TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DE RONDÔNIA


ACÓRDÃO N. 736/2023

RECURSO CRIMINAL ELEITORAL PJE N. 0600031-76.2021.6.22.0013 – MIRANTE DA SERRA/RO

Relator: Juiz Edenir Sebastião Albuquerque da Rosa

Revisor: Juiz Enio Salvador Vaz

Recorrente: Adinaldo de Andrade

Advogado: Ricardo Oliveira Junqueira – OAB/RO 4477

Advogada: Ariane Maria Guarido Xavier – OAB/RO 3367

Advogada: Karen Karoline Gomes Ito – OAB/RO 7785

Advogada: Nataly Fernandes Andrade Moura – OAB/RO 7782

Recorrido: Ministério Público Eleitoral

Recurso criminal. Art. 301 do Código Eleitoral. Crime formal. Condenação. Autoria e materialidade configuradas. Condenação. Manutenção da sentença. Recurso desprovido.

I – Tratando-se a ameaça de crime de natureza formal, é dispensada a consumação do mal prometido.

II – Demonstrada de forma suficiente a autoria e a materialidade do crime previsto no art. 301 do Código Eleitoral, deve ser mantida a sentença que condenou o recorrente à pena de quatro anos de reclusão.

III – Recurso conhecido e, no mérito, desprovido.

ACORDAM os Membros do Tribunal Regional Eleitoral de Rondônia em negar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator, unânime.

Porto Velho, 7 de dezembro de 2023.

Assinado de forma digital por:

JUIZ EDENIR SEBASTIÃO ALBUQUERQUE DA ROSA

Relator


RELATÓRIO

O SENHOR JUIZ EDENIR SEBASTIÃO ALBUQUERQUE DA ROSA: Trata-se de recurso criminal interposto por Adinaldo de Andrade em face da sentença proferida pelo Juízo da 28ª Zona Eleitoral de Ouro Preto do Oeste, que julgou procedente a denúncia ofertada pelo Ministério Público e condenou o recorrente como incurso nas penas do art. 301 do Código Eleitoral.

Na denúncia, narra o órgão ministerial que no dia 13/11/2020, o recorrente disputava a reeleição para o cargo de prefeito da cidade de Mirante da Serra, e nessa qualidade ameaçou e coagiu alguns servidores públicos a votarem na sua candidatura.

Após regular instrução, o Juízo Singular condenou o recorrente à pena de quatro anos, a ser cumprida em regime aberto, pelo crime de coação eleitoral, previsto no art. 301 do Código Eleitoral.

Em suas razões, o recorrente sustenta, preliminarmente, a atipicidade da conduta imputada, ante a impossibilidade da configuração do tipo na modalidade culposa. No mérito, alega a fragilidade das provas, sobretudo dos depoimentos colhidos na fase pré-processual, que embasaram a inicial acusatória. Nesses termos, postula a reforma da sentença, a fim de julgar improcedentes os pedidos formulados na denúncia (id. 7995790).

Nas contrarrazões, o Ministério Público Eleitoral aduz que a materialidade está comprovada pelas provas constantes nos autos, razão por que pleiteia o conhecimento e não provimento do recurso (id. 7995796). No mesmo sentido é o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral (id. 8129137).

É o relatório, submetido ao exame do Excelentíssimo Revisor, nos termos do art. 33, inciso XVI, do Regimento Interno deste Tribunal.

VOTO

O SENHOR JUIZ EDENIR SEBASTIÃO ALBUQUERQUE DA ROSA (Relator): Recurso próprio e tempestivo, dele conheço.

I – PRELIMINAR

O SENHOR JUIZ EDENIR SEBASTIÃO ALBUQUERQUE DA ROSA (Relator): A preliminar arguida pela defesa, consistente na atipicidade da conduta em razão da impossibilidade da configuração do tipo na modalidade culposa, guarda relação com o mérito, porquanto se destina a averiguar a intenção do agente no momento do fato.

Assim, a pretensão confunde-se com o mérito, portanto, será analisada no momento próprio.

II – MÉRITO

O SENHOR JUIZ EDENIR SEBASTIÃO ALBUQUERQUE DA ROSA (Relator): Narra a denúncia que o recorrente, em reunião realizada no dia 13/11/2020, por volta das 10h30min, na Secretaria Municipal de Saúde de Mirante da Serra, “de forma livre e consciente, usou de grave ameaça, consistente na ameaça de demissão, exoneração e transferência, para coagir os eleitores e servidores Gessica de Oliveira Vasconcelos, Rosileia Helena de Oliveira, Miriam Alves Stopa e Leonardo Aguiar Merlin a votarem na sua candidatura nas eleições municipais de 2020”.

O tipo penal imputado ao recorrente – art. 301 do Código Eleitoral – prevê:

Art. 301. Usar de violência ou grave ameaça para coagir alguém a votar, ou não votar, em determinado candidato ou partido, ainda que os fins visados não sejam conseguidos:

Pena - reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa.

No particular caso de grave ameaça, o crime é formal, sendo, portanto, desnecessária a concretização do mal prometido para o enquadramento na conduta típica.

Na hipótese dos autos, importa inicialmente destacar que é fato incontroverso nos autos a realização da reunião na Secretaria Municipal de Saúde de Mirante da Serra, conduzida pelo recorrente, na qualidade de prefeito daquela municipalidade – e candidato à reeleição –, do secretário municipal de saúde e alguns servidores municipais da pasta.

A controvérsia existente consiste em averiguar os eventos ocorridos após a reunião, em que, segundo o Ministério Público, o ora recorrente coagiu os servidores Géssica de Oliveira Vasconcelos, Rosileia Helena de Oliveira, Miriam Alves Stopa e Leonardo Aguiar Merlin a votarem na sua candidatura nas eleições municipais de 2020.

A análise do caderno probatório revela a materialidade e autoria da conduta ilícita imputada ao recorrente, bem como o elemento subjetivo da conduta imputada pelo Ministério Público.

Com efeito, os depoimentos colhidos demonstram que a reunião se iniciou com elogio do recorrente aos servidores da pasta, todavia, em certo momento, o então prefeito começou a falar sobre política, tecendo críticas a partido e ex-mandatários “da esquerda”, o que motivou alguns servidores a saírem do recinto, e decorrido alguns instantes desse evento, o recorrente se dirigiu a alguns desses servidores para ameaçá-los, senão vejamos:

Depoimento de Géssica de Oliveira (id. 7995739)

Juiz Eleitoral: A senhora pode me contar o que aconteceu nessa reunião, por favor?

Géssica de Oliveira: Sim, a gente tava lá na farmácia básica, né, aí ele foi lá e chamou a gente, que ele ia fazer uma reunião com a gente. Aí, a gente foi lá numa sala, na secretaria de saúde, ele começou falando, né, sobre...agradecendo aos funcionários pela dedicação e tal, agradecendo a cada funcionário pelo trabalho prestado ao município, e depois começou a falar questão relacionada à política. A gente pegou e retirou da sala, saiu da sala.   

(...)           

Promotora Eleitoral: Aí você já mencionou que, então, houve esse agradecimento em relação aos trabalhos prestados?

Géssica de Oliveira: Ele começou agradecendo os funcionários, agradecendo pelo trabalho, pelo (inaudível) do município, falando do empenho dos funcionários.

Promotora Eleitoral: E aí, logo em seguida, qual que foi o assunto tratado?        

Géssica de Oliveira: Aí ele começou a...tipo que jogar indiretas, né, ao então candidato à Prefeitura de Mirante.                       

(...)

Promotora Eleitoral: Nesse momento lá, enquanto você tava participando da reunião, houve algum tipo de ameaça, de fala mais agressiva por parte do então prefeito Adinaldo?      

Promotora Eleitoral: E depois desse momento, você teve mais algum tipo de contato com o então prefeito nesse dia?      

Géssica de Oliveira: Depois que a gente se retirou da sala, a gente foi lá pra farmácia básica, que era onde a gente tava, aí depois que ele encerrou a reunião, ele foi lá na farmácia básica pra conversar com a gente.          

Promotora Eleitoral: Em algum momento dessa conversa, o então prefeito Adinaldo fez algum tipo de ameaça pra você ou pra alguma das pessoas que estavam lá presentes?   

Géssica de Oliveira: Não, ele só falou assim, que a gente ia ver se caso ele ganhasse a eleição, né. Ele só falou assim, mas não falou (inaudível), só falou assim: “Não, se eu ganhar, vocês vão ver”. Falou assim             

(...)

Promotora Eleitoral: Essa conduta do então prefeito Adinaldo despertou, então, temor em você?      

Géssica de Oliveira: Isso. Foi por isso que eu fiz o boletim. Como eu ainda tinha que fazer estágio no município, foi por essa questão, por essa fala dele que eu fiquei com um pouco de medo, de ele não poder mais deixar eu continuar fazendo estágio.                              

Depoimento de Miriam Alves Stopa (id. 7995740)

Juiz Eleitoral: O que a senhora pode falar? O que a senhora lembra dessa reunião?   

Miriam Alves: Ah sim, da reunião....fomos chamados pra uma reunião de interesse, eu imaginada do trabalho, né, mas aí começou a falar coisas sobre política e tal, né, do...coisas de política, né, que não tinha muito a ver com o trabalho, né. Aí a gente, como era coisas que não tinha relacionada ao trabalho, a gente se ausentou da reunião, né, porque não tinha muito interesse relacionado a isso. Aí ele ficou nervoso na sala e tal, né, aí quando a gente foi pra nossa sala, ele acompanhou até a nossa sala e falou palavras de baixo calão pra gente, né. Até mencionou que segunda-feira a gente conversa, né. Depois de ter falado palavras de baixo calão. Aí a gente ficou assustado com aquela situação, né. Aí fomos abrir o boletim, só isso.   

Depoimento de Miriam Alves Stopa (id. 7995741)

Promotora Eleitoral: Em algum momento ele ameaçou diretamente vocês de algum mal?  

Miriam Alves: Ele só falou, tipo assim, como era segunda-feira já saía o resultado, né, aí ele falava: “Segunda-feira a gente conversa, vocês não vão trabalhar nesse setor mais”.              

(...)

Promotora Eleitoral: Em relação ao comportamento do seu Adinaldo, quando ele proferiu essas palavras lá pra senhora, a senhora percebeu nele um tom ameaçador ou era um tom de brincadeira?        

Miriam Alves: Brincadeira? Os zóio vermelho, chega tava suando (sic).

(...)

Promotora Eleitoral: A senhora ficou amedrontada no sentido de que poderia, de alguma forma, ser prejudicada no seu trabalho?       

Miriam Alves: Sim. Perseguição, sim. Com certeza. Por isso que eu fui fazer o boletim, porque eu nunca fiz isso, né. Eu sempre apoiei o trabalho dele, eu não era contra ele, eu era uma das apoiadoras dele, porque eu tava achando muito bom o que ele tava fazendo com o município, entendeu, mas com os funcionários não tinha aquele, aquela atenção, era mais agressividade mesmo, aí acabou tratando eu, que apoiava ele, mau.     

Depoimento de Leonardo Aguiar Merlin (id. 7995743)

Promotora Eleitoral: E quais foram os assuntos tratados nessa reunião?            

Leonardo Aguiar: Bom, é...ele começou, o prefeito, não foi nem o secretário que deu abertura, foi o prefeito que deu abertura à reunião. Ele começou elogiando os funcionários de modo geral, em especial os funcionários da saúde, que deveriam ter um bom atendimento ao público, passar informações corretas para o bom atendimento. Só que aí, logo em seguida, ele entrou em assuntos que não era de trabalho. Começou a dizer que os candidatos de partidos de esquerda nunca fizeram nada pro município, que candidatos que estavam concorrendo à eleição nunca fizeram nada, que só pensavam em discurso de faculdade e que nunca tinha feito nada, que ele sempre tinha feito o melhor pro município de Mirante da Serra. E aí, quando ele entrou nesse assunto, nós, falo nós porque eu e mais alguns, pedimos licença e dissemos que a reunião não estava tratando de trabalho e que nós não iríamos ficar ali e nos retiramos da sala. Aí quando a gente tava saindo, eu escutei o então prefeito dizendo que era pra anotar o nome de todos esses que estavam saindo da sala.       

(...)

Promotora Eleitoral: E logo depois que você se retirou dessa reunião, o quê que aconteceu?  

Leonardo Aguiar: Eu vim pra minha sala, e os demais, acredito que foram para as suas salas. Continuei meu trabalho normal. Aí passou-se uns dez, quinze minutos mais ou menos, e a reunião acabou, e o prefeito, ele veio na minha sala, bateu na porta, entrou e disse assim: “Parabéns pela sua falta de educação”. Aí eu disse assim: “Prefeito, se não tivesse tratando de assunto que não fosse políticos, que fosse de trabalho, eu nunca tinha me retirado da reunião, mas o assunto estava tratando era político numa véspera de eleição, não era de trabalho”. Aí ele disse assim: “É, segunda-feira a gente se vê. Você não vai mais trabalhar aqui”. E aí, assim, eu fiquei temeroso, de fato, não é uma utopia, porque há dias antes ele tinha demitido um funcionário estatutário, um motorista aqui do município, sem o devido processo legal, então (inaudível) ele demitia, ele trocava, ele perseguia, até os policiais aqui da cidade, eles cumpriam o decreto do COVID, ele desacatou os policiais, então assim, como não ter medo, né.  

Promotora Eleitoral: Essa fala que o Prefeito dirigiu a você, aí na sua sala, ela te causou temor?        

Leonardo Aguiar: Com certeza, com certeza. Ainda mais porque o funcionário recém demitido, um funcionário estatutário, recém demitido, que hoje é, depois de passar pela primeira instância, segunda instância, ganhou e voltou a trabalhar.      

Depoimento de Francisca Nogueira (id. 7995746)

Promotora Eleitoral: Dona Francisca, essa conduta que a senhora presenciou e que depois a senhora soube também da conduta dele, já quando a senhora deixou a reunião. Segundo o entendimento da senhora naquele dia, era uma forma de induzir ou de exigir que os servidores votassem nele na eleição que aconteceria dois dias depois?          

Francisca Nogueira: Sim.                 

Promotora Eleitoral: De alguma forma, a senhora se sentiu pressionada?         

Francisca Nogueira: Sim, porque da forma que ele falou lá, eu senti que a gente tinha que participar e (inaudível) tinha que votar nele, porque daí a gente não voltaria se não votasse, no caso que eu entendi, como eu era da esquerda, eu não ia voltar a trabalhar que ele não ia aceitar, né.    

Depoimento de Rosileia Helena (id. 7995747)

Juiz Eleitoral: O que aconteceu nessa reunião objeto da denúncia?        

Rosileia Helena: O que aconteceu foi assim: o secretário Hermes ele acionou todos os servidores que ia ter uma reunião com o senhor Adinaldo, prefeito Adinaldo. Aí chamou todos nós, aí beleza. Aí o pessoal falou assim: “É sobre agradecimento, né?”, aí ele falou assim: “Provavelmente é sobre agradecimento”. Aí outras pessoas falou: “Se for pra falar sobre política, não pode”. Aí ele falou assim: “Não, é sobre agradecimento”. Aí todo mundo foi na sala, ele chegou, né, agradeceu todo mundo educadamente e aí, falando, começou a conversar, né, começou a conversar, falar, agradecer a nós e aí depois, falou sobre se o pessoal conhecida o lado da esquerda, aí foi quando ele começou a falar o lado da esquerda, aí o pessoal começo a sair e eu também fui junto, mas não foi nada de agressão, nada assim de coisa, aí depois que acabou a reunião, ele foi na sala, né, na farmácia e falou que que no outro dia a gente ia pagar, só isso, “Ó, vocês me pagam”, só isso.       

Promotora Eleitoral: A senhora pode esclarecer melhor o quê que foi tratado nessa reunião e o quê que fez exatamente com que a senhora deixasse a sala da reunião?  

Rosileia Helena: Tava eu e a minha companheira de trabalho, né. Aí ela saiu, foi assim (inaudível), tipo assim, ele não falou nada pra gente votar no outro prefeito, nada, não falou nada disso. Ele disse, teve uma reunião, ele falou assim: “Vocês conhece o lado da esquerda?” Todo mundo ficou em silêncio, ninguém falou nada, simplesmente nóis saiu da sala de reunião. Aí a minha companheira de trabalho saiu, eu fui junto com ela e os outros também. Aí nós saímos, aí parece que ele ficou bravo lá na sala. Eu não tava na hora que que ele ficou bravo, já tinha saído. Ele ficou bravo, bateu na mesa e mandou pegar os nossos nomes, aí eu já tinha saído, isso eu ouvi depois que as pessoas falaram pra gente, e aí ele foi na sala das pessoas e falou assim, falou pra mim e pra outra minha amiga: “Vocês me pagam”. Ele tava nervoso, só e pronto. Acabou e foi embora, ele não chegou a entrar na minha sala, só foi na porta da sala e falou isso. Aí nóis ficou assim, receado, né, nossa, Deus...aí nóis foi pra delegacia, todo mundo.   

Depoimento de Rosileia Helena (id. 7995748)

Promotora Eleitoral: A senhora sabe dizer o quê que motivou a senhora e esses outros servidores a registragem a ocorrência policial?    

Rosileia Helena: Ah, porque tipo assim, era campanha de político, né, aí fez aquela reunião, aí todos nós ficou assim apreensiva, né, porque ele na nossa sala ele falou que no outro dia a gente ia pagar, porque a gente não sabia, tipo assim, como que ia ser, né, no outro dia, se ia ganhar, se ia perder. Nós não tava assim, jogando, fazendo jogo político nem nada, entendeu? Aí ficamos apreensivos, né. Aí todo mundo falou assim “Ai, vou na delegacia”. Aí vai todo mundo junto e foi todo mundo junto.  

Promotora Eleitoral: E a senhora ficou apreensiva com o quê? O quê que poderia acontecer? Qual era o temor da senhora?                       

Rosileia Helena: Ah, do jeito que, tipo assim, “vocês me pagam”, entendeu?

Extrai-se dos depoimentos, todos prestados na fase judicial e, portanto, em atenção ao contraditório e ampla defesa, que após a citada reunião, o recorrente se dirigiu às vítimas para ameaçá-las de demissão/exoneração dos quadros da prefeitura, retirando-lhes a liberdade de escolha do próximo prefeito da cidade, cuja votação estava marcada para o dia 15 de novembro de 2020, isto é, a dois dias da ocorrência dos fatos. Nesse sentido, bem anotou o juízo sentenciante:

“Como se nota, as manifestações do réu durante a reunião tinham o objetivo de infundir nas pessoas presentes à reunião que votassem em sua candidatura e/ou não votassem no adversário. Quando se sentiu confrontado pela postura daqueles que saíram da reunião, foi atrás de tais pessoas proferindo ameaças. As vítimas relataram ter sentido temor por seus empregos e estágio no sentido de serem demitidas ou serem perseguidas.

E, não se diga que a ameaça de exoneração de função demissível ad nutum, como estagiária, ou de perseguição, cuidando de não investidura em cargo em comissão, progressão funcional, não se caracterização como "grave", ante a notória inflesão na condição econômica das vítimas e tranquilidade no trabalho.”

De acordo com Rodrigo López Zilio, o crime tipificado no art. 301 do Código Eleitoral também se consuma a partir da ameaça praticada no contexto profissional da vítima, que tem violada a sua liberdade para o exercício do voto em razão da promessa de demissão:

“Na forma da grave ameaça, a coação deve impor um temor real sobre o mal anunciado, devendo ser verossímil – o que não se coaduna com bravatas ou ameaças genéricas ou vagas. Nesse contexto, destaca-se que não apenas fatos relacionados a vida pessoal (v.g., agressão física, cárcere privado) ou a privacidade do eleitor v.g., fotos íntimas), mas igualmente eventos que guardem pertinência com sua atividade profissional (v.g., ameaça de demissão) ou social (v.g., exposição de fatos vexatórios) também são aptos de serem instrumentalizados para fins da prática do crime de coação eleitoral.”

Crimes eleitorais – 4ª ed. – Salvador: JusPodivm, 2020, p. 167

No caso dos autos, expressões do tipo “na segunda vocês me pagam, vocês não vão mais trabalhar aqui” ou “obrigado pela falta de educação, na segunda-feira a gente se vê, você não vai mais trabalhar aqui” não podem ser encaradas como mera crítica vaga, porquanto ditas no contexto em que as vítimas saíram da reunião no instante em que o ora recorrente começou a enaltecer a própria gestão e a criticar o partido e ex-mandatários “da esquerda”.

Ressalte-se que a ameaça de perda do cargo ou função pública potencializa a violência psicológica suportada pelas vítimas, tanto pela natural dificuldade em ingressar nas fileiras da Administração Pública quanto pela escassa realocação profissional em pequeno município do interior.

De outro norte, não se sustenta a alegação do recorrente no sentido de que a versão das vítimas não passa de perseguição política, isso porque não se trata de ato isolado, oriundo de um único servidor descontente ou mal intencionado. Nota-se que os servidores municipais, receosos com o eventual rompimento injustificado de seus vínculos contratuais com a Administração Pública, buscaram a tutela estatal para produzir provas com a intenção de, caso necessário, reverter, administrativa ou judicialmente, o cumprimento das promessas feitas pelo recorrente.

Não se verifica, assim, o suposto conluio de causar prejuízo à candidatura do recorrente, mesmo porque, fosse esse o caso, as vítimas estariam respondendo pelo crime de denunciação caluniosa com finalidade eleitoral, previsto no art. 326-A do Código Eleitoral, que prevê pena de até oito anos para quem der “causa à instauração de investigação policial, de processo judicial, de investigação administrativa, de inquérito civil ou ação de improbidade administrativa, atribuindo a alguém a prática de crime ou ato infracional de que o sabe inocente, com finalidade eleitoral”. Ao contrário do que sustenta o recorrente, os depoimentos colhidos são firmes e coerentes a respeito dos fatos imputados na denúncia. 

Dessa forma, por se encontrar presente o dolo específico, consistente nas graves ameaças dirigidas a servidores públicos municipais, e a consequente violação ao bem jurídico tutelado pela norma, que é a liberdade de voto dos eleitores, a sentença não merece reparos e deve ser confirmada por seus próprios fundamentos.

Por tais razões, voto pelo conhecimento do recurso e, no mérito, pelo seu não provimento, mantendo hígida a sentença que condenou Adinaldo de Andrade como incurso nas sanções do art. 301 do Código Eleitoral.

É como voto.

PEDIDO DE VISTA

O SENHOR JUIZ IGOR HABIB RAMOS FERNANDES: Peço vista dos autos.


EXTRATO DA ATA 

RECURSO CRIMINAL ELEITORAL PJe n. 0600031-76.2021.6.22.0013. Origem: Mirante da Serra/RO. Relator: Juiz Edenir Sebastião Albuquerque da Rosa. Revisor: Juiz Enio Salvador Vaz. Resumo: Coação Visando a Obtenção de Voto ou a sua Abstenção. Recorrente: Adinaldo de Andrade. Advogado: Ricardo Oliveira Junqueira – OAB/RO 4477. Advogada: Ariane Maria Guarido Xavier – OAB/RO 3367. Advogada: Karen Karoline Gomes Ito – OAB/RO 7785. Advogada: Nataly Fernandes Andrade Moura – OAB/RO 7782. Recorrido: Ministério Público Eleitoral.

Decisão: Após o voto do relator pelo conhecimento e não provimento do recurso, no que foi acompanhado pelo Juiz Enio Salvador, pediu vista o Juiz Igor Habib Ramos Fernandes os demais membros aguardam.

Presidência do Desembargador Paulo Kiyochi Mori. Presentes o senhores juízes, Igor Habib Ramos Fernandes, José Vitor Costa Júnior, Ricardo Beckerath Silva Leitão, Edenir Sebastião Albuquerque da Rosae Enio Salvador Vaz. Procurador Regional Eleitoral, Bruno Rodrigues Chaves. Ausência justificada do Corregedor, Des. Miguel Monico Neto.

87ª Sessão Ordinária do ano de 2023, realizada no dia 30 de novembro.


VOTO-VISTA

O SENHOR JUIZ IGOR HABIB RAMOS FERNANDES: Acompanho na íntegra o voto do relator.


EXTRATO DA ATA 

RECURSO CRIMINAL ELEITORAL PJe n. 0600031-76.2021.6.22.0013. Origem: Mirante da Serra/RO. Relator: Juiz Edenir Sebastião Albuquerque da Rosa. Revisor: Juiz Enio Salvador Vaz. Resumo: Coação visando a obtenção de voto ou a sua abstenção. Recorrente: Adinaldo de Andrade. Advogado: Ricardo Oliveira Junqueira – OAB/RO 4477. Advogada: Ariane Maria Guarido Xavier – OAB/RO 3367. Advogada: Karen Karoline Gomes Ito – OAB/RO 7785. Advogada: Nataly Fernandes Andrade Moura – OAB/RO 7782. Recorrido: Ministério Público Eleitoral.

Decisão: Recurso conhecido e não provido, nos termos do voto do relator, unânime.

Presidência do Desembargador Paulo Kiyochi Mori. Presentes o Desembargador Miguel Monico Neto e o senhores juízes, Igor Habib Ramos Fernandes, José Vitor Costa Júnior, Ricardo Beckerath Silva Leitão, Edenir Sebastião Albuquerque e Enio Salvador Vaz. Procurador Regional Eleitoral, Bruno Rodrigues Chaves.

88ª Sessão Ordinária do ano de 2023, realizada no dia 7 de dezembro.