isso não é prejudicial à candidatura, dizer que isso não é uma forma irregular de impulsionamento do candidato, das ideias do outro candidato, é uma propaganda que atravessa a vontade livre e consciente do el eitor. O eleitor está procurando um conteúdo, por meio de ferramentas, ele acaba chegando a outro totalmente diverso. Isso, a meu ver, como disse, é um verdadeiro estelionato, é fraude, é desvio aqui da interpretação da lei.

Não se trata, também com todo o respeito ao que foi sustentado pelo eminente Vice-Procuradoria-Geral Eleitoral, de um conteúdo neutro. Não. Eu procuro Ricardo Tripoli, é jogado no meu rosto: “Jilmar Tatto é o melhor candidato ao Senado”. Isso de neutro não tem absolutamente nada.

Quer dizer, não é possível que isso ocorra; não é possível que o Tribunal Superior Eleitoral referende essa possibilidade às vésperas das eleições municipais, onde cada candidato tem a sua propaganda na rede e aí o candidato que paga por esses mecanismos, mecanismo SEO, ou SEM, para aumentar a sua visibilidade, ele acaba atravessando o outro candidato sem que o eleitor queira as informações.
O Tribunal Superior Eleitoral, ao referendar isso, vai gerar uma balbúrdia gigantesca de informações. Um vai atravessar o outro e ninguém vai ter informação de nada. O eleitor tem que ser livre para procurar as ideias que ele quiser; o eleitor tem que ser livre para procurar o candidato, com a sua plataforma que ele quiser. Ele não pode ser obrigado, a ter acesso as informações de outro candidato, que em momento algum desejou.
Aqui foi transcrito e o juiz eleitoral colocou: se nós olharmos – está transcrito no voto do eminente relator –, você desiste de procurar o primeiro candidato, porque aparece primeiro “esse é o melhor candidato”, depois “ele fez o bilhete único” “ele fez não sei o que...”. Depois de uma página inteira você desiste de procurar a informação que você pretendia.

Basta verificar e também foi, de forma extremamente leal, foi colocado no voto do eminente relator, que, no campo civil, a Justiça Comum vem entendendo que isso é ilegal. Se você vai procurar – para eu não fazer propaganda aqui na TV Justiça de nenhuma montadora, Presidente −, o carro X e aparece o carro Y. “Oh, esse carro é muito melhor; esse carro é mais econômico.”

É considerado pela Justiça Comum como deslealdade, concorrência desleal. Tem algo muito mais importante que é o voto, que é a informação que o eleitor está procurando. É uma concorrência desleal. Aqui seria, inclusive, um abuso de poder econômico de um candidato em relação ao outro. As candidaturas ricas, candidaturas cujos partidos têm um fundo partidário eleitoral gigantesco, é só eles marcarem: “Ah, se for consultar o vereador tal, vamos colocar todos os nossos vereadores antes.”

Não vai chegar nunca ao vereador tal! Repito, com todo respeito às posições em contrário, se o TSE referendar esse posicionamento, isso vai possibilitar um abuso de poder econômico na contratação dessas ferramentas para as próximas eleições, em que candidatos que não tenham dinheiro não vão conseguir veicular na rede nenhuma informação. Porque ao clicar o nome dele vão aparecer 320 nomes antes. Isso não é mercado livre de ideias, isso é imposição, é invasão à liberdade do eleitor de procurar a informação que ele pretende.
Então, a meu ver, houve veiculação de propaganda eleitoral paga. Aqui não é um impulsionamento; houve uma propaganda eleitoral que atravessou o caminho do candidato. Caracteriza-se, a meu ver, integralmente aqui as elementares do art. 57-C.

Então, pedindo todas as vênias ao eminente relator e ao eminente Ministro Edson Fachin, eu nego provimento aos recursos especiais eleitorais.

A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER (presidente): Obrigada, Ministro Alexandre. É realmente um tema sensível, muito interessante.

 

VOTO

 

O SENHOR MINISTRO OG FERNANDES: Senhora Presidente, Senhores Ministros, Senhoras e Senhores, se nós estivéssemos aqui diante de uma hipótese de temperamento e de personalidade, eu diria que esse é um caso borderline, nós estamos em uma faixa fronteiriça entre o que é admissível, o que é lícito, o que é ético e o que não é.

Coincidentemente, o outro caso a que o Ministro Sérgio Banhos se referiu encontra-se comigo – aliás, acho até que é do Ministro Banhos e é um caso de litispendência. E isso rachou o entendimento. Nós já fizemos várias reuniões internas no gabinete e a compreensão disso – exatamente por ser fronteiriça – é... há um dissenso.

Penso que o voto do Ministro Fachin − do Ministro Fachin, mas essencialmente do Ministro Sérgio Banhos – traz, nessa situação borderline, talvez algo consistente do ponto de vista jurídico. Por quê? E aí talvez eu tivesse uma pergunta a mais a fazer ao Ministro Sérgio Banhos diante da compreensão dos fatos e diante do que tenho lá.

Nós estamos diante de uma hipótese em que, acionado alguém pelo Google, e sendo esse alguém pessoa do mundo político − no caso chama-se Senhor Ricardo Tripoli. No acionamento, acima das informações referentes àquela pessoa, surge um anúncio, claramente dizendo anúncio, de terceiros, no caso o Senhor Jilmar Tatto. Esse anúncio é pago, mas as informações sobre o candidato − no caso o candidato Tripoli − são aquelas usuais, naturais, que são, no decorrer do tempo, reunidas em torno do perfil de alguém. Não é essa a hipótese. Isto é, há um pago e um não. Um é...

O SENHOR MINISTRO SÉRGIO BANHOS (relator): O que se chama patrocinado e orgânico. O patrocinado vem na frente, nesse caso registrado como propaganda...

O SENHOR MINISTRO OG FERNANDES: Perfeito. Perfeito. Perfeito.

O SENHOR MINISTRO SÉRGIO BANHOS (relator): ...depois que se clica nesse é que vem aquelas informações adicionais...

O SENHOR MINISTRO OG FERNANDES: Exatamente. Então...

O SENHOR MINISTRO SÉRGIO BANHOS (relator): ...mas é só essa chamada. Fazendo uma analogia: como se fosse alguém procurar para comprar uma passagem aérea de uma determinada empresa e botasse... e chega sempre uma daquelas empresas que vendem de todas, colocando como se fosse ela e por vezes até nos aborrecendo com essa informação.

O SENHOR MINISTRO OG FERNANDES: Perfeito.

A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER (presidente): Se me permite, até porque eu também ia buscar essa complementação. E, me diga bem, nessa hipótese figurada pelo Ministro Alexandre de Moraes, são vários candidatos, todos utilizando essa estratégia, nós teríamos a tela inundada por aqueles nomes todos. Seria isso?

O SENHOR MINISTRO SÉRGIO BANHOS (relator): Presidente, trabalhando hipoteticamente. Mas todas...

A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER (presidente): Não, não. Eu pergunto como ocorreria, eu até posso depois pedir vista para esclarecer...

O SENHOR MINISTRO SÉRGIO BANHOS (relator): Olha, eu imagino que, como todo link patrocinado vem na frente, essa estratégia hipotética, ela, evidentemente quem fizesse traria esses links patrocinados à frente dos orgânicos. Nesse caso específico foi só um.

O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES: O orgânico apareceu na quarta, apareceria na quarta página. E iria aparecendo, aparecendo...

A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER (presidente): Porque é um número limitado de links que aparecem. Talvez possa o advogado esclarecer.

O SENHOR MINISTRO SÉRGIO BANHOS (relator): O advogado do Google possa explicar melhor.

O DOUTOR EDUARDO MENDONÇA (advogado): Excelência, em toda pesquisa, por mais que possa haver anúncios, a quantidade de anúncios exibidos no começo é limitada. E, na prática, não chega, geralmente 3 ou 4. E a maior parte da primeira página necessariamente é ocupada por anúncios orgânicos relacionados à pesquisa feita pelo usuário. E, quando se contrata anúncio, não existe a possibilidade de se contratar a exclusão ou a mudança de critério para que esses anúncios orgânicos apareçam.

Então, os anúncios são uma pequena parte do começo e não a página inteira. É impossível encher páginas com anúncios, por conta de como é feito o sistema.

A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER (presidente): Obrigada, Doutor Eduardo.

O DOUTOR EDUARDO MENDONÇA (advogado): Eu que agradeço.

A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER (presidente): Ministro Og.

O SENHOR MINISTRO OG FERNANDES: Pois não, Presidente. É exatamente a hipótese que leva o caso concreto e o que tenho é exatamente o mesmo.

A questão não se cinge, a meu ver, nesse momento e nesse caso, ao impedimento da liberdade do eleitor. Penso dessa maneira por quê? Porque ao digitar e necessitar ou querer informações a respeito do indivíduo “A” e vindo essas informações, que eu prefiro dizer não pagas, orgânicas – facilita para o leigo –, acima dessa informação usual, correntio de qualquer um de nós, vem, sim, uma informação a respeito de um nome “B”, no caso do mundo político.

O eleitor, numa hipótese ou noutra, ele tem a liberdade de escolher em quem ele quer visitar ou revisitar. Por quê? Porque não é apenas naquele primeiro, usando o site do Google, em que ele coloca o nome e quer saber a respeito daquela pessoa, que obrigatoriamente abre-se na página daquela pessoa, há um espaço em que se reúnem essas informações e que ele é obrigado mais uma vez a clicar. Isso é experiência nossa. Nós queremos saber do TSE, no Google, e vai aparecer lá um segundo momento em que se é necessário, entre aquelas hipóteses ali, clicar para saber sobre o TSE.

Não agrada − e eu concordo com o Ministro Alexandre − esse tipo de possibilidade tal como posta lá e aqui. Porém, acho que isso ainda está a um passo da ilegalidade. Sendo, como falei, algo fronteiriço, parece que, na hipótese, falta algum elemento a mais, ou aquele passo a mais, que se transborde para o lado da ilegalidade. Qual seria, por exemplo, essa hipótese, no caso concreto? Eu querer informações a respeito do Senhor Tripoli e quando eu entro no Google e digito o nome Tripoli, imediatamente apareceria a página com informação do Senhor Tatto.

Aqui, repito, e por último, tem um segundo passo que não impede a eleição, a eleição do interessado para colher informações de quem quer que seja, notadamente dos seus candidatos ou das suas preferências, ou apenas de alguém que ele tem curiosidade de saber até para opção.

Então, não sendo algo que me pareça elogiável como estratégia na área política, de propaganda de um site como o Google, penso que eu tenho que ir além para disso extrair a ideia de que pela literalidade da legislação pertinente à matéria não vejo como possamos proibir no estado da arte, da legislação...

Pois, não, Ministro Alexandre.

O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES: Permite, Ministro, só uma reflexão?

O SENHOR MINISTRO OG FERNANDES: Pois não, Ministro Alexandre.

O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES: O que a legislação permite é o impulsionamento de conteúdo. Então eu procuro informações “Ministro Og Fernandes”, e chega o conteúdo que o Ministro prefere, é o impulsionamento de um conteúdo. Essa hipótese não é impulsionamento de conteúdo, por isso que me parece que nós vamos abrir demais a interpretação. Essa hipótese é propaganda eleitoral paga.

Eu procuro o candidato Tripoli, não se está impulsionando o conteúdo sobre a minha busca, o impulsionamento de conteúdo é direcionamento sobre um conteúdo ligado a minha busca. No momento em que eu estou buscando um candidato e vem a propaganda do outro, não se trata aqui da exceção, “excetuado o impulsionamento de conteúdo”, se trata da regra: propaganda eleitoral paga. Nós não estamos aqui discutindo impulsionamento de conteúdo, mas, sim, um obstáculo em relação a uma busca, que é propaganda paga. Só essa reflexão.

O SENHOR MINISTRO OG FERNANDES: Pois não, Ministro Alexandre. Veja, demos o nome que quisermos a esse impulsionamento que se faz livremente na internet, independentemente de que ramo, da especificidade que se faça, sairão, necessariamente, informações a respeito daquilo que nós pedimos. E essas informações – repito − não são pagas. Ela é uma espécie de um curriculum vitae eletrônico indesejado, porque surgem boas e más informações, cabendo ao usuário do serviço fazer a distinção do joio do trigo.

O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN: Vossa Excelência me permite um aparte, Ministro Og?

O SENHOR MINISTRO OG FERNANDES: Claro, Ministro.

O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN: Apenas à luz da intervenção do Ministro Alexandre e reiterando – o Ministro Og, o Ministro Alexandre e o Ministro Sérgio Banhos – a singularidade dessa situação a exigir uma ampla reflexão, mas essa condição que o eminente Ministro Alexandre de Moraes traz à colação para definir o que é impulsionamento não me parece estar no § 2º do art. 27 da Lei das Eleições, que diz: “para os fins dessa lei, inclui-se entre as formas de impulsionamento de conteúdo a priorização paga de conteúdos resultantes de aplicações de busca na Internet.”

A dificuldade a que se tem, e jungindo isso com a propaganda na internet, que é permitida à luz do art. 57, caput, letra A, expressamente. Nos termos claros do 57-B, vedando-se alterar o teor, vedando-se falsear a realidade, continua ainda tendo dificuldade em alçar a Justiça Eleitoral, ainda que, nesse caso limítrofe, num papel de quase censor universal.

Muito obrigado, Ministro Og.

O SENHOR MINISTRO OG FERNANDES: É um prazer, Ministro Fachin.

A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER (presidente): Ministro Og, só para continuar refletindo em conjunto. O tribunal de origem buscou os institutos da fraude e do abuso, não é? Porque parece-me que o problema todo é a palavra-chave: eu faço a minha propaganda a partir da palavra-chave, que é o nome do outro candidato. É essa? Esse é o ponto, não é?

Por isso, na verdade, pelo que eu depreendi dos debates, examinei, na verdade, se caminha para o uso indevido do direito nas figuras da fraude, do abuso. Seria por aí. Realmente é um tema muito complicado.

O SENHOR MINISTRO OG FERNANDES: É.

A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER (presidente): Obrigada, Ministro Og.

O SENHOR MINISTRO OG FERNANDES: Na verdade, é que nós vivemos numa nova república grega. A praça é a internet e nós todos, a população, em torno dela avaliando como vamos decidir.

Voltando e concluindo meu raciocínio – parco raciocínio, porque o tema realmente é candente –, penso que uma interpretação, embora até desejável, eu cheguei a discutir esse caso no gabinete, até diante do Código de Defesa do Consumidor, veja que abrangência, que espectro esse tema tem. Nós estaríamos em uma relação abusiva na área do Direito do Consumidor? Então, terminaríamos o ano aqui decidindo isso.

Mas enfim, para concluir, eu penso que esse passo além da fronteira, que eu penso estabelecer no caso, que eu metaforicamente pensei, não seria possível pelo TSE. Porque aí acho que nós estaríamos revisitando a legislação. Parece ser um trabalho desejável, mas que nós não pudemos dar o passo além das nossas possibilidades, que é a mera interpretação aqui.

Mas, enfim, eu concluo o meu voto feliz por estar podendo participar dessa discussão, uma discussão que enriquece o currículo de cada um de nós.

Eu, acompanhando ao eminente relator sem com isso entender que o posicionamento do Ministro Alexandre de Moraes não mereça reflexão, merece sim.

 

PEDIDO DE VISTA

 

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO: Presidente, eu vou pedir vista.

A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER (presidente): Que bom, Ministro Salomão! Vai me dar tempo também para refletir um pouco mais, porque eu ia terminar pedindo vista também. Porque entendo que é um assunto relevantíssimo, às portas das novas eleições, como disse. São quase seis mil eleições que nós teremos em outubro, não é? E aqui vamos concluir numa outra linha, é muito importante.

 

 

EXTRATO DA ATA

 

 

REspEl nº 0605310-76.2018.6.26.0000/S. Relator: Ministro Sérgio Banhos. Recorrente: Google Brasil Internet Ltda. (Advogados: Eduardo Mendonça – OAB: 130532/RJ e outros). Recorrente:  Coligação São Paulo do Trabalho e de Oportunidades (Advogados: Marcelo Santiago de Pádua Andrade – OAB: 182596/SP e outros). Recorrente: Jilmar Augustinho Tatto (Advogados: Jéssica Guedes Santos – OAB: 57719/DF e outros).  Recorrida: Coligação Acelera SP (Advogados: Tatiane de Oliveira Flores – OAB: 346230/SP e outros).

Usaram da palavra, pela recorrente Google Brasil Internet Ltda., o Dr. Eduardo Mendonça, pelo recorrente Jilmar Augustinho Tatto, o Dr. Ademar Aparecido da Costa Filho, e, pelo Ministério Público Eleitoral, o Dr. Humberto Jacques de Medeiros.

Decisão: Após o voto do relator, dando provimento aos recursos especiais eleitorais a fim de julgar improcedente a representação e tornar insubsistente a multa aplicada, no que foi acompanhado pelos Ministros Edson Fachin e Og Fernandes, e o voto divergente do Ministro Alexandre de Moraes, negando-lhes provimento, pediu vista o Ministro Luis Felipe Salomão. Suspeição do Ministro Luís Roberto Barroso.

Aguardam o Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e a Ministra Rosa Weber.

Composição: Ministra Rosa Weber (presidente), Ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Og Fernandes, Luis Felipe Salomão, Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e Sérgio Banhos.

Vice-Procurador-Geral Eleitoral: Humberto Jacques de Medeiros.

SESSÃO DE 5.3.2020.

 

VOTO-VISTA

 

 

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO: Senhor Presidente, a hipótese cuida de dois recursos especiais, um deles interposto por Google Brasil Internet Ltda. e o outro por Jilmar Augustinho Tatto (candidato ao cargo de senador nas Eleições 2018) e pela Coligação São Paulo do Trabalho e de Oportunidades, contra acórdão no qual o TRE/SP cominou multa de R$ 10.000,00 aos segundos recorrentes por prática de propaganda eleitoral na internet, em desconformidade com o art. 57-C da Lei 9.504/97.

De acordo com a Corte local, houve o indevido uso da ferramenta de impulsionamento da Google (Google Ads), pois o eleitor, ao pesquisar o nome de candidato adversário, obtinha como retorno, no topo da primeira página de resultados e a título de conteúdo patrocinado, a mensagem “procurando p/ Ricardo Tripoli? / Conheça Jilmar Tatto”, com link para o respectivo o sítio eletrônico da campanha.

Na sessão de 5/3/2020, o douto Relator, Ministro Sérgio Banhos, em voto verticalizado, proveu os recursos especiais, no que foi seguido pelos eminentes Ministros Edson Fachin e Og Fernandes. Assentou-se, em suma, que “a apresentação de alternativas ao eleitor, a fim de que ele, se desejar, conheça outro candidato não pode ser vista, por via de regra, como forma de prejudicar a campanha eleitoral de outros candidatos”. 

Por sua vez, o douto Ministro Alexandre de Moraes divergiu e manteve a multa. Entendeu que a hipótese não é de impulsionamento, mas de invasão do espaço de propaganda de adversário político, a representar “verdadeiro obstáculo entre o eleitor e as informações que ele procura do seu candidato”, com nefastas consequências na livre circulação de ideias e na paridade de armas.

Pedi vista dos autos para melhor exame do caso em virtude da relevância da matéria.

2. De início, acompanho o eminente Relator no que tange às duas questões preliminares trazidas à apreciação, suscitadas pelos recorrentes.

Em primeiro lugar, é incontroversa a legitimidade ativa da coligação adversária – ora recorrida – para ajuizar a representação, sendo claro o art. 96 da Lei 9.504/97 no sentido de que “salvo disposições específicas em contrário desta Lei, as reclamações ou representações relativas ao seu descumprimento podem ser feitas por qualquer partido político, coligação ou candidato [...]”.

Ainda a esse respeito, anoto que o candidato em princípio prejudicado pela propaganda dos segundos recorrentes disputou as eleições pela coligação autora, motivo pelo qual é inconteste o interesse desta na causa.

De outra parte, reconheço o interesse recursal da Google Brasil Internet Ltda.

Apesar da improcedência do pedido quanto à referida empresa, eventual manutenção do aresto a quo poderá repercutir diretamente em aspectos negociais relativos ao impulsionamento de conteúdos por candidatos, partidos políticos e coligações nas campanhas eleitorais. Transcrevo do bem lançado parecer ministerial (ID 13.661.688, fl. 13):

 46. [...] Isso porque, embora não tenha sido proibida pelo TRE/SP a utilização da ferramenta, a prevalecer o entendimento fixado pela Corte Regional, fica reduzido o alcance do mecanismo de impulsionamento Google Ads na seara eleitoral.

Há de se reconhecer, assim, a qualidade de terceiro prejudicado da empresa, nos termos do art. 996 do CPC/2015.

3. No que concerne ao tema de fundo, penso que a matéria, de complexidade ímpar, possui grande relevância e inequívoca repercussão nas Eleições 2020, circunstâncias que motivaram o pedido de vista.

Esses aspectos não passaram desapercebidos pelos eminentes pares que me antecederam, independentemente da posição adotada. Como bem sintetizou o douto Ministro Og Fernandes, está-se diante de “faixa fronteiriça entre o que é admissível, o que é lícito, o que é ético e o que não é”.

A controvérsia cinge-se à possibilidade de que certo candidato, visando promover sua campanha na internet, lance mão da ferramenta de links patrocinados de tal modo que o seu nome componha o primeiro resultado da busca realizada pelo eleitor, ainda que ele estivesse procurando informações a respeito de outra candidatura.

Os fatos foram delimitados com clareza no aresto regional:

No caso dos autos, este magistrado, ao realizar, em 08.09.2018, a busca do nome do candidato Ricardo Tripoli no dispositivo de busca Google, obteve, no topo da primeira página de resultados, além de diversos sítios relacionados ao candidato, o seguinte conteúdo patrocinado:

Procurando p/ Ricardo Tripoli? | Conheça Jilmar Tatto‎

Anúncio www.jilmartatto.com.br/‎

Criador do Bilhete Único, Corredores de Ônibus e Ciclovias. Conheça Jilmar Tatto. Propaganda Eleitoral - Pago por Cnpj: 31234239000150.

E, ao clicar no aludido conteúdo, este magistrado foi direcionado a URL https://jilmartatto.com.br/2018/09/01/conheca-jilmar-tatto-o-melhor-candidato-a-senador/, que tem o seguinte texto:

Conheça Jilmar Tatto, o melhor candidato a senador!

por jilmarta | set 1, 2018 | Sem categoria | 0 Comentários

Conheça Jilmar Tatto, o melhor candidato a senador!

Estava procurando por Ricardo Tripoli no Google? Temos uma opção melhor e mais alinhada com o que o povo de São Paulo precisa. Conheça jilmar Tatto, o senador do Lula. Criador do Bilhete Único, Corredores de Ônibus, Ciclovias e muito mais… Veja algumas propostas de Jilmar no texto abaixo.

[...]

(sem destaques no original)

4. Nos estados modernos, credita-se a John Stuart Mill a sistematização da ideia de democracia representativa a partir da constatação empírica da impossibilidade de participação direta de todos no governo. Nesse ponto, o poder do discurso e dos argumentos não servia mais à aprovação das decisões da comunidade em relação a questões relevantes para o bem comum, mas como meios de se alcançar a figura de representação. 

Assim, a forma de propagação dos discursos sofreu modificações ao longo da História, em decorrência da necessidade de maior alcance e otimização do poder de convencimento, culminando, nos tempos modernos, na chamada democracia digital. Sua origem remonta ao surgimento de novas tecnologias no início do século passado, gradativamente incrementada com as transmissões televisivas e espaços para debates e exposição de propostas aos cidadãos.

De modo mais específico, a interatividade com os destinatários da informação – aqueles que levariam o representante ao poder por meio do voto – tem início em meados da década de 1990 a partir da disseminação do acesso à internet e da criação de ágoras virtuais, como fóruns de debate, blogs e páginas pessoais dos postulantes aos cargos eletivos.

Atualmente, a disseminação da propaganda eleitoral por meio da internet ganha contornos de regra geral, cabendo ao legislador e a esta Justiça especializada – no exercício de seu poder regulamentar e no julgamento de casos concretos – fixar balizas seguras para que os escopos sociais e jurídicos sejam alcançados, garantindo-se a legitimidade do pleito e a igualdade entre os concorrentes.

5. Sob o prisma legal, o caso dos autos envolve primordialmente o art. 57-C da Lei 9.504/97, in verbis:

Art. 57-C. É vedada a veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet, excetuado o impulsionamento de conteúdos, desde que identificado de forma inequívoca como tal e contratado exclusivamente por partidos, coligações e candidatos e seus representantes.

[...]

§ 2º A violação do disposto neste artigo sujeita o responsável pela divulgação da propaganda ou pelo impulsionamento de conteúdos e, quando comprovado seu prévio conhecimento, o beneficiário, à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 30.000,00 (trinta mil reais) ou em valor equivalente ao dobro da quantia despendida, se esse cálculo superar o limite máximo da multa.

§ 3º O impulsionamento de que trata o caput deste artigo deverá ser contratado diretamente com provedor da aplicação de internet com sede e foro no País, ou de sua filial, sucursal, escritório, estabelecimento ou representante legalmente estabelecido no País e apenas com o fim de promover ou beneficiar candidatos ou suas agremiações.

Como se vê, em regra é vedada a propaganda eleitoral paga na internet (gênero), sendo possível somente o impulsionamento de conteúdos (espécie), nos precisos termos da legislação de regência.

Parece não haver dúvida, igualmente, de que a priorização paga de conteúdos nas ferramentas de busca está inserida na autorização legal, diante do disposto no art. 26, XV e § 2º, da Lei 9.504/97, com o texto da Lei 13.488/2017, in verbis:

Art. 26. São considerados gastos eleitorais, sujeitos a registro e aos limites fixados nesta lei: 

[...]

XV – custos com a criação e inclusão de sítios na Internet e com o impulsionamento de conteúdos contratados diretamente com provedor da aplicação de Internet com sede e foro no país;

§ 2º Para os fins desta lei, inclui-se entre as formas de impulsionamento de conteúdo a priorização paga de conteúdos resultantes de aplicações de busca na Internet.

Anoto também que esta Corte Superior, no exercício do poder regulamentar conferido pelo art. 105 da Lei 9.504/97, procurou conceituar a prática do impulsionamento ao editar a Res.-TSE 23.551/2017, que assim dispõe no ponto:

Art. 32. Para o fim desta resolução, considera-se:

[...]

XIII – impulsionamento de conteúdo: o mecanismo ou serviço que, mediante contratação com os provedores de aplicação de internet, potencializem o alcance e a divulgação da informação para atingir usuários que, normalmente, não teriam acesso ao seu conteúdo; 

[...]

Ressalto que a utilização de palavras-chave nas ferramentas de busca é um modelo de negócios da empresa recorrente e o valor por ela cobrado varia conforme a capacidade dessa palavra impulsionar o produto anunciado.

A ferramenta Google Ads é produto originariamente lícito, assim como também lícito é o impulsionamento de conteúdo eleitoral, desde que identificado de forma inequívoca como tal e contratado apenas por candidatos, partidos políticos, coligações e seus representantes, com a única finalidade de promover ou beneficiar candidatos ou suas agremiações, nos termos do já referido art. 57-C da Lei 9.504/97.

6. Todavia, no meu modo de pensar, hipótese diversa é a de redirecionamento de conteúdos, prática que, embora possa guardar certa semelhança com o impulsionamento, a ele não se equivale. 

O redirecionamento consiste em termo genérico utilizado para descrever a situação na qual, através de uma palavra-chave utilizada pelo usuário, sua busca de conteúdo no google.com é artificialmente encaminhada para um destino alternativo, contrário às palavras utilizadas na pesquisa.

Segundo consta, o método de redirecionamento foi utilizado originariamente pela Google para orientar a mudança de opinião de potenciais extremistas que nutriam simpatia pelo Estado Islâmico, conforme seus históricos de pesquisa na ferramenta de busca. Afirma-se que, no início de 2016, centenas de milhares de pessoas, ao clicarem em anúncios que supostamente refletiam o interesse em conteúdo extremistas, foram redirecionadas para uma lista de reprodução de vídeos que desmascaram as narrativas de recrutamento do grupo terrorista.

Trata-se, em última análise, de método de ordem psicológica, com o intuito de influenciar o comportamento das pessoas. Ainda que em certas situações possa representar a defesa de um bem maior, transformou-se em modelo de negócios, através da valorização das palavras-chave. A capacidade de angariar simpatizantes, consumidores ou eleitores com a utilização não só do seu próprio nome ou marca, mas também com a do adversário, obviamente é sobrelevada.

Ainda que se afirme que não existe controle de conteúdo ou chapada modificação de estado mental, o fato é que a criação artificial de contextos através do redirecionamento afeta a liberdade de escolha do usuário e pode ser perigosa porta de entrada para a desinformação, inclusive com o potencial de restringir a livre circulação de ideias.

Essa preocupação foi reforçada pelo legislador pátrio com a recentíssima sanção da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que estabelece em seu art. 2º, dentre seus fundamentos, a autodeterminação informativa, a liberdade de opinião, a livre concorrência e o exercício da cidadania pelas pessoas naturais:

Art. 2º A disciplina da proteção de dados pessoais tem como fundamentos:

I – o respeito à privacidade;

II – a autodeterminação informativa;

III – a liberdade de expressão, de informação, de comunicação e de opinião;

IV – a inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem;

V – o desenvolvimento econômico e tecnológico e a inovação;

VI – a livre iniciativa, a livre concorrência e a defesa do consumidor; e

VII – os direitos humanos, o livre desenvolvimento da personalidade, a dignidade e o exercício da cidadania pelas pessoas naturais.

7. Ressalto, ademais, que a controvérsia envolvendo a licitude do método de redirecionamento de conteúdos vem ganhando corpo nos tribunais pátrios e na doutrina, notadamente no âmbito do direito privado – quanto aos aspectos da concorrência desleal e da afronta ao direito de marca.

Consoante bem enfatiza Juliana Abrusio, 

A ferramenta [Google AdWords] funciona assim: o interessado cadastra, mediante pagamento, junto ao provedor de busca, uma ou mais palavras-chave, a fim de melhor posicionar o seu site no resultado de indexação da busca. A oferta também é conhecida como “anúncios patrocinados”, pois dizem respeito a uma contratação de publicidade.

[...]

É indiscutível que a ordem de aparição na qual os links são listados tem relevante valor comercial devido à tendência dos usuários acessarem as primeiras ocorrências apresentadas, especialmente pela comodidade de procurar pelos primeiros itens indexados. [...]

[...]

Ocorre que, por vezes, os serviços de links patrocinados têm sido utilizados, pelos adquirentes do serviço, para captação indevida de clientela. Para tanto, é efetuado o cadastro de expressão pertencente a terceiro como se fosse sua. Esse tipo de utilização indevida dos links patrocinados implica em concorrência desleal.

[...]

Conforme afirma Nims, “a todos cabe o direito de aproveitar os raios de sol, mas não de usá-los para queimar a casa do vizinho”. Na mesma vereda as palavras de Celso Delmanto:

[...] pode, e deve mesmo, esforçar-se o concorrente na disputa; mas não usar de meios desleais para vencê-la. Por isso, como no esporte, incentiva-se a sua prática, mas procura-se afastar os contendores que não são honestos no embate.

(Revista Pensamento Jurídico – São Paulo – Vol. 12, Nº 1, jan./jun. 2018) (sem destaques no original)

Esse entendimento tem sido adotado nos tribunais pátrios e estrangeiros. Reproduzo novamente a citada autora diante da abrangência do estudo:

São vários os casos já analisados pelo pretório brasileiro com entendimento de concorrência desleal por links patrocinados. Nessa toada, cite-se, ainda, o processo travado entre as empresas Dafiti e World Tennis. Segundo entendeu a 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo, o comércio eletrônico da Dafiti foi proibido de utilizar o recurso de link patrocinado, nos mecanismos de buscas, utilizando-se do termo correspondente à marca World Tennis. A multa imposta pelo descumprimento foi de 1 mil reais. O Tribunal ainda condenou a ré ao pagamento de danos morais e materiais, com fundamento em que “o direcionamento do link patrocinado favorece o desvio de clientes, em ferimento à marca e concorrência desleal”. Outras decisões do Tribunal de Justiça de São Paulo foram no mesmo sentido. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro também colaciona casos em que situações de links patrocinados foram julgados como indevido[s].

[...]

No direito comparado também se encontram julgados em igual sentido. No caso Brookfield Communications, Inc. v. West Coast Entertainment Corporation 174 F.3d 1036 (9th Cir. 1999), foi reconhecido como violação ao direito de marca, a utilização de metatags em páginas de internet que possam causar confusão. No caso Google, Inc. v. American Blind and Wallpaper Factory, Inc., nº 03-cv-05340 JF (RS) (Northen District of California, 2007), foi questionada a legalidade do serviço do Google Adwords, por violação ao direito de marca. A American Blind and Wallpaper Factory alegou que o Google infringiu o seu direito marcário ao permitir que anunciantes utilizassem como palavras-chave, para contratar links patrocinados, marcas que lhe pertenciam. Em decisão interlocutória, o juiz do caso entendeu pelo prosseguimento da ação, não obstante a defesa da empresa Google. Essa decisão teve como fundamento a legislação americana de marcas (Lanham Act), o precedente do caso Playboy v. Netscape, e o precedente do caso 800-JR Cigar, Inc. v. GoTo.com, Inc. Logo após a decisão, porém, as partes firmaram um acordo.

[...]

Em julgado francês, envolvendo as empresas Viaticum, Luteciel e Google França, esse provedor foi condenado a pagar indenização por permitir o uso da marca da empresa concorrente como termo de pesquisa para a veiculação dos links patrocinados no Google AdWords.

(sem destaques no original)

Em acréscimo, já tive a oportunidade, como Relator, de cuidar do tema no Superior Tribunal de Justiça, no AREsp 1.450.872/SP, ao manter acórdão no qual o TJ/SP condenara os réus – inclusive a empresa Google – à abstenção do uso da marca do autor como palavras-chave para remissão a anúncios da concorrente no site de pesquisas do réu Google, no qual se afirmava que: 

Uso parasitário da marca configurado - Provedor de pesquisas que não pode se eximir da responsabilidade pelo ocorrido, ao argumento de que não realiza controle prévio das palavras-chave de busca contratadas pelo anunciante no serviço “AdWords” - Situação que não se confunde com o controle de provedor sobre o conteúdo de páginas na internet - Celebração de contrato eletrônico de prestação de serviços de publicidade no qual necessariamente o site de buscas toma inequívoco conhecimento do uso de marca alheia. Propriedade intelectual tem a natureza de direito absoluto e efeitos erga omnes.

8. As premissas acima mencionadas guardam identidade com o caso dos autos, em que determinado candidato utilizou-se do nome de adversário como palavra-chave para remissão a conteúdo patrocinado de sua própria campanha eleitoral. Reproduzo novamente os termos do aresto regional:

No caso dos autos, este magistrado, ao realizar, em 08.09.2018, a busca do nome do candidato Ricardo Tripoli no dispositivo de busca Google, obteve, no topo da primeira página de resultados, além de diversos sítios relacionados ao candidato, o seguinte conteúdo patrocinado:

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Cuida-se, com as mais respeitosas vênias, de espécie de uso parasitário eleitoral, embuste, ofendendo os fundamentos da proteção de dados pessoais, principalmente a autodeterminação informativa.

Se, no campo do direito privado, a conduta ilícita consiste em desviar a fidelidade de determinado produto – a lealdade do usuário com a marca do adversário –, no âmbito do direito de sufrágio vê-se que o eleitor, na busca por informações pelo candidato de sua preferência, tem sua atenção desviada mediante contra-mensagem artificial que pode vir a influenciar suas crenças, convicções e ideologias.

Reputo que a sinalização positiva da Justiça Eleitoral a esse ardil – a meu sentir ilícito – opõe-se aos valores abraçados por esta Corte para garantir a legitimidade do pleito eleitoral e o fortalecimento da democracia. Faço referência aos valores da ética e da valorização das pessoas, sendo imperiosa a atuação dos atores do processo eleitoral pautada pelos princípios da honestidade, lealdade e dignidade.

9. Mas não é só. Como se viu da dicção do art. 26, § 2º, da Lei 9.504/97, dentre as formas de impulsionamento de conteúdos se insere a priorização paga de conteúdos resultantes de aplicações de busca na internet.

Ora, quando o candidato utiliza o nome do seu adversário como palavra-chave, não existe relação de causalidade entre a busca e o resultado que se projeta. O eleitor buscou o candidato “A”, surgindo como resposta priorizada – uma vez que paga – o candidato “B”.

Assim sendo, a prática não encontra adequação ao teor da norma de exceção, tratando-se, como asseverado, de modalidade vedada de propaganda eleitoral na internet. O que a norma permite é a priorização paga de conteúdos resultantes da busca do eleitor, o que não é o caso dos autos. 

Em outras palavras, o eleitor não buscou aquele candidato, mas seu adversário. O conteúdo do resultado da busca é distinto e, dessa forma, não há nexo causal entre a busca pelo eleitor e o conteúdo resultante, fruto de priorização paga.

A ampliação da exceção legal, na realidade, atende apenas aos interesses mercadológicos da empresa recorrente, não servindo ao livre debate de ideias. 

Aliás, anoto que esta própria Corte Superior, ao regulamentar a Lei 9.504/97 por meio da Res.-TSE 23.551/2017, anteviu – ainda que em hipótese não idêntica à do presente caso, envolvendo dispositivo diverso – a impossibilidade de que candidatos, legendas e coligações se aproveitem da associação parasitária no âmbito da propaganda eleitoral.

Com efeito, o § 3º do art. 23 da mencionada Resolução estabelece que “é vedada a utilização de impulsionamento de conteúdos e ferramentas digitais não disponibilizadas pelo provedor da aplicação de internet, ainda que gratuitas, para alterar o teor ou a repercussão de propaganda eleitoral, tanto próprios quanto de terceiros (Lei nº 9.504/1997, art. 57-B, § 3º)”. 

Dito de outra forma, não pode o candidato, seu partido político ou coligação, sob o pretexto de alavancar sua campanha, interferir no espaço de propaganda de adversário político.  

10. Não é demais relembrar que está em trâmite no Congresso Nacional o PL 2630/2020, que institui a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet (também chamada de “Lei das Fake News”), priorizando o combate à desinformação. Consta do art. 3º, III, do texto aprovado pelo Senado da República que a lei será pautada pelo princípio do respeito ao usuário em sua livre formação de preferências políticas e de uma visão de mundo pessoal. 

Nos termos do art. 15 do PL 2630/2020, os provedores de redes sociais que fornecerem impulsionamento de propaganda eleitoral deverão disponibilizar ao público a identificação do anunciante, além das características gerais da audiência contratada. 

Já no caso em tela, o anunciante somente pôde ser identificado após o redirecionamento, com a utilização do critério de busca distinto escolhido pelo eleitor, nos termos do que consignou a Corte local.

Não parece ser esta a intenção do legislador. Seja no arcabouço normativo eleitoral, na Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais ou na legislação projetada da Transparência na internet, tudo o que se pretende é o livre fluxo de ideias, desalijada a desinformação, a contrafação, em suma, o fomento do escorreito debate democrático, sob condições legítimas e igualitárias.

Por meio de um raciocínio tecnologicamente regressivo, a conduta em debate seria como, em uma campanha de rua, a Justiça Eleitoral permitir o uso de aparato pago a fim de que certo candidato atravesse o canal de comunicação utilizado pelo adversário. 

Em termos práticos, se o candidato fixa uma placa em determinada região que é seu reduto eleitoral e por onde passam seus simpatizantes, seria permitir que seu adversário colocasse aparato mais chamativo com sua imagem e nome, impedindo o acesso direto do eleitor àquele contendor de sua preferência. 

Parece que sequer o vetusto dolus bônus outrora admitido para as relações comerciais autoriza a prática ora pretendida como lícita. A partir do momento em que, utilizando mecanismo de impulsionamento oneroso, o candidato usa o nome de seu adversário como palavra-chave para gerar um resultado patrocinado com seu próprio nome, reitero que a conduta não encontra guarida no ordenamento, não sendo abarcada pela exceção prevista no art. 57-C da Lei 9.504/97.

Cuida-se de campo fértil para o abuso do poder econômico e dos meios de comunicação – ainda que não sejam exatamente objeto do caso dos autos –, vulnerando o ideal democrático da livre circulação de ideias e a autodeterminação informativa, com capacidade de alcançar gravidade suficiente para macular a igualdade e a legitimidade do pleito eleitoral.

11. De igual modo, há de se ressaltar o direito ao nome, inserido no bloco protetivo irradiado da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição da República). Sua utilização indevida por terceiros deve ser coibida não só conceitualmente, mas também na prática.

O espectro de garantia das cláusulas constitucionais que asseguram tanto a liberdade individual (art. 5º, caput) como a privacidade (art. 5º, X) orientam o julgador no tratamento de eventuais conflitos que a manipulação e desvirtuamento do nome civil possam gerar. A proteção constitucional impõe limites nesse atuar com o nome alheio, reiterando que o respeito à privacidade e à autodeterminação informativa foram positivados pelo legislador na Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (art. 2º, I e II, da Lei nº 13.709/2018).

A privacidade e a autodeterminação são corolários da proteção de dados individuais e, segundo a clássica doutrina americana The Right to Privacy, artigo dos juízes da Suprema Corte dos Estados Unidos Samuel D. Warren e Louis D. Brandeis, constata-se que, independentemente do contexto social, político, tecnológico ou histórico, “a invasão injustificada da privacidade individual deve ser repreendida e, tanto quanto possível, prevenida”. Somente se pode admitir ponderação e modulação desse feixe garantista diante de interesses de igual ou maior relevo. Não parece ser o caso dos autos.

Como se viu, o único interesse subjacente é o comercial da empresa de tecnologia que pretende disponibilizar esse produto para as centenas de milhares de candidatos nas próximas eleições. Em exercício de ponderação entre o direito à liberdade individual e privacidade, ambos derivados da dignidade da pessoa humana, e o interesse comercial, a Justiça Eleitoral deve se posicionar.

Ademais, e sem olvidar a existência de outros provedores de aplicações de busca na internet, cumpre anotar que, “para determinação desse valor por clique, acontece uma espécie de leilão entre os anunciantes que é intermediado pelo Google (e em seu beneficio). Quanto maior for o lance, mais provável será a exibição da publicação e em melhor posição ela estará”.

Obviamente, caso seja possível a utilização do nome do adversário como palavra-chave, o leilão alcançará valor superior, beneficiando diretamente a empresa ora recorrente.

Não é desinfluente recordar que a responsabilidade da empresa deflui da teoria do risco-proveito, uma vez que se dispõe a vender anúncios em seu site de pesquisas sem analisar previamente o potencial lesivo do conteúdo inserido, contratando com milhares de usuários sem qualquer prévio controle de violação de direitos (inclusive imateriais alheios), ao passo que incrementa suas receitas e potencializa o risco de danos. A meu sentir, sua defesa nesses autos não diz respeito ao debate democrático, mas exclusivamente ao seu modelo de negócios. Não que tal conduta seja ilegítima, porém não se pode utilizar essa justificativa para fins de interpretação elástica da exceção legal quanto ao impulsionamento pago de propaganda eleitoral.

Nos termos do art. 18 do Código Civil, “sem autorização, não se pode usar o nome alheio em propaganda comercial”. Em suma, a empresa de tecnologia, ao permitir e comercializar a utilização da palavra-chave com o nome alheio, comete prática ajustável ao comando legal.

12. Sequer é possível inserir a conduta na seara da publicidade comparativa, como se pretendeu alinhavar a permissão em razão do livre fluxo de ideias e da comparação entre os candidatos.

A publicidade comparativa, segundo o Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária (CBAP), deve ter por finalidade o esclarecimento e a informação (verdadeira), tendo como pano de fundo a própria defesa do consumidor. 

Conclusão inarredável é que essa prática – para ser lícita e atender às finalidades descritas – não pode caracterizar prática de concorrência desleal ou lesão à esfera jurídica de terceiros. Dentre esses direitos, como já ressaltado, estão os de personalidade, com esteio constitucional.

13. De igual sorte, a conduta não pode levar o eleitor à confusão indevida entre seu critério de busca e o resultado alcançado, sob pena de associação e aproveitamento parasitário.

Segundo Fábio Ulhoa Coelho, 

O que caracteriza a irregularidade da prática concorrencial é o meio utilizado e não as motivações, ou os objetivos do empresário – sempre iguais aos da concorrência leal, isto é, a conquista de clientela. De fato, ao promover publicidade comparativa, o empresário possui sempre o objetivo de conquistar fatias dos consumidores de um ou mais concorrentes, especialmente os mencionados no anúncio. Possui este objetivo, tanto na hipótese de comparação lícita, como na desleal. O que distingue uma de outra situação é a veiculação de informações falsas em detrimento do concorrente, em prejuízo da imagem dele junto aos consumidores. Ou seja, a inidoneidade do meio empregado é o fato decisivo para que a publicidade comparativa deixe de ser lícita, para os fins da disciplina jurídica da concorrência.

(Curso de direito comercial: direito de empresa, pp. 436-437).

A utilização de ardil, de engodo – uso do nome do adversário como palavra-chave –, com a finalidade de desviar a atenção do eleitor e direcioná-lo para resultados patrocinados do adversário do candidato de sua preferência, nada mais revela do que o uso inidôneo de meios tecnológicos pagos para a tentativa de cooptação de simpatizantes.

Com o devido respeito, se no campo do direito privado os tribunais vêm entendendo pela ilicitude da conduta, com muito mais razão essa Justiça Especializada deverá atuar na defesa dos bens jurídicos aqui tutelados que alcançar status constitucional e de relevância ímpar para o Estado Democrático de Direito. 

Essa, aliás, foi a linha adotada pelo douto Ministro Alexandre de Moraes em seu voto divergente. A natureza pública e a amplitude difusa das normas de Direito Eleitoral atraem interpretação mais consentânea aos seus escopos sociais e jurídicos, em patamar mais sensível do que aquele utilizado para a ponderação de conflitos de interesses exclusivamente privados.

A utilização de subterfúgios tecnológicos – pagos – que desviam a atenção do eleitor somente beneficiam a empresa e o contratante, não servindo à liberdade informacional, pelo contrário.

O eleitor tem plena consciência da relevância de sua escolha nas urnas e somente através do exercício isento do voto e do mandato por ele conferido poderá ocorrer a verdadeira transformação tão necessária para os destinos da nação. Nunca houve tanto acesso à informação, de forma tão simples e instantânea como agora. As chamadas figuras públicas nunca estiveram tão expostas. A realidade e a “verdade” como as visualizamos no mundo virtual a cada momento não serão as mesmas daqui a alguns minutos. Pois bem, será nesse ambiente que a campanha eleitoral ocorrerá.

14. Noutro sentido, é possível extrair do contexto um prejuízo concreto ao candidato que tem sua publicidade orgânica – não impulsionada – atravessada pelo ardil da utilização do seu nome, como palavra-chave pelo adversário, para gerar um resultado patrocinado. 

Assim as coisas, reforça-se o argumento de que a conduta é ilegítima, uma vez que  nos  termos  do  art. 57-C,  § 3º da Lei 9.504/97, o impulsionamento de conteúdo eleitoral somente poderá ser contratado com o fim de promover ou beneficiar os próprios candidatos ou agremiações, sem que essa conduta importe – de modo direto, como na presente hipótese – em locupletamento do nome de adversário e na asfixia do debate. 

Sua utilização com a finalidade – ou a consequência – de prejudicar o adversário não pode, a meu sentir, ser compreendida como legítima. Reitere-se, por fundamental, que a regra é a vedação à propaganda eleitoral paga na internet. A exceção é o impulsionamento, cujos contornos devem ser verificados com o rigor pretendido pelo legislador e consoante o escopo da norma eleitoral que é garantir a lisura do pleito eleitoral.

Respeitando as opiniões distintas, não há necessidade de críticas ou ofensas ao adversário, bastando que o conteúdo impulsionado o prejudique para que se mostre ilícita a conduta, para que seja configurado o abuso na utilização do mecanismo.

Na mesma linha, destaco os seguintes trechos do voto condutor do acórdão recorrido:

Ocorre que, ante as peculiaridades do caso concreto, o impulsionamento, apesar de contratado por meio formalmente lícito, fere substancialmente a lei eleitoral.

Com efeito, o candidato Jilmar Tatto, em evidente abuso de direito, fez uso de modalidade lícita de propaganda para, por meio de um claro estratagema, desviar em seu proveito o espaço da candidata adversária.

[...]

E, no caso, é evidente que o conteúdo impulsionado se utilizou do interesse dos eleitores na candidatura adversária para atrair a atenção para a candidatura do recorrente Jilmar Tatto, prejudicando, inequivocamente, o alcance e a repercussão da propaganda eleitoral do candidato Ricardo Tripoli.

De fato, o eleitor, ao buscar o nome de Ricardo Tripoli no mecanismo de busca Google, intenciona obter informações acerca de sua candidatura ao Senado, e não de seus adversários. No entanto, em razão do artifício utilizado pelos recorrentes, ao realizar a consulta, o primeiro resultado a aparecer para o eleitor é o nome de Jilmar Tatto, a demonstrar que o conteúdo impulsionado se utiliza do nome do adversário para capturar seus pretensos eleitores, com notória repercussão negativa em sua propaganda.

A respeito, mister a transcrição da perspicaz análise do representante do Ministério Público Eleitoral, que utiliza excertos do parecer apresentado na Representação nº 0605243-37.2018.6.26.0000 (ID 1064075, p. 6):

É evidente que se um grupo de eleitores – meticulosamente escolhidos pela campanha de Jilmar Tatto – pesquisassem o nome da representante, seriam direcionados para resultados do seu site de campanha.

Ou seja, esse anúncio do representado não age em benefício puro de sua candidatura, divulgando sua plataforma, mas visa, de uma vez só, desviar a atenção da campanha da sua adversária ao Senado, e diminuir a visualização do conteúdo por ela produzido e disponibilizado na internet.

[...]

Se isso fosse válido, grandes campanhas poderiam soterrar os resultados de buscas dos adversários com menos recursos pelo uso de anúncios pagos e impulsionamento de links. (...)

O que se tem é nítida tentativa de desvio de atenção, prejudicando o conteúdo direto da candidatura procurada pelo eleitor. Pois o anuncio só é veiculado a quem ativamente procura por informações da candidatura de Mara Gabrilli e é direcionado à página política de Jilmar Tatto. (...)

(sem destaques no original)

15. O douto Ministro Alexandre de Moraes, que inaugurou a divergência, qualifica a conduta como um estelionato eleitoral, um “obstáculo eleitoral pago” indevidamente imposto durante sua legítima busca por informações do candidato de sua preferência.

Lembra bem Sua Excelência que a situação ora tratada é análoga, guardando-se as devidas especificidades e contextualizações necessárias, ao que sucedeu nas últimas eleições americanas, consoante descreveu à saciedade a imprensa especializada. Da mesma forma, a utilização de ferramentas tecnológicas pagas com o intuito de influenciar a opinião do cidadão foi amplamente utilizada no Brexit, também conforme os veículos de comunicação.

O uso parasitário do nome do adversário não auxilia o debate e o livre fluxo de informações, respeitando as opiniões em sentido contrário.

Para além do desvio de atenção do eleitor – que prejudicou a candidatura daquele que teve seu nome indevidamente utilizado como palavra-chave pelo adversário –, o aparecimento destacado do conteúdo eleitoral do contratante em detrimento do resultado orgânico tem o potencial de inutilizar a capacidade informacional da propaganda originária. 

Como ponderado no voto divergente, o eleitor desiste de buscar informações do candidato do seu interesse em razão dos resultados patrocinados que atravessam a informação originariamente desejada. Obviamente, essa circunstância prejudica o candidato – e o próprio eleitor, em função da atitude espúria e financiada do seu adversário. Essa é a linha de entendimento da douta divergência, cuja compreensão me filio. 

16. Diante de todas essas considerações, rogando as mais respeitosas vênias ao Relator e aos eminentes pares que o acompanharam, entendo que a condenação dos recorrentes deve ser mantida, fixando-se o seguinte entendimento: na propaganda eleitoral na internet (art. 57-C da Lei 9.504/97), é vedado a candidatos, partidos políticos e coligações contratar a ferramenta de links patrocinados de modo parasitário, isto é, associando os resultados da busca realizada pelo eleitor a candidato adversário que não foi por ele procurado.

17. Ante o exposto, acompanho a divergência instaurada pelo eminente Ministro Alexandre de Moraes e nego provimento aos recursos especiais.

É como voto.

 

ESCLARECIMENTO
 

O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (vice-presidente no exercício da presidência): Apenas para explicitar, o Ministro Luis Felipe Salomão acompanha a divergência que foi aberta pelo eminente Ministro Alexandre de Moraes. Já havia votado o Ministro Sérgio Banhos, relator, que foi acompanhado por mim e pelo Ministro Og Fernandes.

Portanto, nós temos três votos pelo provimento do especial, dois votos pelo não provimento e restam votar, na sessão de hoje presente, o Ministro Carlos Horbach e o Ministro Marco Aurélio.

Pois não, eminente Ministro Relator. Vossa Excelência tem preferência, na condição de relator. 

 
VOTO (ratificação)
 

O SENHOR MINISTRO SÉRGIO BANHOS (relator): Muito obrigado, Senhor Presidente.

Senhores Ministros, apenas um rápido contraponto ao belíssimo voto proferido pelo eminente e estimado por todos, Ministro Luis Felipe Salomão, que nos brindou com um voto de indiscutível relevo jurídico e intelectual.

Não obstante, com as mais respeitosas vênias, mantenho na íntegra o meu voto. E o faço porque, na minha compreensão, a utilização do nome de candidato adversário como palavra-chave para o fim de impulsionamento de propaganda eleitoral na modalidade de priorização paga de conteúdos em plataforma de busca na internet, os chamados links patrocinados, por si só, não infringe o disposto no art. 57-C, conquanto os links patrocinados sejam exibidos de forma prioritária nas listagens apresentadas pelos buscadores da internet, os resultados orgânicos, ou seja, aqueles não patrocinados, também são apresentados ao usuário na lista de achados da pesquisa.

Assim, entendo que é inatacável o fundamento do acórdão recorrido, de que o anúncio patrocinado, no caso dos autos, teria aptidão para [interrupção do áudio] candidato cujo nome foi utilizado como palavra-chave.

Isso porque, a despeito do destaque conferido ao link patrocinado, os resultados orgânicos que diziam respeito ao candidato adversário foram exibidos na listagem de achados da pesquisa de forma que o eleitor tinha plena liberdade para clicar ou não no resultado patrocinado, assim como para acessar qualquer outra página entre as listadas no resultado da pesquisa.

Não se trata, portanto, na minha compreensão, de redirecionamento, tendo em vista que o interessado tem o poder, a liberdade de escolher entre abrir ou não aquele conteúdo patrocinado.

Penso que a regra em regime democrático é a livre circulação de ideias, assegurando-se ao eleitor o pleno direito de se informar sobre as campanhas eleitorais. Sob essa perspectiva, a apresentação de alternativas ao eleitor, desde que garantida a sua liberdade de escolha, a fim de que ele, se assim desejar, conheça outro candidato, não pode ser vista, por via de regra e a meu sentir, como forma de prejudicar a campanha eleitoral de outros candidatos, mas sim como maneira de ampliar o debate político e embasar a escolha consciente do eleitor.

Registrei, por fim, no voto que àquela ocasião proferi, que não obstante o impulsionamento de conteúdo seja permitido – excepcionalmente, é claro, pelo art. 57-C –, cumpre advertir a todos os candidatos, em especial esses que concorrem nesse certame já inaugurado de 2020, que o eventual desvirtuamento da referida ferramenta, em detrimento da isonomia entre os candidatos – o que, na minha opinião, não restou demonstrado nos presentes autos – poderá, sim, em determinadas situações, caracterizar, além de propaganda eleitoral irregular, abuso do poder econômico apurado e punido na forma do 22 da Lei Complementar.

Por essas singelas considerações, por entender que no caso em julgamento não houve violação legal, é que votei, e mantenho o meu voto, no sentido de dar provimento aos recursos especiais eleitorais, louvando mais uma vez os bem alinhavados e verticalizados argumentos trazidos nos votos divergentes – em primeiro lugar, pelo Ministro Alexandre de Moraes e agora pelo Ministro Luis Felipe Salomão.

Mantenho, Senhor Presidente, portanto, o teor do meu voto.

Muito obrigado.

O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (vice-presidente no exercício da presidência): Muito obrigado, Ministro Sérgio Banhos. Muito obrigado a Vossa Excelência. Antes de colher os votos faltantes, pediu a palavra o Ministro Alexandre de Moraes, que abriu a divergência.

Pois não, Ministro Alexandre.

VOTO (ratificação)
 

O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES: Agradeço, Presidente. Rápida palavra, porque a decisão de hoje é extremamente importante para a regularidade das eleições cujo período eleitoral já se iniciou.

Como lembrou o Ministro Salomão, essa prática já é considerada absolutamente ilícita pela Justiça Comum. Você procura o carro X e se faz esse direcionamento para o carro Y, da outra marca, isso é considerado ilícito pela Justiça Comum. Você procura comprar o título de sócio do Clube Corinthians Paulista, entra no site e se direciona para o Clube Regatas Flamengo, isso não é liberdade para quem procura, isso é um direcionamento.

Nós não podemos confundir, e me preocupa muito, o mercado livre de ideias, que existe para que o eleitor procure tudo que ele queira, com um verdadeiro estelionato parasitário, como disse o eminente Ministro Luis Felipe Salomão, onde o eleitor procura uma coisa e vem uma lista de outras coisas. E ainda dizendo: “Você quer o candidato A? Não, não, veja o candidato B”.

Para encerrar, eu faço ainda uma comparação, porque, obviamente, a campanha via internet é algo novo, que todos estamos nos acostumando. Mas, será que se fosse algo antigo, se o eleitor entrasse num táxi - que é o veículo de levar fisicamente as pessoas, como a internet é o veículo digital - e dissesse para o motorista: “Por favor, me leve até o diretório do Partido A, para eu conhecer o candidato A”. E esse taxista, pago pelo candidato B, levasse para o diretório B, será que nós consideraríamos isso lícito?

A mesma coisa, só que passou aqui do conhecimento digital. Você pede, entre aspas “taxista Google, me leve para o candidato A, que eu quero conhecê-lo”. E ele, pago pelo candidato B, muda o caminho e te leva para o candidato B. Mais claro que esse estelionato, que, repito, já reconhecido no campo do consumidor pela Justiça Comum, me parece difícil.

Eu insisto, com todo o respeito às posições em contrário, se o TSE referendar isso, vai ser uma loucura essa campanha. Todos os candidatos vão usar e nós vamos ter o repique: o A paga para levar para o B, o B para o C, o C para o D. E o eleitor é que vai ser prejudicado. O eleitor deve ter liberdade para procurar o que ele quiser e não ser direcionado para outros candidatos.

Desculpe, Presidente. E agradeço a possibilidade de completar essa opinião. Obrigado.

VOTO
 

O SENHOR MINISTRO CARLOS HORBACH: Senhor Presidente, de início eu destaco e louvo a percuciência e a profundidade do voto do eminente Ministro Luis Felipe Salomão, que agora torna ainda mais clara a posição da divergência, já muito bem delineada, nos termos do voto do Ministro Alexandre de Moraes.

De qualquer sorte, eu, já tendo acompanhado o início dessa discussão, a partir da manifestação do eminente relator, Ministro Sérgio Banhos, entendo que a melhor solução para o caso concreto é acompanhar Sua Excelência o eminente relator.

Creio que a posição de Sua Excelência é a posição mais consentânea com a liberdade que tem o eleitor, a liberdade que tem o cidadão, ante diversas informações, selecionar aquelas que lhe são mais relevantes e que permitem formar a sua opinião de maneira mais clara.

Voltando ao exemplo do taxista, do eminente Ministro Alexandre de Moraes, me parece que a situação é mais próxima da seguinte: o usuário do serviço de transporte entra no táxi, diz que quer ir ao diretório A para o taxista e o taxista responde: “Mas tem o candidato do diretório B”.

Ao que ele responde: “Não. Eu prefiro ir para o candidato A”.

Exatamente porque as informações são todas apresentadas na tela, para o que faz a busca, para aquele eleitor que busca a informação. Não existe uma compulsória e exclusiva direção do buscador de internet para esse ou aquele candidato.

De modo que, feita essa breve consideração, eu acompanho integralmente o voto do eminente relator e o voto dos Ministros Edson Fachin e Og Fernandes, para dar provimento aos recursos especiais eleitorais, julgando, por consequência, improcedente a representação originalmente ajuizada.

É como voto, Senhor Presidente.

ESCLARECIMENTO
 

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO: Presidente.

O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (vice-presidente no exercício da presidência): Pois não, Ministro Salomão.

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO: Vossa Excelência me concede apenas uma observação, que eu reputo importante para a dinâmica do julgamento?

O SENHOR MINISTRO EDSON FACHIN (vice-presidente no exercício da presidência): Pois não.

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO: Presidente, eu não volto aos fundamentos, não. Apenas para registrar, inclusive para o Ministro Marco Aurélio, que será o último a votar, que existe com o Ministro Mauro Campbell, que ainda não se pronunciou, porque foi o voto do Ministro Og, um caso absolutamente idêntico – inclusive o mesmo candidato e os mesmos fundamentos. É o REspe 0605327.

Então, dependendo do posicionamento do último votante e do próprio Ministro Mauro, poderá haver uma certa dispersão. Eu fiz questão de fazer esse registro apenas para que nós tenhamos a perspectiva da segurança jurídica ao apreciar esse caso.

Era só isso, Presidente.

VOTO
 

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Presidente, em primeiro lugar, a cadeira ocupada pelo Ministro Mauro Campbell já votou. Somos sete e não oito.

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO: É porque tem um outro caso.

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO: Em segundo lugar, Presidente, sou da terra do samba, ou seja, sou do Rio de Janeiro. Em 1989, foi composto um samba por Niltinho Tristeza, Preto Joia, Vicentinho e Jurandir, para aquele carnaval. E o chavão muito interessante desse samba, que precisa ser relembrado nos dias de hoje: “Liberdade, liberdade. Abra as asas sobre nós”.

É a tônica, Presidente, a liberdade de expressão. É a tônica, a veiculação de ideias. É a tônica, eu diria, em uma campanha eleitoral, a criatividade. E os candidatos digladiam-se – cada qual a seu modo.

A glosa pela Justiça Eleitoral é uma glosa excepcionalíssima. E, sendo exceção, tudo que verse à matéria em exame deve ser interpretado de forma estrita. É o que se contém na legislação e nada mais.

O que nos vem desse voto, que dá um banho, perdoe-me, Sérgio Banhos, em termos de liberdade de expressão? Nos vem uma pérola – e eu vou me referir ao trecho –, e uma pérola que tem como lastro maior, como base maior, o art. 248 do Código Eleitoral.

E interpreto o Código Eleitoral de forma sistemática. Interpreto o Código Eleitoral com a mitigação que esse artigo faz ao 242.

O 248 dispõe:

Art. 248. Ninguém poderá impedir a propaganda eleitoral, nem inutilizar, alterar ou perturbar os meios lícitos nela empregados.

O Código Eleitoral é de uma época de um regime de exceção. E tem-se, realmente, no art. 242 – e o 248 o mitiga, dá-lhe sentido.

Art. 242 A propaganda, qualquer que seja a sua forma ou modalidade, mencionará sempre a legenda partidária e só poderá ser feita em língua nacional [...].

Como também as peças apresentadas no campo jurisdicional, que o Código de Processo preconiza a utilização do vernáculo, para tristeza daqueles que gostam de citar, sem sequer apresentar a tradução, textos em língua estrangeira.

E me lembro que uma vez houve a impetração de um mandado de segurança no Supremo e a inicial continha umas vinte transcrições em língua estrangeira e eu determinei que o subscritor vertesse para o português. E ele verteu, porque senão eu negaria seguimento, talvez com o agravo pudesse a ilustrada maioria dar razão ao autor da peça.

Mas prossigo no 242:

Art. 242. [...] e só poderá ser feita em língua nacional, não devendo empregar meios publicitários destinados a criar, artificialmente, na opinião pública, estados mentais, emocionais ou passionais.

Vejo com muita reserva essa cláusula final. Eleitor não é um curatelado, eleitor não é um tutelado. Não comungo com um grande jogador de futebol que disse que o brasileiro não sabe votar – para mim, ele sabe votar. E ele escolhe segundo as circunstâncias reinantes, segundo o momento vivenciado.

A pérola que está no voto do Ministro Sérgio Banhos, e, como eu disse, dá um banho em termos de liberdade:

A regra em regime democrático é a livre circulação de ideias, assegurando-se ao eleitor o pleno direito de se informar sobre campanhas eleitorais.

Sob essa perspectiva, a apresentação de alternativas ao eleitor, a fim de que ele, se assim desejar, conheça outro candidato, não pode ser vista, por via de regra, como forma de prejudicar a campanha eleitoral de outros candidatos, mas sim como maneira de ampliar o debate político e embasar a escolha consciente do eleitor.

E encerra o Relator, o Ministro Sérgio Silveira Banhos:

Não obstante impulsionamento de conteúdos, seja em caráter excepcional, permitido pelo art. 57-C da Lei nº 9.504/97, inclusive na hipótese de utilização do nome de candidato adversário [tenha nome bonito ou não, não importa] como palavra-chave de mecanismo ou serviço de priorização paga de resultados em aplicações de busca na internet.

Cumpre advertir, porque não há direito absoluto, que o eventual desvirtuamento da referida ferramenta, em detrimento da isonomia entre os candidatos, poderá caracterizar, além de propagando eleitoral irregular, abuso do poder econômico [não se cuida aqui do abuso de poder econômico] apurado e punido na forma do art. 22 da Lei Complementar.

O Relator, Presidente, votou a partir dessa moldura fática, teve oportunidade de mencionar o que se contém no acórdão impugnado, mediante o recurso eleitoral. Disse Sua Excelência:

Conforme reconhecido no acórdão recorrido, o link patrocinado cumpriu os requisitos formais previstos na legislação de regência, entre os quais a identificação inequívoca como anúncio pago e como propaganda eleitoral, o que enfraquece a tese de que teria havido captação de atenção do eleitor de forma artificial e sem o seu conhecimento.

O acórdão, o aresto regional, como está no voto, não explicita em que consistiria o estado mental que teria sido criado no eleitor, em virtude do impulsionamento questionado, tampouco há no acórdão elementos que possam permitir vislumbrar a capacidade de mero link patrocinado para gerar estados mentais, emocionais e passionais no eleitor.

O que houve? Houve um gancho. O eleitor pegou o nome de um candidato opositor para fazer uma chamada, talvez emprestando aí um predicado que atrairia a atenção para a matéria, em termos de conteúdo, dos eleitores.

Vou repetir, Presidente, é preciso que se deixe os candidatos digladiarem-se, revelando de forma antagônica os perfis possuídos, para que possa haver uma sadia, uma salutar escolha pelo eleitor.

A maioria, de quatro votos, já está, pelos meus cálculos, formada, porquanto temos pelo provimento do recurso o Relator – Ministro Banhos –, Vossa Excelência o acompanhou, Ministro Edson Fachin, o Ministro Og e agora o Ministro Carlos. Eu somo o meu voto, Presidente, numa, vou repetir, profissão de fé, quanto à liberdade de expressão, a essa corrente.

É como voto.

 

EXTRATO DA ATA

 

 

REspEl nº 0605310-76.2018.6.26.0000/S. Relator: Ministro Sérgio Banhos. Recorrente: Google Brasil Internet Ltda. (Advogados: Eduardo Mendonça – OAB: 130532/RJ e outros). Recorrente:  Coligação São Paulo do Trabalho e de Oportunidades (Advogados: Marcelo Santiago de Pádua Andrade – OAB: 182596/SP e outros). Recorrente: Jilmar Augustinho Tatto (Advogados: Jéssica Guedes Santos – OAB: 57719/DF e outros).  Recorrida: Coligação Acelera SP (Advogados: Tatiane de Oliveira Flores – OAB: 346230/SP e outros).

Decisão: O Tribunal, por maioria, deu provimento aos recursos especiais eleitorais, a fim de julgar improcedente a representação e tornou insubsistente a multa aplicada, nos termos do voto do relator, vencidos os Ministros Alexandre de Moraes e Luis Felipe Salomão. 

Composição: Ministros Edson Fachin (vice-presidente no exercício da presidência), Alexandre de Moraes, Marco Aurélio, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell Marques, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.

Vice-Procurador-Geral Eleitoral: Renato Brill de Góes

SESSÃO DE 8.10.2020.

Sem revisão das notas de julgamento dos Ministros Marco Aurélio, Luis Felipe Salomão e Carlos Horbach.