TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO PARANÁ

 

ACÓRDÃO Nº 61.666

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS   0603250-70.2022.6.16.0000 – Curitiba – PARANÁ
Relator:  THIAGO PAIVA DOS SANTOS

 INTERESSADA: ELEICAO 2022 CLOARA PINHEIRO LIMA DEPUTADO ESTADUAL
ADVOGADO: RICARDO JOSE DE OLIVEIRA - OAB/PR69549-A
REQUERENTE: CLOARA PINHEIRO LIMA
ADVOGADO: RICARDO JOSE DE OLIVEIRA - OAB/PR69549-A
FISCAL DA LEI: Procurador Regional Eleitoral1

 

EMENTA - ELEIÇÕES 2022. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. SEGUNDA. PRESTAÇÃO DE CONTAS. RETIFICADORA. FORA. HIPÓTESES LEGAIS. NÃO CONHECIMENTO. ATRASO. MÍDIA DIGITAL. IMPROPRIEDADE. RESSALVA. ATRASO. RELATÓRIOS FINANCEIROS. DOAÇÃO. IRREGULARIDADE. DIVERGÊNCIA. MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA DECLARADA. REGISTRO. EXTRATOS BANCÁRIOS. VIOLAÇÃO. CONSISTÊNCIA. OBRIGAÇÃO CONTRAÍDA. APÓS O PLEITO. IRREGULARIDADE. OMISSÃO. DESPESA. PRESTAÇÃO PARCIAL. IRREGULARIDADE. GRAVIDADE. IMPACTO RELEVANTE. DESAPROVAÇÃO.

1 - Não se conhece da segunda prestação de contas retificadora apresentada fora das hipóteses legais.

2 - O atraso na entrega da prestação de contas final e/ou da mídia digital contendo a documentação, quando não impõe prejuízo ou impedimento à fiscalização das contas, configura impropriedade e, assim sendo, a aposição de ressalva.

3 - Configura irregularidade o atraso no registro dos relatórios financeiros de doações recebidas, que deve ser sopesada em conjunto com as demais falhas apuradas, sendo suficiente a aposição de ressalva quando a informação é prestada antes do pleito e atinge percentual diminuto no contexto e/ou o valor absoluto é irrisório. 

4 - A divergência entre a movimentação financeira registrada na prestação de contas e aquela obtida partir dos extratos eletrônicos pode configurar irregularidade grave quando violar a consistência das contas de forma extensa. In casu, o descompasso entre a informação registrada e aquela que constou no comprovante da transação bancária de valor diminuto em termos absolutos e percentuais não é apta a ensejar a desaprovação das contas.

5 - Configura irregularidade contrair obrigação após a data do pleito, podendo ser superada pela aplicação dos princípio da proporcionalidade e razoabilidade quando, ausente a má-fé, o valor da falha representar valor irrisório, em termos absolutos ou percentuais.

6 - A omissão de despesas na prestação de contas parcial é irregularidade grave apta a conduzir, por si só, à desaprovação das contas quando verificada a gravidade em razão da extensão da falha, pelo valor absoluto envolvido ou pelo impacto percentual nas contas, não bastando para supri-la o lançamento dos dados na prestação de contas final, porquanto, viola bem jurídico relevante de fiscalização atual dos recursos auferidos e despesas contraídas pelo candidato.

7 - Contas desaprovadas.

 

DECISÃO

À unanimidade de votos, a Corte desaprovou as contas, nos termos do voto do Relator.

Curitiba, 13/12/2022

RELATOR(A) THIAGO PAIVA DOS SANTOS

 

RELATÓRIO

Trata-se da prestação de contas de CLOARA PINHEIRO LIMA ao cargo de DEPUTADO ESTADUAL, relativa às Eleições 2022.

As contas parciais foram apresentadas no prazo em 13/09/2022 (id. 43134164); as finais em 04/11/2022 (id. 43372195), com o extrato apontando como receitas totais R$ 746.857,00, das quais R$ 46.557,00 estimáveis em dinheiro e R$ 700.300,00 financeiras, e como despesas totais contratadas R$ 699.529,09, com registro de sobras financeiras no importe de R$ 778,91 e sem registro de dívidas de campanha.

Publicado em 04/11/2022 o edital previsto no artigo 56, caput, da resolução TSE nº 23.607/2019 (id. 43378920 e 43378921), não houve impugnação no prazo legal (id. 43383139).

Submetidas as contas à análise técnica, considerou-se que as inconsistências identificadas não impediam a  avaliação integral das contas e, em decorrência, foi emitido Parecer Técnico Conclusivo (id. 43422925) pela não prestação, apontando como inconsistências remanescentes:

a) intempestividade das contas finais (item 1.1);

b) atraso na entrega de um relatório financeiro de campanha (item 1.1.1);

c) não apresentação do instrumento de mandato para constituição de advogado (item 1.2);

d) omissão de receitas e despesas (item 6);

e) divergência entre a movimentação financeira declarada e a registrada nos extratos bancários (item 9);

f) realização de despesas antes da data da solicitação do registro de candidatura (item 10.1);

g) realização de despesas após a data da eleição (item 10.2);

h) omissão de gastos na prestação de contas parcial (item 10.3);

i) não recolhimento integral das sobras de campanha (item 11).

Constaram ainda do parecer conclusivo informações complementares, sem impacto na apreciação das contas, relativas a indícios de irregularidades.

Intimada quanto ao parecer conclusivo (id. 43423415 e 43423616), a requerente apresentou tempestivamente retificação às contas (id. 43431470 e seguintes), sem alteração nos valores totais de receitas e despesas declaradas, e manifestou-se, com documentos (id. 43432381).

A Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pela aprovação com ressalvas (id. 43444278).

Por despacho, determinou-se a recepção da prestação retificadora e a emissão de parecer técnico complementar (id. 43444795).

Na sequência, a requerente peticionou pela juntada de comprovante de recolhimento de sobra de campanha (id. 43449199).

Seguiu-se a emissão de parecer técnico complementar pela desaprovação das contas em razão do apontamento constante no item 10.3 - omissão de gastos na prestação de contas parcial, bem como as ressalvas em razão dos itens 1.1,  1.1.1, 9 e 10.2. (id. 43451575).

Intimada, a requerente manifestou-se acerca dos apontamentos e apresentou nova prestação de contas retificadora (id. 43455422).

A Procuradoria Regional Eleitoral apresentou novo parecer pela aprovação com ressalvas (id. 43457674).

É o relatório.


 

 VOTO

Preliminarmente, não há como conhecer da segunda prestação de contas retificadora ou da manifestação apresentada pela requerente em 28/11/2022, após o parecer técnico conclusivo complementar, haja vista não se enquadrar nas hipóteses legais previstas no art. 71, caput e § 3º, da Resolução TSE nº 23.607/19.

Transcreve-se o dispositivo:

Art. 71. A retificação da prestação de contas somente é permitida, sob pena de ser considerada inválida:
I - na hipótese de cumprimento de diligência que implicar a alteração das peças inicialmente apresentadas;
II - voluntariamente, na ocorrência de erro material detectado antes do pronunciamento técnico.
§ 3º A validade da prestação de contas retificadora e a pertinência da nota explicativa de que trata o § 2º serão analisadas e registradas no parecer técnico conclusivo de que trata o § 3º do art. 69, a fim de que a autoridade judicial sobre elas decida na oportunidade do julgamento da prestação de contas e, se for o caso, determine a exclusão das informações retificadas na base de dados da Justiça Eleitoral.

No presente, conforme relatado, considerou-se que as inconsistências identificadas não impediam a  avaliação integral das contas e, em decorrência, foi emitido Parecer Técnico Conclusivo em 18/11/2022 (id. 43422925), sem a abertura de diligência.

Nesse caso, uma vez intimada, a interessada apresentou, tempestivamente, prestação de contas retificadora em 21/11/2022 (id. 43431789) que foi conhecida, seguindo-se, por despacho, a determinação para a confecção de parecer técnico complementar com análise da nova documentação trazida aos autos, o qual foi juntado aos autos em 26/11/2022 (id. 43451575).

Nessa esteira, considerando que a primeira prestação de contas retificadora foi recepcionada e apreciada pela unidade técnica, uma vez emitido o parecer complementar a única hipótese de manifestação e juntada de documentos por parte da prestadora seriam aquelas previstas no art. 72 da Resolução TSE nº 23.607/19, quais sejam, o apontamento de irregularidade ou inconsistência acerca da qual não se tenha dado oportunidade específica de manifestação ou no caso de documento novo.

Ocorre que no presente caso, o parecer técnico complementar não apontou inconsistências ou irregularidades diversas daquelas que já haviam sido referidas no primeiro parecer técnico.

Assim, considerando que não havia diligência aberta ou erro material anterior ao pronunciamento técnico, não havia oportunidade processual para apresentação de segunda prestação de contas retificadora e sequer havia situação fática que se enquadrasse no art. 72 da Resolução específica, motivos pelos quais não se conhece da segunda prestação de contas retificadora, bem como da manifestação e documentos apresentados após o parecer conclusivo complementar (id. 43455422).

Nesse contexto, serão consideradas para o julgamento a primeira prestação de contas retificadora e a manifestação realizada após o primeiro parecer conclusivo.

Adentrando propriamente à análise das contas, no caso sub judice, a unidade técnica apontou como inconsistência determinante para opinar pela desaprovação o registro constante do item 10.3 que trata da omissão de despesas na prestação de contas parcial e referiu como causa para aposição de ressalva os itens 1.1, 1.1.1, 9 e 10.2, os quais se passa a avaliar:

i) 1.1 - Prazo de entrega:

No ponto, a unidade técnica fez constar que a prestação de contas final foi apresentada intempestivamente, no dia 04/11/2022.

 Após o parecer, a prestadora manifestou-se no sentido de que as contas finais foram encaminhadas eletronicamente em 01/11/2022 via SPCE, porém, em razão de manifestações populares, não pode se deslocar até a capital para entrega da mídia física. Afirmou, outrossim, que após orientação obtida junto ao TRE/PR, a mídia foi encaminhada via e-mail e processada no dia 04/11/2022.

De acordo com o art. 49 da Resolução TSE nº 23.607/19, as prestações de contas finais relativas ao primeiro turno devem ser prestadas, via SPCE, até o 30º dia posterior à realização das eleições, o que para o pleito de 2022 ocorreu em 02/10, portanto, os candidatos teriam até o dia 02/11 para apresentarem suas prestações de contas finais.

Ademais, os arts. 53, § 1º, e 55 do mesmo diploma tratam acerca da mídia eletrônica gerada pelo SPCE e que deve conter os documentos a que se refere o art. 53, II. Em específico, o § 2º do art. 55 dispõe que "o recibo de entrega da prestação de contas somente será emitido após o recebimento da mídia eletrônica" com os documentos. 

No caso em apreço, em razão da ausência da apresentação de contas final até o término do prazo legal pela prestadora, a Secretaria Judiciária certificou essa situação no dia 04/11/2022 e, na mesma data, foi juntado recibo de entrega da prestação de contas final com a seguinte informação: "A Justiça Eleitoral recebeu em 01/11/2022, às 16:30 (horário de Brasília) a prestação de contas final, tipo oficial". A entrega da mídia, todavia, ocorreu somente no dia 04/11, conforme certidão nos autos.

Ocorre que o § 1º do art. 55 da Resolução específica determina que a mídia eletrônica deve ser apresentada até o prazo final estabelecido no art. 49, o que não ocorreu no caso em apreço.

Portanto, à míngua de demonstração concreta do fato impeditivo alegado pela prestadora, no sentido de que manifestações populares obstaram-na de entregar a mídia física na sede do Tribunal, impõe-se o reconhecimento da impropriedade, mesmo porque a falha poderia ter sido sanada tempestivamente com a entrega da mídia de forma eletrônica, como de fato acabou sendo realizado, porém fora do prazo legal.

É certo, todavia, que a falha não impôs dificuldade à fiscalização, mormente porque o atraso foi de apenas dois dias, o que dá ensejo somente à aposição de ressalva.

ii) 1.1.1 - Relatórios financeiros de campanha:

De acordo com o setor técnico, houve descumprimento quanto à entrega dos relatórios financeiros de campanha no prazo estabelecido pela legislação eleitoral em relação a uma doação, no valor de R$ 300,00, recebida no dia 24/08/2022 e relatada em 01/09/2022.

O art. 47, I, da Resolução TSE nº 23.607/19 dispõe:

Art. 47. Os partidos políticos e as candidatas ou os candidatos são obrigadas(os), durante as campanhas eleitorais, a enviar por meio do SPCE à Justiça Eleitoral, para divulgação em página criada na internet para esse fim (Lei nº 9.504/1997, art. 28, § 4º):
I - os dados relativos aos recursos financeiros recebidos para financiamento de sua campanha eleitoral, em até 72 (setenta e duas) horas contadas do recebimento;

Intimada, a prestadora afirmou que “em análise ao conteúdo, observa-se que em relação ao crédito do dia 24/08/2022, de R$ 300,00, a sua identificação e lançamento correto foi realizado no dia 01/09/2022 dias depois do prazo de 72h. Apesar da irregularidade mínima constatada, é cogente o entendimento de que o mero atraso, quando não significativo, impõe mera ressalva na análise da prestação de contas”.

É cediço que é dever do prestador de contas observar a regularidade e tempestividade dos dados que devem ser fornecidos à Justiça Eleitoral, em conformidade com a norma de regência. Trata-se de falha apurada objetivamente, cuja responsabilidade pelo registro tempestivo recai sobre o próprio candidato.

Assim, considerando que houve efetivo atraso na entrega do relatório, uma vez que ultrapassado o prazo legal de 72 horas, tem-se por caracterizada a inconsistência.

A falha apurada, a depender da quantidade e valores envolvidos, pode levar à desaprovação das contas, conforme enuncia o § 7º do mesmo dispositivo.

Não obstante, no caso dos autos, não se vislumbra gravidade suficiente a determinar a desaprovação. Isso porque o valor é baixo, o atraso foi de poucos dias e a informação foi prestada antes da data da eleição.

É certo, outrossim, que não houve prejuízo ao exercício da fiscalização por parte dessa justiça especializada no que concerne ao valor, já que foi declarado na prestação de contas, ainda que a destempo, bem como não se impediu que os eleitores tomassem conhecimento da transação antes do pleito, motivo pelo qual é suficiente a aposição de ressalva, acompanhando farta jurisprudência já emanada desta Corte.

ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO. RELATÓRIOS FINANCEIROS DE CAMPANHA. ATRASO DE POUCOS DIAS. APRESENTAÇÃO ANTES DAS ELEIÇÕES. OUTRAS IRREGULARIDADES E IMPROPRIEDADES COM IMPACTO ÍNFIMO NAS CONTAS. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.
1. A jurisprudência do TSE que, em um primeiro momento, qualificava o atraso dos relatórios financeiros como mero vício formal em qualquer caso, passou a dar sinais de que, para eleições posteriores a 2018, começaria a tratar de forma mais rigorosa a matéria. Precedente.
2. O bem jurídico tutelado pela norma que prevê a apresentação de relatórios financeiros de campanha em até três dias da data de recebimento de receitas é a transparência do financiamento eleitoral, permitindo que os eleitores – principais destinatários dessa informação – possam votar cientes de quem são os apoiadores de partidos e candidatos, tendo ainda a função de viabilizar a fiscalização concomitante, isto é, antes da eleição, pela Justiça Eleitoral.
3. Caso concreto em que dois relatórios financeiros de campanha foram apresentados com atraso de dois e dez dias, mas respectivamente 35 e cinco dias antes das eleições, não havendo prejuízo ao bem jurídico tutelado. Com isso, mesmo atingindo valor absoluto expressivo e impactando percentual significativo das receitas – 43,55% –, configura mero desatendimento formal da norma, superável com a aposição de ressalvas.
[...]
6. Contas aprovadas com ressalvas, com determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.
[PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS nº 060056998, Rel. Des. Claudia Cristina Cristofani, Rel. designado(a) Des. Thiago Paiva Dos Santos, DJE 24/06/2022]

Ademais, em relação ao montante arrecadado, a falha atinge 0,04% e não supera o valor de R$ 1.064,00, podendo ser considerada irrisória tanto do ponto de vista absoluto quanto relativo, permitindo-se a aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

iii) 9 - Análise da movimentação financeira:

Constou uma divergência entre a movimentação financeira registrada na prestação de contas e aquela registrada nos extratos eletrônicos, consistente em uma despesa que foi declarada no SPCE, porém sem o respectivo registro no extrato bancário.

Pormenorizando o item, a unidade técnica identificou que na prestação de contas o registro do pagamento de R$ 145,00, realizado em 04/10/2022 para LUANA VANESSA NERI SANTANA, CPF 09731705902, foi lançado na prestação de contas como pago com Outros Recursos. Contudo, verifica-se que o pagamento ocorreu por meio da conta nº 99427-1, destinada à movimentação de recursos do FEFC, consoante documento apresentado (id. 43377757).

Destacou-se, ademais, que o registro permaneceu incorreto na prestação de contas retificadora, o que motivou o opinativo de ressalva.

Em sua manifestação, a prestadora afirmou que realizou a correção da informação relativa ao registro da origem dos recursos para saldar o referido débito na prestação de contas retificadora.

Analisando as informações prestadas na prestação de contas final e na primeira retificadora, verifica-se que há, efetivamente, um descompasso entre o comprovante bancário da despesa mencionada e a informação que foi prestada e que constou no relatório de despesas efetuadas. Isso porque, no comprovante bancário consta que o pagamento via pix foi efetivado a partir da conta corrente nº 99.427-1, relativa à movimentação do FEFC; entretanto, foi lançado na prestação de contas que a origem dos recursos seria da conta nº 99.428-9, destinada a movimentação de "outros recursos".

Embora a informação não tenha sido validamente corrigida, trata-se de impropriedade, na medida em que não impediu o exercício da fiscalização, e foi possível analisar a movimentação financeira em sua completude, no que se refere à origem e o destino, bem como o pagamento por meio de uma das formas previstas na legislação, além de conter comprovação escorreita nos autos. Mantém-se a ressalva em razão do descompasso no registro.

iv) 10.2 -  Despesa após a eleição:

Conforme constou no parecer conclusivo complementar, houve a realização de uma despesa no dia 03/10/2022, junto à fornecedora Helena Bueno Santos, no valor de R$ 100,00, identificada pelo documento fiscal nº 128.

A prestadora argumentou que "a despesa com Helena Bueno Santos fora lançada com data errada no recibo de pagamento e no SPCE, ocorre que a data correta da contratação e prestação do serviço é de 01/10/2022 e não como constou em 03/10/2022 que é a data do efetivo pagamento e não da contratação que se deu em dia anterior".

Sobre o ponto, confira-se o art. 33 da Resolução TSE nº 23.607/19:

Art. 33. Partidos políticos e candidatas ou candidatos podem arrecadar recursos e contrair obrigações até o dia da eleição.
§ 1º Após o prazo fixado no caput, é permitida a arrecadação de recursos exclusivamente para a quitação de despesas já contraídas e não pagas até o dia da eleição, as quais deverão estar integralmente quitadas até o prazo de entrega da prestação de contas à Justiça Eleitoral.

Em síntese, portanto, a norma de regência permite ao candidato a arrecadar e contrair obrigações até o dia da eleição; porém, após o pleito é vedado que sejam contraídas novas despesas, permitindo-se apenas a captação de recursos para a quitação de despesas já contraídas e não pagas até aquela data. 

No caso concreto, considerando as informações e documentos que foram colacionados, impõe-se o reconhecimento de irregularidade, uma vez que não há elementos que demonstrem que a obrigação foi contraída antes da eleição.

Com efeito, há nos autos o comprovante de transação bancária de pagamento realizada no dia 03/10 e o recibo de pagamento assinado por Helena no qual consta a mesma data. Todavia, não foi trazido aos autos o contrato, que teria aptidão de demonstrar que a obrigação foi contraída antes do pleito.

Nessa senda, à míngua de dados que comprovem que Helena foi contratada antes do pleito, como buscou fazer crer a prestadora, há que se considerar a data documentalmente demonstrada nos autos, qual seja, 03/10/2022 e, portanto, posterior à data limite prevista na legislação.

Ocorre que o valor da irregularidade - R$ 100,00 - pode ser considerado diminuto tanto em termos absolutos quanto em relativos, já que representa apenas 0,01 % dos gastos contratados, possibilitando a aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade para que seja suficiente a aposição de ressalva às contas.

Por fim, deixa-se de determinar a devolução do valor em razão de não proceder de fonte pública.

v) 10.3 - Confronto com a prestação de contas parcial:

Por fim, constou do parecer conclusivo, que foram detectados gastos eleitorais realizados em data anterior à data inicial de entrega da prestação de contas parcial, mas não informados à época. Os dados foram reproduzidos em tabela:

Em razão desse item, considerando que o somatório -  R$ 220.380, 00 - alcança 31,50% dos gastos contratados, a unidade técnica opinou pela desaprovação das contas.

Em sua manifestação a prestadora afirmou que "no caso da divergência indicada com gastos que não constaram na prestação de contas parcial, vindo a compor a prestação de contas final, cabe apontar que, de fato, ocorreu um atraso no repasse das informações pelos gestores dos contratos para o responsável pela prestação de contas final. Todavia, em que pese essa ocorrência, inexistiu qualquer omissão ou intuito de prejudicar a fiscalização pela Justiça Eleitoral, de modo que a omissão restou superada pela indicação completa dos gastos na prestação de contas final. Nesse tópico, inexistindo prejuízo à atividade fiscalizatória a ocorrência, conforme a jurisprudência do TRE/PR e TSE".

Quanto à matéria, dispõe a resolução TSE nº 23.607/2019:

Art. 47. Os partidos políticos e as candidatas ou os candidatos são obrigadas(os), durante as campanhas eleitorais, a enviar por meio do SPCE à Justiça Eleitoral, para divulgação em página criada na internet para esse fim (Lei nº 9.504/1997, art. 28, § 4º):
I - os dados relativos aos recursos financeiros recebidos para financiamento de sua campanha eleitoral, em até 72 (setenta e duas) horas contadas do recebimento;
II - relatório parcial discriminando as transferências do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), os recursos financeiros e os estimáveis em dinheiro recebidos, bem como os gastos realizados.
(...)
§ 4º A prestação de contas parcial de campanha deve ser encaminhada por meio do SPCE, pela internet, entre os dias 9 a 13 de setembro do ano eleitoral, dela constando o registro da movimentação financeira e/ou estimável em dinheiro ocorrida desde o início da campanha até o dia 8 de setembro do mesmo ano.
(...)
§ 6º A não apresentação tempestiva da prestação de contas parcial ou a sua entrega de forma que não corresponda à efetiva movimentação de recursos caracteriza infração grave, salvo justificativa acolhida pela justiça eleitoral, a ser apurada na oportunidade do julgamento da prestação de contas final.

Tal comando normativo busca dar maior publicidade e transparência às movimentações financeiras ocorridas no curso da campanha eleitoral, a fim de facilitar a fiscalização dos órgãos competentes e dos próprios cidadãos.

A fim de manter a segurança jurídica, até o pleito de 2018, o Tribunal Superior Eleitoral reproduziu o entendimento de que a entrega da prestação de contas parcial de modo a não corresponder à real movimentação financeira do candidato até aquele momento poderia ser relevada, caso os valores fossem devidamente declarados na prestação de contas final.

Todavia, desde 2018 a mesma Corte Superior tem expressado preocupação com esse entendimento, mormente diante do prejuízo à transparência que acarreta ao eleitor, principal destinatário dessas informações, e sinalizou pela alteração prospectiva de sua jurisprudência no sentido de que "o descumprimento dos comandos normativos quanto às informações sobre as receitas e despesas durante a campanha (relatórios financeiros e prestação parcial) não será justificado pelo simples argumento de que tais dados foram contemplados na prestação de contas final, mas serão ponderadas as circunstâncias outras a justificar ou não a aprovação com ressalvas das contas, sob pena de tornar inócuas tais exigências legais" (TSE, AgR no AI nº 060155246/SC, rel. Min. Sergio Silveira Banhos, DJE 15/04/2020, não destacado no original).

Essa guinada fica mais evidente a partir de julgados posteriores, ainda com relação ao pleito de 2018, nos quais o Tribunal Superior estabeleceu que "com relação às eleições antes de 2020, o atraso na apresentação dos relatórios financeiros ou a omissão de despesas na prestação de contas parcial não ensejam a desaprovação das contas, tendo em vista que as informações podem ser declaradas na prestação de contas final" (TSE, PC nº 060121441/DF, rel. Min. Sergio Silveira Banhos, DJE 28/10/2022, não destacado no original).

Recentemente, em decisão monocrática proferida no REspEl nº 060071541, que trata justamente da prestação de contas de candidato nas eleições 2020, ficou consignado que:

(...)
Assim, de acordo com a jurisprudência desta Corte, o atraso, por si só, na entrega dos relatórios financeiros, não conduziria necessariamente à desaprovação das contas.
Todavia, o entendimento deste Tribunal acerca da omissão de valores na prestação de contas parcial, é de que, apenas para as prestações de contas relativas às eleições anteriores a 2020, tal irregularidade não deve ser considerada como apta a prejudicar a transparência e a confiabilidade das contas.
(...)
Assim, na espécie, tendo em vista se tratar de prestação de contas relativas ao pleito de 2020, na linha da jurisprudência desta Corte, a irregularidade atinente à omissão de informações em prestações de contas parciais deve ser considerada grave e suficiente para ensejar, por si só, a desaprovação das contas.
Desse modo, entendo que a irregularidade deve ser mantida.
(...) [TSE, REspEl nº 060071541/GO, rel. Min. Sergio Silveira Banhos, dec. monocr., DJE 15/06/2022, não destacado no original]

Diante da clara orientação daquela Corte Superior, a partir dos julgamentos das prestações de contas do pleito de 2020, esta Corte Regional tem entendido que "a apresentação intempestiva dos relatórios financeiros de campanha, a entrega das contas parciais com inconsistências, a emissão de recibos eleitorais após a prestação de contas final e as divergências nos valores das doações estimadas feitas pelo partido político e os declarados pelos beneficiários, podem ocasionar prejuízos à correta fiscalização e confiabilidade da prestação, bem como constituir óbice ao acompanhamento da movimentação financeira pelos eleitores" (TRE-PR, REl nº 060039896, rel. Rodrigo Otavio Rodrigues Gomes do Amaral, DJE 19/09/2022, não destacado no original).

Portanto, concatenando-se os atuais entendimentos acerca da matéria, configurada a irregularidade em razão da omissão de receitas e despesas na prestação de contas parcial, seu impacto deve ser analisado casuisticamente, podendo conduzir à desaprovação das contas quando verificada a gravidade em razão da extensão da falha, pelo valor absoluto envolvido ou pelo impacto percentual nas contas, não bastando para supri-la o lançamento dos dados na prestação de contas final, mormente porque apresentados apenas após o pleito.

No caso concreto, com base nos valores apurados, evidencia-se que a omissão de despesas na parcial alcança valor absoluto que não pode ser considerado diminuto (R$ 220.380,00) e impacta percentual significativo das contas, qual seja, 31,5 % do total de despesas contratadas, o que impossibilita a aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Nem se diga que a irregularidade não possui gravidade, porquanto viola um dos principais bens jurídicos protegidos pela norma que determina a prestação de informações na parcial, qual seja, a possibilidade de o cidadão comum obter dados concretos sobre os financiadores e o destino dos recursos da campanha antes da eleição, até mesmo como parâmetro para tomada de sua decisão.

A manobra, caso admitida, além de tornar praticamente inócua a previsão legal de prestação de contas parcial e, assim, mitigar a atualidade da fiscalização, pode ser utilizada para "esconder" eventuais doadores ou respectivos fornecedores "indesejáveis", isto é, cuja associação ao candidato seja mal vista pelo eleitorado.

Portanto, configurada a irregularidade pela omissão de despesas na prestação de contas parcial, com gravidade suficiente a afastar a possibilidade de que seja superada pela aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, impõe-se a desaprovação das contas, em linha com o opinativo técnico desta Corte Eleitoral.

 

CONCLUSÃO

Ante o exposto, voto no sentido de julgar DESAPROVADAS as contas de CLOARA PINHEIRO LIMA, relativas ao pleito de 2022.

Por fim, considerando a ausência de previsão legal para apresentação da segunda prestação de contas retificadora (id. 43456713 e ss.), nos termos da fundamentação, determino à Secretaria Judiciária que proceda à exclusão das informações retificadas na base de dados da Justiça Eleitoral, na forma do § 3º do artigo 71 da resolução TSE nº 23.607/2019.

 

THIAGO PAIVA DOS SANTOS
Relator

 

 

EXTRATO DA ATA

PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS (12193) Nº 0603250-70.2022.6.16.0000 - Curitiba - PARANÁ - RELATOR: DR. THIAGO PAIVA DOS SANTOS - INTERESSADA: ELEICAO 2022 CLOARA PINHEIRO LIMA DEPUTADO ESTADUAL - Advogado da INTERESSADA: RICARDO JOSE DE OLIVEIRA - PR69549-A - REQUERENTE: CLOARA PINHEIRO LIMA - Advogado da REQUERENTE: RICARDO JOSE DE OLIVEIRA - PR69549-A. 

DECISÃO

À unanimidade de votos, a Corte desaprovou as contas, nos termos do voto do Relator.

Presidência do Excelentíssimo Senhor Desembargador Wellington Emanuel Coimbra de Moura. Participaram do julgamento os Eminentes Julgadores: Desembargador Fernando Wolff Bodziak, Rodrigo Otávio Rodrigues Gomes do Amaral, Flavia da Costa Viana, Desembargadora Federal Claudia Cristina Cristofani, Thiago Paiva dos Santos e José Rodrigo Sade. Presente a Procuradora Regional Eleitoral, Monica Dorotea Bora.

SESSÃO DE 13.12.2022.