Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso do Sul

RECURSO ELEITORAL (11548)  nº  0600210-94.2020.6.12.0054 
PROCEDÊNCIA:  Terenos -  MATO GROSSO DO SUL
RECORRENTE: DANIEL RODRIGUES JUNIOR
ADVOGADO: AUREO GARCIA RIBEIRO FILHO - OAB/MS8310
ADVOGADO: ANTONIO ALVES DUTRA NETO - OAB/MS14513-A
RECORRIDO: ORGÃO DE DIREÇÃO MUNICIPAL DO DEMOCRATAS - DEM/TERENOS
ADVOGADO: PEDRO HENRIQUE ARAUJO ROZALES - OAB/MS23635-A
ADVOGADO: MILENA DE BARROS FONTOURA - OAB/MS10847-A
ADVOGADO: KATIANA YURI ARAZAWA - OAB/MS8257-A
ADVOGADO: KENIA PAULA GOMES DO PRADO FONTOURA - OAB/MS11789-A
ADVOGADO: JOSE VALERIANO DE SOUZA FONTOURA - OAB/MS6277-A
RECORRIDO: SEBASTIAO DONIZETE BARRACO
ADVOGADO: PEDRO HENRIQUE ARAUJO ROZALES - OAB/MS23635-A
ADVOGADO: MILENA DE BARROS FONTOURA - OAB/MS10847-A
ADVOGADO: KATIANA YURI ARAZAWA - OAB/MS8257-A
ADVOGADO: KENIA PAULA GOMES DO PRADO FONTOURA - OAB/MS11789-A
ADVOGADO: JOSE VALERIANO DE SOUZA FONTOURA - OAB/MS6277-A

RELATOR: JUIZ RICARDO DAMASCENO DE ALMEIDA

EMENTA

RECURSO EM REPRESENTAÇÃO. ELEIÇÕES 2020. PROPAGANDA IRREGULAR. CRIAÇÃO DE PERFIL FALSO EM REDE SOCIAL FACEBOOK E DISSEMINAÇÃO DE CONTEÚDO ILÍCITO. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 57-D, CAPUT e §§ 2º E 3º, DA LEI Nº 9.504/1997. RECURSO DESPROVIDO.

A Lei nº 9.504/1997 assegura a livre manifestação do pensamento, mas veda a divulgação de conteúdo de cunho eleitoral inverídico e o anonimato durante a campanha eleitoral por intermédio da internet e por outros meios de comunicação interpessoal, sujeitando os responsáveis pela propagação à multa.

Configurada a responsabilidade pela prática de propaganda eleitoral irregular, deve incidir a aplicação da multa do art, 57-D, § 2º, da Lei nº 9.504/1997, cominada acima do mínimo legal, em observância às peculiaridades no caso concreto dada à prática recorrente do representado em criação de perfil falso e disseminação de conteúdo ilícito em rede social.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Juízes deste Tribunal Regional Eleitoral, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, que ficam fazendo parte integrante desta decisão colegiada, À unanimidade de votos e acompanhando o parecer ministerial, este Tribunal Regional negou provimento ao recurso, mantendo in totum a sentença que julgou procedente a representação e aplicou penalidade de multa ao recorrente em face de propaganda irregular com impulsionamento de conteúdo negativo em rede social, nos termos do voto do relator e resolvendo o mérito.

Sala das Sessões do Tribunal Regional Eleitoral.

Em Campo Grande, MS, 28/11/2023.

Juiz RICARDO DAMASCENO DE ALMEIDA, Relator.

 

RELATÓRIO

Trata-se de recurso eleitoral interposto por DANIEL RODRIGUES JÚNIOR contra sentença proferida pelo juízo da 54ª Zona Eleitoral de Campo Grande (ID 12406378), jurisdicionante do município de Terenos, que na representação ajuizada pelo ÓRGÃO DE DIREÇÃO MUNICIPAL DO DEMOCRATAS – DEM/TERENOS e SEBASTIÃO DONIZETE BARRACO em face do recorrente e de JONAS SCHIMIDT DAS NEVES e NAME – CONSULTORIA E ASSESSORIA EMPRESARIAL LTDA., julgou extinta a punibilidade em relação a JONAS em virtude do falecimento, improcedente em relação à NAME CONSULTORIA e procedente em relação ao recorrente, condenando-o ao pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00, confirmando a tutela antecipada para retirada das postagens e do perfil falso em rede social.

Alega que:

i) analisando os prints colacionados verifica-se que as postagens são direcionadas ao recorrido enquanto investigado no cargo de Prefeito, não transbordam para sua esfera particular, portanto não há excesso a ser repreendido;

ii) as manifestações estão acobertadas pelo direito à crítica, ainda que feitas sob anonimato, uma vez que a utilização de um pseudônimo foi necessária para sua proteção;

iii) a multa deve ser reduzida ao mínimo legal em homenagem aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, devendo ser consideradas as circunstâncias de que é trabalhador assalariado, auferindo renda de R$ 3.000,00, além de ser primário e que suas postagens não constituiu fator preponderante para o resultado do pleito.

Ao final, requer o provimento do recurso para julgar improcedente o pleito inicial ou, caso não seja esse o entendimento, pede a redução da multa para o mínimo legal.

Contrarrazões pelo desprovimento do recurso (ID 12406387).

A douta PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL manifestou-se pelo conhecimento e desprovimento do Recursos Eleitorais sub examine, com a consequente manutenção da Sentença ID 12406378 (ID 12408070).

É o relatório.

VOTO

Conforme relatado, trata-se de recurso eleitoral interposto por DANIEL RODRIGUES JÚNIOR contra sentença proferida pelo juízo da 54ª Zona Eleitoral de Campo Grande (ID 12406378), jurisdicionante do município de Terenos, que na representação ajuizada pelo ÓRGÃO DE DIREÇÃO MUNICIPAL DO DEMOCRATAS – DEM/TERENOS e SEBASTIÃO DONIZETE BARRACO em face do recorrente e de JONAS SCHIMIDT DAS NEVES e NAME – CONSULTORIA E ASSESSORIA EMPRESARIAL LTDA., julgou extinta a punibilidade em relação a JONAS em virtude do falecimento, improcedente em relação à NAME CONSULTORIA e procedente em relação ao recorrente, condenando-o ao pagamento de multa no valor de R$ 10.000,00, confirmando a tutela antecipada para retirada das postagens e do perfil falso em rede social.

Conheço do recurso, porque tempestivo e preenche todos os requisitos de admissibilidade.

A representação ajuizada pelo PARTIDO DEMOCRATAS e SEBASTIÃO DONIZETE BARRACO versa sobre propaganda irregular consistente em inserção por meio de perfil falso na rede social Facebook sob a denominação “Paul Resende” (https://www.facebook.com/adolfo.alber.3), sem a identificação do seu responsável.

Pediu a remoção do perfil da rede social em razão de propaganda eleitoral negativa divulgada em perfil falso, bem como a penalização do responsável.

Somente a partir da decisão judicial foram fornecidos os dados completos dos provedores de acesso, possibilitando a identificação de Daniel Rodrigues Júnior, ora recorrente, como criador do perfil falso.

É fato incontroverso nos autos que o recorrente criou o perfil falso “Paul Resende” e impulsionou conteúdo negativo sobre o candidato representante, persuadindo o eleitorado a não votar nele, configurando violação ao art. 57-D, §§ 2º e 3º, da Lei nº 9.504/1997, que estabelece:

Art. 57-D. É livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato durante a campanha eleitoral, por meio da rede mundial de computadores - internet, assegurado o direito de resposta, nos termos das alíneas a, b e c do inciso IV do § 3o do art. 58 e do 58-A, e por outros meios de comunicação interpessoal mediante mensagem eletrônica.

§ 2º A violação do disposto neste artigo sujeitará o responsável pela divulgação da propaganda e, quando comprovado seu prévio conhecimento, o beneficiário à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

§ 3º Sem prejuízo das sanções civis e criminais aplicáveis ao responsável, a Justiça Eleitoral poderá determinar, por solicitação do ofendido, a retirada de publicações que contenham agressões ou ataques a candidatos em sítios da internet, inclusive redes sociais.

Quanto à alegação de que a conduta representa críticas aos problemas da administração do candidato representante enquanto Prefeito do Município de Terenos, tem-se que tal justificativa não prospera, bastando observar os seguintes trechos das postagens realizadas:

“Covid 19, chegou em nossa cidade

1 dama com 1200 no bolso

Porém nosso prefeito já tomou as devidas providências... A foto fala por si...!” Legenda da imagem: pra tomar cachaça o homem apareceu”

Outrossim, o argumento de que foi necessário criar um perfil falso para sua proteção mostra-se completamente desarrazoado, além de ser vedada pela Constituição Federal (art. 5º, inciso IV), bem como na legislação de regência (art. 57-D, caput, da Lei nª 9.50419/97; art. 30, § 1º, da Resolução TSE nº 23.610/2019).

Não se exige que o debate eleitoral seja polido, contudo as eventuais críticas devem se limitar a informações de interesse público, sem teor vexatório, difamatório ou de exortação de outro candidato de forma descontextualizada.

Conforme ressaltado na sentença recorrida (ID 12406378):

Com efeito, com relação aos fatos descritos na representação, bem como os documentos com ela juntados, e ainda as provas produzidas durante a instrução do feito, dentre elas a própria confissão do representado Daniel, denota-se comprovada de forma suficiente a criação de perfil ‘fake’ para disseminar informações, algumas supostamente difamatórias, sem a identificação devida da autoria das postagens, prejudicando a defesa do representante que, sem saber de quem partiam as críticas, não teve como se defender ou contrapor os fatos que em face dele foram postados.

A alegação da defesa de ‘precisar’ criar perfil falso, utilizando pseudônimo, em razão do histórico de agressão do representante a seus críticos, além de sequer ter sido minimamente comprovada, não encontra amparo legal, ao contrário, sendo vedada pela legislação pátria.

Neste ponto, não obstante a liberdade de expressão garantida na Constituição Federal de 1988, a mesma Carta veda o anonimato, no caso dos autos consubstanciado no perfil falso criado pelo representado, traçando os limites necessários para as manifestações de opinião.

A propósito, trago parte do parecer da douta PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL que abordou com muita precisão o tema, cujos fundamentos também adoto como razões de decidir (ID 12408070):

Compulsando as provas acostadas, é indubitável que estamos diante de conteúdo apócrifo, cujo responsável pela criação não estava identificado nas postagens publicadas em rede social, fato que lhe atribui caráter anônimo.

No tocante a esta última característica, o anonimato aqui deve ser compreendido em relação ao responsável pela criação do conteúdo ilícito e não somente de quem o propala.

Diante desse cenário, não há dúvida de que a disseminação foi de conteúdo anônimo, ultrapassando os limites da liberdade de expressão, não podendo ser equiparado às mensagens privadas permitidas pelo art. 33, § 2º, da Resolução TSE n. 23.610/2019.

Ademais, se o conteúdo não ultrapassasse o direito de livre manifestação do pensamento e crítica política, por qual motivo o representado estaria utilizando-se do anonimato? A alegação de que a utilização do pseudônimo foi necessária para sua proteção não afasta a ilegalidade da conduta.

Por conseguinte, a conduta dos recorrentes violou a norma de regência ao compartilharem postagem apócrifa de conteúdo inverídico e atrai a aplicação da penalidade.

Estabelece a Lei nº 9.504/1997:

Art. 57-D.  É livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato durante a campanha eleitoral, por meio da rede mundial de computadores - internet, assegurado o direito de resposta, nos termos das alíneas a, b e c do inciso IV do § 3o do art. 58 e do 58-A, e por outros meios de comunicação interpessoal mediante mensagem eletrônica.

(...)

§ 2o  A violação do disposto neste artigo sujeitará o responsável pela divulgação da propaganda e, quando comprovado seu prévio conhecimento, o beneficiário à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 30.000,00 (trinta mil reais). 

Na hipótese, a penalidade foi aplicada em R$ 10.000,00, patamar que deve ser mantido, não obstante a alegação de falta de condições financeiras do recorrente.

Isso porque, como bem fundamentado pela douta PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL, o recorrente, além da criação do perfil falso e da disseminação de conteúdo ilícito nestes autos, já foi condenado anteriormente pela criação e publicação de conteúdo por meio de perfil denominado “Anderson Delgado” (autos 0600211-79.2020.6.12.0054), de forma que mostra recorrente a prática do representado em utilizar-se do anonimato de forma contrária à legislação (ID 1248070).

Desse modo, deve ser mantida a multa no valor fixado, não havendo circunstâncias que permitam modificar a conclusão da sentença recorrida.

Ante o exposto, acompanhando o parecer da douta PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL, nego provimento ao recurso, mantendo incólume a decisão de ID 12406378 que julgou procedente a representação.

É como voto, Senhor Presidente.

EXTRATO DA ATA - DECISÃO

Conforme consta na ata de julgamentos, a DECISÃO foi a seguinte:

À unanimidade de votos e acompanhando o parecer ministerial, este Tribunal Regional negou provimento ao recurso, mantendo in totum a sentença que julgou procedente a representação e aplicou penalidade de multa ao recorrente em face de propaganda irregular com impulsionamento de conteúdo negativo em rede social, nos termos do voto do relator e resolvendo o mérito.

Presidência do Exmo. Des. PASCHOAL CARMELLO LEANDRO.

Relator(a), o(a) Exmo(a) Juiz(a) RICARDO DAMASCENO DE ALMEIDA.

Procurador(a) Regional Eleitoral, o(a) Exmo(a). Dr(a). LUIZ GUSTAVO MANTOVANI.

Tomaram parte no julgamento, além do(a) relator(a), o(a)(s) Exmo(a)(s). Senhor(a)(es)(s) Juízes: Des. CARLOS EDUARDO CONTAR, JULIANO TANNUS, RICARDO DAMASCENO DE ALMEIDA, JOSÉ EDUARDO CHEMIN CURY, DJAILSON DE SOUZA (Membro Substituto) e SANDRA REGINA DA SILVA RIBEIRO ARTIOLI.

Sala das Sessões do Tribunal Regional Eleitoral.

Em Campo Grande, MS, 28 de novembro de 2023.

HARDY WALDSCHMIDT, Secretário da Sessão