Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso do Sul


 

RECURSO ELEITORAL (11548)  nº  0600518-05.2024.6.12.0018 
PROCEDÊNCIA:  Dourados -  MATO GROSSO DO SUL
RECORRENTE: ISA JANE MARCONDES
ADVOGADO: DANIELY HENSCHEL - OAB/MS15030
ADVOGADO: DANIEL RIBAS DA CUNHA - OAB/MS16626
RECORRIDO: ALAN AQUINO GUEDES DE MENDONCA
ADVOGADO: JOSE VALERIANO DE SOUZA FONTOURA - OAB/MS6277-A
ADVOGADO: OSCAR HENRIQUE PERES DE SOUZA KRUGER - OAB/MS14369

RELATOR: JUIZ FERNANDO NARDON NIELSEN

 

EMENTA

ELEIÇÕES 2024. RECURSO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2024. PROPAGANDA ELEITORAL NA INTERNET. IMPULSIONAMENTO DE CONTEÚDO NEGATIVO. VIOLAÇÃO DO ART. 57-C, §§ 2º E 3º, DA LEI Nº 9.504/1997 E DO ART. 28, § 5º, DA RESOLUÇÃO TSE Nº 23.610/2019. MULTA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.

I. CASO EM EXAME

1. Recurso eleitoral interposto contra sentença que julgou procedente representação por propaganda eleitoral irregular, condenando a recorrente ao pagamento de multa de R$ 5.000,00, com fundamento no art. 57-C, §§ 2º e 3º, da Lei nº 9.504/1997 c/c art. 28, § 5º, da Resolução TSE nº 23.610/2019.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO

2. Há duas questões em discussão: (i) definir se o impulsionamento do vídeo configura exercício legítimo da liberdade de expressão no contexto do debate político; e (ii) estabelecer se a conduta caracteriza propaganda eleitoral negativa vedada pela legislação eleitoral.

III. RAZÕES DE DECIDIR

3. O impulsionamento de conteúdo na internet é permitido pela legislação eleitoral apenas para promover ou beneficiar candidatos, partidos ou coligações, sendo vedado para veicular propaganda negativa contra adversários, nos termos do art. 57-C, §§ 2º e 3º, da Lei nº 9.504/1997, e art. 28, § 7º-A, da Resolução TSE nº 23.610/2019.

4. O vídeo impulsionado apresenta críticas à gestão do candidato à reeleição, com teor depreciativo e identificável, ainda que de forma implícita, como mensagem negativa direcionada ao atual prefeito.

5. Embora a liberdade de expressão seja assegurada pelo art. 5º, incisos IV e IX, da Constituição Federal, essa garantia encontra limitações no âmbito eleitoral, visando preservar o equilíbrio do pleito e evitar práticas que comprometam a igualdade entre os candidatos.

6. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é clara ao vedar o uso do impulsionamento para propagar críticas a adversários políticos, considerando que tal prática desvirtua a finalidade da ferramenta e viola os princípios do debate propositivo e da disputa justa.

7. A aplicação de multa no valor mínimo legal, prevista no art. 57-C, § 2º, da Lei nº 9.504/1997, revela-se adequada e proporcional à infração constatada.

IV. DISPOSITIVO E TESE

8. Recurso desprovido.

Tese de julgamento:

1. O impulsionamento pago de propaganda eleitoral negativa contra adversários políticos é vedado pela legislação eleitoral, sendo permitido apenas o impulsionamento com a finalidade de promover ou beneficiar candidatos, partidos ou coligações.

2. A liberdade de expressão no âmbito eleitoral encontra limitações quanto ao uso de ferramentas digitais para evitar desequilíbrios no pleito.

Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, IV e IX; Lei nº 9.504/1997, art. 57-C, §§ 2º e 3º; Resolução TSE nº 23.610/2019, art. 28, § 7º-A.

Jurisprudência relevante citada:

1. TSE, Rp nº 0601473-94, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 09.05.2024;

2. TSE, Rp nº 0601472-12, Rel. Min. Floriano de Azevedo Marques, j. 03.05.2024;

3. TRE/MS, RE nº 0600239-19, Rel. Juiz José Eduardo Chemin Cury, j. 04.12.2024.

 
ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Juízes deste Tribunal Regional Eleitoral, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, que ficam fazendo parte integrante desta decisão colegiada, Por maioria de votos e contrariando o parecer ministerial, este Tribunal Regional negou provimento ao recurso, mantendo incólume a sentença que julgou procedente a representação e aplicou a penalidade de multa, nos termos do voto do relator. Ficaram vencidos o 2º vogal (Dr. Fernando Bonfim Duque Estrada) e o 3º vogal (Desembargador Luiz Tadeu Barbosa Silva).

Sala das Sessões do Tribunal Regional Eleitoral.

Em Campo Grande, MS, 24/01/2025.

Juiz FERNANDO NARDON NIELSEN, Relator. 

 

RELATÓRIO

ISA JANE MARCONDES interpõe recurso eleitoral contra sentença proferida pelo Juízo da 18ª Zona Eleitoral de Dourados (ID 12566411) que, na representação por suposta prática de propaganda eleitoral irregular ajuizada por ALAN AQUINO GUEDES DE MENDONÇA, julgou procedente o pedido, condenando a recorrente ao pagamento de multa no valor de R$ 5.000,00, com fundamento no art. 57-C, §§ 2º e 3º, da Lei nº 9.504/2019 c/c art. 28, § 5º da Resolução nº 23.610/2019.

Alega que (ID 12566417): i) as críticas veiculadas no vídeo encontram-se dentro do espectro da liberdade de expressão garantida pelo art. 5º, incisos IV e IX, da Constituição Federal, tratando-se de questões de interesse público que não configuram ofensas pessoais ou propaganda eleitoral negativa; ii) o vídeo impulsionado apenas expôs fatos já amplamente divulgados na imprensa local e pela Câmara de Vereadores, não apresentando distorções ou manipulações que configurassem propaganda negativa; e, iii) o recorrido incide em abuso processual ao ingressar com mais 100 representações na Justiça Eleitoral e 25 na esfera criminal, configurando tentativa de censura às críticas políticas

Ao final, requer o provimento do recurso para, reformando a sentença, julgar improcedente a representação, afastando-se pena de multa aplicada.

Contrarrazões do recorrido pelo desprovimento do recurso (ID 12566421).

Instada a se manifestar, a douta PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL opinou pelo conhecimento do recurso interposto por ISA JANE MARCONDES e, no mérito, pelo seu provimento, nos termos do parecer (ID 12566801).

É o relatório.

VOTO

Conforme relatado, trata-se de recurso eleitoral interposto por ISA JANE MARCONDES contra sentença proferida pelo Juízo da 18ª Zona Eleitoral de Dourados (ID 12566411) que, na representação por suposta prática de propaganda eleitoral irregular ajuizada por ALAN AQUINO GUEDES DE MENDONÇA, julgou procedente o pedido, condenando a recorrente ao pagamento de multa no valor de R$ 5.000,00, com fundamento no art. 57-C, §§ 2º e 3º, da Lei nº 9.504/2019 c/c art. 28, § 5º, da Resolução nº 23.610/2019.

Conheço do recurso, porque tempestivo e preenche os requisitos de admissibilidade.

A representação trata da suposta prática de propaganda eleitoral irregular, consistente no impulsionamento de conteúdo negativo no perfil da rede social da recorrente, de um vídeo criticando a gestão do atual prefeito, candidato à reeleição, apontando a precariedade do Hospital da Vida no município de Dourados.

A sentença recorrida, ao julgar procedente a representação, abordou a questão de forma assertiva, destacando que a legislação eleitoral proíbe expressamente o uso de impulsionamento para veiculação de propaganda negativa, autorizando-o apenas para promoção de candidatos ou coligações contratantes. Ressaltou-se, ainda, que embora seja permitida a crítica política aos adversários, o impulsionamento de conteúdo com teor depreciativo compromete o equilíbrio do debate eleitoral, contrariando os princípios que regem o processo democrático.

A recorrente insurge-se alegando as teses acima relatadas.

A sentença não merece reparos.

O cerne da controvérsia reside em estabelecer se a publicação impulsionada na rede social da recorrente se trata de uma manifestação legítima da liberdade de expressão no contexto do debate político ou constitui propaganda eleitoral negativa, violando a Lei nº 9.504/1995 e a Resolução TSE nº 23.610/2019.

Ao se analisar o conteúdo do vídeo impulsionado (ID 12566396), pode-se concluir pela existência de ofensa à legislação eleitoral, confira-se:

Povo Douradense, to aqui na frente do hospital da vida hoje. Hoje o hospital da vida chega dá tristeza e vontade de chorar. Aí tá faltando tudo porque? Porque não tem gestão! A cidade não tem gestão! Esse atual prefeito não tem gestão! Eu Isa Marcondes eleita por vocês eu vou fiscalizar eu vou fiscalizar baixo pra cima tudo dentro desse hospital porque eu já avisei eles eu não tenho medo porque eles têm que dar o nosso básico até o nosso básico sumiu desapareceu nem papel higiênico tem no hospital da vida. Isa Marcondes 10222 e Marçal Filho para prefeito 45 segura.”

A legislação eleitoral estabelece parâmetros claros para a realização de propaganda na internet, sendo o impulsionamento regulamentado de forma restritiva. O art. 57-C, § 3º, da Lei nº 9.504/1997, bem como o arts. 28, § 7º-A, da Resolução TSE nº 23.610/2019, vedam seu uso para veiculação de conteúdo negativo, permitindo-o exclusivamente para promover ou beneficiar candidatos ou suas agremiações.

No caso em apreço, a análise do conteúdo impulsionado evidencia críticas à gestão do candidato à reeleição, apresentando-o de forma depreciativa e destacando supostos problemas administrativos. Ainda que o nome do gestor não tenha sido explicitamente mencionado, o teor da mensagem claramente identifica tratar-se do atual prefeito o alvo da crítica.

A interpretação das normas aplicáveis deixa evidente que o impulsionamento de propaganda negativa não se coaduna com os princípios do debate eleitoral propositivo, cujo objetivo é fomentar a apresentação de ideias e soluções, e não a amplificação de críticas ou ataques a adversários.

Embora a liberdade de expressão seja um direito fundamental assegurado pelo art. 5º, inciso IV, da Constituição Federal, no âmbito eleitoral, encontra limitações impostas pelo equilíbrio do pleito e pela necessidade de assegurar um ambiente democrático. A vedação ao impulsionamento de propaganda negativa busca justamente evitar o uso abusivo de ferramentas digitais para desestabilizar adversários de forma desproporcional.

Na espécie, as críticas veiculadas na postagem poderia ser considerada um exercício legítimo de liberdade de expressão. No entanto, ao ser impulsionada, ultrapassou os limites impostos pela legislação eleitoral, violando os princípios que regem a disputa justa e equilibrada.

A jurisprudência eleitoral é clara ao estabelecer que o impulsionamento pago não pode ser instrumento de ataque ou desqualificação, mas apenas de promoção de ideias ou candidaturas. Veja-se:

(...) 2. Só se admite o impulsionamento da propaganda eleitoral para promover ou beneficiar candidato. 3. Aplica–se a multa prevista no § 2º do art. 57–C da Lei 9.504/1997 quando demonstrada a realização de impulsionamento de propaganda eleitoral negativa. 4. Representação julgada procedente para aplicar multa de R$ 5.000,00, solidariamente, e determinar a remoção da propaganda veiculada e abstenção de novas veiculações. Liminar prejudicada. (TSE – Acórdão no Rp nº 0601473-94, j. 09.05.2024, rel. Min. CÁRMEN LÚCIA). (g. n.)

(...) 2. De acordo com o art. 57–C da Lei 9.504/97, o impulsionamento de conteúdo de propaganda eleitoral na internet somente é permitido para a finalidade de promover ou beneficiar candidatos e suas agremiações, sendo vedado esse tipo de propaganda com o intuito de criticar, prejudicar ou induzir a ideia de não voto a candidato adversário. (TSE – Acórdão no Rp nº 0601472-12, j. 03.05.2024, rel. Min. FLORIANO DE AZEVEDO MARQUES).

(...) 3. O art. 57-C, § 3º, da Lei nº 9.504/1997, combinado com o art. 29, § 3º, da Resolução TSE nº 23.610/2019, veda expressamente o impulsionamento pago de propaganda eleitoral com conteúdo negativo contra adversários, permitindo o impulsionamento apenas para promover ou beneficiar candidatos, partidos ou coligações. 4. O conteúdo impulsionado analisado desvirtua a finalidade legal, pois consistia em críticas ao adversário político, configurando afronta à norma e sujeitando o infrator à aplicação de multa entre R$ 5.000,00 e R$ 30.000,00. 5. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) consolida o entendimento de que o impulsionamento pago de propaganda negativa não é permitido, não violando, entretanto, o princípio da liberdade de expressão, uma vez que limita apenas a forma de divulgação, sem restringir críticas em outras modalidades de propaganda. (...) 7. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. O impulsionamento pago de propaganda eleitoral negativa contra adversários políticos é vedado pela legislação eleitoral, sendo permitido apenas o impulsionamento com a finalidade de promover ou beneficiar candidatos, partidos ou coligações. 2. A aplicação de multa em seu valor mínimo legal, conforme o art. 57-C, § 2º, da Lei nº 9.504/1997, não viola os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. (TRE/MS – Acórdão no RE nº 0600239-19, j. 04.12.2024, rel. Juiz JOSÉ EDUARDO CHEMIN CURY). (g. n.)

Dessa forma, o uso do impulsionamento de conteúdo para desabonar adversários políticos, afronta o objetivo de assegurar igualdade no processo eleitoral.

Assim, considerando que o conteúdo veiculado pela representada caracterizou propaganda eleitoral irregular no intuito de desequilibrar a disputa eleitoral, é cabível a aplicação da sanção pecuniária prevista no § 2º do art. 57-C da Lei nº 9.504/1997, reproduzido no § 5º do art. 28 da Resolução TSE nº 23.610/2019.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, contrariando o parecer da douta PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL, nego provimento ao recurso, mantendo incólume a sentença que julgou procedente a representação, aplicando multa no valor mínimo legal de R$ 5.000,00 à recorrente.

É como voto, Senhor Presidente.

 

O Senhor Juiz ALEXANDRE ANTUNES DA SILVA

Senhor Presidente, pensando sobre esse assunto, e sempre na diversidade de pensamentos que temos, é que vamos construindo soluções. Fico imaginando que a eleição é mais ou menos como uma licitação, um certame com regras previamente estabelecidas sobre como aquele evento acontecerá.

Há pessoas que cumprem rigorosamente as regras, e temos outras que não as cumprem. Então, fica a reflexão: será que aqueles que cumpriram as regras, se tivessem agido de maneira diferente, também não poderiam ter alcançado um resultado melhor ou sido eleitos?

Pensando nisso e homenageando aqueles que cumprem as regras, acredito que não podemos deixar de aplicar penalidades para aqueles que as descumpriram. Deste modo, acompanho o relator.

 

O Senhor Juiz FERNANDO BONFIM DUQUE ESTRADA (Declaração oral de voto divergente)

Senhor Presidente,  mantendo coerência com os votos que proferi nos julgamentos anteriores, entendo que a questão envolve uma análise sobre o que significa promover ou beneficiar um candidato. Temos visto algumas decisões e posicionamentos que vedam, neste caso, a propaganda negativa.

Assim, é importante analisar o que se entende por promover e se, no caso, promover pode incluir apontar falhas de uma determinada gestão e afirmar que as corrigirá. Será que isso não seria considerado promover? No meu entendimento, o que seria proibido aqui é o impulsionamento que envolva propaganda negativa, como ofensa à honra, injúria ou algo que ridicularize outros candidatos. Fora desses parâmetros, não vejo razão para a vedação do impulsionamento quando se apontam problemas e se promete resolvê-los.

Seguindo a linha de pensamento das decisões anteriores, vou abrir uma divergência neste caso sobre a tese jurídica. Entendo que a Justiça Eleitoral tem que estar atenta aos abusos, para coibir e aplicar sanções. 

Ressalto que, com relação aos dois ou três processos que julgamos durante esta semana, este processo em particular se aproximou mais da linha divisória do que é permitido ou proibido. No entanto, no meu entendimento, não a ultrapassou. 

Dessa forma, na mesma linha de decisão de que, não configurando propaganda negativa, não se atrai a proibição do impulsionamento, acompanho o parecer ministerial, tanto do Ministério Público de primeiro grau quanto da Procuradoria Regional Eleitoral e divirjo do eminente relator e dou provimento ao recurso da recorrente, para reformar a sentença e julgar improcedente a representação. É como voto Senhor Presidente.

 

O Senhor Desembargador LUIZ TADEU BARBOSA SILVA (Voto Vista Divergente)

 Senhor Presidente,

 Trata-se de recurso eleitoral interposto por ISA JANE MARCONDES contra sentença proferida pelo Juízo da 18ª Zona Eleitoral de Dourados (ID 12566411) que, na representação por suposta prática de propaganda eleitoral irregular ajuizada por ALAN AQUINO GUEDES DE MENDONÇA, julgou procedente o pedido, condenando a recorrente ao pagamento de multa no valor de R$ 5.000,00, com fundamento no art. 57-C, §§ 2º e 3º, da Lei nº 9.504/2019 c/c art. 28, § 5º, da Resolução nº 23.610/2019.

A recorrente, Isa Jane Marcondes Nantes, argumenta que suas manifestações políticas, consideradas propaganda negativa, não extrapolaram os limites da liberdade de expressão, sendo críticas fundamentadas em fatos já divulgados pela imprensa local e em situações vivenciadas pela população. Ademais, defende que a decisão de origem desconsiderou precedentes do TSE que garantem a proteção da liberdade de crítica política no debate democrático.

A sentença fundamentou-se no entendimento de que o impulsionamento de conteúdo nas redes sociais deve restringir-se à promoção das qualidades do próprio candidato, conforme disposto no artigo 57-C, § 3º, da Lei n.º 9.504/97 e artigo 28, § 7º-A, da Resolução TSE n.º 23.610/2019. No caso concreto, foi constatado que o conteúdo impulsionado pela representada Isa Jane Marcondes Nantes configurou propaganda eleitoral negativa, contendo críticas à gestão do adversário, o que é vedado pela legislação eleitoral. A prática foi considerada violação às normas que visam assegurar um debate eleitoral propositivo, resultando na imposição de multa de R$ 5.000,00 e confirmação da ordem de exclusão permanente da postagem.

Após o exame minucioso dos autos, bem como da jurisprudência consolidada do Tribunal Superior Eleitoral, especialmente no tocante à interpretação das normas que regem a propaganda eleitoral, verifico que a matéria exige uma análise com enfoque na distinção entre propaganda negativa proibida e crítica política legítima, essa última sendo essencial ao debate democrático.

Em que pese o voto do relator, entendo de modo diverso.

A jurisprudência do TSE, de forma consistente, já se manifestou sobre a necessidade de distinguir propaganda eleitoral negativa - a qual visa atacar a pessoa do candidato adversário, ferindo sua honra e imagem ou utilizando informações falsas - de críticas legítimas a atos de gestão pública.

Embora a propaganda impugnada contenha críticas à gestão do candidato Alan Guedes, tais críticas não ultrapassam os limites da liberdade de expressão e da crítica política, conforme assegurado pela Constituição Federal e pela legislação eleitoral. Destaca-se que o conteúdo analisado não se configura como propaganda eleitoral negativa qualificada, pois não apresenta fatos sabidamente inverídicos ou descontextualizados de forma grave. Dessa forma, conclui-se que as críticas, ainda que incisivas, integram o debate eleitoral legítimo e funcionam como recurso retórico válido para a apresentação de propostas, dentro dos limites permitidos pelo ordenamento jurídico.

Lembra-se que a tutela repressiva da Justiça Eleitoral sobre a prática de propaganda eleitoral irregular deve necessariamente observar - sob o manto da ordem constitucional vigente - as liberdades de expressão e de manifestação de pensamento.

Assim, em respeito aos princípios da intervenção mínima e da preponderância da liberdade de expressão, o entendimento do TSE reconhece que "as críticas políticas, ainda que duras e ácidas, ampliam o fluxo de informações, estimulam o debate sobre os pontos fracos dos possíveis competidores e de suas propostas e favorecem o controle social e a responsabilização dos representantes pelo resultado das ações praticadas durante o seu mandato" (REspe nº 0600057-54/MA, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJe de 22.6.2022).

 O conteúdo, embora crítico, encontra-se dentro do âmbito da liberdade de expressão e do direito à informação, ambos amparados pela Constituição Federal. Ademais, não há nos autos indícios de que a publicação tenha distorcido fatos ou promovido ataques pessoais, limitando-se a tratar de práticas administrativas da gestão anterior e suas respectivas consequências. Tal conteúdo, portanto, está em conformidade com a jurisprudência e não ultrapassa os limites da crítica política legítima.

Na espécie, não é possível verificar excessos no exercício do direito de liberdade de expressão, porquanto "a interpretação de texto não pode incidir em extrapolação, redução ou contradição e deve considerar o contexto e os pressupostos que decorrem diretamente do discurso", de modo que "suposições e inferências que decorrem do universo cognitivo do destinatário do discurso não podem ser consideradas como elementos suficientes a atrair a sanção prevista em norma legal" (R-Rp nº 989-51/DF, Rel. Min. Henrique Neves, DJe de 23.8.2010, g.n.). E mais:

"Não se podem considerar referências interpretativas como degradante e infamante. Não ultrapassado o limite de preservação da dignidade da pessoa, é de se ter essa margem de liberdade como atitude normal na campanha" (Rp 2409-91/DF, Rel. designada Min. Cámen Lucia, PSESS de 25.8.2010).

Outro enfoque que poderia se colocar é que também é considerada propaganda negativa aquela que visa atacar a pessoa do adversário, que fira a honra e a imagem, ou contenha informações não verdadeiras. Diferente é a crítica a atos administrativos ou ideologias seguidas ou a linhas de pensamentos dos adversários, e que são combatidas. A doutrina já segue esse entendimento:

"Respeitando os limites impostos pela legislação vigente que impede a veiculação de ofensas à honra e imagem, bem como informações não verdadeiras, não há que se abandonar a crítica política, característica da propaganda negativa, nem mesmo frente à oposição a este instrumento e aos apelos à moralização da campanha política. A campanha eleitoral não é um encontro de amigos para tratar de amenidades. Ao contrário, é o momento para desnudar todas as propostas apresentadas e descortinar o véu da ignorância sobre atributos e condutas de certos candidatos, evitando com isso que a sociedade amargue um longo período de desassossegos, dissabores e retrocessos.

(...) A despeito das mazelas que a divulgação de fatos relacionados, especialmente, às pessoas públicas, pode ocasionar em termos de disputa eleitoral, é preciso dizer que a propaganda eleitoral negativa não deve ser encarada apenas como uma técnica empregada pelos candidatos para desconstruir o adversário e suas propostas. É antes de tudo um direito do eleitor alicerçado na Constituição Federal, representado pelo princípio da liberdade de expressão e de informação anteriormente já abordado.” (Prezotto, Mauro Antonio. Propaganda eleitoral negativa como instrumento de convencimento do eleitor. In: Fux, Luiz; Pereira, Luiz Fernando Casagrande; Agra, Walber de Moura (Coord.); Peccinin, Luiz Eduardo (Org.). Belo Horizonte: Fórum, 2018. p.47/48).

Também penso como o Ministro Ayres Britto, que, numa histórica decisão no STF, assim se pronunciou:

 

"O pensamento crítico é parte integrante da informação plena e fidedigna. O possível conteúdo socialmente útil da obra compensa eventuais excessos de estilo e da própria verve do autor. (...).

 

"(...) a cabeça do art. 220 da Constituição veda qualquer cerceio ou restrição à concreta manifestação do pensamento (vedado o anonimato), bem assim todo cerceio ou restrição que tenha por objeto a criação, a expressão e a informação, seja qual for a forma, o processo, ou o veículo de comunicação social. Com o que a Lei Fundamental do Brasil veicula o mais democrático e civilizado regime da livre e plena circulação das ideias e opiniões, assim como das notícias e informações, mas sem deixar de prescrever o direito de resposta e todo um regime de responsabilidades civis, penais e administrativas. Direito de resposta e responsabilidades que, mesmo atuando a posteriori, infletem sobre as causas para inibir abusos no desfrute da plenitude de liberdade de imprensa." :

 

Com o mesmo enfoque, trago o pensamento do Ministro Celso de Mello, também em voto proferido no Pretório Excelso, sobre o direito de crítica, este relacionado à imprensa, mas que se amolda ao caso concreto:

 

"A crítica que os meios de comunicação social dirigem às pessoas públicas, por mais dura e veemente que possa ser, deixa de sofrer, quanto ao seu concreto exercício, as limitações externas que ordinariamente resultam dos direitos de personalidade. Não induz responsabilidade civil a publicação de matéria jornalística cujo conteúdo divulgue observações em caráter mordaz ou irônico ou, então, veicule opiniões em tom de crítica severa, dura ou, até, impiedosa, ainda mais se a pessoa a quem tais observações forem dirigidas ostentar a condição de figura pública, investida, ou não, de autoridade governamental, pois, em tal contexto, a liberdade de crítica qualifica-se como verdadeira excludente anímica, apta a afastar o intuito doloso de ofender. Jurisprudência. Doutrina. O STF tem destacado, de modo singular, em seu magistério jurisprudencial, a necessidade de preservar-se a prática da liberdade de informação, resguardando-se, inclusive, o exercício do direito de crítica que dela emana, por tratar-se de prerrogativa essencial que se qualifica como um dos suportes axiológicos que conferem legitimação material à própria concepção do regime democrático. Mostra-se incompatível com o pluralismo de ideias, que legitima a divergência de opiniões, a visão daqueles que pretendem negar, aos meios de comunicação social (e aos seus profissionais), o direito de buscar e de interpretar as informações, bem assim a prerrogativa de expender as críticas pertinentes. Arbitrária, desse modo, e inconciliável com a proteção constitucional da informação, a repressão à crítica jornalística, pois o Estado – inclusive seus Juízes e Tribunais – não dispõe de poder algum sobre a palavra, sobre as ideias e sobre as convicções manifestadas pelos profissionais da Imprensa."

 

Quando a legislação estabelece que não pode ser permitido o impulsionamento de propaganda negativa, deve-se interpretar a norma de forma teleológica, ou seja, buscando o fim para o qual foi elaborada e o que se buscou combater. É necessário lembrar quais são os princípios que baseiam a propaganda eleitoral: liberdade, legalidade, veracidade das informações, isonomia e liberdade de expressão.

Trazendo esses parâmetros e novamente analisando a publicação atacada, o que se verifica é que se trata de uma publicação que apresenta fatos ocorridos na gestão anterior, o respectivo vídeo simplesmente narra fatos a respeito da falta de papel higiênico no hospital da vida de Dourados, fato que é de interesse comum da sociedade de Dourados, com a seguinte transcrição:

 

“Povo Douradense, to aqui na frente do hospital da vida hoje. Hoje o hospital da vida chega dá tristeza e vontade de chorar. Aí tá faltando tudo porque? Porque não tem gestão! A cidade não tem gestão! Esse atual prefeito não tem gestão! Eu Isa Marcondes eleita por vocês eu vou fiscalizar eu vou fiscalizar baixo pra cima tudo dentro desse hospital porque eu já avisei eles eu não tenho medo porque eles têm que dar o nosso básico até o nosso básico sumiu desapareceu nem papel higiênico tem no hospital da vida. Isa Marcondes 10222 e Marçal Filho para prefeito 45 segura.”

 

As informações apresentadas não são falsas, descontextualizadas ou manipuladas, mas diretas. O conteúdo limita-se a informar dados relativos à gestão de Alan Guedes, com caráter eminentemente político.

Sobre o tema, é necessário registrar que é possível localizar vários posicionamentos jurisprudenciais, contudo a mais recente posição do TSE é de que para a caracterização de propaganda negativa se faz necessária a desqualificação direta de candidato ou divulgação de fato inverídico que prejudique sua honra (TSE, REsp Eleitoral n.º 060040842, Min. Benedito Gonçalves, DJE 11/06/2024).

No caso, o conteúdo impulsionado pela recorrente Isa Jane Marcondes, ainda que crítico à gestão pública, não qualifica a pessoa de Alan Aquino Guedes de Mendonça, nem divulga fato inverídico. Trata-se de uma crítica legítima à gestão pública realizada no exercício da liberdade de expressão, algo plenamente permitido no contexto do debate político. A jurisprudência eleitoral é clara ao estabelecer que a crítica política, desde que não atinja a honra ou a imagem do adversário e não contenha informações falsas, não configura propaganda eleitoral negativa.

Neste mesmo sentido os julgados do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (Acórdão nº 65.046, Rel. Des. Anderson Ricardo Fogaça, de 16.10.2024) e do Tribunal Superior Eleitoral (RP n° 143175/DF, ReI. Min. Admar Gonzaga Neto, PSESS de 2/10/2014).

E, inclusive, este Colegiado já se debruçou sobre a matéria, no julgamento do RE n.º 0600046-23.2024.6.12.0044, Rel. Des. Sideni Soncini Pimentel, julgado em 1.º.10.2024, por unanimidade, tendo firmado o seguinte entendimento sobre o tema:

RECURSO ELEITORAL. PROPAGANDA ELEITORAL. IMPULSIONAMENTO DE CONTEÚDO EM REDES SOCIAIS. ALEGAÇÃO DE PROPAGANDA NEGATIVA. LIBERDADE DE EXPRESSÃO E CRÍTICA POLÍTICA. NÃO CONFIGURAÇÃO DE PROPAGANDA IRREGULAR. DESPROVIMENTO.

1. O impulsionamento de conteúdo eleitoral nas redes sociais é permitido pela legislação, desde que tenha como objetivo a promoção de candidatas ou candidatos, sendo vedada a propaganda negativa, conforme disposto no art. 29, § 3.º da Resolução TSE n.º 23.610/2019.

2. A crítica política, ainda que contundente ou veemente, integra o debate democrático e é protegida pela liberdade de expressão. Não caracteriza propaganda eleitoral negativa quando baseada em fatos verídicos e sem distorção ou manipulação da realidade.

3. Para que se configure a propaganda eleitoral negativa irregular, é necessária a presença de elementos que demonstrem a intenção de denegrir a imagem do adversário com base em informações falsas, descontextualizadas ou manipuladas, o que não se verifica no simples exercício da crítica política.

4. Jurisprudência consolidada do Tribunal Superior Eleitoral reconhece que a veiculação de críticas políticas, mesmo que ácidas, faz parte do processo democrático, desde que observados os limites da legalidade.

5. Recurso desprovido. Sentença mantida.

 

Neste contexto, a crítica dirigida a Alan Aquino Guedes de Mendonça,  ao relacioná-lo a fatos de sua gestão, não configura propaganda eleitoral negativa. Isso porque não há desqualificação pessoal nem divulgação de fatos inverídicos, mas, sim, um questionamento legítimo de uma situação de interesse público. Trata-se, portanto, de uma crítica especialmente qualificada, que busca trazer ao debate político questões relevantes sobre a administração pública, sem ultrapassar os limites da ética e da veracidade.

Conclui-se que o conteúdo impulsionado pela recorrente Isa Jane Marcondes, ao criticar Alan Guedes, não ultrapassou os limites da liberdade de expressão nem caracterizou propaganda eleitoral negativa.

Posto isso, com o parecer, divirjo do voto do relator; conheço e dou provimento ao recurso interposto por Isa Jane Marcondes, para reformar a sentença de primeiro grau e julgar improcedente a representação.

 

O Senhor Juiz VITOR LUÍS DE OLIVEIRA GUIBO

Senhor Presidente, acompanho o relator. 

 

O Senhor Juiz MÁRCIO DE ÁVILA MARTINS FILHO 

Senhor Presidente,  como já dito pelos outros colegas, nobres pares, este assunto já foi debatido exaustivamente esta semana e inclinei meu posicionamento na linha do relator.

Estou acompanhando o relator neste caso novamente, fazendo, mais uma vez, uma ressalva por se tratar de impulsionamento, não pelo conteúdo da manifestação.

De forma alguma, estamos aqui tolhendo a livre manifestação ou qualquer tipo de censura, mas por se tratar de impulsionamento, como muito bem apontou o relator, o artigo 57-C estabelece que os impulsionamentos devem ser estritamente propositivos. Eles não têm o caráter de propaganda negativa, como está previsto na resolução do TSE. Por essas razões, Senhor Presidente acompanho o relator. 



EXTRATO DA ATA - DECISÃO

 

Conforme consta na ata de julgamentos, a DECISÃO foi a seguinte:

Por maioria de votos e contrariando o parecer ministerial, este Tribunal Regional negou provimento ao recurso, mantendo incólume a sentença que julgou procedente a representação e aplicou a penalidade de multa, nos termos do voto do relator. Ficaram vencidos o 2º vogal (Dr. Fernando Bonfim Duque Estrada) e o 3º vogal (Desembargador Luiz Tadeu Barbosa Silva).

Presidência do Exmo. Desembargador CARLOS EDUARDO CONTAR.

Relator(a), o(a) Exmo(a) Juiz(a) FERNANDO NARDON NIELSEN.

Procurador(a) Regional Eleitoral Substituto, o(a) Exmo(a). Dr(a). SÍLVIO PETTENGILL NETO.

Tomaram parte no julgamento, além do(a) relator(a), o(a)(s) Exmo(a)(s). Senhor(a)(es)(s) Juízes: Desembargador LUIZ TADEU BARBOSA SILVA (Membro Substituto), VITOR LUÍS DE OLIVEIRA GUIBO, MÁRCIO DE ÁVILA MARTINS FILHO  (Membro Substituto)  , FERNANDO NARDON NIELSEN, ALEXANDRE ANTUNES DA SILVA e FERNANDO BONFIM DUQUE ESTRADA (Membro Substituto).

Sala das Sessões do Tribunal Regional Eleitoral.

Em Campo Grande, MS, 24 de janeiro de 2025.

HARDY WALDSCHMIDT, Secretário da Sessão