JUSTIÇA ELEITORAL

TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DE PERNAMBUCO

 

REPRESENTAÇÃO (11541) - Processo nº 0601936-62.2022.6.17.0000 - Jaboatão dos Guararapes - PERNAMBUCO

[Propaganda Política - Propaganda Eleitoral - Bem Particular de Uso Comum]

RELATOR: DARIO RODRIGUES LEITE DE OLIVEIRA

REPRESENTANTE: ELIAS GOMES DA SILVA

Advogados do(a) REPRESENTANTE: HUMBERTO CABRAL VIEIRA DE MELO - PE0006766A, MARILIA CARVALHEIRA VIEIRA DE MELO - PE51228, ANA CAROLINA DO REGO COSTA FERRAZ - PE54947

REPRESENTADO: ADEILDO PEREIRA LINS, LAERCIO VENANCIO DO ESPIRITO SANTO, GINALDO JOSE TRAJANO DO CARMO
 

 

DECISÃO FINAL 

 

Trata-se presentemente de REPRESENTAÇÃO ELEITORAL ajuizada ELIAS GOMES DA SILVA em face de ADEILDO PEREIRA LINS, candidato ao cargo de Deputado Estadual, LAERCIO VENÂNCIO ESPÍRITO SANTO e GINALDO JOSÉ TRAJANO DO CARMO, em razão da suposta veiculação de propaganda irregular durante a realização cerimônia religiosa, o que violaria o art. 37, caput, da Lei nº 9.504/1997 e ensejaria a imposição de multa prevista no §1º do mesmo dispositivo legal1.

Em sua Petição Inicial constante do Id 29287402, o Representante afirma que os Representados estão transformando o ato religioso em uma verdadeira propaganda eleitoral, na medida que o 2º e 3º representados, Pastores da Igreja, interromperam o sermão religioso para apresentação do candidato Adeildo Pereira Lins, 1º representado, com o objetivo de influenciar a opinião dos fiéis.  Aduz que os fatos narrados podem desequilibrar a corrida eleitoral e não se pode permitir que o espaço religioso seja utilizado para captação dos votos dos fiéis. Busca o deferimento de tutela de urgência, com determinação de que os Representados se abstenham de praticar propaganda eleitoral de qualquer natureza em bens de uso comum. No mérito, requer a imposição da multa insculpida no art. 37, §1º, da Lei nº 9.504/1997.

Houve outorga da Medida de Urgência suscitada, determinando-se aos Representados que se abstivessem “(...) de realizar propaganda eleitoral em templos ou qualquer outro bem de uso comum, sob ônus de incidência de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais) a título de astreintes, de incidência jurisprudencialmente admitida (TSE – RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 060088567, Acórdão, Relator(a) Min. Luis Felipe Salomão, Publicação: DJE – Diário da justiça eletrônico, Tomo 199, Data 27/10/2021).” (Id . 29288337).

Em Contestação constante do Id 29297032, o Representado Adeildo Pereira Lins negou ter infringido o §4º do art. 37 da Lei n.º 9.504/97 e/ou o §2º do art. 19 da Resolução TSE n.º 23.610/2019, indicando não ser cabível a imposição da sanção preconizada no §1º do art. 37 de dito Diploma Legal. Explicitou que no vídeo acostado à Peça Inaugural traz indicativo de que por ocasião do registrado: não está no altar ou no púlpito; que não fez uso de microfone para campanha; que se manteve em silêncio; que é presenteado com uma bíblia; e que não há menção às palavras “voto” ou “apoio”, tanto dos pastores presentes, quanto do candidato. Detalhou que “(...), a expressão de que o candidato seria um representante da família Ferreira foi absolutamente deturpada, vez que, a bem da verdade, a fala do Pr. Laércio deve ser interpretada no sentido real, atestando-se apenas a ocorrência de um fato real, que o candidato “Adeildo da Igreja” agora estava concorrendo a uma cadeira no Legislativo Estadual, haja vista que o Deputado Manoel Ferreira já anunciou que não irá concorrer à mesma cadeira neste pleito, retirando-se da vida pública.”. Concluiu que “(...) sob todos os prismas, impossível estabelecer que a fala de apoio ao candidato ora Defendente, verbalizada por dois pastores, em uma reunião com pouco mais de 40 pessoas, “potencialmente pode significar sensível desvantagem a prejudicar demais candidatos, com consequente comprometimento à lisura do pleito eleitoral” conforme citado na decisão liminar.”. Pleiteou pelo julgamento improcedente da Representação.

Em Contestação de Id 29299989, os Representados Laercio Venâncio Espírito Santo e Ginaldo José Trajano do Carmo identicamente negaram a prática de quaisquer irregularidades, posto que, “(...) em momento algum da gravação de mídia o candidato Adeildo da Igreja, sobe no Púlpito para fazer algum discurso, muito menos teve a posse do microfone para pedir votos ou persuadir os fieis daquela denominação religiosa.”. Esclareceram que “(...) como todos que visitam o templo da Assembleia de Deus, é de maneira costumeira apresentar os visitantes presentes, como forma de dá boas vindas, antes durante ou no final do culto religioso, existindo para isso até um hino de apresentação, portanto os lideres religiosos que ali se encontravam ora representados neste autos, em momento nenhum tentaram captar ou pedir aos fieis que votassem no primeiro Representado.”. Destacaram que o Representado Adeildo Pereira Lins permaneceu inerte durante à sua apresentação como visitante, inclusive sem verbalizar, e que não houve qualquer indicação de que seria, aquele, mais apto do que qualquer outro candidato, não tendo havido tentativa de captação de votos. Situaram que “(...) no vídeo, o Pastor Ginaldo e Pastor Laercio não mencionam que tem algum tipo de divida com o primeiro Representado, diferentemente do que foi narrado na R.decisão liminar com a seguinte frase “nos temos uma dívida com o senhor” , o Pastor Ginaldo apenas e tão somente fala que: a Câmara de Jaboatão é representada por alguns homens de Deus, palavras de praxe usadas por pessoas seguidoras do evangelho.”. Defenderam que “(...) a mera apresentação pessoal de candidato, sem pedido de votos explícitos, está amparado pela exceção prevista no art. 35-A da Lei n° 9.504/97, e ou no art. 3° da Resolução do TSE n° 23.600/2019, bem como pela liberdade de expressão e comunicação, garantida pelo, art. 5º inciso IV e art. 220 da CF/88.”.

Em Parecer constante do Id 29304540, o Ministério Público Eleitoral opina pela procedência da Representação.

É o relatório no essencial. Passo a decidir.

De ciência, o artigo 37 da Lei 9.504/1997 proíbe a realização de propaganda eleitoral de qualquer natureza nos bens que pertença ao Poder Público e nos bens de uso comum, enquanto o §4º estabelece que bens de uso comum, para fins eleitorais, são os assim definidos pela Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil e também aqueles a que a população em geral tem acesso, tais como cinemas, clubes, lojas, centros comerciais, templos, ginásios, estádios, ainda que de propriedade privada.

Diante dos dispositivos imediatamente acima mencionados, observa-se que a Legislação não autoriza a realização de propaganda eleitoral em templos religiosos pôr os considerar bens de uso comum. Assim, a controvérsia se cinge a examinar se houve demonstração nos autos de que os Representados Laercio Venâncio Espírito Santo e Ginaldo José Trajano do Carmo, Pastores, tenham realizado publicidade eleitoral em benefício do candidato Adeildo Pereira Lins durante culto. Entendo que sim.

Com efeito, de logo explicitando o número de registro da candidatura do Representado Adeildo Pereira Lins à concorrência à Assembleia Legislativa do Estado de Pernambuco (22345), bem como o nome de urna (Adeildo da Igreja) e agradecimento ao apoio à correlata candidatura concedido pelos Pastores Laércio e Ginaldo (tais grafias são destacadas durante toda a gravação), o vídeo de Id 29287404 registra a presença dos Representados no templo (bem de uso comum) durante cerimônia religiosa e, por oportunidade dessa, falas dos Representados Laercio Venâncio Espírito Santo e Ginaldo José Trajano do Carmo, ambos Pastores, dirigidas aos fiéis que ali se encontravam, de explícita publicização de apoio, de suporte à aludida candidatura, em claríssimo vilipêndio à vedação expressamente consignada no caput do art. 37 c/c § 4º do mesmo dispositivo, ambos da Lei 9.504/1997. Observe-se a íntegra dos áudios registrados: “vai dar tudo certo... (jingles) ... Fala do Representado Laercio Venâncio Espírito Santo: A coisa mais triste na vida de um ser humano é você esquecer de quem já fez alguma coisa por você. E quando o deputado Manoel Ferreira me convidou e conversou comigo e o pastor Ginaldo também explicando que o senhor seria o representante da família ferreira no lugar do nosso anfitrião, nosso deputado Manoel Ferreira, eu muito me alegrei, porque nós tínhamos uma dívida para com o senhor. Fala do Representado Ginaldo José Trajano do Carmo: porque sempre o Adeildo nos ajudou aqui na vida toda, nos eventos da Igreja, quando era pra fazer, tudo Adeildo nos ajudou. Hoje a Câmara tem dois, três, quatro, cinco homens de Deus lá, que ajuda a gestão de Jaboatão a avançar ... vai dar tudo certo... (jingles)”.

Ora, do acima descrito, vê-se que os Representados Laercio Venâncio Espírito Santo e Ginaldo José Trajano do Carmo, ambos Pastores, portanto, gozando de evidente prestígio perante os fiéis, em oportunidade de culto com grande frequência - como perceptível do registrado -, explicitamente apresentam o Representado Adeildo Pereira Lins como sendo futuro representante da família Ferreira na política, substituindo o Deputado Manoel Ferreira, circunstância a indicar que não estaria sendo apresentado aos presentes como mero visitante da Igreja e, sim, clara e visivelmente apontado como candidato, concorrente no pleito eleitoral, ligado e apoiado por tradicional família de políticos que possuem inegável ligação de natureza religiosa à Instituição Religiosa, advindo daí perceptível o viés propagandístico de correlatas falas. Tanto o é que inclusive se apresenta sugestão indicativa de possuir o Representado Adeildo Pereira Lins atributo positivo sabidamente de grande recepção ao público ouvinte: de contribuir, ajudar nos eventos promovidos pela Igreja.  

De se ressaltar ainda que o doc. de Id 29287405, print de tela de smartphone em que se visualiza justamente imagem da gravação do vídeo acima referenciado, bem comprova o caráter propagandístico do registrado, já que acompanhado de comentários indicados como atribuídos ao Representado Adeildo Pereira Lins com expressa indicação de ter havido pelos dois outros Representados, Laercio Venâncio Espírito Santo e Ginaldo José Trajano do Carmo, acolhida e apoio à candidatura.

Diante do imediatamente acima constatado, tem-se que os restritivos dispostos nos já elencados no §4º do artigo 37 da Lei n.º 9.504/97 e §2º do artigo 19 da Resolução TSE n.º 23.6010/2019 foram, pelos Representados Laercio Venâncio Espírito Santo e Ginaldo José Trajano do Carmo, violados por conduta que ilicitamente beneficia o Representado Representado Adeildo Pereira Lins, candidato ao cargo de Deputado Estadual, advindo de tal constatação elemento apto a autorizar a imposição de sanção pecuniária a todos, conforme preconiza o § 1º do art. 37 da Lei n.º 9.504/97.

A outro tanto, como explicitado na Decisão concessiva da Medida de Urgência, pela irregularidade da propaganda eleitoral realizada no interior de templo religioso, apresenta-se os recentes precedentes:

“Propaganda eleitoral irregular. Bem de uso comum. Igreja. Configuração. [...] 1. Quanto ao fato narrado na representação eleitoral, a Corte Regional fluminense manteve a decisão de primeiro grau, concluindo, à unanimidade e mediante análise da mídia acostada aos autos, que ‘não se pode negar que a participação do recorrente e, principalmente a leitura do salmo com o número pelo qual ele iria concorrer às eleições, considerando principalmente que foi chamada a atenção dos ouvintes para esse fato, conduz a constatação de que houve, de fato, propaganda irregular realizada dentro do templo religioso’. 2. A revisão do entendimento do Tribunal a quo - no sentido de que ficou configurada a prática de propaganda eleitoral irregular em bem de uso comum, durante missa religiosa em igreja, em que foi concedido amplo destaque a candidato, o qual fez leitura de salmo bíblico - implicaria o reexame de matéria fático-probatória, vedado nesta instância especial, nos termos do verbete sumular 24 do TSE. […]”(Ac. de 19.6.2018 no AgR-AI nº 23930, rel. Min. Admar Gonzaga.)

Recurso. Representação. Eleições de 2020. Propaganda Eleitoral em templo religioso. Bem particular de uso comum. Divulgação de fotos nas redes sociais da candidata recorrente. Não atendimento de liminar para imediata retirada da propaganda. Sentença que julgou procedente a representação. Condenação em multa no valor mínimo e para cada um dos representados individualmente. (…) A veiculação de propaganda em desacordo com o disposto no caput do art. 37 da Lei das Eleições sujeita o responsável ao pagamento de multa. Os candidatos recorrentes, devidamente intimados para remover a propaganda de suas redes sociais, não promoveram a retirada no prazo legal. A retirada posterior não elide a multa. Caráter instantâneo da propaganda em templo religioso. Recurso a que se dá parcial provimento apenas para reduzir o valor da multa ao mínimo legal. (TRE-MG Recurso Eleitoral nº 060030344, Acórdão, Relator(a) Des. Luiz Carlos Rezende e Santos, Publicação: DJEMG - Diário de Justiça Eletrônico-TREMG, Data 11/02/2021).

Assim, diante do explicitado e com lastro nos dispositivos legais adrede referenciados, julgo procedente a Representação apresentada para: i) tonar definitiva a Medida de Urgência adrede outorgada para fins de determinar aos Representados que se abstenham de realizar propaganda eleitoral em templos ou qualquer outro bem de uso comum, sob ônus de incidência de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais) a título de astreintes, de incidência jurisprudencialmente admitida (TSE – RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 060088567, Acórdão, Relator(a) Min. Luis Felipe Salomão, Publicação: DJE – Diário da justiça eletrônico, Tomo 199, Data 27/10/2021); ii) condenar os Representados, per capta, ao pagamento de multa do importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), com lastro no prevista no § 1º, do art. 37, da Lei 9.504/97, sendo certo que o arbitramento se faz se levando em consideração as situações pessoais, particulares de cada um dos Representados, com atenção ao viés pedagógico da penalidade. 

Publique-se, intimando-se as partes para fins de ciência desta Decisão.

À Secretaria Judiciária para providências de publicação, intimação e outras que forem cabíveis.

Recife, na data da assinatura eletrônica.

Dario Rodrigues Leite de Oliveira

Desembargador Eleitoral Auxiliar