JUSTIÇA ELEITORAL
TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DE MATO GROSSO DO SUL

 

RECURSO ESPECIAL ELEITORAL no(a) AIJE  nº  0601998-43.2022.6.12.0000 
PROCEDÊNCIA:  Campo Grande -  MATO GROSSO DO SUL
 
RECORRENTE: WALTER BENEDITO CARNEIRO JUNIOR
ADVOGADO: IGOR DE MELO SOUSA - OAB/MS19143
ADVOGADO: ELITON CARLOS RAMOS GOMES - OAB/MS0016061
RECORRIDO: CAMILA BAZACHI JARA MARZOCHI
ADVOGADO: VINICIUS CARNEIRO MONTEIRO PAIVA - OAB/MS14445-A
ADVOGADO: ALEXANDRE JANOLIO ISIDORO SILVA - OAB/MS15656
ADVOGADO: PABLO COSTA DIAS HOLLSBACK OTA - OAB/MS23801
FISCAL DA LEI: PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL DO MATO GROSSO DO SUL

 

DECISÃO

 

Trata-se de recurso especial interposto por WALTER BENEDITO CARNEIRO JUNIOR de acórdão deste Tribunal Regional Eleitoral, cuja ementa restou redigida com o seguinte teor:

 

ELEIÇÕES 2022 – AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL – ABUSO DE PODER ECONÔMICO – USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO – UTILIZAÇÃO DE IMPULSIONAMENTO EM REDES SOCIAIS – CONDUTA LÍCITA – AUSÊNCIA DE PROVAS DO ILÍCITO ELEITORAL – GRAVIDADE NÃO CONFIGURADA – IMPROCEDÊNCIA.

O abuso de poder configura-se quando a normalidade e a legitimidade do pleito são comprometidas por atos ilícitos que beneficiem candidaturas, em manifesto desvio de finalidade.

Por sua vez, o uso indevido de meios de comunicação, tradicionalmente, caracteriza–se pela exposição midiática desproporcional de candidato. A compreensão se amolda ao paradigma da comunicação de massa (um–para–muitos), marcado pela concentração do poder midiático em poucos veículos com particular capacidade de influência sobre a sociedade.

Em sede de Ação de Investigação Judicial Eleitoral por abuso de poder político e/ou econômico e uso indevido de meio de comunicação social, a gravidade é elemento típico das práticas abusivas, que se desdobra em um aspecto qualitativo (alto grau de reprovabilidade da conduta) e outro quantitativo (significativa repercussão em um determinado pleito). Seu exame exige a análise contextualizada da conduta, que deve ser avaliada conforme as circunstâncias da prática, a posição das pessoas envolvidas e a magnitude da disputa. Precedentes do TSE.

No caso, a candidata requerida fez uso de impulsionamento de publicações propositivas em suas redes sociais, dentro das normas de regência, pois não há qualquer vedação na legislação eleitoral acerca de impulsionamento de propaganda eleitoral na véspera da eleição, nos termos do art. 39, § 5.º, IV, da Lei n. 9.504/1997, e arts. 5.º e 87, ambos da Resolução TSE n. 23.610/2019.

A exposição excessiva apta a ensejar a procedência da AIJE por uso indevido de meio de comunicação social não pode ser presumida com base nas impressões (número de vezes que um anúncio apareceu em uma tela) e alcance potencial (estimativa do tamanho do público que se qualifica para o anúncio) apontados pela rede social, uma vez que conclusão em sentido contrário faria que qualquer propaganda negativa impulsionada ensejasse a grave sanção de inelegibilidade e cassação de eventual registro ou mandato, dada a dinâmica dos serviços de impulsionamento, sem contar a possibilidade de enfrentamento de propaganda eleitorais negativas impulsionadas por meio da representação eleitoral prevista no art. 96, da Lei de Eleições.

A gravidade, nessas situações, deve ser aferível quantitativamente pelo número excessivo de compartilhamentos, comentários, bem como a contabilização de grande número de expectadores em transmissões síncronas, em situações de publicações tais quais já utilizadas pelo TSE em decisões paradigmas.

Não se verifica desequilíbrio de forças em decorrência da utilização regular de ferramenta de impulsionamento de conteúdo feito dentro dos limites e formas impostos pela legislação de regência, afastando-se também o alegado uso indevido dos meios de comunicação.

Ação de Investigação Judicial Eleitoral julgada improcedente.

 

Em suas razões, o recorrente alega que a "Recorrida pretendeu interferir na lisura das eleições gerais de 2022, especialmente nas eleições para os cargos de deputados e deputadas federais do Estado de Mato Grosso do Sul, fazendo o uso indevido dos meios de comunicações e abusando de seu poder econômico", tendo em vista que, "conforme documentos, anexos, a Recorrida postou, nas redes sociais Facebook e Instagram, 36 novos anúncios simultâneos com potencial de atingirem 2 milhões de pessoas, das quais 1,9 milhão estariam situadas no Estado de Mato Grosso do Sul, enquanto todos os demais candidatos, ema tenção ao quanto estabelecido pela legislação eleitoral, já tinha cessado suas propagandas eleitorais pagas na internet".

 

Afirma que "a propaganda eleitoral veiculada gratuitamente na internet não se submete à vedação temporal de veiculação estabelecida pelo caput da Resolução TSE n. 23.610/2019", pois "o TSE, quando da edição da Resolução TSE n. 23.610/2019 escreveu menos do que queria dizer", e que, atualmente, ''a Resolução TSE n. 23.732/2024 incluiu o §11º no art. 29 da Resolução TSE n. 23.610/2019, o qual estabelece que é vedada a circulação paga ou impulsionada de propaganda eleitoral na internet nas 48 horas antes e nas 24 horas depois do pleito eleitoral".

 

Pretende, dessa forma, "demonstrar que desde 2019 o que pretendia o TSE era proibir a veiculação paga ou impulsionada de propaganda eleitoral na internet nas 48 horas antes e nas 24 horas depois do pleito eleitoral".

 

Aduz, ainda, que "a Recorrida não somente utilizou indevidamente os meios de comunicação digitais disponíveis, extrapolando o termo final para divulgação de propaganda eleitoral paga na internet, como também, intencionalmente, reservou recursos para esse fim específico, despendendo 15% de todo o seu gasto com impulsionamento somente na véspera da eleição".

 

Ao final, requer "que seja reformado o acórdão proferido pelo TRE/MS, julgando-se procedentes os pedidos formulados na ação de investigação judicial eleitoral, a fim de que seja reconhecido o uso indevido dos meios de comunicação e o abuso de poder econômico perpetrados pela Recorrida, a qual deverá, nos termos do inciso XIV do art. 22 da LC 64/90 ser declarada inelegível pelo prazo de 8 anos e ter seu registro cassado, nos termos da fundamentação acima exposta".

 

É o relatório.

 

Decido.

 

Na análise do recurso especial, necessário se faz a verificação dos requisitos de admissibilidade.

 

A publicação do acórdão se deu na data de 16/04/2024; sendo o recurso especial interposto no dia 19/04/2024, resta configurada a sua tempestividade.

 

Verifica-se que o recurso se apresenta em sua devida forma, sendo interposto juntamente com as razões recursais, sendo cabível a sua utilização na forma do art. 276, do Código Eleitoral, para buscar a irresignação contra o acórdão proferido por este Regional.

 

Sendo a recorrente parte na lide que ora se apresenta, resta integralmente caracterizado o seu interesse recursal.

 

Também se faz presente o interesse recursal, haja vista a sucumbência sofrida pela parte que sofre os efeitos desfavoráveis do julgamento desta Corte Eleitoral.

 

Denota-se, do acórdão objurgado, que a matéria suscitada foi debatida na decisão recorrida. Dessarte, entende-se preenchido o indispensável requisito do prequestionamento.

 

Ainda que o apelo especial seja cabível na hipótese, é necessário que atenda à comprovação dos requisitos específicos do aventado recurso.

 

Pela leitura do acórdão recorrido tem-se que este Tribunal analisou de forma escorreita todos os argumentos trazidos pelo recorrente, como bem se pode observar do excerto do voto a seguir transcrito:

 

Contudo, a gravidade, elemento indispensável para configuração do ilícito ora sob análise, diferentemente da decisão acima colacionada, no caso dos autos, não foi materializada, o que responde a segunda pergunta.

Isso porque, aqui, houve o impulsionamento regular de conteúdo propositivo, que não possui qualquer vedação legal ou precise de qualquer reprimenda desta Especializada nem mesmo em se tratando de representações eleitorais por propaganda irregular, nos termos do art. 96 da Lei de Eleições.

Nesse ponto, cumpre dizer que  o art. 57-C, caput e § 3.º da Lei n. 9.504/1997 veda o impulsionamento de qualquer propaganda negativa na internet, sendo devida a aplicação de multa pelo seu descumprimento.

[...]

E nem mesmo a tese de impulsionamento excessivo de propaganda, a ser verificada por impressões e alcance em ferramenta tecnológica das redes sociais é suficiente para conclusão diversa, pois realizada dentro dos estritos termos das normas de regência.

É como já decidiu este Regional:

 (...) In casu, verifica-se que o candidato recorrido utilizou-se de impulsionamento para alavancar as publicações com propaganda eleitoral negativa em desfavor do candidato da Coligação recorrente. À luz de precedentes do TSE, é de rigor a imposição da multa prevista no § 2º do art. 57-C da Lei nº 9.504/1997 se a propaganda eleitoral por meio de impulsionamento de conteúdo na internet tiver o objetivo de criticar candidatos a cargo eletivo. Vedação expressa no art. 29, § 3º, da Resolução TSE nº 23.610/2019. Se da ferramenta biblioteca de anúncios da rede social facebook é possível verificar que cada uma das publicações impulsionadas teve alto número de impressões  (número de vezes que um anúncio apareceu em uma tela), é justificável a imposição da multa em valor acima do mínimo legal.  Recurso provido, em parte. Multa de R$ 10.000,00 aplicada3.

A exposição excessiva não pode ser presumida com base nas impressões (número de vezes que um anúncio apareceu em uma tela) e alcance potencial (estimativa do tamanho do público que se qualifica para o anúncio) apontados pela rede social facebook, uma vez que conclusão em sentido contrário faria que qualquer propaganda negativa impulsionada ensejasse a grave sanção de inelegibilidade e cassação de eventual registro ou mandato, dada a dinâmica dos serviços de impulsionamento. A gravidade, nessas situações, deve ser aferível objetivamente pelo número excessivo de compartilhamentos de notícias falsas, comentários, bem como a contabilização de grande número de expectadores em transmissões síncronas, tais quais apontadas pelo TSE na decisão colegiada paradigma.

[...]

No caso, a candidata requerida fez uso de impulsionamento de publicações propositivas em suas redes sociais, dentro das normas de regência, pois não há qualquer vedação na legislação eleitoral acerca de impulsionamento de propaganda eleitoral na véspera da eleição, nos termos do art. 39, § 5.º, IV da Lei n. 9.504/1997 e arts. 5.º e 87 da Resolução TSE n. 23.610/2019.

Aqui, a despeito de a candidata utilizar cerca de R$ 93.000 (noventa e três mil reais) para tal estratégia de propaganda, da simples consulta à página do divulgacandcontas, denota-se que tal montante equivale a apenas 11% (onze por cento) de todas as suas despesas de campanha, não se verificando desequilíbrio de forças em decorrência da utilização regular de ferramenta de impulsionamento de conteúdo, sobretudo porque feito dentro dos limites e formas impostos pela legislação de regência, afastando-se também o alegado uso indevido dos meios de comunicação.

Afinal, nada obstante o parágrafo único do art. 5º da Resolução do TSE n. 23.610/19, dispositivo que tem suas raízes do art. 240 do Código Eleitoral, estabeleça que a proibição de propaganda eleitoral desde 48 (quarenta e oito) horas antes até 24 (vinte e quatro) horas depois da eleição não se aplica à veiculada gratuitamente na internet, relativamente à propaganda paga - que é o caso dos autos -, remete seja observado o disposto no art. 87, IV da mesma norma de regência, segundo o qual o impulsionamento de publicação de conteúdos - cuja ferramenta é, por natureza, onerosa - somente é proibida no dia do pleito. Inteligência do art. 39, § 5º, IV, da Lei n. 9.504/19975.

 

Como visto, os fundamentos normativos que embasam a decisão objurgada foram devidamente analisados pela Corte, de modo que os argumentos expostos não ensejam a admissibilidade de instauração da requerida instância especial, vez que não logram êxito em convencer sobre a necessária violação dos dispositivos apontados e uma possível reclassificação jurídica dos fatos contidos nos autos.

 

Com efeito, para reverter a conclusão de julgamento seria necessário o revolvimento do conjunto fático-probatório, o que é incabível em sede de recurso especial, com fulcro na súmula n. 24, do TSE.

 

Ante o exposto, nego seguimento ao recurso.

 

Apresentado agravo da presente decisão, proceda-se na forma do art. 279, §§ 3º e 4º, do Código Eleitoral, observada a súmula TSE n. 71.

 

P.R.I. Arquivem-se oportunamente os autos

 

À Secretaria Judiciária para as providências cabíveis.

 

Campo Grande, data da assinatura eletrônica.

 

 

Des. Paschoal Carmello Leandro

                 Presidente