JUSTIÇA ELEITORAL
TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DE MATO GROSSO DO SUL

RECURSO ELEITORAL (11548)  nº  0600494-23.2024.6.12.0035 
PROCEDÊNCIA:  Campo Grande -  MATO GROSSO DO SUL
RECORRENTE: FLAVIO NUNES DE ALMEIDA
ADVOGADO: ANDRESSA NAYARA MOULIE RODRIGUES BASMAGE MACHADO - OAB/MS12529
ADVOGADO: LEONARDO BASMAGE PINHEIRO MACHADO - OAB/MS11814
RECORRIDO: MINISTERIO PUBLICO ELEITORAL
RELATOR: JUIZ FERNANDO BONFIM DUQUE ESTRADA (Membro Substituto)

 

 

EMENTA – RECURSO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2024. DERRAMAMENTO DE SANTINHOS. PROPAGANDA IRREGULAR. ARTIGO 19, § 7º, DA RESOLUÇÃO N° 23.610/2019 E ARTIGO 37 DA LEI N° 9.504/97. RESPONSABILIDADE DO CANDIDATO. IRREGULARIDADE. CONFIGURAÇÃO. SANÇÃO. DOSIMETRIA. REDUÇÃO DA MULTA PARA O MÍNIMO LEGAL. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

A propaganda irregular de derramamento de santinhos, por ocorrer geralmente nas vésperas ou na madrugada do dia do pleito, possui o condão de influenciar ilicitamente a vontade do eleitor na votação, além de causar evidente degradação higiênica e estética. A conduta é vedada e sancionada com multa nos termos do art. 19, § 7º, da Resolução TSE nº 23.610/2019.

O ilícito de derrame de santinhos possui características próprias e, portanto, parâmetros específicos de responsabilização a fim de resguardar a razão de ser da norma. A jurisprudência, ao fixar tais parâmetros entendeu pela desnecessidade de comprovação do conhecimento prévio e prescindibilidade de notificação prévia para a retirada da propaganda.

Para a consumação da propaganda eleitoral irregular, a legislação eleitoral não exige a comprovação de apreensão de uma quantidade mínima de material de divulgação, sendo que a quantidade de material derramado tem importância para fins de dosimetria da penalidade a ser aplicada e não propriamente para a caracterização do ilícito.

É de responsabilidade do candidato, partido ou da coligação a produção, posse, guarda, distribuição e as destinações das sobras de seus materiais de campanha, nos termos do que dispõem o artigo 38, da Lei nº 9.504/97 e artigo 241, caput e Parágrafo Único, do Código Eleitoral.

No que se refere a redução da multa, este Juízo, levando em conta a capacidade econômica do recorrente, acolhe o pedido para fixar a multa em R$ 2.000,00 para cada uma das 9 escolas descritas na inicial. 

Recurso parcialmente provido.

 
ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Juízes deste Tribunal Regional Eleitoral, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, que ficam fazendo parte integrante desta decisão colegiada, À unanimidade de votos e em parte com o parecer ministerial, este Tribunal Regional deu parcial provimento ao recurso, para reformar a sentença, apenas para reduzir a multa para o mínimo legal, nos termos do voto do relator.

Sala das Sessões do Tribunal Regional Eleitoral.

Em Campo Grande, MS, 12/11/2024.

Juiz FERNANDO BONFIM DUQUE ESTRADA (Membro Substituto), Relator.

 

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por Flávio Nunes de Almeida contra a sentença proferida pelo Juízo da 53ª Zona Eleitoral de Campo Grande/MS que julgou procedente a representação formulada pelo Ministério Público Eleitoral em desfavor do recorrente, em razão da prática de propaganda eleitoral irregular mediante o derramamento de material de campanha (santinhos).

Consta da petição inicial:

“chegou ao conhecimento desta Promotoria Eleitoral, por meio de vistoria in loco e da documentação encaminhada pela Polícia Militar, que o Representado promoveu, por meio de seus apoiadores, propaganda irregular, consistente em derrame de santinhos nas imediações de locais de votação deste Município, conforme documentos anexos que comprovam a irregularidade, a saber: 1) E. E. Blanche dos Santos Pereira, localizada na Rua Tabira, n. 911, bairro Tijuca; 2) E. E. Prof. Neyder Suelly Costa Vieira, localizada na Rua Marco Aurélio Beier, n. 100, bairro Aero Rancho; 3) E. E. Manoel Bonifácio Nunes da Cunha, localizada na Rua Itaóca, n. 196, bairro Jardim Tarumã; 4) E. E. 11 de Outubro, localizada na Rua Pôrto Batista, n. 29, bairro Jardim Bonança; 5) E. M. Prof. Plínio Mendes dos Santos, localizada na Rua Barra Mansa, n. 327, bairro Guanandi; 6) E. E. Dona Consuelo Muller, localizada na Rua Equador, n. 70, bairro Jardim Jacy; 7) E. E. Aracy Eudociak, localizada na Rua Maracatins, n. 696, bairro Tijuca; 8) E. M. Eduardo Olimpio Machado, localizada na Rua Lúcia Martins Coelho, n. 793, bairro Ouro Verde; e; 9) E. E. Prof. Silvio Oliveira dos Santos, localizada na Rua Pedro Soares de Souza, n. 154, bairro Aero Rancho”.

Em razões recursais, o recorrente sustenta a reforma da decisão ao argumento de que a prova é insuficiente para demonstrar o derrame de santinhos alegados, marcadamente porque encontrados materiais de propaganda esparsos e não somente do recorrente/candidato. Em caráter subsidiário, caso mantida a sentença, pugna o recorrente pela redução da pena de multa, uma vez que a R. Sentença não justifica a aplicação da multa acima do mínimo legal, tampouco considera que a capacidade econômica do candidato e a totalidade do débito.

O recorrido apresentou contrarrazões, pugnando pela manutenção da decisão recorrida.

A Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

 É o relatório.

VOTO

O recurso é próprio e tempestivo, razão pela qual deve ser conhecido.

Narra a petição inicial apresentada pelo Ministério Público Eleitoral que o recorrente promoveu, por meio de seus apoiadores, propaganda eleitoral irregular consistente em derrame de santinhos nas imediações dos seguintes locais de votação deste Município, conforme documentos anexos: (1) E. E. Blanche dos Santos Pereira, localizada na Rua Tabira, n. 911, bairro Tijuca; (2) E. E. Prof. Neyder Suelly Costa Vieira, localizada na Rua Marco Aurélio Beier, n. 100, bairro Aero Rancho; (3) E. E. Manoel Bonifácio Nunes da Cunha, localizada na Rua Itaóca, n. 196, bairro Jardim Tarumã; (4) E. E. 11 de Outubro, localizada na Rua Pôrto Batista, n. 29, bairro Jardim Bonança; (5) E. M. Prof. Plínio Mendes dos Santos, localizada na Rua Barra Mansa, n. 327, bairro Guanandi; (6) E. E. Dona Consuelo Muller, localizada na Rua Equador, n. 70, bairro Jardim Jacy; (7) E. E. Aracy Eudociak, localizada na Rua Maracatins, n. 696, bairro Tijuca; (8) E. M. Eduardo Olimpio Machado, localizada na Rua Lúcia Martins Coelho, n. 793, bairro Ouro Verde; e (9) E. E. Prof. Silvio Oliveira dos Santos, localizada na Rua Pedro Soares de Souza, n. 154, bairro Aero Rancho.

A prática do derramamento de santinhos é vedada pelo artigo 37, da Lei nº 9.504/97, já que se subsume à divulgação de propaganda de candidato em bens públicos e de uso comum, pelo artigo 22, IX, da Resolução TSE nº 23.610/2019 e pelo artigo 243, VIII do Código Eleitoral.

O artigo 243, inciso VIII, do Código Eleitoral, estabelece como regra geral que “não será tolerada propaganda: (…) que prejudique a higiene e a estética urbana ou contravenha a posturas municipais ou a outra qualquer restrição de direito”.

Já o artigo 39, § 9º, da Lei nº 9.504/1997, prevê que “a distribuição de material gráfico” será permitida “até as vinte e duas horas do dia que antecede a eleição”.

A Resolução TSE nº 23.6010/2019, por sua vez, regulamentando as normas acima citadas, fixa o seguinte:

“Art. 19. (...)

§ 7º O derrame ou a anuência com o derrame de material de propaganda no local de votação ou nas vias próximas, ainda que realizado na véspera da eleição, configura propaganda irregular, sujeitando-se a infratora ou o infrator à multa prevista no § 1º do art. 37 da Lei nº 9.504/1997, sem prejuízo da apuração do crime previsto no inciso III do § 5º do art. 39 da Lei nº 9.504/1997.

§ 8º caracterização da responsabilidade da candidata ou do candidato na hipótese do § 7º deste artigo não depende de prévia notificação, bastando a existência de circunstâncias que revelem a impossibilidade de a pessoa beneficiária não ter tido conhecimento da propaganda.

§ 8º-A Na hipótese de derrame de material de propaganda no local de votação realizado na véspera ou no dia da eleição, a representação por propaganda eleitoral irregular poderá ser ajuizada até 48 (quarenta e oito) horas após a data do pleito”. (Incluído pela Resolução nº 23.671/2021)

A norma proibitiva de derrame de santinhos “busca coibir a poluição visual, além de evitar a ausência de tratamento isonômico no dia da eleição, bem como busca proteger os idosos e demais transeuntes de possíveis esbarrões e acidentes, dada a multiplicidade de propaganda em vias públicas, esparramadas pelo chão”. (TSE – Recurso Especial Eleitoral nº 379823, Acórdão, Relator Min. Gilmar Mendes, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 14/03/2016)

Fixadas essas balizas, observo, com bem fez o julgador de primeiro grau, que há prova suficiente e robusta do ilícito eleitoral produzida pelo Ministério Público Eleitoral, autor da representação, apta a confirmação da condenação do recorrente.

Os registros fotográficos e termos de constatação, deixam claro que houve:

1.  derrame considerável de santinhos na via pública;

2. que o material de propaganda foi lançado nos locais de votação declinados nos termos de constatação ids 12568913, 12568914, 12568915, 12568916, 12568917, 12568918, 12568919, 12568920 e 12568921, e em suas proximidades (elemento territorial), no dia da eleição ou véspera (elemento temporal).

3. que houve a correta individualização pelo autor da representação do artefato publicitário.

Não merece prosperar a alegação do recorrente acerca da quantidade diminuta de santinhos nas provas trazidas aos autos.

Saliente–se que, para a consumação da propaganda eleitoral irregular, a legislação eleitoral não exige a comprovação de apreensão de uma quantidade mínima de material de divulgação, sendo que a quantidade de material derramado tem importância para fins de dosimetria da penalidade a ser aplicada e não propriamente para a caracterização do ilícito.

Conforme o artigo 40-B da Lei n.º 9.504/97, a representação deverá ser instruída com elementos probatórios de autoria ou do prévio conhecimento do beneficiário da propaganda.

Por outro lado, a jurisprudência do TSE é pacífica no sentido de que a necessidade de comprovação de prévio conhecimento e notificação prévia para retirada da propaganda são prescindíveis, “podendo ser mitigado quando o fato ocorrer na véspera do dia do pleito, a fim de se resguardar o escopo da norma, que é impedir influências no voto do eleitor e desequilíbrio no certame” (Recurso Especial Eleitoral nº 060339818, Acórdão, Relator Min. Jorge Mussi, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 154, Data 12/08/2019).

Ademais, o TSE estabeleceu que é irrelevante a notificação prévia do artigo 37, § 1º, da Lei das Eleições, pois se trata de medida incompatível com a razão de ser da norma, especialmente na hipótese de a propaganda ocorrer na véspera do pleito.

Condicionar a configuração do ilícito à comprovação da autoria direta do ato, ou mesmo sua anuência, de fato, tornaria o dispositivo e a própria tutela desta Justiça Eleitoral ineficaz, já que a remoção posterior ao pleito não afasta os danos já causados ao meio ambiente, ao bem público e à isonomia do pleito.

Desse modo, não merece acolhimento a alegação de ausência de prévia notificação e desconhecimento acerca do derrame de santinhos, quando as circunstâncias e peculiaridades do caso apontam a impossibilidade de o beneficiário não ter tido conhecimento da propaganda irregular.

Por fim, vale lembrar que por força do disposto no artigo 38 da Lei das Eleições e artigo 241, caput e Parágrafo Único do Código Eleitoral, o material de campanha é de responsabilidade do candidato, partido ou coligação que possuem domínio, e, portanto, a responsabilidade, desde sua produção, posse, guarda e distribuição, bem como pelo destino final.

Este Tribunal Regional Eleitoral já julgou caso semelhante, conforme julgado citado na sentença recorrida, que peço vênia para reproduzir:

“RECURSO ELEITORAL. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. DERRAME OU A ANUÊNCIA COM O DERRAME DE MATERIAL DE PROPAGANDA NO LOCAL DE VOTAÇÃO OU NAS VIAS PRÓXIMAS, NO DIA DA ELEIÇÃO. (...). APLICAÇÃO DE APENAS UMA PENALIDADE EM RAZÃO DA CONDUTA CONSISTENTE NO DERRAME DE SANTINHOS EM DOIS LOCAIS, NO MESMO MUNICÍPIO. INVIABILIDADE. INTELIGÊNCIA DO ART. 19, § 7º, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.610/19. APLICAÇÃO DE MULTA PARA CADA UM DOS LOCAIS DE VOTAÇÃO ATINGIDOS. (...). MÉRITO. (...). QUANTIDADE E ELABORAÇÃO DOS SANTINHOS. CIRCUNSTÂNCIAS QUE CARACTERIZAM A RESPONSABILIDADE DA CANDIDATA E DO PARTIDO, QUER SEJA IN ELIGENDO OU IN VIGILANDO. SENTENÇA MANTIDA. DESPROVIMENTO DO RECURSO. (...) 3. Mérito. Houve, no decisum pelo qual se indignam os recorrentes, a avaliação das provas trazidas aos autos, com enfrentamento concreto da matéria, não sendo desacerto judicial deixar de seguir a jurisprudência invocada na defesa dos recorrentes, senão uma demonstração do seu desagrado com o resultado. (...). 9. O material derramado foi impresso sob a responsabilidade do partido político e dos candidatos, e eles têm o dever de cuidar desses artefatos publicitários, dando-lhes a devida destinação após o período em que são permitidos, a fim de evitar que sejam utilizados irregularmente e, especialmente, para que não sejam lançados em desacordo com a legislação de regência. 10. Os santinhos, elaborados pelos candidatos e pelo partido, distribuídos em frente a um local de votação, traduz circunstância que caracteriza a responsabilidade dos candidatos, quer seja in eligendo ou in vigilando. 11. Recurso não provido. Decisão monocrática mantida. (TRE/MS - RE n. 060178889 - Rel. José Eduardo Chemin Cury. Julgado em: 24.10.2022). (grifo nosso)   

quantum da multa é aquele prescrito no § 1º do artigo 37 da Lei nº 9.504/97, ou seja, de R$ 2.000,00 a R$ 8.000,00.

Acolhendo pedido do recorrente, entendo que a multa deve ser aplicada no mínimo legal, no valor de R$ 2.000,00, tendo em vista a condição econômica do recorrente que declarou como único bem material, conforme Sistema Candex, apenas um veículo no valor de R$ 20.000,00; assim como não há notícia de que seja reincidente na prática da referida conduta.  

Ante o exposto, em parte com o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, conheço do recurso e lhe dou parcial provimento para, reformando a sentença proferida pelo Juízo da 53ª Zona Eleitoral de Campo Grande/MS, reduzir a multa imposta ao recorrente para o mínimo legal, R$ 2.000,00 para cada uma das 9 escolas descritas na inicial.

É como voto.


EXTRATO DA ATA - DECISÃO

 

Conforme consta na ata de julgamentos, a DECISÃO foi a seguinte:

À unanimidade de votos e em parte com o parecer ministerial, este Tribunal Regional deu parcial provimento ao recurso, para reformar a sentença, apenas para reduzir a multa para o mínimo legal, nos termos do voto do relator.

Presidência do Exmo. Desembargador CARLOS EDUARDO CONTAR.

Relator(a), o(a) Exmo(a) Juiz(a) FERNANDO BONFIM DUQUE ESTRADA (Membro Substituto).

Procurador(a) Regional Eleitoral, o(a) Exmo(a). Dr(a). LUIZ GUSTAVO MANTOVANI.

Tomaram parte no julgamento, além do(a) relator(a), o(a)(s) Exmo(a)(s). Senhor(a)(es)(s) Juízes: Desembargador LUIZ TADEU BARBOSA SILVA (Membro Substituto), JOSÉ EDUARDO CHEMIN CURY, DJAILSON DE SOUZA (Membro Substituto), VITOR LUÍS DE OLIVEIRA GUIBO e FERNANDO NARDON NIELSEN.

Sala das Sessões do Tribunal Regional Eleitoral.

Em Campo Grande, MS, 12 de novembro de 2024.

HARDY WALDSCHMIDT, Secretário da Sessão.