TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO PARANÁ

 

ACÓRDÃO N.º 57.467

 

RECURSO ELEITORAL   0600161-38.2020.6.16.0120 – Iracema do Oeste – PARANÁ
Relator:  CARLOS ALBERTO COSTA RITZMANN

 RECORRENTE: ADEMIR GIROTTO
ADVOGADO: JOAO PAULO PYL - OAB/PR49767
RECORRIDO: JUÍZO DA 120ª ZONA ELEITORAL DE FORMOSA DO OESTE PR
FISCAL DA LEI: Procurador Regional Eleitoral1

 

EMENTA - ELEIÇÕES 2020 – RECURSO ELEITORAL – REGISTRO DE CANDIDATURA. INDEFERIDO - PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. CONTRADITÓRIO ESTABELECIDO. ADOÇÃO DA TEORIA DA CAUSA MADURA. ART.1.013 DO CPC. PRELIMINAR NÃO ACOLHIDA – MÉRITO. AUSÊNCIA DE CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE. CONDENAÇÃO CRIMINAL PELO CRIME PREVISTO NO ART.129, §9º, DO CP. SUSPENSÃO DE DIREITOS POLÍTICOS. JUNTADA DE NOVOS DOCUMENTOS EM SEDE RECURSAL. POSSIBILIDADE. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE COMPROVADA. CRIME QUE NÃO GERA INELEGIBILIDADE – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

1.Encontrando-se a causa madura para julgamento imediato, bem como possibilitada a juntada de documentos com o recurso, nos termos do art.1.013, §3º, inciso I, do Código de Processo Civil, não há prejuízo a parte que importe na declaração de nulidade da sentença.

2.Pedido de registro de candidatura indeferido em razão da suspensão de direitos políticos do recorrente, por condenação criminal transitada em julgado.

3.Juntada, em sede recursal, de sentença proferida pela Vara Criminal da Comarca de Formosa do Oeste/PR, declarando a extinção da punibilidade, o que possibilita o pleno exercício dos direitos políticos do recorrente.

4.O crime de lesão corporal, qualificado pela violência doméstica, não se enquadra nas hipóteses de inelegibilidade previstas no artigo 1º, inciso I, alínea “e”, da Lei Complementar nº64/90.

5.Recurso conhecido e provido para deferir o pedido de registro de candidatura do recorrente.

 

DECISÃO

À unanimidade de votos, a Corte conheceu do recurso, e, no mérito, deu-lhe provimento, nos termos do voto do Relator.

Curitiba, 27/11/2020

RELATOR(A) CARLOS ALBERTO COSTA RITZMANN

 

RELATÓRIO

1.Trata-se de Recurso Eleitoral (ID 14687266) com pedido de concessão de efeito suspensivo, interposto por ADEMIR GIROTTO em face da sentença proferida pelo Juízo da 120ª Zona Eleitoral de Formosa do Oeste/PR, que julgou procedente a Ação de Impugnação ao Registro de Candidatura proposta pelo Ministério Público e indeferiu o pedido de registro de candidatura do Recorrente, para concorrer ao cargo de Vereador das eleições de 2020 no Município de Iracema do Oeste/PR, em razão de suspensão de direitos políticos, decorrente de condenação criminal.

2.Em suas razões recursais o recorrente alegou, preliminarmente, a nulidade da sentença pela ausência de intimação quanto à manifestação do Ministério Público e a certidão explicativa juntada aos autos, afrontando o contraditório e a ampla defesa do recorrente.

3.No mérito alegou ainda: a) erro do judiciário ao não emitir a guia de execução de pena e apresentação de certidão explicativa (objeto e pé) que supre a documentação exigida na legislação eleitoral; b) erro dos Cartórios de Nova Aurora e Formosa do Oeste ao emitirem as Certidões NEGATIVAS Criminais do requerente, o que representa risco de prejuízo ao requerente; c) a não incidência do crime enquadrado na condenação no rol de inelegibilidade do artigo 1º da LC n°64/90 e d) a prescrição da pena pelo lapso temporal, o que seria automático e imediato, com a consequente extinção da pena.

4.Ao final, pugnou pelo conhecimento e provimento do recurso para: a) declarar a nulidade da sentença; b) declarar a inexistência do crime da condenação nos autos sob nº001812-24.2011.8.16.0082; c) declarar a prescrição da pena imposta nos autos nº001812-24.2011.8.16.0082 pelo lapso temporal do Estado quanto à pretensão punitiva; d) deferir o Registro de Candidatura do Recorrente para concorrer ao pleito eleitoral municipal de 2020.

5.O Ministério Público Eleitoral apresentou contrarrazões alegando, preliminarmente, a não ocorrência da nulidade arguida, tendo em vista que o recorrente teve oportunidade de se manifestar e questionar sobre as certidões e manifestações do Ministério Público desde o início da demanda e utilizou o momento para tão somente negar a verdade dos fatos e alegar a inexistência de condenação criminal (ID 14687816).

7.No mérito, sustentou que se houve erro ou não do cartório em que tramitou o processo criminal, isso não altera o fato de que existe uma condenação criminal transitada em julgado em desfavor do recorrente, que foi publicada em Diário de Justiça Eletrônico, não podendo o candidato alegar o desconhecimento da condenação. Afirmou que em decorrência da condenação na Ação Penal, o recorrente se encontra com seus direitos políticos suspensos, o que impede sua capacidade eleitoral passiva.

8.Sustentou que o indeferimento da candidatura não se deu com base na legislação mencionada no rol do artigo 1º da Lei Complementar nº64/90, mas sim com fundamento na própria Constituição Federal, em seu artigo 14, §3º, que menciona ser condição de elegibilidade o pleno exercício dos direitos políticos.

9.Aduziu ainda que a punibilidade do réu não foi declarada extinta, o que é condição essencial para que a suspensão dos direitos políticos seja afastada.

10.Ao final, pugnou pela rejeição da preliminar de nulidade e pelo desprovimento do recurso, mantendo-se integralmente a sentença de primeiro grau.

11.Em decisão proferida no dia 30.10.2020, este relator indeferiu o pedido de concessão de efeito suspensivo, sendo o recurso recebido somente em seu efeito devolutivo (ID 15137566).

12.Ato contínuo, a Procuradoria Regional Eleitoral emitiu parecer ratificando as contrarrazões apresentadas pelo Ministério Público Eleitoral e manifestando-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso eleitoral interposto (ID 16484516).

13.Após, o recorrente peticionou nos autos, juntando decisão proferida nos autos de execução penal nº4000091-51.2020.8.16.0082, declarando a extinção da punibilidade, em face da prescrição da pretensão executória (ID 16982616 e 16982916).

14.Diante disso, a Procuradoria Regional Eleitoral retificou o parecer anteriormente apresentado, manifestando-se pelo deferimento do registro de candidatura de Ademir Girotto (ID 18529766).

15.Com a superveniência do pleito eleitoral, verifica-se que o candidato obteve 241 votos, sendo o mais votado do Município.

    É o relatório.

 

VOTO

 

 

1.Inicialmente, encontram-se presentes os pressupostos de admissibilidade do recurso, mormente a tempestividade, razão pela qual merece ser conhecido.

Preliminar de nulidade da sentença

2.Preliminarmente, o recorrente alegou a nulidade da sentença de primeiro grau, em razão da ausência de intimação quanto à manifestação do Ministério Público e a juntada aos autos de certidão explicativa da Vara Criminal de Formosa do Oeste/PR.

3.Com efeito, assiste razão ao recorrente de que deveria ter sido oportunizada sua manifestação acerca da petição apresentada pelo Ministério Público Eleitoral, bem como de documento novo juntado aos autos, nos termos do artigo 36, §2º, da Res. TSE nº23.609/2019:

Art.36 - Constatada qualquer falha, omissão, indício de que se trata de candidatura requerida sem autorização ou ausência de documentos necessários à instrução do pedido, inclusive no que se refere à inobservância dos percentuais previstos no §2º do art.17, o partido político, a coligação ou o candidato será intimado para sanar a irregularidade no prazo de 3 (três) dias.

§1º - A intimação a que se refere o caput poderá ser realizada de ofício.

§2º - Se o juiz ou relator constatar a existência de impedimento à candidatura que não tenha sido objeto de impugnação ou notícia de inelegibilidade, deverá determinar a intimação do interessado para que se manifeste no prazo de 3 dias.

4.Contudo, após proferida a sentença, o candidato recorrente teve oportunidade de se manifestar sobre os documentos. Ademais, denota-se que inclusive juntou aos autos novo documento, a fim de comprovar a extinção de sua punibilidade, evidenciando estar a causa madura para a análise do mérito.

5.Assim, diante da juntada de novo documento nesta instância e considerando que foi estabelecido o contraditório com a apresentação das razões recursais, verifica-se que a causa se encontra madura para julgamento imediato, nos termos do artigo 1.013, §3º, inciso I, do Código de Processo Civil, não havendo, portanto, prejuízo ao candidato que justifique a anulação da sentença.

6.Por tais razões, rejeita-se a preliminar, passando-se à análise do mérito.

Mérito

7.No mérito o recurso tem por objeto a reforma da sentença proferida pelo Juízo da 120ª Zona Eleitoral de Formosa do Oeste/PR, que julgou procedente a Ação de Impugnação ao Registro de Candidatura e, consequentemente, indeferiu o pedido de registro de candidatura do recorrente para concorrer às eleições de 2020, em razão da ausência de pleno exercício de direitos políticos, decorrente de condenação criminal pelo crime previsto no artigo 129, §9º, do Código Penal. O candidato obteve 241 votos no pleito realizado no dia 15.11.2020, sendo o mais votado do Município.

8.Da análise dos autos verifica-se que o Magistrado de primeiro grau, ao proferir a sentença, reconheceu a ausência de condição de elegibilidade do recorrente em razão dos documentos acostados nos autos até então, que indicavam a existência de condenação criminal transitada em julgado pelo crime de lesão corporal qualificada pela violência doméstica, prevista no artigo 129, §9º, do Código Penal, o que ensejou o indeferimento do pedido de Registro de Candidatura.

9.Ressalte-se que, até a data da prolação da sentença, não constava nos autos qualquer documento que indicasse o cumprimento da pena ou a extinção da punibilidade do recorrente.

10.Contudo, no dia 04.11.2020 o recorrente juntou aos autos a sentença proferida pelo Juízo da Vara Criminal da Comarca de Formosa do Oeste/PR (ID 16982766), declarando a extinção de sua punibilidade, pelo reconhecimento da prescrição da pretensão executória.

11.Cumpre ressaltar que a jurisprudência vem admitindo a juntada de novos documentos antes de esgotadas as instâncias ordinárias, a fim de propiciar melhor análise dos direitos pleiteados à Justiça Eleitoral. Veja-se:

“ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. INDEFERIMENTO DE REGISTRO DE CANDIDATURA AO CARGO DE VEREADOR. AUSÊNCIA DE CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE. DESINCOMPATIBILIZAÇÃO. JUNTADA DE DOCUMENTO NOVO EM EMBARGOS DECLARATÓRIOS. POSSIBILIDADE NAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1.Admite-se, nos processos de Registro de Candidatura, a apresentação de documentos novos em âmbito de Embargos Declaratórios nas vias ordinárias. 2.Na espécie, o TRE de Mato Grosso é o Tribunal competente para a análise de documentos, pois soberano no exame dos fatos e provas. 3.Merece ser desprovido o Agravo Interno, tendo em vista a inexistência de argumentos hábeis para modificar o decisum agravado. 4.Retorno dos autos ao Tribunal Regional, a fim de que se manifeste acerca dos documentos novos apresentados. 5.Agravo Regimental a que se nega provimento” (TSE — AgR-RESpe nº20911/MT. Rel. Min. Napoleão Nunes Maia. Publicado no DJe de 26/04/2017. Página 76 — grifei).

 

“A juntada tardia de documento, nos processos de registro de candidatura, deve ser considerada pelo julgador enquanto não esgotada a instância ordinária, até mesmo em razão da ausência de prejuízo ao processo eleitoral. Incidência, na espécie, dos princípios da instrumentalidade das formas, da razoabilidade e da proporcionalidade” (TSE. Recurso Especial Eleitoral nº13781, Acórdão, Relator(a) Min. Luciana Christina Guimarães Lóssio, Publicação:  PSESS - Publicado em Sessão, Data 22/11/2016).

12.Desta forma, tem-se que, neste momento, encontra-se preenchida a condição de elegibilidade que ensejou ao indeferimento do pedido de registro, vez que, com a declaração da extinção da punibilidade do recorrente, não mais perdura a suspensão de seus direitos políticos.

13.Importante destacar que o crime de lesão corporal qualificada (art.129, §9º, do CP), pelo qual o recorrente foi condenado, não se enquadra nas hipóteses de inelegibilidade previstas pelo artigo 1º, inciso I, alínea “e”, da Lei Complementar nº64/90, razão pela qual deve ser reconhecida sua capacidade eleitoral passiva para concorrer ao pleito.

14.Neste sentido o TRE/RJ em caso semelhante adotou o seguinte entendimento:

Recurso Eleitoral. Requerimento de Registro de Candidatura. Eleições 2020. Condenação criminal transitada em julgado. Crime que não enseja inelegibilidade. Suspensão dos direitos políticos. Efeito automático.

I.O crime tipificado no art.129, §9º do Código Penal, qual seja, lesão corporal (violência doméstica), não enseja a inelegibilidade prevista no art.1º, I, alínea “e”, da LC nº64/90.

II.A suspensão dos direitos políticos, em caso de sentença condenatória penal transitada em julgado, é consequência imediata, independentemente de comunicação promovida pelo juízo criminal, mesmo nas hipóteses de cumprimento de penas alternativas em razão de suspensão condicional. Art.15, III da Constituição. Precedentes do TSE e desta Corte.

III.Não comprovação de causa extintiva de afastamento dos efeitos da condenação, a inviabilizar a plenitude dos direitos políticos. Inteligência do art.14, §3º, II da CRFB c/c art.11, §1º, VI e §7º, da Lei nº9.504/97.

Recurso desprovido. Manutenção do indeferimento do registro de      candidatura. (0600188-56.2020.6.19.0049 REl nº060018856 - CACHOEIRAS DE MACACU – RJ - Acórdão de 06/11/2020 Relator(a) Des. Guilherme Couto De Castro Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 06/11/2020) (grifo nosso).

15.Outrossim, conforme informações prestadas pelo Cartório da 120ª Zona Eleitoral de Formosa do Oeste/PR (ID 14686966), estão preenchidos todos os demais requisitos para o deferimento do Requerimento de Registro de Candidatura - RRC do recorrente.

16.Sendo assim, diante da comprovação da extinção da punibilidade pelo crime em que foi condenado, e da ausência de outras causas de inelegibilidade, merece reforma a sentença de primeiro grau, para deferir o registro de candidatura do recorrente.

17.ISTO POSTO, diante da argumentação acima expendida e acompanhando o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, voto no sentido de conhecer do recurso eleitoral interposto por ADEMIR GIROTTO e, no mérito, aplicando o artigo 1.013 do CPC, dar-lhe provimento, para reformar a sentença de primeiro grau e deferir seu pedido de Registro de Candidatura, para o cargo de vereador no Município de Iracema do Oeste.

   

Carlos Alberto Costa Ritzmann

Relator

 

EXTRATO DA ATA

 

 

RECURSO ELEITORAL  Nº 0600161-38.2020.6.16.0120 - Iracema do Oeste - PARANÁ - RELATOR: DR. CARLOS ALBERTO COSTA RITZMANN - RECORRENTE: ADEMIR GIROTTO - Advogado do RECORRENTE: JOAO PAULO PYL - PR49767 - RECORRIDO: JUÍZO DA 120ª ZONA ELEITORAL DE FORMOSA DO OESTE PR.

DECISÃO

À unanimidade de votos, a Corte conheceu do recurso, e, no mérito, deu-lhe provimento, nos termos do voto do Relator.

Presidência do Excelentíssimo Senhor Desembargador Tito Campos de Paula. Participaram do julgamento os Eminentes Julgadores: Desembargador Vitor Roberto Silva, Rogério de Assis, Carlos Alberto Costa Ritzmann, Thiago Paiva dos Santos, Desembargador Federal Fernando Quadros da Silva e Roberto Ribas Tavarnaro. Presente a Procuradora Regional Eleitoral, Eloisa Helena Machado.

SESSÃO DE 27.11.2020.