JUSTIÇA ELEITORAL

TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO RIO GRANDE DO SUL

 


RECURSO ELEITORAL (11548) - 0600098-82.2024.6.21.0039 - Rosário do Sul - RIO GRANDE DO SUL
RELATORA: PATRICIA DA SILVEIRA OLIVEIRA
INTERESSADO: JOAO LUIS DE LIMA IZAGUIRRY
Advogados do(a) INTERESSADO: EDUARDO ARLA CABRERA - RS35970, SILVANA CHAGAS FABRICA - RS128012, LUCIANE TEMP AMARAL - RS117031, GEORGIA PAWLOSSKI GONCALVES NUNES - RS123670, CASSIO ACOSTA SARAIVA - RS123773
RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL

 

 

Direito eleitoral. Eleição 2024. Recurso especial eleitoral. Ação de impugnação ao registro de candidatura. Delito de estelionato. Inelegibilidade. Preliminar de não conhecimento acolhida. Interposição de recurso inadequado. Erro grosseiro. Inaplicabilidade do princípio da fungibilidade recursal. Recurso não conhecido.

I. CASO EM EXAME

1.1. Recurso especial eleitoral interposto contra decisão que julgou procedente a ação de impugnação e indeferiu o registro de candidatura do recorrente ao cargo de vereador nas eleições de 2024. Reconhecimento de inelegibilidade por condenação penal por estelionato (art. 171, § 3º, do CP), cuja extinção da pena ocorreu por indulto em 26.01.2024, impondo inelegibilidade por 8 anos, conforme o art. 1º, inc. I, al. "e", da Lei Complementar n. 64/1990.

1.2. O recorrente argumenta que, com a extinção da punibilidade, a inelegibilidade não deveria subsistir, e alega erro material na sentença. Requereu a reforma da decisão e deferimento de seu registro de candidatura.

II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO

2.1. A questão em discussão é saber se o recurso especial eleitoral foi adequadamente interposto, considerando que o recurso correto seria o recurso inominado, conforme previsto no Código Eleitoral.

2.2. Outra questão é a aplicabilidade do princípio da fungibilidade recursal em razão do erro na interposição do recurso.

III. RAZÕES DE DECIDIR

3.1. Preliminar de não conhecimento acolhida.

3.1.1. O recurso especial foi interposto de forma inadequada, visto que a decisão de primeiro grau deveria ter sido atacada por recurso inominado, conforme o art. 265 do Código Eleitoral e o art. 58 da Resolução TSE n. 23.609/19.

3.1.2. O Tribunal Superior Eleitoral possui entendimento consolidado de que o princípio da fungibilidade recursal não se aplica em casos de erro grosseiro na interposição do recurso, sendo este o caso, visto que não há dúvida objetiva quanto ao recurso cabível (TSE, AgR–REspEl n. 0600268–11/BA, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto).

3.1.3. Esta Casa apontou recentemente que “inexiste a possibilidade de aplicação do princípio da fungibilidade recursal ante a ausência de dúvida objetiva patente sobre as hipóteses de cabimento das espécies recursais, pois há previsão legal expressa acerca de qual recurso a ser interposto” (TRE/RS, ED em REl n. 0000038-90, Relator Desembargador Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Publicação: DJE, 06/09/2023).

3.1.4. Impossibilidade de aplicação do princípio da fungibilidade na presente hipótese, pois a interposição de recurso especial contra sentença representa evidente erro grosseiro. Existência de óbice intransponível para se conhecer a tese recursal, pois se faz necessária a observância da jurisprudência consolidada desta Casa e no Tribunal Superior Eleitoral sobre a matéria, concretizando princípios de segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia (art. 927, § 4º, in fine, do CPC).

IV. DISPOSITIVO E TESE

4.1. Recurso não conhecido.

Tese de julgamento: "A interposição de recurso especial em substituição ao recurso inominado contra sentença de indeferimento de registro de candidatura configura erro grosseiro, sendo inaplicável o princípio da fungibilidade recursal".

Dispositivos relevantes citados: Constituição Federal, art. 105, inc. III; Código Eleitoral, art. 265; Lei Complementar n. 64/90, art. 1º, inc. I, al. "e"; Código de Processo Civil, art. 1.029; Resolução TSE n. 23.609/19, art. 58.

Jurisprudência relevante citada: TSE, AgR–REspEl n. 0600268–11/BA, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, PSESS 12.11.2020; TSE, AgR-AI n. 30525, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 22.5.2018; TJ/RS, AC n. 70048840243, Rel. Des. Luiz Felipe Silveira Difini, 1ª Câmara Cível, DJe 10.9.2012.

 

 

A C Ó R D Ã O

Vistos, etc.

ACORDAM os juízes do Tribunal Regional Eleitoral, por unanimidade, ouvida a Procuradoria Regional Eleitoral, acolher a preliminar e não conhecer do recurso.

Sala de Sessões do Tribunal Regional Eleitoral.

Porto Alegre, 02/10/2024.

 

                                             DESA. ELEITORAL PATRICIA DA SILVEIRA OLIVEIRA

                                                RELATORA 

 


 

 

RELATÓRIO

Trata-se de analisar recurso especial eleitoral, com fundamento no art. 105, inc. III, da CF (Constituição Federal) e no art. 1.029 do CPC (Código de Processo Civil), interposto por JOAO LUIS DE LIMA IZAGUIRRY contra decisão do Juízo da 39ª Zona Eleitoral – Rosário do Sul/RS, que julgou procedente a ação de impugnação e indeferiu o requerimento do seu registro de candidatura por entender que o delito de estelionato – art. 171, § 3º, do CP (Código Penal) – caracteriza causa de inelegibilidade com duração de 8 anos a partir da extinção da pena por indulto, em 26.01.2024, conforme exige o art. 1º, inc. I, al. “e”, da Lei Complementar 64/90 (ID 45703097).

Em suas razões, assevera que, com a concessão do indulto, extinta a punibilidade das penas que lhe foram impostas pelo delito de estelionato, não subsistiria amparo legal para inelegibilidade declarada. Entende que há erro material na sentença, pois a inelegibilidade representaria cominação de sanção penal indevida. Aduz que a extinção da punibilidade ocorreu antes das datas das convenções partidárias. Refere ser vítima de crimes contra honra. Informa que o CANDEX (módulo externo do sistema de protocolo administrativo de registro de candidatura) “aprovou toda a documentação apresentada pelo recorrente”. Colaciona jurisprudência, junta fotos de placas e capturas de telas do sistema CANDEX. Requer, ao final, o provimento do presente recurso para reformar a sentença e deferir seu registro de candidatura (ID 45703101).

Apresentadas contrarrazões, os autos vieram conclusos (ID 45707939).

Concluí que, em homenagem ao ius honorum, a análise do cabimento e do conhecimento do recurso seria realizado após a manifestação ministerial (ID 45707743).

A Procuradoria Regional Eleitoral opinou, preliminarmente, pelo não conhecimento do recurso e, no mérito, pelo não conhecimento.

É o relatório.

VOTO

Preliminarmente, analiso a preliminar de não conhecimento do recurso arguida pela Procuradoria Regional Eleitoral, uma vez que contra a sentença de primeiro grau foi interposto recurso especial com fundamento no art. 105, inc. III, als. “a” e “c”, da CF (Constituição Federal), e do art. 1.029 do CPC (Código de Processo Civil), no lugar do recurso inominado disciplinado pelo art. 265 do Código Eleitoral.

Ao receber o recurso, consignei que das regras previstas no art. 265 do Código Eleitoral e do art. 58 da Resolução TSE n. 23.609/19, da sentença que julga o requerimento de registro de candidatura cabe a interposição de recurso inominado eleitoral, e que, embora o recurso especial interposto seja tempestivo, para o TSE “é inaplicável o princípio da fungibilidade recursal aos erros processuais reputados grosseiros” (AgR–REspEl nº 0600268–11/BA, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, PSESS de 12.11.2020).

A Procuradoria Regional Eleitoral igualmente aponta que houve erro grosseiro na interposição do apelo especial eleitoral e que é inaplicável o princípio da fungibilidade recursal.

Conforme entendimento pacífico no Tribunal Superior Eleitoral, incide o princípio da fungibilidade recursal quando verificada “a ocorrência de (i) dúvida objetiva quanto ao meio recursal a ser exercido contra decisão específica ou (ii) divergência doutrinária ou jurisprudencial acerca do meio recursal adequado para contestar determinada decisão." (TSE, AgR-AI n. 30525, Relator Ministro Luiz Fux, publicação no DJe, 22/05/2018).

Lembro, a propósito, que esta Casa recentemente, a partir do voto do ilustre Desembargador Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, apontou que “inexiste a possibilidade de aplicação do princípio da fungibilidade recursal ante a ausência de dúvida objetiva patente sobre as hipóteses de cabimento das espécies recursais, pois há previsão legal expressa acerca de qual recurso a ser interposto” (TRE/RS, ED em REl n. 0000038-90, Relator Desembargador Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Publicação: DJE, 06/09/2023).

Sublinho, ademais, o precedente do Colendo Tribunal de Justiça deste Estado de que caracteriza evidente erro grosseiro a interposição de recurso especial contra sentença:

DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. FORNECIMENTO DE ÁGUA. AÇÃO DE REPETIÇÃO DO INDÉBITO CUMULADA COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTE A AÇÃO ORDINÁRIA. RECURSO CABÍVEL. APELAÇÃO CÍVEL. INVIABILIDADE DA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE RECURSAL. O recurso cabível contra a sentença que julga improcedente ação ordinária é a apelação cível, e não o recurso especial, nos termos do art. 513 do Código de Processo Civil. Erro grosseiro configurado. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO.

(TJ/RS - AC: 70048840243, Relator Desembargador Luiz Felipe Silveira Difini, Primeira Câmara Cível, Publicação: Diário da Justiça, 10/09/2012)

Por conseguinte, encontro óbice intransponível para conhecer a tese recursal, pois se faz necessária a observância da jurisprudência consolidada desta Casa e do Tribunal Superior Eleitoral sobre a matéria, concretizando princípios de segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia (art. 927, § 4º, in fine, do CPC).

Desta forma, considerando a impossibilidade de aplicação do princípio da fungibilidade na presente hipótese, representando a interposição de recurso especial contra sentença evidente erro grosseiro, impõe-se o não conhecimento do recurso.

Diante do exposto, acolho a matéria preliminar e VOTO pelo não conhecimento do recurso.