RECURSO ELEITORAL (11548) N. 0600059-97.2024.6.24.0105
RECORRENTE: PARTIDO LIBERAL (PL) - ITAPOÁ - SC - MUNICIPAL
ADVOGADO: BRUNO RIBEIRO DE ALMEIDA - OAB/SC55667
ADVOGADO: JOSE CARLOS POZZER DE OLIVEIRA - OAB/SC55338
ADVOGADO: MARIA ELISA GIACOMELI - OAB/SC55313
RECORRIDO: BRUNO FERNANDO DOS SANTOS
ADVOGADO: DIEGO ARAUJO VARGAS LEAL - OAB/SC44595
RELATOR: JUIZ SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
ELEIÇÕES 2024 – RECURSO ELEITORAL – REPRESENTAÇÃO – PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA – MENSAGENS DIVULGADAS EM GRUPO DE WHATSAPP – ALEGAÇÃO DE VEICULAÇÃO DE DISSEMINAÇÃO DE INFORMAÇÃO FALSA COM O INTUITO DE PREJUDICAR A IMAGEM DE CANDIDATO A PREFEITO – IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO DE APLICAÇÃO DE MULTA.
PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA – DIVULGAÇÃO DE MENSAGENS DE ÁUDIO EM GRUPO DE WHATSAPP POR PESSOA NATURAL – INFORMAÇÃO FALSA A RESPEITO DE CANDIDATO A PREFEITO – APLICATIVO DE MENSAGENS INSTANTÂNEAS – GRUPO RESTRITO DE PARTICIPANTES – MENSAGENS QUE NÃO SE SUBMETEM ÀS NORMAS SOBRE PROPAGANDA ELEITORAL – ART. 33, § 2º, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.610/2019 – PRECEDENTES DO TSE E DO TRE-SC – ALEGAÇÃO DE DIVULGAÇÃO DE CONTEÚDOS INVERÍDICOS E PREJUDICIAIS À CANDIDATURA, COM POTENCIAL PARA CAUSAR DANOS AO EQUILÍBRIO DO PLEITO – ART. 9º-C DA RES. TSE N. 23.610/2019 – NÃO COMPROVAÇÃO DE QUE OS FATOS CONSTANTES DAS MENSAGENS SÃO NOTORIAMENTE INVERÍDICOS – AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DO POTENCIAL DE AS MENSAGENS DIVULGADAS EM GRUPO DE MENSAGERIA COM 194 INTEGRANTES CAUSAREM DANOS AO EQUILÍBRIO DO PLEITO.
RECURSO DESPROVIDO – MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.
ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina, à unanimidade, em conhecer do recurso e a ele negar provimento, nos termos do voto do Relator.
Florianópolis, 3 de setembro de 2024.
JUIZ SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, RELATOR
RELATÓRIO
Tratam os autos de recurso interposto pelo Partido Liberal de Itapoá, pleiteando a reforma a sentença proferida pelo Juízo da 105ª Zona Eleitoral de Joinville, que julgou improcedente a representação eleitoral proposta em face de Bruno Fernando dos Santos, ajuizada nos termos dos arts. 36 e 96 da Lei nº. 9.504/97 e Resolução TSE nº. 23.608/2019 (ID 19230102).
Sustentou o recorrente, em síntese, que: a) a liberdade de expressão não é absoluta, devendo respeitar os limites impostos pela legislação eleitoral e pelos princípios democráticos; b) os áudios enviados pelo recorrido no WhatsApp em grupo com aproximadamente 200 (duzentas) pessoas, em tom deliberado e pejorativo, desabona a imagem do candidato a Prefeito, dissemina informações inverídicas e prejudica o postulante ao Executivo Municipal (ID 19230109).
Ao ofertar as contrarrazões recursais, sustentou o recorrido que: a) suas manifestações são de cunho crítico/político, encontrando-se albergadas pelo manto do direito à liberdade de expressão (Constituição Federal, art. 5º, incisos IV e IV); b) os fatos mencionados nos áudios 1 e 2, ainda que em tom áspero, fundamentam-se em fatos públicos e objeto do mandado de segurança cível nº. 0600141-55.2024.6.24.0000, julgado em 05 de agosto de 2024; c) as críticas em torno da condenação do ex-prefeito de Itapoá (Marlon Neuber) no bojo da Operação Mensageiro, bem como a atuação de seus correligionários e agentes políticos à época, foram amplamente veiculadas em órgãos de imprensa; d) os áudios foram objeto de apuração na Representação nº. 0600037-39.2024.6.24.0105, julgada improcedente em 22 de julho de 2024; e) os áudios publicados no grupo de WhatsApp não configuram propaganda eleitoral antecipada, de autopromoção ou negativa, além de não registrarem pedido explícito de voto (ID 19230116).
Recebidos os autos perante esta instância, mantive o segredo de justiça no tocante ao documento identificado sob o ID 19230221, postergando para o momento da decisão o exame referente aos demais documentos (IDs 19230095, 19230096, 19230097, 19230098 e 19230099). Na mesma ocasião, determinei o encaminhamento dos autos à Procuradoria Regional Eleitoral (ID 19230501).
Aportaram aos autos, na sequência, a manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral. Na condição de custos legis, exarou parecer opinando pelo conhecimento e não provimento do recurso (ID 19231106).
É o relatório.
VOTO
O SENHOR JUIZ SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ (Relator): Senhora Presidente, voto por conhecer do recurso, por ser tempestivo e preencher os demais requisitos de admissibilidade.
O Partido Liberal de Itapoá, com fundamento nos arts. 36 e 96 da Lei nº. 9504/1997, c/c a Resolução TSE nº. 23.608/2019, propôs representação eleitoral em face de Bruno Fernando dos Santos, redigindo-a, no que tange aos fatos, nos seguintes termos:
“(...)
01 - DOS FATOS
O Representante é Partido Político com atuação no âmbito municipal de Itapoá/SC.
Assim, na função fiscalizatória inerente às agremiações partidárias, verificou-se que o Representado, em 05 de julho de 2024, praticou propaganda eleitoral antecipada, se autopromovendo e difamando o Representante e seus candidatos em grupo de whatsapp com quase 200 (duzentas) pessoas:
“Não, não é meu partido não, e partido de amigos de colegas, de pessoas de direita, pessoas de bem, entendeu? só que não queriam coligar antigamente com o PL, o que que o PL fez? Entrou com, com um deputado presidente estadual. Há que não sei o que, e mudaram a presidência, simplesmente colocaram seu Partica como presidente do PRD, uma vergonha, uma vergonha, apresentar o partido lá na... na...junto lá, isso e uma vergonha, pessoal..pessoal do PL não tem vergonha na cara, colocaram todos ali na...nas das presidência ali...vice presidente, secretário, tesoureiro, tudo do PL, bando de sem vergonha, e isso, eles não tem vergonha na cara, e isso que não tem, sabe? Não quer deixar os outros concorrer, se não coligar com eles não vai coligar com ninguém então, ponto final, e isso o pensamento deles, cadê a liberdade que a gente tem?” (Áudio 01)
Em sequência, alegou:
“Não, não e isso Daiane, e ver você ver as pessoas ter trabalhado, ter juntado um partido, ter juntado pessoas boas, gente boa que quer..tem, tem ideias interessantes para Itapoá, sabe? E você olhar o partido lá e falar , pô, legal, gostei desse partido, show, espero que pelo menos entre um ou dois candidato a vereador lá na câmara de vereadores pra fazer a mudança por Itapoá, sabe? Que tem ideias boas pra “nois”, e simplesmente os cara pega, pó Bruno se não sabe o que aconteceu, aconteceu isso isso e isso, e o PL colocou o seu Partica como presidente agora, se não coligar com eles não ai a gente não sai, orra, isso e uma sem vergonhice, puxão de tapete, e sujeira, e depois fala há não o PL e santo a que o PL e isso e aquilo,passaram a mão na cabeça do Marlon, quando ele tava preso lá, manteram ele no poder lá, mesmo preso, vergonheira do Tiago e companhia, ai que lançar campanha, ai que não sei o que de extrema direita, extrema direita o caramba, bando de sem vergonha, isso sim que são” (Áudio 02)
Excelência, o Representado explicitamente promove sua candidatura de forma antecipada, bem como claramente pratica o “não-voto” contra candidatos do Partido Liberal.
Por sua vez, quanto ao interesse eleitoral do Representado, colaciona-se áudio de whatsapp enviado pelo Representado em junho de 2024 (também anexado no âmbito dos autos n. 0600037-39.2024.6.24.0105, que objetiva a apuração de outras condutas proscritas), no qual se apresenta como pré-candidato ao cargo de Vereador, ratificando-se assim seu interesse no pleito eleitoral:
Então, acredito que o nosso pré-candidato a prefeito Caldeira não vai aceitar isso aí, entendeu? É. E se der tudo certo aí se o republicano estadual não se meter, que eu acho que não vai se meter, os nossos mais para frente aí intermediários falaram que não vão se meter. A gente vai ter nosso vice, nós vamos sair candidatos, entendeu? Iremos lutar aí nessa campanha e fazer um bom projeto, uma boa campanha e, se der tudo certo, sair campeão acima de tudo, é?
E o que nós precisa, é eu mesmo fazer meu papelzinho como pré-candidato a vereador. Tudo certo. Se der certo ai, precisar dos votos necessários aí de 300 a 400 votos aí, e ganhar essa eleição para vereador, entendeu? E falo se eu não tiver, se a população estiver contente com meu papel como fiscalizador lá no futuro, posso Certeza que eu peço a conta e deixo pro o próximo”.
Deste modo, depreende-se claramente que as referidas manifestações configuram propaganda eleitoral antecipada, pois viola a legislação na medida em que ofende a imagem de outros candidatos, criando assim um ambiente negativo, desleal e que fere os princípios da igualdade e da moralidade eleitoral.”
Após o regular trâmite processual, sobreveio sentença cujo dispositivo restou redigido nos seguintes termos: “(...) Assim, dentro do princípio de intervenção mínima do Judiciário dentro do sistema eleitoral e não sendo constatado abuso do direito por parte do representado, resolvo o mérito da demanda na forma do art. 487, I do CPC para julgar improcedente a presente representação”.
Pois bem.
Registro, inicialmente, que o representante e ora recorrente fez menção em sua petição inicial a 3 (três) áudios enviados por Bruno Fernando dos Santos para o grupo de WhatsApp intitulado Política de Itapoá.
No que se refere ao áudio no qual Bruno Fernando dos Santos se apresenta como pré-candidato a vereador, importante registrar que referida conduta é objeto de questionamento nos autos da Representação nº 0600037-39.2024.6.24.0105, cujo trâmite se processa no juízo de primeiro grau (105ª Zona Eleitoral de Joinville). Em consulta ao Diário de Justiça Eletrônico, verifiquei que houve julgamento de improcedência, nos termos da imagem a seguir reproduzida:
Portanto, descabe qualquer apreciação no presente recurso de considerações sobre possível configuração de propaganda eleitoral antecipada, notadamente porque na movimentação do referido processo registra-se que decorreu o prazo para a interposição de recurso pelo Ministério Público Eleitoral e também pelo requerido, nos termos da imagem extraída do respectivo sistema:
O recurso ora em julgamento, portanto, limitar-se-á ao exame da questão com foco nos áudios remanescentes (ID 19230078 – áudio 01 e ID 19230079 – áudio 02).
Sem adentrar no exame do teor das aludidas mensagens, o meio em que foram propagadas (grupo de WhatsApp) enquadra-se na exceção contida no § 2º do art. 33 da Res. TSE n. 23.610/2019, que estabelece: “as mensagens eletrônicas e as mensagens instantâneas enviadas consensualmente por pessoa natural, de forma privada ou em grupos restritos de participantes, não se submetem ao caput deste artigo e às normas sobre propaganda eleitoral previstas nesta Resolução”.
Transcrevo ementa de julgados recentes deste Tribunal que trataram da questão:
ELEIÇÕES 2024 – RECURSO – REPRESENTAÇÃO – PROPAGANDA ELEITORAL EXTEMPORÂNEA NEGATIVA – ALEGADA DISSEMINAÇÃO DE NOTÍCIA FALSA NA INTERNET – CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE MULTA (LEI 9.504/1997, ART. 57-D, § 2º).
MÉRITO – MENSAGEM COM CONOTAÇÃO ELEITORAL ENVIADA POR PESSOA NATURAL EM GRUPO DO APLICATIVO WHATSAPP – GRUPO PRIVADO E RESTRITO DE PARTICIPANTES – NORMA PREVENDO, DE FORMA EXPRESSA, A IMPOSSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DAS REGRAS QUE LIMITAM O CONTEÚDO DA PROPAGANDA ELEITORAL (RESOLUÇÃO TSE 23.610/2019, ART. 33, § 2º) – NECESSIDADE DE PREVALÊNCIA DA GARANTIA FUNDAMENTAL DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO E DO PENSAMENTO (CF, art. 5º, IV) – INTERVENÇÃO MÍNIMA DA JUSTIÇA ELEITORAL – INEXISTÊNCIA, ADEMAIS, DE ELEMENTOS NOS AUTOS QUE PERMITAM AFERIR A DIVULGAÇÃO DE FATOS NOTORIAMENTE INVERÍDICOS – AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE – PROVIMENTO DO RECURSO – AFASTAMENTO DA MULTA.
1. O direito fundamental à liberdade de manifestação de pensamento (CF, art. 5º, IV) constitui garantia constitucional que deve ser protegida ao máximo, especialmente por se constituir num dos pilares de nosso atual regime democrático de direito.
Nas palavras do Ministro Luiz Fux, “a liberdade de expressão reclama proteção reforçada, não apenas por encerrar direito moral do indivíduo, mas também por consubstanciar valor fundamental e requisito de funcionamento em um Estado Democrático de Direito, motivo por que o direito de expressar-se e suas exteriorizações (informação e de imprensa) ostenta uma posição preferencial (preferred position) dentro do arquétipo constitucional das liberdades”.
E, conclui, “a proeminência da liberdade de expressão deve ser trasladada para o processo político-eleitoral, mormente porque os cidadãos devem ser informados da variedade e riqueza de assuntos respeitantes a eventuais candidatos, bem como das ações parlamentares praticadas pelos detentores de mandato eletivo” [TSE, REspe 198793, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 27/10/2017, Página 66-67].
2. Reflexo dessa proteção é a regra normativa que afasta a incidência das normas sobre propaganda eleitoral em relação “as mensagens eletrônicas e as mensagens instantâneas enviadas consensualmente por pessoa natural, de forma privada ou em grupos restritos de participantes” (Resolução TSE 23.610/2019, art. 33, § 2º).
Logo, não é juridicamente viável reprimir as mensagens de conotação político-eleitoral enviadas em grupos de Whatsapp, notadamente porque não abertos ao público, a exemplo de redes sociais como o Facebook e o Instagram, constituindo comunicação de natureza privada, que fica restrita a um número limitado de pessoas, o que justifica, à luz da proporcionalidade em sentido estrito, a prevalência da liberdade comunicativa ou de expressão.
A adoção de medidas judiciais coercitivas pela Justiça Eleitoral na hipótese de transmissão de mensagem com conotação eleitoral pelo aplicativo WhatsApp somente se justifica quando presentes elementos seguros da ocorrência de disparos em massa, pois, nesse caso, há evidente risco de propagação do conteúdo para grande número de pessoas e, consequentemente, potencial para interferir no equilíbrio da disputa eleitoral.
(RECURSO ELEITORAL nº 060006689, Acórdão, Des. Carlos Alberto Civinski, Julgado em 22/08/2024 – grifei)
ELEIÇÕES 2024 - RECURSO ELEITORAL - REPRESENTAÇÃO - PROPAGANDA ELEITORAL EXTEMPORÂNEA - DIVULGAÇÃO DE VÍDEO PELO APLICATIVO WHATSAPP EM GRUPO RESTRITO DE PESSOAS - RESOLUÇÃO TSE N. 23.610/2019 - APLICATIVO NÃO SUJEITO ÀS NORMAS SOBRE PROPAGANDA ELEITORAL (ART. 33, § 2º DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.610/2019) - AUSÊNCIA DE INFRAÇÃO ÀS NORMAS ELEITORAIS - PROVIMENTO.
RECURSO PROVIDO - IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO.
(RECURSO ELEITORAL nº 060006266, Acórdão, Des. Sergio Francisco Carlos Graziano Sobrinho, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 22/08/2024 – grifei).
ELEIÇÕES 2024 - RECURSO - REPRESENTAÇÃO - PROPAGANDA ELEITORAL NEGATIVA ANTECIPADA - OFENSA A PRÉ-CANDIDATOS - MENSAGENS ELETRÔNICAS - APLICATIVO WHATSAPP - ALEGADA DESINFORMAÇÃO (FAKE NEWS) MEDIANTE ADUZIDO EMPREGO DE INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL - SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.
RÉU INDETERMINADO - PEDIDO À INICIAL DE APURAÇÃO DO NOME DO REPRESENTADO A PARTIR DO RESPECTIVO NÚMERO TELEFÔNICO - NEGATIVA TÁCITA JUDICIAL NÃO IMPUGNADA - AUSÊNCIA DE CONVOCAÇÃO PROCESSUAL À NECESSÁRIA FORMAÇÃO DO CONTRADITÓRIO - NULIDADE ABSOLUTA - INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO, NO CASO CONCRETO, EM RAZÃO DA DECISÃO DE MÉRITO QUE APROVEITA AO IMPUTADO - APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO PAS DE NULLITÉ SANS GRIEF.
MENSAGENS PELO APLICATIVO WHATSAPP ENVIADAS POR PESSOA NATURAL - GRUPO PRIVADO E RESTRITO DE PARTICIPANTES - NÃO SUJEIÇÃO ÀS NORMAS REGENTES DA PROPAGANDA ELEITORAL (RESOLUÇÃO TSE N. 23.610/2019, ART. 33, § 2º) - INTERVENÇÃO MÍNIMA DA JUSTIÇA ELEITORAL (RESOLUÇÃO TSE N. 23.610/2019, ART. 38) - INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 9º-C DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.610/2019 E 57-DA LEI N. 9.504/1997 - POSTAGEM DE CONOTAÇÃO ELEITORAL - SUPOSTA DESINFORMAÇÃO, POR FABRICAÇÃO OU MANIPULAÇÃO, E ANONIMATO - AUSÊNCIA DE NOTORIEDADE E COMPROBABILIDADE SEM O DEVIDO CONTRADITÓRIO - ILEGALIDADE NÃO MANIFESTA.
RECURSO DESPROVIDO.
(RECURSO ELEITORAL nº 060006428, Acórdão, Des. Otávio José Minatto, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 22/08/2024 – grifei).
De minha relatoria, destaco o seguinte precedente:
ELEIÇÕES 2024 – RECURSO ELEITORAL – REPRESENTAÇÃO – PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA – MENSAGEM DIVULGADA EM GRUPO DE WHATSAPP – ALEGAÇÃO DE VEICULAÇÃO DE DISSEMINAÇÃO DE INFORMAÇÃO FALSA, COM O INTUITO DE PREJUDICAR PRÉ-CANDIDATO A PREFEITO – REPRESENTAÇÃO JULGADA PROCEDENTE NA ORIGEM, COM APLICAÇÃO DE MULTA.
PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA – DIVULGAÇÃO DE MENSAGEM DE ÁUDIO EM GRUPO DE WHATSAPP POR PESSOA NATURAL – INFORMAÇÃO FALSA A RESPEITO DE PRÉ-CANDIDATO A PREFEITO – APLICATIVO DE MENSAGENS INSTANTÂNEAS – GRUPO RESTRITO DE PARTICIPANTES – MENSAGENS QUE NÃO SE SUBMETEM ÀS NORMAS SOBRE PROPAGANDA ELEITORAL – ART. 33, § 2º, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.610/2019 – PRECEDENTES DO TSE E DO TRE-SC – ALEGAÇÃO DE DIVULGAÇÃO DE CONTEÚDO FABRICADO OU MANIPULADO PARA DIFUNDIR FATOS NOTORIAMENTE INVERÍDICOS OU DESCONTEXTUALIZADOS COM POTENCIAL PARA CAUSAR DANOS AO EQUILÍBRIO DO PLEITO – ART. 9º-C DA RES. TSE N. 23.610/2019 – NÃO COMPROVAÇÃO DE QUE OS FATOS CONSTANTES DA MENSAGEM SÃO NOTORIAMENTE INVERÍDICOS – AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DO POTENCIAL DE A MENSAGEM DIVULGADA EM GRUPO DE MENSAGERIA COM 80 INTEGRANTES CAUSAR DANOS AO EQUILÍBRIO DO PLEITO – RECURSO PROVIDO PARA JULGAR IMPROCEDENTE A REPRESENTAÇÃO, AFASTANDO A MULTA APLICADA NA SENTENÇA.
(RECURSO ELEITORAL nº 060006507, Acórdão, Des. Sebastião Ogê Muniz, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 27/08/2024)
O Tribunal Superior Eleitoral também possui precedente nesse sentido:
ELEIÇÕES 2016. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL EXTEMPORÂNEA. PROCEDÊNCIA PARCIAL NA ORIGEM. CONDENAÇÃO EM MULTA NO MÍNIMO LEGAL. VEICULAÇÃO DE MENSAGENS NO APLICATIVO WHATSAPP CONTENDO PEDIDO DE VOTOS. AMBIENTE RESTRITO. CONVERSA CIRCUNSCRITA AOS USUÁRIOS DO GRUPO. IGUALDADE DE OPORTUNIDADE ENTRE OS CANDIDATOS E LIBERDADE DE EXPRESSÃO. CONFLITO ENTRE BENS JURÍDICOS. "VIRALIZAÇÃO". FRAGILIDADE DA TESE. AUSÊNCIA DE DADOS CONCRETOS. POSIÇÃO PREFERENCIAL DA LIBERDADE COMUNICATIVA OU DE EXPRESSÃO E OPINIÃO. PROVIMENTO.
Histórico da demanda
1. O Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe (TRE/SE) entendeu configurada a propaganda eleitoral extemporânea, incontroverso o pedido explícito de voto "em data anterior ao dia 15 de agosto de 2016", quando a recorrente, "em diálogo travado no grupo de Whatsapp 'Na Boca do Povo', expressou, por mais de uma vez, o pedido de voto em favor do pré-candidato Danilo Alves de Carvalho", filho do seu ex-marido, nos seguintes termos: "Nena vote em Danilo" e "vote em consideração ao velho".
2. Interposto recurso especial eleitoral por Dayana Rodrigues Moreira dos Santos, aparelhado na afronta aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, aos arts. 5º, IV, da Constituição Federal; 36-A, V, da Lei nº 9.504/1997; e 21, §§ 1º e 2º, da Res.-TSE nº 23.457/2015, coligidos arestos a amparar o dissenso pretoriano.Do recurso especial eleitoral.
3. Existe na espécie certo conflito entre bens jurídicos tutelados pelo ordenamento jurídico de um lado, a igualdade de oportunidade entre os candidatos e, de outro, a liberdade de expressão e opinião do cidadão eleitor (liberdade comunicativa), de modo que a atividade hermenêutica exige, por meio da ponderação de valores, o reconhecimento de normas carregadas com maior peso abstrato, a ensejar, por consequência, a assunção por uma delas, de posição preferencial, como é o caso da liberdade de expressão.
4. Dada a sua relevância para a democracia e o pluralismo político, a liberdade de expressão assume uma espécie de posição preferencial (preferred position) quando da resolução de conflitos com outros princípios constitucionais e direitos fundamentais.
5. Quando o enfoque é o cidadão eleitor, como protagonista do processo eleitoral e verdadeiro detentor do poder democrático, não devem ser, a princípio, impostas limitações senão aquelas referentes à honra dos demais eleitores, dos próprios candidatos, dos Partidos Políticos e as relativas à veracidade das informações divulgadas (REspe nº 29-49, Rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJe de 25.8.2014).
6. As mensagens enviadas por meio do aplicativo Whatsapp não são abertas ao público, a exemplo de redes sociais como o Facebook e o Instagram. A comunicação é de natureza privada e fica restrita aos interlocutores ou a um grupo limitado de pessoas, como ocorreu na hipótese dos autos, o que justifica, à luz da proporcionalidade em sentido estrito, a prevalência da liberdade comunicativa ou de expressão.
7. Considerada a posição preferencial da liberdade de expressão no Estado democrático brasileiro, não caracterizada a propaganda eleitoral extemporânea porquanto o pedido de votos realizado pela recorrente em ambiente restrito do aplicativo Whatsapp não objetivou o público em geral, a acaso macular a igualdade de oportunidade entre os candidatos, mas apenas os integrantes daquele grupo, enquanto conversa circunscrita aos seus usuários, alcançada, nesta medida, pelo exercício legítimo da liberdade de expressão.
8. Consignada pelo Tribunal de origem a possibilidade em abstrato de eventual "viralização" instantânea das mensagens veiculadas pela recorrente, ausente, contudo, informações concretas, com sólido embasamento probatório, resultando fragilizada a afirmação, que não pode se amparar em conjecturas e presunções. Recurso especial eleitoral a que se dá provimento para julgar improcedente a representação por propaganda eleitoral extemporânea e, por conseguinte, afastar a sanção de multa aplicada na origem.
(Recurso Especial Eleitoral nº 13351, Acórdão, Min. Rosa Weber, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 15/08/2019 – grifei).
A incidência da norma foi ressalvada, nos acórdãos deste Tribunal citados, apenas nas hipóteses de configuração das condutas previstas nos arts. 9º-C e 34, II, §§ 1º e 2º, da Res. TSE n. 23.610/2019, que preconizam:
Art. 9º-C É vedada a utilização, na propaganda eleitoral, qualquer que seja sua forma ou modalidade, de conteúdo fabricado ou manipulado para difundir fatos notoriamente inverídicos ou descontextualizados com potencial para causar danos ao equilíbrio do pleito ou à integridade do processo eleitoral. (Incluído pela Resolução nº 23.732/2024)
§ 1º É proibido o uso, para prejudicar ou para favorecer candidatura, de conteúdo sintético em formato de áudio, vídeo ou combinação de ambos, que tenha sido gerado ou manipulado digitalmente, ainda que mediante autorização, para criar, substituir ou alterar imagem ou voz de pessoa viva, falecida ou fictícia (deep fake). (Incluído pela Resolução nº 23.732/2024)
§ 2º O descumprimento do previsto no caput e no § 1º deste artigo configura abuso do poder político e uso indevido dos meios de comunicação social, acarretando a cassação do registro ou do mandato, e impõe apuração das responsabilidades nos termos do § 1º do art. 323 do Código Eleitoral, sem prejuízo de aplicação de outras medidas cabíveis quanto à irregularidade da propaganda e à ilicitude do conteúdo. (Incluído pela Resolução nº 23.732/2024)
Art. 34. É vedada a realização de propaganda: (Redação dada pela Resolução nº 23.671/2021)
(...)
II - por meio de disparo em massa de mensagens instantâneas sem consentimento da pessoa destinatária ou a partir da contratação expedientes, tecnologias ou serviços não fornecidos pelo provedor de aplicação e em desacordo com seus termos de uso. (Constituição Federal, art. 5º, X e XI ; Código Eleitoral, art. 243, VI ; Lei nº 9.504/1997, art. 57-J) (Incluído pela Resolução nº 23.671/2021)
§ 1º Na hipótese do inciso II deste artigo, deverá ser observada a regra do art. 33 desta Resolução. (Incluído pela Resolução nº 23.671/2021)
§ 2º Abusos e excessos serão apurados e punidos nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990. (Incluído pela Resolução nº 23.671/2021)
Registro que, neste caso, sequer foi alegado o disparo em massa de mensagens instantâneas e, quanto à divulgação de fato notoriamente inverídico, nenhuma prova foi produzida sobre o assunto, tampouco foi demonstrado o potencial de a mensagem divulgada em grupo com 194 (cento e noventa e quatro) integrantes causar danos ao equilíbrio do pleito.
Assim, deve ser aplicado ao caso concreto, conforme os precedentes citados, o § 2º do art. 33 da Res. TSE n. 23.610/2019, devendo, portanto, ser mantido o julgamento de improcedência.
No que tange a necessidade de sigilo referente aos documentos acostados (ID’s 19230221, 19230095, 19230096, 19230097, 19230098 e 19230099), observo que não se justifica sua decretação.
Ante o exposto, voto por conhecer do recurso e a ele negar provimento, para fins de manter a improcedência da representação.
É como voto.
EXTRATO DE ATA
RECURSO ELEITORAL (11548) N. 0600059-97.2024.6.24.0105
RECORRENTE: PARTIDO LIBERAL (PL) - ITAPOÁ - SC - MUNICIPAL
ADVOGADO: BRUNO RIBEIRO DE ALMEIDA - OAB/SC55667
ADVOGADO: JOSE CARLOS POZZER DE OLIVEIRA - OAB/SC55338
ADVOGADO: MARIA ELISA GIACOMELI - OAB/SC55313
RECORRIDO: BRUNO FERNANDO DOS SANTOS
ADVOGADO: DIEGO ARAUJO VARGAS LEAL - OAB/SC44595
RELATOR: JUIZ SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Decisão: ACORDAM os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina, à unanimidade, em conhecer do recurso e a ele negar provimento, nos termos do voto do Relator.
Participaram do julgamento os Juízes Maria do Rocio Luz Santa Ritta (Presidente), Carlos Alberto Civinski, Sebastião Ogê Muniz, Otávio José Minatto, Ítalo Augusto Mosimann, Adilor Danieli e Sérgio Francisco Carlos Graziano Sobrinho.
Presente o Procurador Regional Eleitoral Cláudio Valentim Cristani.
Processo julgado na sessão de 03/09/2024.