JUSTIÇA ELEITORAL
TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO PARANÁ
AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (11527) - Processo nº 0604176-51.2022.6.16.0000 - Curitiba - PARANÁ
[Abuso - De Poder Econômico, Abuso - De Poder Político/Autoridade, Abuso - Uso Indevido de Meio de Comunicação Social]
RELATOR: MARIO HELTON JORGE
INVESTIGANTE: PARTIDO LIBERAL - PARANA - PR - ESTADUAL
Advogados do(a) INVESTIGANTE: GUILHERME RUIZ NETO - SP303736, MARCELO DELMANTO BOUCHABKI - SP146774, BRUNO CRISTALDI COSTA DE MATTOS - SP259375, NATHALIA ORTEGA DA SILVA - SP426068
INVESTIGADO: SERGIO FERNANDO MORO, LUIS FELIPE CUNHA, RICARDO AUGUSTO GUERRA
DECISÃO
Vistos e examinados estes autos.
1. Trata-se de AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL COM PEDIDO DE TUTELA CAUTELAR DE PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVAS ajuizada pelo PARTIDO LIBERAL DO ESTADO DO PARANÁ – PL PARANÁ em face do candidato ao cargo de Senador da República SERGIO FERNANDO MORO, do candidato a primeiro suplente LUIS FELIPE CUNHA e do candidato a segundo suplente RICARDO AUGUSTO GUERRA.
Em breve síntese o autor sustenta que:
Houve desequilíbrio eleitoral causado pela irregular pré-campanha dos corréus, desde o momento da filiação partidária inicial do primeiro requerido ao Podemos com lançamento de pré-candidatura ao cargo de presidente e até o resultado viciado em que os requeridos foram eleitos pelo União Brasil do pleito ao Senado Federal pelo Estado do Paraná;
Os investigados orquestraram conjunto de ações para usufruir de estrutura e exposição de pré-campanha presidencial para, num segundo momento, migrar para uma disputa de menor visibilidade, menor circunscrição e teto de gastos vinte vezes menor, carregando consigo todas as vantagens e benefícios acumulados indevidamente, ferindo a igualdade de condições entre os concorrentes ao cargo de Senador no Estado do Paraná;
Em 11 de novembro de 2021, o primeiro requerido se filiou ao Podemos, sob o motivo de lançar-se como a terceira via na disputa presidencial, sendo que para viabilizar tal projeto não foram medidos esforços, inclusive em fase de pré-campanha, com maciça cobertura midiática, realização de evento de filiação aberto ao público e televisionado, com feição de lançamento de pré-candidatura, produção de vídeo, estrutura robusta de comício, painel eletrônico, discursos de autoridades, slogan de campanha, exposição de propostas de governo e, segundo reportagem, tal evento teria custado R$ 200.000,00 (duzentos mil reais);
No referido partido, o primeiro investigado foi alavancado para Comissão Executiva Nacional, como “Diretor do Núcleo de Políticas Públicas”, permanecendo como tal de 13 de novembro de 2021 até 1º de abril de 2022, tendo recebido remuneração mensal de R$ 22.000,00 (vinte e dois mil reais), totalizando R$ 88.000,00 (oitenta e oito mil reais) de pagamento nos quatro meses de permanência na legenda, tendo cumprido agenda de pré-candidato no período;
Foi disponibilizado ao primeiro requerido a dedicação de renomado publicitário e respectiva empresa – Fernando Vieira e empresa IV5 – para a preparação de Sérgio Moro para discursos e entrevistas (media training), bem como sua assessoria de imprensa;
Essas primeiras contratações de agência de marketing e produtora de vídeo não poderiam ser realizadas naquele momento, como também foi irregular a contratação da empresa SPE Comunicação 2022, no valor de R$ 14.800.000,00 (quatorze milhões e oitocentos mil reais), assim como a empresa D7 Produções Cinematográficas Ltda., no valor de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais);
Em 31 de janeiro de 2022, foi anunciado pelo então presidenciável Sérgio Moro a contratação do estrategista em comunicação Pablo Nobel, especialista em campanhas presidenciais, para comandar o marketing de sua campanha ao Palácio do Planalto, sendo que para possibilitar o financiamento, houve a constituição, em 10 de março de 2022, de uma Sociedade de Propósito Específico denominada 2022 Comunicação SPE Ltda pelo aludido publicitário, com sede na própria residência deste, sendo que oito dias após a sua constituição, a empresa tem seu pré-contrato assinado pelo Órgão Nacional do partido político do requerido à época com custo de R$ 14.800.000,00;
Entre o anúncio da escolha do marqueteiro Pablo Nobel e a constituição de sua empresa 2022 Comunicação SPE Ltda., foi contratada a empresa D7 Produções Cinematográficas Ltda. para a realização do seguinte objeto contratual: “assessoria em comunicação social, marketing e publicidade, inclusive com a criação de estratégia, produção e entrega de inserções partidárias estaduais e nacionais”, sendo definido que a prestação dos serviços ocorreria “desde a assinatura do contrato até o dia 31 de junho”, tratando-se de empresa que faz parte da equipe do mesmo marqueteiro Pablo Nobel e ocontrato previa a remuneração no valor total de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais), com o primeiro pagamento de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) na data de assinatura do contrato, e o saldo restante em 4 parcelas iguais e sucessivas de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais), a serem pagas em 05/04/2022, 05/05/2022, 05/06/2022 e 05/07/2022;
Justamente no meio das datas concedidas pela Justiça Eleitoral para a veiculação das referidas inserções partidárias produzidas pela equipe do marqueteiro Pablo Nobel, em 31 de março, poucos dias antes da data limite para nova filiação partidária, o Primeiro Requerido se filiou ao Partido União Brasil, sendo que as inserções da agremiação seguiram com o ex-filiado por vários dias até que as emissoras conseguissem retirá-las da programação;
A saída do partido anterior foi marcada pela descontinuidade dos contratos de marketing e produção de vídeos, sendo que em 7 de julho de 2022, a empresa D7 ajuizou Ação Monitória para cobrar os valores que entende devidos referentes aos serviços prestados à pré-campanha do primeiro requerido;
O segundo requerido e atual suplente ao senado, por meio da empresa “Bella Ciao Consultoria”, declarou ter sido contratado pela Fundação Partidária do Podemos para receber mensalmente R$ 30.000,00 (trinta mil reais), no valor total de R$ 360.000,00, para a elaboração de plano de governo, tendo ocorrido o pagamento de apenas duas parcelas, interrompendo-se a contratação com a saída do primeiro requerido da agremiação;
A Fundação Trabalhista Nacional (fundação partidária ligada ao Podemos) contratou pesquisas qualitativas para entender melhor o eleitorado e ajudar a formar o plano de governo do primeiro requerido, enquanto candidato à Presidência da República, no valor de R$ 663.540,00 (seiscentos e sessenta e três mil e quinhentos e quarenta reais), com claro teor eleitoral, sendo que o material compôs o conjunto de serviços que beneficiaram o primeiro requerido na elaboração de plano de governo e na definição de estratégias publicitárias;
No mesmo mês em que o primeiro requerido se filia Podemos foi contratado pela Fundação Partidária o escritório SS Advocacia – Santana Santos Sociedade individual de Advocacia, escritório de Uziel Santana Santos, o qual, em verdade,atuou como como o articulador político da pré-campanha de Sérgio Moro, ora primeiro requerido, junto ao público evangélico e cristão, sendo que a sociedade individual de advogado de Uziel Santana é Administrada por sua esposa, Anna Helena Barrozo Pires Santana dos Santos quem assina o contrato, cujo valor é de R$ 180.000,00 (cento e oitenta mil reais), em parcelas mensais de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), se iniciando em 1º de novembro de 2021, sendo que, assim que o primeiro requerido deixou aquela agremiação, ao final de março de 2022, tal contrato também foi interrompido, reforçando a suspeita de se ter realizado, em verdade, serviços voltados apenas à pré-campanha do primeiro corréu;
Em fevereiro de 2022, outra empresa de Uziel Santana foi contratada pela mesma fundação, o Instituto Internacional De Pesquisa E Estudos Jurídicos Em Liberdades Civis Fundamentais Ltda., de nome fantasia FCL Law & Trading, também administrada pela mesma Anna Helena Barrozo Pires Santana dos Santos, com sede no mesmo endereço da SS Advocacia para a receber exatamente o mesmo valor que o seu escritório recebia mensalmente – R$ 15.000,00 (quinze mil reais), sendo que o contrato também é abruptamente descontinuado com a saída do ex-juiz da agremiação ligada à fundação partidária contratante;
Com a apresentação da prestação de contas eleitorais dos investigados, verificou-se a contratação da empresa SS Advocacia (Santana Santos Sociedade Individual de Advocacia) para atuação durante o período eleitoral propriamente dito, corroborando a alegação defendida de ter se tratado, desde o início, de trabalho eleitoral voltado à pré-campanha;
Na mesma época da saída do primeiro requerido do Podemos, também foi encerrada a atividade do advogado Bonini Guedes iniciada com a chegada do requerido e concluída com a sua saída, sinalizando que mais uma contratação não possuía outro escopo que não a estruturação e viabilização da candidatura do investigado, já que o advogado manteve-se junto ao primeiro requerido, realizando inclusive a defesa, sem êxito, no processo em que aquele teve negada a mudança de seu domicílio eleitoral de Curitiba/PR para São Paulo/SP, além de que o causídico foi contratado para atuação jurídica na campanha ao Senado dos requeridos pelo Partido União Brasil, para atuação duranteo período eleitoral propriamente dito;
Após aparecer em rede nacional de televisão nas propagandas partidárias do Podemos, o primeiro requerido voltou a aparecer na propaganda partidária na televisão, dessa vez pelo Partido União Brasil, em 1º de junho de 2022, e, em 27 de junho de 2022, com cunho eleitoral e superexposição, transbordando para o uso indevido dos meios de comunicação social;
Em 12 de julho de 2022 foi realizado outro evento de lançamento de pré-candidatura, desta vez pelo Partido União Brasil, anunciando a escolha de competir ao cargo de Senador pelo Estado do Paraná com nítido teor eleitoral, com transmissão ao vivo pela internet, coletiva de imprensa, apresentação de vídeo de antecipação de campanha, sendo que os responsáveis pela produção do vídeo não foram informados, também tendo sido divulgados, na sequência, outros vídeos nas redes sociais;
Com a data de saída dos requeridos da relação havida com o Partido Podemos em meio a acusações de falta de pagamentos e cobranças de mais valores para pré-campanha, o escritório de advocacia (Vosgerau e Cunha Advogados Associados) do segundo requerido (Luis Felipe Cunha) é agraciado com um vultoso contrato no valor de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) pela nova sigla, o União Brasil;
O segundo investigado, Luis Felipe Cunha, - que é sócio da empresa Bella Ciao Assessoria Empresarial Ltda., que havia sido contratada pela Fundação Partidária do Podemos -, também é sócio do escritório Vosgerau e Cunha Advogados Associados, sendo que a área de Direito Eleitoral não fazia parte dos ramos de atuação daquele escritório anteriormente à sua contratação;
Fazendo-se um breve apanhado, o primeiro requerido teve à sua disposição em pré-campanha: (a) media training; (b) assessoria de imprensa; (c) planejamento de marketing; (d) produção de vídeos em ambos os partidos; (e)remuneração mensal; (f) figurinista; (g) consultoria jurídica; (h)evento de filiação e lançamento de pré-candidatura; (i) segurança privada; (j) viagens aéreas nacionais e internacionais para ele e equipe; (k) veículo blindado; (l) hospedagens; (m) exposição midiática de presidenciável; (n) protagonismo em metade das inserções de propaganda partidária gratuita no rádio e na televisão; (o) produção de conteúdo e estratégia de campanha; e (p) pesquisas eleitorais. Ou seja, não é um conjunto que esteja ao alcance das possibilidades do pré-candidato médio ao Senado pelo Estado do Paraná;
Os investigados se beneficiaram de vultosos investimentos em período vedado e houve inegável cunho eleitoral ao se realizarem múltiplos eventos de lançamento de pré-candidatura e produção de vídeos, sendo que a maioria dos gastos foi realizada de forma disfarçada, como se fossem contratações cujo objeto estaria direcionado e limitado a atividades partidárias;
Independentemente da origem do pagamento por tais serviços – ou até mesmo de sua inadimplência – o fato é que os requeridos se beneficiaram de serviço da equipe de marketing por eles escolhida e o efeito perante o eleitorado ocorreu, sendo que o benefício de um serviço de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais) em uma pré-campanha presidencial poderia ser discutido se dentro de um patamar razoável, mas quando comparado permissão de gasto moderado para uma campanha de senador, o abuso se torna patente;
As contratações e movimentações financeiras entre partido, segundo requerido e empresas relacionadas impelem na direção de fundada suspeita de “Caixa 2”, especialmente pelo contrato de empresa de advocacia do segundo investigado pelo partido que acolhe os candidatos, no valor de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), justamente no mês da mudança partidária (abril de 2022), já que após a quitação integral das quatro parcelas de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais) – consoante declarado na mídia – é que se deu o segundo evento de lançamento de candidatura;
Uma das formas de se evidenciar a gravidade dos fatos é o
volume excessivo dos recursos patrimoniais utilizados em favor dos requeridos, como por exemplo os serviços para alavancar a campanha do primeiro requerido à Presidência da República que foram contratados da empresa D7 Comunicação Ltda., no valor de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais), por si só, representam mais de 40% do teto de gastos da eleição à qual concorreu;
Se tal gravidade for desconsiderada, abrir-se-á precedentes hediondos para pleitos futuros, ao se relevar a estratégia de downgrade de cargo ao qual se pretende concorrer, como no caso em análise em que o desarrazoado volume dos gastos e a dimensão nacional e intensa da exposição verdadeiramente presidencial realizada, se traduziram em verdadeira “pá-de-cal” para as chances de concorrência minimamente igualitária entre os competidores ao Senado pelo mesmo Estado, sepultando as chances até mesmo de outros candidatos inicialmente mais bem posicionados na corrida eleitoral daquele cargo e circunscrição;
O abuso do poder econômico transbordou para a utilização indevida de veículos e meios de comunicação social, pois o estratagema de cooptar o espaço midiático de um candidato presidencial, somado ao uso de propaganda partidária para exclusiva promoção pessoal e o desdobramento desses impulsos nos algoritmos da internet, gerou uma superexposição desmedida e prematura do primeiro investigado;
O conjunto indiciário aponta para utilização de esquema de empresas para financiamento disfarçado e não contabilizado de pré-campanha, como nos casos das contratações da empresa Bella Ciao, do escritório SS Advocacia – Santana Santos Sociedade individual de Advocacia e do Instituto Internacional De Pesquisa E Estudos Jurídicos Em Liberdades Civis Fundamentais Ltda., de nome fantasia: Fcl Law & Trading;
No caso destes autos, os indícios levam à suspeita da utilização de empresa de propriedade do segundo corréu para a captação de recursos não contabilizados para a pré-campanha dos investigados ou até mesmo a cooptação do então pré-candidato de agremiação diversa, para que desistisse de sua candidatura presidencial e declarasse apoio à candidatura do então presidente do partido contratante (União Brasil), Luciano Bivar, eliminando-se um concorrente da disputa à vaga do Planalto;
Diante do caráter indisponível do bem jurídico tutelado – a lisura e a legitimidade do pleito – e da gravidade das condutas narradas, se clama pela postura proativa do douto Desembargador Relator na busca de mais provas e evidências que entender necessárias para o julgamento da causa, sendo o rito adotado – o do art. 22 da Lei Complementar nº 64/90 – favorável à produção de provas pelas partes e pelo ínclito magistrado relator, ainda que de ofício, nos termos do inciso VII do supra pontuado artigo da Lei das Inelegibilidades;
O conjunto probatório e indiciário destes autos pode ser complementado para persecução mais refinada da verdade real, propiciando alicerce mais firme e panorama mais nítido, fazendo-se mister a determinação de ordem de apresentação de alguns documentos que se encontram em posse de terceiros, sob pena de busca e apreensão;
Mostra-se profícua e enriquecedora em relação à persecução da verdade real, a análise das comunicações realizadas entre os investigados e entre estes e terceiros envolvidos na possível triangulação de recursos, contabilidade paralela de pré-campanha e cooptação de apoio político ou desistência de candidatura, havendo justa razão para o requerimento de tutela cautelar de busca e apreensão de dispositivos móveis de telefonia e computadores;
Mostra-se profícua e enriquecedora em relação à persecução da verdade real, a análise das movimentações financeiras realizadas entre os investigados e entre estes e terceiros envolvidos na possível triangulação de recursos, contabilidade paralela de pré-campanha e cooptação de apoio político ou desistência de candidatura, havendo justa razão para o requerimento de tutela cautelar de quebra de sigilo bancário e fiscal;
Presentes os indícios de materialidade de triangulação de recursos, financiamento e gasto não contabilizado de campanha eleitoral e corrupção na mudança de legenda e desistência de cargo, além de indícios suficientes da autoria, há fundadas razões a autorizar a quebra do sigilo bancário, fiscal e telemático dos agentes envolvidos, além de busca e apreensão, mostrando-se necessária a medida para apreender ou descobrir objetos e elementos de convicção necessários à prova;
Os requisitos fáticos e normativos mínimos para ensejar a autorização das buscas e apreensões estão presentes, vez que a prova indiciária apresentada aponta para a possível ocorrência dos delitos eleitorais e, se comprovados, penais, caracterizando-se inclusive a formação de organização criminosa e lavagem de dinheiro, assentando o fumus commissi delicti.
Destaca-se a irreversibilidade no caso de indeferimento da medida, situação que pode fazer com que a prova da materialidade dos crimes investigados se perca pelo desaparecimento de seus indícios e, por outro lado, acaso nada de ilícito seja encontrado nos dados, aparelhos e locais, tem-se que os envolvidos sofrerão um inconveniente suportável, especialmente quando a razoabilidade indicar que a medida é essencial ao atendimento do interesse público, em resguardo aos direitos da sociedade como um todo, inclusive com a possibilidade da quebra de sigilos de terceiros não demandados;
Há fato específico a ser apurado e endereço preciso do local a ser diligenciado, de forma que prudente e necessária se faz a diligência, a fim de ser alcançada a verdade real dos fatos, sendo que a memória de aparelhos eletrônicos (como celulares e computadores) permite acesso a um leque de informações pessoais, devendo ser selecionado para os autos tão somente aqueles que envolvem os fatos narrados nesta peça. Apenas, frise-se, apenas com o efetivo acesso que se poderá aferir se há algo de importância investigativa. Desde já se requer que tais informações não sejam divulgadas, m. as sim apenas verificadas pelos agentes públicos da própria Justiça Eleitoral (responsáveis por manter tudo em sigilo);
No que tange à necessidade de concessão de sigilo, o partido autor pleiteia, entre outras provas a serem produzidas, a quebra de sigilo temático e telemático, inclusive com busca e apreensão de documentos e aparelhos celulares e computadores das partes, devendo ser atendido também o pleito pelo acesso às mensagens e aplicativos dos eletrônicos que vierem a ser apreendidos.
Está demonstrada, suficientemente, a necessidade da medida para a investigação, bem como a urgência e a situação de risco de lesão ao objeto jurídico tutelado, a justificar a busca nos endereços requeridos.
No tocante à pedidos cautelares e demais produções de provas, requer que este Relator venha a:
DETERMINAR a distribuição do presente feito sob sigilo, o usual deve ser mantido até que sejam apreciadas e eventualmente cumpridas as cautelares requeridas;
AUTORIZAR a quebra de sigilo fiscal e bancário, do período de 01.11.2021 a 10.11.2022, de todas as contas correntes, contas de depósitos, contas de poupança, contas de investimento e outros bens, direitos e valores mantidos em Instituições Financeiras pelas pessoas físicas e jurídicas
abaixo relacionadas, no período também informado no quadro abaixo, as
quais devem ser apresentadas dentro de prazo a ser fixada por V. Exa. e, acontar da comunicação do Banco Central às instituições financeiras,
para que estas cumpram a determinação:
- SERGIO FERNANDO MORO (requerido);
- LUIS FELIPE CUNHA, CPF (requerido e doador da campanha);
- UZIEL SANTANA DOS SANTOS (titular da empresa Santana Santos Sociedade Individual de Advocacia, e sócio da empresa Instituto Internacional De Pesquisa E Estudos Jurídicos Em Liberdades Civis Fundamentais Ltda., de nome fantasia Fcl Law & Trading);
- ANNA HELENA BARROSO PIRES SANTANA DOS SANTOS administradora da empresa Santana Santos Sociedade Individual de Advocacia, e administradora da empresa Instituto Internacional De Pesquisa E Estudos Jurídicos Em Liberdades Civis Fundamentais Ltda., de nome fantasia Fcl Law & Trading);
- SÉRGIO ROBERTO VOSGERAU (sócio administrador da empresa Bella Ciao Assessoria Empresarial Ltda., e sócio administrador da empresa Vosgerau e Cunha Sociedade de Advogados, suspeitas de triangularem recursos);
- VOSGERAU E CUNHA ADVOGADOS ASSOCIADOS (empresa do segundo requerido, suspeita de triangular recursos);
- VOSGERAU E CUNHA ADVOGADOS ASSOCIADOS (empresa do segundo requerido, suspeita de triangular recursos);
- BONINI GUEDES SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA (empresa de terceiro envolvido, suspeita de triangular recursos);
- BONINI GUEDES ADVOCACIA (empresa de terceiro envolvido, suspeita de triangular recursos);
- INSTITUTO INTERNACIONAL DE PESQUISA E ESTUDOS
JURÍDICOS EM LIBERDADES CIVIS FUNDAMENTAIS LTDA. ME, NOME FANTASIA FCL LAW & TRADING (empresa de terceiro envolvido, suspeita de triangular recursos);
- SANTANA SANTOS SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA, CNPJ: 30.573.135/0001-07 (empresa de terceiro envolvido, suspeita de triangular recursos.
c) OFICIAR o Banco Central do Brasil para que realize consulta o Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional (CCS), para a identificação das instituições financeiras nas quais as referidas pessoas naturais e jurídicas (investigadas) mantêm relacionamento, tais como contas correntes, contas de depósito à vista, de poupança, de investimento, de depósitos a prazo e outros bens, direitos e valores, diretamente ou por seus representantes legais ou procuradores, bem como em relações em conjunto com terceiros;
d) ORDENAR que as instituições financeiras envolvidas encaminhem os dados bancários no prazo máximo de 10 (dez) dias a partir do recebimento do comunicado da decisão judicial;
e) COMUNICAR, ainda, as instituições financeiras, com base nas Cartas Circulares BCB nº 3.290, de 05/09/2005, nº 3.461, de 24/07/2009 e nº 3.517, de 07/12/2010, para que informem os dados de origem e destino (CPF/CNPJ, nome, banco, agência e conta) das transações eletrônicas, assim como, cheques, saques, depósitos e quaisquer tipos de transferência de valores, inclusive, aquelas efetuadas mediante cheque, cheque administrativo, cheque ordem de pagamento e outros documentos compensáveis da mesma natureza, além do respectivo número do documento bancário (número do cheque, da transferência etc.) e demais informações que as instituições financeiras e cooperativas de crédito estão obrigadas a manter em seus arquivos;
f) Em relação ao afastamento do sigilo das pessoas físicas e jurídicas supramencionadas, SEJAM informados a esse E. Tribunal:
1. Declarações de Ajuste Anual do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física – DIRPF (originais e todas as retificadoras);
2. DOSSIÊ INTEGRADO completo (com todas as bases de dados, inclusive a DIRPF com extrato de pessoa física, DOI e outras, ainda que sejam fornecidas também de forma avulsa);
3. “e-Financeira” completa, com todos os tipos de contas que tenham qualquer vínculo com as pessoas físicas objeto da
quebra;
4. Declaração de Operações Imobiliárias (DOI) integral, desde 1980 até o mês em curso;
5. Declaração de Operações Liquidadas com Moeda em Espécie (DME); e6. Declaração de Operações com Criptoativos
g) Relação de notas fiscais eletrônicas (NF-e), emitidas no período do afastamento do sigilo fiscal, em que figurem as pessoas físicas e jurídicas relacionadas como partes;
h) Cópia integral de eventuais autos de infrações expedidos pela RFB em relação a quaisquer das pessoas físicas relacionadas, quando os fatos geradores se enquadrem nos períodos de afastamento do sigilo.
i) DEFERIR e autorizar a busca e apreensão domiciliar, com prazo de validade de 30 (trinta) dias, de livros fiscais, notas fiscais, anotações, recibos e demais documentos relativos ao período objeto da investigação, relacionados com os fatos investigados, bem como aparelhos eletrônicos eventualmente apreendidos, em especial celulares e computadores, que forem encontrados nos endereços relacionados de:
- SERGIO FERNANDO MORO;
- LUIS FELIPE CUNHA;
- RICARDO AUGUSTO GUERRA;
- UZIEL SANTANA DOS SANTOS;
- ANNA HELENA BARROSO PIRES SANTANA DOS SANTOS;
- SÉRGIO ROBERTO VOSGERAU;
- VOSGERAU E CUNHA ADVOGADOS ASSOCIADOS;
- VOSGERAU E CUNHA ADVOGADOS ASSOCIADOS - SCP;
- BELLA CIAO ASSESSORIA EMPRESARIAL LTDA;
- BONINI GUEDES SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA;
- BONINI GUEDES ADVOCACIA, CNPJ: 28.120.077/0001-14;
- INSTITUTO INTERNACIONAL DE PESQUISA E ESTUDOS
JURÍDICOS EM LIBERDADES CIVIS FUNDAMENTAIS LTDA. ME, NOME FANTASIA FCL LAW & TRADING; e
- SANTANA SANTOS SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA.
j) AUTORIZAR a pesquisa nas informações existentes na memória dos aparelhos eletrônicos eventualmente apreendidos (exemplo: lista de contatos, mensagens e aplicativos, fotos e vídeos), vedado a acesso, sem consentimento ou mediante nova autorização judicial, a dados supervenientes (interceptação telemática);
k) SEJAM COLHIDOS os depoimentos pessoais dos requeridos;
l) SEJA OFICIADO o PARTIDO PODEMOS, com sede nacional, para, sob pena de busca e apreensão, apresentar:
1. O custo total do evento de filiação partidária do primeiro requerido, o valor estimado da realização do evento e a origem dos recursos utilizados para o pagamento;
2. Os Dados do fornecedor responsável pela produção do vídeo do primeiro requerido, exibido durante o evento de filiação partidária deste, o valor estimado da produção e a origem dos recursos utilizados para o pagamento;
3. Os contratos, notas fiscais, relatórios, comprovantes de realização dos serviços, e demais documentos referentes aos serviços contratados em benefício da pré-campanha dos requeridos, relativos – mas não limitados – a fotojornalismo, propaganda, produção de vídeos, marketing digital, assessoria de imprensa, media training, assessoria jurídica, pesquisas eleitorais ou políticas, segurança, transporte e hospedagem dos requeridos (nacionais e internacionais), familiares e equipe (com respectivo detalhamento), aluguel ou aquisição de veículos e figurinista, incluindo eventuais reembolsos e gastos indiretos decorrentes das contratações;
4. O valor e o período durante o qual houve pagamento de remuneração ao primeiro requerido pelo desempenho de atividades relacionadas ao cargo de “Diretor do Núcleo de Políticas Públicas”, na direção do partido; e
5. Os documentos que comprovem os referidos pagamentos e
os documentos que comprovem a realização das atividades condizentes.
m) SEJA OFICIADA a FUNDAÇÃO TRABALHISTA NACIONAL, para, sob pena de busca e apreensão, apresentar:
1. Os contratos, notas fiscais, relatórios, comprovantes de realização dos serviços, e demais documentos relativos à contratação das empresas BELLA CIAO ASSESSORIA EMPRESARIAL LTDA., SANTANA SANTOS SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA E INSTITUTO INTERNACIONAL DE PESQUISA E ESTUDOS JURÍDICOS EM LIBERDADES CIVIS FUNDAMENTAIS LTDA. (nome fantasia: Fcl Law & Trading), incluindo eventuais reembolsos e gastos indiretos decorrentes das contratações; e
2. Os contratos, notas fiscais, relatórios, comprovantes de realização dos serviços, e demais documentos relativos à contratação de pesquisas eleitorais ou políticas, voltadas para o projeto presidencial, incluindo eventuais reembolsos e gastos indiretos decorrentes das contratações.
n) SEJA OFICIADO o PARTIDO UNIÃO BRASIL – ÓRGÃO NACIONAL, para, sob pena de busca e apreensão, apresentar:
1. O custo total do evento de lançamento de pré-candidatura
do primeiro requerido ao Senado pelo Estado do Paraná, o valor estimado da realização do evento e a origem dos recursos utilizados para o pagamento;
2. Os Dados do fornecedor responsável pela produção do
vídeo do primeiro requerido, exibido durante o evento de lançamento de pré-candidatura ao Senado pelo Estado do Paraná, o valor estimado da produção e a origem dos recursos utilizados para o pagamento;
3. Os Dados do fornecedor responsável pela produção dos 5 (cinco) vídeos do primeiro requerido que formam o conjunto das “Cinco propostas para transformar o Paraná e o Brasil”, o valor pago ou, na falta deste, o valor estimado da produção e a origem dos recursos utilizados para o
pagamento;
4. Os contratos, notas fiscais, relatórios, comprovantes de realização dos serviços, e documentos referentes aos serviços contratados em benefício da pré-campanha dos requeridos, relativos – mas não limitados – a fotojornalismo, propaganda, produção de vídeos, marketing digital, assessoria de imprensa, media training, assessoria jurídica, pesquisas eleitorais ou políticas, segurança, transporte e hospedagem dos requeridos (nacionais e internacionais), familiares e equipe (com respectivo detalhamento), aluguel ou aquisição de veículos e figurinista, incluindo eventuais reembolsos e gastos indiretos decorrentes das contratações;
5. Os contratos, notas fiscais, relatórios, comprovantes de realização dos serviços, e documentos referentes aos serviços contratados da empresa VOSGERAU E CUNHA SOCIEDADE DE ADVOGADOS; e
6. Os contratos, notas fiscais, relatórios, comprovantes de realização dos serviços, e documentos referentes a serviços contratados de VOSGERAU E CUNHA SOCIEDADE DE ADVOGADOS SCP, BELLA CIAO ASSESSORIA EMPRESARIAL LTDA., SANTANA SANTOS SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA, INSTITUTO INTERNACIONAL DE PESQUISA E ESTUDOS JURÍDICOS EM LIBERDADES CIVIS FUNDAMENTAIS LTDA. ME (NOME FANTASIA: FCL LAW & TRADING), SERGIO FERNANDO MORO, LUIS FELIPE CUNHA, RICARDO AUGUSTO GUERRA, UZIEL SANTANA DOS SANTOS, ANNA HELENA BARROSO PIRES SANTANA DOS SANTOS, SÉRGIO ROBERTO VOSGERAU, ou de empresas em que estes figurem como sócios ou administradores.
o) SEJA OFICIADO o PARTIDO UNIÃO BRASIL – ÓRGÃO ESTADUAL DO PARANÁ, para, sob pena de busca e apreensão, apresentar:
1. O custo total do evento de lançamento de pré-candidatura do primeiro requerido ao Senado pelo Estado do Paraná, o valor estimado da realização do evento e a origem dos recursos utilizados para o pagamento;
2. Os Dados do fornecedor responsável pela produção do vídeo do primeiro requerido, exibido durante o evento de lançamento de pré-candidatura ao Senado pelo Estado do Paraná, o valor estimado da produção e a origem dos recursos utilizados para o pagamento;
3. Os Dados do fornecedor responsável pela produção dos 5 (cinco) vídeos do primeiro requerido que formam o conjunto das “Cinco propostas para transformar o Paraná e o Brasil”, o valor pago ou, na falta deste, o valor estimado da produção e a origem dos recursos utilizados para o pagamento;
4. Os contratos, notas fiscais, relatórios, comprovantes de realização dos serviços, e documentos referentes aos serviços contratados em benefício da pré-campanha dos requeridos, relativos – mas não limitados – a fotojornalismo, propaganda, produção de vídeos, marketing digital, assessoria e imprensa, media training, assessoria jurídica, pesquisas eleitorais ou políticas, segurança, transporte e hospedagem dos requeridos (nacionais e internacionais), familiares e equipe (com respectivo detalhamento), aluguel ou aquisição de veículos e figurinista, incluindo eventuais reembolsos e gastos indiretos decorrentes das contratações;
5. Os contratos, notas fiscais, relatórios, comprovantes de realização dos serviços, e documentos referentes aos serviços contratados da empresa VOSGERAU E CUNHA SOCIEDADE DE ADVOGADOS; e
6. Os contratos, notas fiscais, relatórios, comprovantes de realização dos serviços, e documentos referentes a serviços contratados de VOSGERAU E CUNHA SOCIEDADE DE ADVOGADOS SCP, BELLA CIAO ASSESSORIA EMPRESARIAL LTDA., SANTANA SANTOS SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA, INSTITUTO INTERNACIONAL DE PESQUISA E ESTUDOS JURÍDICOS EM LIBERDADES CIVIS FUNDAMENTAIS LTDA. ME (NOME FANTASIA: FCL LAW & TRADING), SERGIO FERNANDO MORO, LUIS FELIPE CUNHA, RICARDO AUGUSTO GUERRA, UZIEL SANTANA DOS SANTOS, ANNA HELENA BARROSO PIRES SANTANA DOS SANTOS, SÉRGIO ROBERTO VOSGERAU, ou de empresas em que estes figurem como sócios ou administradores.
p) SEJA OFICIADA a FUNDAÇÃO ÍNDIGO, para, sob pena de busca e apreensão, apresentar:
1. Os contratos, notas fiscais, relatórios, comprovantes de realização dos serviços, e documentos referentes aos serviços contratados ligados às pré-campanhas dos requeridos, relativos – mas não limitados – a fotojornalismo, propaganda, produção de vídeos, marketing digital, assessoria de imprensa, media training, assessoria jurídica, pesquisas eleitorais ou políticas, segurança, transporte e hospedagem dos requeridos (nacionais e internacionais), familiares e equipe (com respectivo detalhamento), aluguel ou aquisição de veículos e figurinista, incluindo eventuais reembolsos e gastos indiretos decorrentes das contratações; e
2. Os contratos, notas fiscais, relatórios, comprovantes de realização dos serviços, e documentos referentes a serviços contratados de VOSGERAU E CUNHA SOCIEDADE DE ADVOGADOS SCP, BELLA CIAO ASSESSORIA EMPRESARIAL LTDA., SANTANA SANTOS SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA, INSTITUTO INTERNACIONAL DE PESQUISA E ESTUDOS JURÍDICOS EM LIBERDADES CIVIS FUNDAMENTAIS LTDA. ME (NOME FANTASIA: FCL LAW & TRADING), SERGIO FERNANDO MORO, LUIS FELIPE CUNHA, RICARDO AUGUSTO GUERRA, UZIEL SANTANA DOS SANTOS, ANNA HELENA BARROSO PIRES SANTANA DOS SANTOS, SÉRGIO ROBERTO VOSGERAU, ou de empresas em que estes figurem como sócios ou administradores.
q) SEJAM OUVIDAS as testemunhas arroladas.
Ao final requer seja julgada procedente a presente Ação de Investigação Judicial Eleitoral, para que sejam cassados os registros, diplomas ou mandatos – caso já expedidos – dos requeridos; seja declarada a inelegibilidade dos requeridos por oito anos; seja ordenada a realização de nova eleição, suplementar, para o cargo de Senador pelo Estado do Paraná, assumindo de maneira interina, na vacância do cargo, a chapa majoritária que alcançou a segunda colocação na eleição majoritária anulada, sob pena de sub-representação inconstitucional do Estado do Paraná no Senado Federal.
É o relatório.
Passo a decidir.
2. Funda-se a presente demanda na suposta configuração de abuso de poder econômico e de uso indevido dos meios de comunicação nos atos de pré-campanha dos requeridos.
Não obstante não haja pedido expresso para a concessão de tutela liminar inaudita altera pars, denota-se que a ação foi denominada como “AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL COM PEDIDO DE TUTELA CAUTELAR DE PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVAS” e que, ademais, em sua fundamentação, o requerente faz menção no caso de indeferimento de algumas das medidas pleiteadas, a situação que pode “fazer com que a prova da materialidade dos crimes investigados se perca pelo desaparecimento de seus indícios” bem como menção de estar demonstrada “a necessidade da medida para a investigação, bem como a urgência e a situação de risco de lesão ao objeto jurídico tutelado”.
Pleiteia-se, portanto, a determinação de medidas antecipatórias de produção de provas voltadas a comprovar supostos gastos de natureza eleitoral realizados na fase de pré-campanha.
A concessão de tutela de urgência, nos termos do art. 300 e seguintes do Código de Processo Civil, está condicionada à demonstração de dois requisitos, quais sejam a probabilidade do direito; perigo de dano irreparável ou risco ao resultado útil do processo.
No caso, o fumus boni iuris, em juízo de cognição sumária, não está suficientemente evidenciado.
Primeiramente, a redação do art. 36-A permite a realização de diversos atos de divulgação de pré-candidaturas, desde que não haja pedido expresso de votos:
Art. 36-A. Não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de voto, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos e os seguintes atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via Internet:
I – a participação de filiados a partidos políticos ou de pré-candidatos em entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na Internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, observado pelas emissoras de rádio e de televisão o dever de conferir tratamento isonômico;
(...)
V – a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive nas redes sociais;
VI – a realização, a expensas de partido político, de reuniões de iniciativa da sociedade civil, de veículo ou meio de comunicação ou do próprio partido, em qualquer localidade, para divulgar ideias, objetivos e propostas partidárias;
(...)
§ 1º É vedada a transmissão ao vivo por emissoras de rádio e de televisão das prévias partidárias, sem prejuízo da cobertura dos meios de comunicação social.
§ 2º Nas hipóteses dos incisos I a VI do caput, são permitidos o pedido de apoio político e a divulgação da pré-candidatura, das ações políticas desenvolvidas e das que se pretende desenvolver.
Assim, a jurisprudência evoluiu para, a despeito de reconhecer a possibilidade de atos de pré-campanha, reconhecer acerca da possibilidade de caracterização, em tese, de abuso do poder econômico, destacando-se o seguinte julgado paradigma, assim ementado:
AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. PLACAS DE PLÁSTICO. PEDIDO EXPLÍCITO DE VOTOS. AUSÊNCIA. ART. 36-A DA LEI Nº 9.504/97. INCIDÊNCIA. DESPROVIMENTO.
1. Este Tribunal Superior, em julgamento recente, assentou que, "com a regra permissiva do art. 36-A da Lei nº 9.504, de 1997, na redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015, retirou-se do âmbito de caracterização de propaganda antecipada a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais de pré-candidatos e outros atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet, desde que não haja pedido expresso de voto" (Rp nº 294-87/DF, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 9.3.2017 - grifei).
2. A veiculação de mensagens com menção a possível candidatura, sem pedido explícito de votos, como ocorreu na espécie, não configura propaganda eleitoral extemporânea, nos termos da redação conferida ao art. 36-A pela Lei nº 13.165/2015.
3. Agravo regimental desprovido.
(TSE - Agravo de Instrumento nº 924, Acórdão, Relator(a) Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 22/08/2018)
A leitura do inteiro teor do precedente acima aponta no sentido de que, por mais que certos atos na fase de pré-campanha não violem o art. 36-A da Lei das Eleições, em tese, é possível cogitar que certos atos caracterizem uma das condutas abusivas passíveis de serem apuradas em .AIJE, conforme descrito no art. 22, XIV, da LC nº 64/ 90 nos seguintes contextos: (a) os meios utilizados ultrapassem o limite do razoável; (b) as condutas sejam reiteradas; (c) os custos, a capilaridade, a abrangência e o período da exposição sejam expressivos.
No caso em análise, os meios utilizados não parecem ter ultrapassado o limite do razoável, já que consistiram em duas reuniões partidárias, nas quais houve menção a pré-candidatura, divulgação de propostas tendo ocorrido cobertura pelos meios de comunicação e divulgação pela imprensa.
Da mesma forma é razoável que as agremiações façam pesquisas qualitativas para avaliar a viabilidade de futuras candidaturas.
Também é razoável que as agremiações façam investimentos no que tange a produção do material a ser veiculado em suas propagandas partidárias.
Ademais, dos próprios documentos apresentados pelo requerente, denota-se que tais reuniões, ainda que tenham se utilizado de recursos de marketing e com produção audiovisual profissional, ocorreram às expensas dos respectivos partidos. Da mesma forma no que tange à pesquisa mencionada.
Também não se pode falar em reiteração de condutas, já que uma das reuniões teria ocorrido em 11 de novembro em uma das agremiações e outra reunião teria ocorrido em 12 de julho já em outra agremiação.
No que tange aos custos, para nenhuma das contratações mencionadas o requerente trouxe indícios de que estariam acima dos padrões de mercado ou que seriam incompatíveis com as qualificações dos respectivos fornecedores e nem de que os serviços nelas descritas não chegaram a ser prestados.
Ainda que chame a atenção da existência de um pré-contrato de serviços de marketing e publicidade no valor de R$ 14.000.000,00 o próprio instrumento do contrato preliminar demonstra que nenhum serviço foi prestado antes do período eleitoral e que também nenhum valor decorrente de tal contratação preliminar foi desembolsado no período pré-eleitoral. Inclusive, tal instrumento demonstra que a assinatura do contrato definitivo estava condicionada a diversas circunstâncias, dentre as quais a escolha do candidato em convenção.
No que tange ao outro contrato de publicidade mencionado, no valor de R$ 2.000.000,00, ainda que com a saída do primeiro requerido da agremiação o respectivo pagamento ao fornecedor tenha deixado de ser realizado, seu instrumento contratual não deixa dúvidas de que o seu objeto não era a divulgação da campanha presidencial ou do requerido, mas sim a produção e veiculação da propaganda partidária.
Não se pode perder de vista, ainda, que é público e notório que nos meses de novembro de 2021 a março de 2022, o primeiro requerido esteve na status de pré-candidato ao cargo de presidente, cujo limite de gastos de campanha foi de R$ 133.416.046,20. Sendo assim, ainda que estivessem mais relacionados àquela potencial candidatura do que à promoção do partido, os gastos daquela agremiação devem ser considerados tendo por base tal parâmetro.
E com base no limite de gastos do cargo de presidente, ainda que venha a se identificar conteúdo eleitoral na publicidade decorrente do contrato firmado em R$ 2.000.000,00, referido gasto representaria eventual burla de aproximadamente 1,49% do limite de gastos permitido àquele cargo.
Do mesmo modo, ainda que venha se caracterizar os serviços de pesquisas contratados como eleitorais, o valor de R$ 663.540,00, representaria eventual burla de aproximadamente 0,04% do limite de gastos permitido àquele cargo, e ainda que se considere que o evento para a divulgação de filiação do requerido ao Podemos tenha configurado um ato de campanha bem como que se considere que efetivamente tenha custado os mencionados R$ 200.000,00, tal valor representaria eventual burla de aproximadamente 0,14 % do limite de gastos permitido.
Não há nenhum indício de que os gastos realizados até aquele momento teriam ocorrido já se antevendo a hipótese do denominado (pelo requerente) “downgrade” ao cargo de senador, o qual possui limite de gastos na fase de campanha de R$ 4.447.201,54.
Registre-se que a ampla cobertura jornalística naquele momento era justificada até mesmo em função do cargo inicialmente cogitado, sem esquecer que o primeiro requerido é personalidade que atrai o interesse não só da mídia, como da população, sendo alvo de elogios e de críticas, em virtude de sua atuação na denominada “Operação Lava-Jato”.
No que tange às demais contratações envolvendo advogados e serviços de consultoria, o requerente faz meras conjecturas de que teriam sido firmadas em desvio de finalidade, para acobertar triangulações e compras de passes, cujos indícios estariam parcialmente presentes em matérias jornalísticas apresentadas.
Mais uma vez, destaque-se que o requerente não trouxe indícios de que os respectivos valores estariam acima dos padrões de mercado ou que seriam incompatíveis com as qualificações dos respectivos fornecedores e nem de que os serviços nelas descritos não chegaram a ser prestados.
No que tange aos valores pagos diretamente ao requerido, na importância mensal de R$ 22.000,00, não há óbice legal para a remuneração de dirigentes e nem que estes ostentam a condição de pré-candidatos ou até mesmo de candidatos.
Quanto ao pedido de busca e apreensão nos locais indicados, verifica-se que diversos documentos, incluindo os instrumentos das contratações questionadas já se encontram nos autos, mostrando-se suficientes para o recebimento da presente demanda.
Não se pode perder de vista que, em verdade, o que está sendo pleiteado não é a mera busca e apreensão de algum material ou documento, mas sim a realização de "perícia" sobre celulares, computadores e demais equipamentos eletrônicos que possam vir a ser apreendidos, o que em envolve a quebra de sigilo de dados constantes nos aparelhos eventualmente apreendidos.
Conforme é sabido, o conteúdo armazenado nos aparelhos celulares e demais equipamentos de informática possui evidente relação com a intimidade e a vida privada do indivíduo, recaindo sobre tal conteúdo a garantia da inviolabilidade e do sigilo, descrita no art. 5°, incisos X e XII, da Constituição da República.
Destaque-se, ainda, que o presente caso exige cautela ainda maior, inclusive porque diversos dos endereços indicados para as diligências pretendidas são de escritórios de advocacia, protegidos pela inviolabilidade profissional.
Assim, deve ser tida como excepcional a possibilidade de afastamento desta garantia, o que não se verifica nos autos.
Ainda que se considere, em tese, a possibilidade de investigação de "caixa dois", que nada mais é do que prática do crime de falsidade ideológica eleitoral (art. 350 do Código Eleitoral), além de eventual configuração de “lavagem de dinheiro” e de “formação de quadrilha”, a mera suposição da prática do delito não autoriza a realização de devassas investigativas, destacando-se ainda que o requerente sequer possui legitimidade para o ajuizamento da respectiva ação penal, que é de natureza pública incondicionada nos termos do art. 355 do Código Eleitoral.
No caso, as matérias jornalísticas apresentadas são frágeis para configurar indícios das supostas triangulações e compras de passes, não sendo justificativas idôneas afastar os sigilos pretendidos.
Nesse sentido:
AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2018. PRESIDENTE E VICE–PRESIDENTE DA REPÚBLICA. ABUSO DE PODER ECONÔMICO. USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO. WHATSAPP. DISPARO DE MENSAGENS EM MASSA. NOTÍCIAS FALSAS (FAKE NEWS). MATÉRIA JORNALÍSTICA. PRELIMINARES. REJEIÇÃO. ACUSAÇÃO AMPARADA EM CONJECTURAS. AUSÊNCIA DE PROVAS SEGURAS A VINCULAR A CAMPANHA ELEITORAL AOS SUPOSTOS DISPAROS. IMPROCEDÊNCIA.
Os representados são acusados de (i) contratarem empresas especializadas em marketing digital para procederem ao disparo de mensagens com conteúdo falso via WhatsApp contra os oponentes da chapa de Jair Bolsonaro nas eleições 2018, em especial os candidatos do PT e do PDT; (ii) utilizarem indevidamente base de dados de usuários fornecida por empresas de estratégia digital; (iii) realizarem e receberem doação de pessoa jurídica e (iv) utilizarem valores acima do limite máximo permitido para gastos nas eleições.
(...)
17. Requisição dos relatórios contábeis, notas fiscais, contratos, relação de clientes e demais documentos aptos a demonstrar as relações jurídicas entabuladas durante o período eleitoral pelos réus e pelas empresas de publicidade suspeitas de terem realizado os disparos.18. É pacífico que o afastamento de qualquer tipo de sigilo requer fundamentos idôneos, pertinência temática, limitação temporal e absoluta imprescindibilidade da medida, além da inexistência de outros meios de obtenção da prova. Precedentes.
19. Não se consideram fundamento idôneo, para fins de justificar a requisição de documentos e/ou quebra de sigilos protegidos constitucionalmente, matérias jornalísticas publicadas em veículos de comunicação. (TSE, AIJE nº 060196965/DF, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe 8.5.2020; STF, Pet–AgR nº 2.805/DF, Tribunal Pleno, Relator Ministro Nelson Jobim, DJ 27.2.2004)
(...)
24. Assim, dada a fragilidade dos argumentos e do conjunto probatório colacionados aos autos, o não preenchimento dos pressupostos para a quebra de sigilo constitucionais e a imprestabilidade dos documentos requeridos para a comprovação das acusações veiculadas na peça inaugural, nega–se o requerimento de entrega da documentação solicitada.
MÉRITO. ART. 22, CAPUT E INCISOS, DA LC Nº 64/1990. ABUSO DE PODER. REQUISITOS. ART. 373 DO CPC. NÃO APRESENTAÇÃO DE PROVAS SUFICIENTES PARA A COMPROVAÇÃO DAS IMPUTAÇÕES. NÃO DEMONSTRAÇÃO DA MATERIALIDADE DO ILÍCITO E DE SUA GRAVIDADE.
(...)
26. O abuso do poder econômico, por sua vez, caracteriza–se pelo emprego desproporcional de recursos patrimoniais (públicos ou privados), com gravidade suficiente para afetar o equilíbrio entre os candidatos e macular a legitimidade da disputa.27. Contratação de empresas especializadas em marketing digital para disparo de mensagens contra opositores. Não comprovação da existência das mensagens, bem como de seu disparo. Ausência de documentos e/ou outros elementos que demonstrem a contratação. A denúncia jornalística não basta para revelar a ocorrência de ilícito eleitoral, sendo necessária a apresentação de elementos concretos que respaldem a acusação.(...)
CONCLUSÃO
40. Ação de Investigação Judicial Eleitoral que, rejeitadas as preliminares, julga–se improcedente.
(TSE - Ação de Investigação Judicial Eleitoral nº 060177905, Acórdão, Relator(a) Min. Luis Felipe Salomão, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 44, Data 11/03/2021)
A fishing expediton, ou pescaria investigativa, não é aceita pelo nosso ordenamento jurídico, conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal no Inquérito nº 4831/DF:
“(…) nosso sistema jurídico, além de amparar o princípio constitucional da intimidade pessoal, repele atividades probatórias que caracterizem verdadeiras e lesivas ‘fishing expeditions’, vale dizer, o ordenamento positivo brasileiro repudia medidas de obtenção de prova que se traduzam em ilícitas investigações meramente especulativas ou randômicas, de caráter exploratório, também conhecidas como diligências de prospecção, simplesmente vedadas pelo ordenamento jurídico brasileiro, como resulta não só da doutrina (…), mas também, da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça” (RHC 66.126/PR, Rel. Min. RIBEIRO DANTAS – RHC 72.065/RS, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA – RHC 96.585/ PR, Rel. Min. FELIX FISCHER, v.g.) e do proprio Supremo Tribunal Federal (HC 106.566/SP,Rel. Min. GILMAR MENDES – HC 137.828/RS, Rel. Min. DIAS TOFFOLI)
No mesmo sentido, vem sendo construída a jurisprudência na seara eleitoral:
HABEAS CORPUS. BUSCA E APREENSÃO. APARELHOS DE TELEFONIA CELULAR. QUEBRA DE SIGILO DE DADOS TELEFÔNICOS E DE TELEMÁTICA. MEDIDA AUTORIZADA SEM DELIMITAÇÃO DO ESPAÇO TEMPORAL E BASEADA EM DEPOIMENTO GENÉRICO DE CANDIDATO PRESO EM FLAGRANTE. NULIDADE DO ATO. DETERMINAÇÃO DE DESENTRANHAMENTO DAS PROVAS OBTIDAS DE FORMA ILEGAL E AS QUE DELA DECORRAM. ART. 157 E PARÁGRAFOS DO CPP. A MEDIDA DE BUSCA E APREENSÃO NÃO PODE SE TRANSFORMAR EM DEVASSA ESTATAL AMPLA E INDISCRIMINADA, COM O OBJETIVO DE ENCONTRAR PROVAS PARA FUTURA AÇÃO. O ACESSO AOS DADOS É TUTELADO CONSTITUCIONALMENTE. NÃO DEMONSTRADA A EXCEPCIONALIDADE PARA O FIM DE AUTORIZAR O ACESSO. ORDEM CONCEDIDA, PARA QUE SEJAM DESENTRANHADAS DOS AUTOS DA AÇÃO PENAL AS PROVAS OBTIDAS COM A BUSCA E APREENSÃO E AS DELAS DERIVADAS.
(TRE/MG - HABEAS CORPUS CRIMINAL nº 060049846, Acórdão, Relator(a) Des. Marcelo Vaz Bueno, Publicação: DJEMG - Diário de Justiça Eletrônico-TREMG, Data 23/03/2022)
HABEAS CORPUS. BUSCA E APREENSÃO. DEFERIMENTO. AUSÊNCIA DE FUNDADAS RAZÕES DO §1º DO ART. 240 DO CPP. IMPOSSIBILIDADE DE DEFERIMENTO COM BASE EXCLUSIVAMENTE EM DECLARAÇÕES PRESTADAS POR CANDIDATO PRESO EM FLAGRANTE POR COMPRA DE VOTOS QUE ESPONTANEAMENTE TERIA COMPARECIDO PERANTE AUTORIDADE POLICIAL PARA DELATAR ESQUEMA CRIMINOSO. PRECEDENTE DO STJ. VEDAÇÃO AO FISHING EXPEDITION (PESCARIA PROBATÓRIA). IMPOSSIBILIDADE DE DILIGÊNCIAS EXPLORATÓRIAS. PRECEDENTES DO STF. INVIOLABILIDADE DE DADOS ARMAZENADOS EM APARELHOS CELULARES. DIREITO À INTIMIDADE E À VIDA PRIVADA.
É inadmissível o deferimento de medida de busca e apreensão que se caracterize como indiscriminada devassa estatal, consubstanciando verdadeira fishing expedition que, em apertadas linhas, representaria a tentativa de se realizar buscas intrusivas, amplas e sem delimitação objetiva, somada à ausência de causa relevante e suficiente para realização do ato.
Os dados armazenados nos aparelhos celulares decorrentes de envio ou recebimento de dados via mensagens SMS, programas ou aplicativos de troca de mensagens, com destaque para o WhatsApp, dialogam com o respeito à intimidade e à vida privada do indivíduo, sendo–lhes estendida a garantia da inviolabilidade e do sigilo, estipulados no art. 5°, incisos X e XII, ambos da Constituição da República. (...).
Ordem concedida em parte para determinar o desentranhamento da ação penal das provas obtidas com a busca e apreensão e de todas aquelas que dela sejam derivadas com a extensão dos efeitos ao corréu, nos termos do art. 580 do CPP.
(TRE/MG - HABEAS CORPUS CRIMINAL nº 060037633, Acórdão, Relator Des. Marcos Lourenco Capanema De Almeida, Publicação: DJEMG - Diário de Justiça Eletrônico-TREMG, Tomo 196, Data 21/10/2021)
Assim, não se mostra razoável a medida pretendida de busca e apreensão porque não está devidamente justificada a excepcionalidade a respaldar o afastamento de garantias constitucionais já mencionadas.
Quanto aos requerimentos de quebras de sigilo bancário e fiscal bem como de requisição de documentos em poder terceiros, verifica-se que seu deferimento seria prematuro neste momento.
Nesse sentido:
EMENTA - MANDADO DE SEGURANÇA. DECISÃO JUDICIAL NÃO RECORRÍVEL DE IMEDIATO. SUCEDÂNEO RECURSAL. CABIMENTO. ILEGALIDADE DE NATUREZA PROCESSUAL JÁ SUPERADA PELO DECURSO DO TEMPO. PERDA SUPERVENIENTE DO INTERESSE PROCESSUAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL - AIJE. FORO ESPECIAL. PRERROGATIVA DE FUNÇÃO. NÃO CABIMENTO.
1. A Ação de Investigação Judicial Eleitoral possui rito disciplinado na LC nº 64/1990, que prevê momento processual específico para a realização de diligências pelo Juízo, posterior à notificação dos investigados.
2. O deferimento liminar, inaudita altera parte, de quebra de sigilos bancário e fiscal no âmbito de AIJE configura ilegalidade, visto que afronta o rito estabelecido, salvo se configurado o perigo de demora, ausente no caso em exame.
3. (...)
(TRE/PR - Mandado de Segurança nº 20061, Acórdão de , Relator(a) Des. Roberto Ribas Tavarnaro_5, Publicação: DJ - Diário de justiça, Data 09/11/2017)
Do inteiro teor do precedente acima destaca-se que:
(...) é de comezinho conhecimento que os dados fiscais e bancários pretéritos, isto é, já registrados perante a Receita Federal e os estabelecimentos bancários, não podem ser alterados, de modo que não se justifica a urgência em obtê-los e, tampouco, a inobservância do rito claramente estabelecido no art. 22 da LC nº 64/1990.
(...)
(...) a quebra de sigilos bancário e fiscal é medida que pode ser adotada pelo juiz no caso concreto, visando a produção de provas relevantes à instrução da AIJE, como aliás expressamente previsto no art. 22, VIII da LC nº 64/1990,
Com efeito, o rito da Ação de Investigação Judicial Eleitoral assim prevê momento próprio para a produção das provas pretendidas, após a notificação dos investigados e a audiência de instrução, conforme se extrai especialmente dos incisos VI e VIII do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990:
Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito:
I - o Corregedor, que terá as mesmas atribuições do Relator em processos judiciais, ao despachar a inicial, adotará as seguintes providências:
a) ordenará que se notifique o representado do conteúdo da petição, entregando-se-lhe a segunda via apresentada pelo representante com as cópias dos documentos, a fim de que, no prazo de 5 (cinco) dias, ofereça ampla defesa, juntada de documentos e rol de testemunhas, se cabível;
b) determinará que se suspenda o ato que deu motivo à representação, quando for relevante o fundamento e do ato impugnado puder resultar a ineficiência da medida, caso se/a julgada procedente;
c) indeferirá desde logo a inicial, quando não for caso de representação ou lhe faltar algum requisito desta lei complementar;
(...)
V- findo o prazo da notificação, com ou sem defesa, abrír-se-á prazo de 5 (cinco) dias para inquirição, em uma só assentada, de testemunhas arroladas pelo representante e pelo representado, até o máximo de 6 (seis) para cada um, as quais comparecerão independentemente de intimação;
VI - nos 3 (três) dias subseqüentes, o Corregedor procederá a todas as diligências que determinar, ex officio ou a requerimento das partes;
VII - no prazo da alínea anterior, o Corregedor poderá ouvir terceiros, referidos pelas partes, ou testemunhas, como conhecedores dos fatos e circunstâncias que possam influir na decisão do feito;
VIII - quando qualquer documento necessário à formação da prova se achar em poder de terceiro, inclusive estabelecimento de crédito oficial ou privado, o Corregedor poderá, ainda, no mesmo prazo ordenar o respectivo depósito ou requisitar cópias.
Conforme já destacado, diversos documentos foram carreados aos autos, não se justificando a intervenção judicial em caráter de urgência para a obtenção de informações bancárias, fiscais e em poder de terceiros, que podem vir a ser trazidas, se houver necessidade e justificativa idônea a afastar os sigilos constitucionalmente garantidos, em momento processual oportuno, nos termos do no art. 22, VI e VIII da LC nº 64/1990, sem quaisquer prejuízos.
3. Nessas condições, ante a especial ausência de fumus boni iuris, indefiro o pedido de liminar de produção antecipada de provas.
Por ora, mantenho o sigilo nos autos, na forma da lei.
Notifiquem-se pessoalmente os investigados para que, no prazo de 5 (cinco) dias, apresentem defesa, juntando os documentos que entenderem pertinentes e apresentando, caso queiram, rol de testemunhas, nos termos do artigo 22, I, "a", da Lei Complementar nº 64/90.
Decorrido o prazo, com ou sem manifestação, voltem os autos conclusos.
Intimem-se.
Autorizo a Senhora Secretária Judiciária a assinar os expedientes necessários ao fiel cumprimento da presente decisão.
Datado e assinado digitalmente.
Des. MÁRIO HELTON JORGE - Relator