TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DE MINAS GERAIS

 

AGRAVO REGIMENTAL (1321) - Processo nº 0600375-77.2024.6.13.0118 - Governador Valadares - MINAS GERAIS

[Condição de Elegibilidade - Filiação Partidária, Registro de Candidatura - RRC - Candidato, Cargo - Vereador]

RELATOR: VINICIUS DINIZ MONTEIRO DE BARROS

AGRAVANTE: RICARDO FERNANDO PEDROSA

Advogados do(a) AGRAVANTE: EMERSON SILVA KAIZER - MG150250, AMANDA MATTOS CARVALHO ALMEIDA - MG127391, RAIMUNDO CANDIDO NETO - MG98737-A
 

 

DECISÃO MONOCRÁTICA

 

Tratam os autos de agravo interno interposto por RICARDO FERNANDO PEDROSA contra decisão monocrática que manteve o indeferimento do registro de sua candidatura, com fundamento na ausência da condição de elegibilidade pertinente à filiação partidária.

O agravante argumenta que sua filiação ao Avante deve ser reconhecida, pois, embora o Judiciário Eleitoral tenha declarado a impossibilidade de filiação ao PDT, consta do sistema Filia sua filiação a esse partido desde 04/07/2024. Afirma que essa filiação ao PDT teve como consequência sua desfiliação ao Avante. Defende que deve ser desconsiderada sua filiação ao PDT e restabelecida a filiação anterior (Avante). Aponta que o Judiciário Eleitoral revelou comportamento contraditório (venire contra factum proprium), já que a filiação ao PDT em 04/07/2024 ocorreu à sua revelia, por erro do partido, conforme declarado pelo presidente do órgão municipal da agremiação. Alega que sua intenção tinha sido a filiação ao PDT em 04/04/2024, negada pelo Judiciário Eleitoral. Explica que sua filiação ao PDT pode ter sido finalmente aceita pelo sistema por causa do levantamento da restrição à quitação eleitoral, obtida judicialmente. Sustenta, ainda, que é nula sua filiação ao PDT em 04/07/2024, tendo em vista a ausência de seu consentimento. Espera que, sendo reconhecida a nulidade, se restabeleça a filiação ao Avante, independentemente da falta de documentação comprobatória da filiação, pois esta é preexistente à filiação ao PDT. Entende que o caso revela prejuízo à participação do agravado nas eleições e, por conseguinte, à representatividade democrática (ID 72050399).

A Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo não provimento do agravo, reiterando o entendimento manifestado no parecer prévio à decisão recorrida, por reputar que não houve fato novo capaz de alterá-lo (ID 72078057).

É o breve relato.

Decido.

O recurso é próprio e tempestivo.

O recorrente foi intimado da decisão monocrática por meio do mural eletrônico de 16/09/2024 e interpôs o agravo em 19/09/2024. Observado, portanto, o prazo recursal de 3 (três) dias (arts. 258 do Código Eleitoral e 173, § 2º, do RITREMG).

Presentes os demais pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Análise da petição de agravo revela razões suficientes para reconsiderar a decisão monocrática. O recurso veio acompanhado de certidão com a sequência das filiações partidárias do candidato, identificando-se a filiação ao Avante, anterior à filiação ao PDT (ID 72050400).

Com apoio na jurisprudência iterativa do TRE-MG, conheço dos documentos juntados na fase recursal ordinária do procedimento de registro de candidatura:

DIREITO ELEITORAL. AGRAVO INTERNO. REGISTRO DE CANDIDATURA. DRAP. CARGOS DE PREFEITO E DE VICE-PREFEITO. ELEIÇÕES 2024. REGISTRO INDEFERIDO. RECURSO DESPROVIDO. AGRAVO DESPROVIDO.

I. CASO EM EXAME

1. Agravo Interno interposto à decisão monocrática que negou provimento ao Recurso Eleitoral à sentença que indeferiu o Demonstrativo de Regularidade dos Atos Partidários (DRAP) da Coligação.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO

2. Preliminares de nulidade da sentença por violação ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa e por necessidade de reexame de decisão interlocutória em outros autos.

3. Intempestividade da convenção e da apresentação do DRAP.

III. RAZÕES DE DECIDIR

4. Na ausência de impugnação ao DRAP não se aplica o procedimento previsto no art. 40 da Resolução TSE 23.609/2019. Preliminar de nulidade da sentença rejeitada.

5. Impossibilidade de se reexaminar decisões proferidas em outros autos. Compatibilidade entre as decisões a ser analisada no mérito.

6. No julgamento dos registros de candidatura, é possível conhecer de documentos juntados de forma tardia, enquanto não esgotada a instância ordinária.

7. A sentença recorrida indeferiu o DRAP sob os seguintes fundamentos: a) convenção partidária que deliberou pela formação da coligação realizada intempestivamente em 15/8/2024; b) DRAP apresentado intempestivamente em 16/8/2024; c) não observância das formalidades legais.

8. A mudança de posição pelas agremiações na formação das coligações não é vedada pela legislação, desde que sejam respeitados os prazos estabelecidos para a realização das convenções partidárias e para os registros das candidaturas, bem como as próprias normas dos estatutos partidários.

IV. DISPOSITIVO.

9. Agravo desprovido, para manter a decisão que negou provimento ao recurso, para indeferir o DRAP. AGRAVO REGIMENTAL no(a) AR nº060029039, Acórdão, Des. Patricia Henriques Ribeiro, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 30/09/2024.  

O agravante possuía restrição à elegibilidade atinente à quitação eleitoral, conforme relatado na sentença (ID 72003770). É provável que este quadro tenha inviabilizado, em princípio, a efetivação de sua filiação ao PDT com a data de 04/04/2024 – mesma data da ficha de filiação (ID 72003757). A sentença julgou improcedente o requerimento de registro com base unicamente na ausência de filiação ao partido pelo qual o candidato deseja concorrer. Essa a matéria devolvida à apreciação do TRE-MG, pois já não permanecia a ausência de quitação eleitoral quando da prolação da sentença recorrida.

Conforme ID 72003756, um dos motivos para a ausência de quitação eleitoral era a suspensão dos direitos políticos do candidato em razão de condenação criminal transitada em julgado, com extinção da punibilidade em 10/06/2024. Até então, possivelmente o sistema Filia não aceitaria a filiação ao PDT, porque o art. 21-A da Resolução TSE nº 23.596/2019 considera nula a filiação realizada na vigência da suspensão de direitos políticos; se existente outra filiação, fica suspensa:

Art. 21-A. Em caso de suspensão de direitos políticos, a filiação partidária será: (Incluído pela Resolução nº 23.668/2021)

I - nula, se realizada durante o período de suspensão dos direitos políticos; ou (Incluído pela Resolução nº 23.668/2021)

II - suspensa, se for preexistente à suspensão de direitos políticos. (Incluído pela Resolução nº 23.668/2021)

Parágrafo único. Na hipótese do inciso II deste artigo, a filiação voltará a produzir todos os seus efeitos, inclusive para fins de aferição da condição de elegibilidade prevista no inciso V do § 3º do art. 14 da Constituição, na data em que forem restabelecidos os direitos políticos, ainda que a respectiva comunicação à Justiça Eleitoral ocorra em momento posterior. (Incluído pela Resolução nº 23.668/2021)

O outro fundamento para a ausência de quitação teria sido a existência de débito junto à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.

O agravante requer, em síntese, o restabelecimento da filiação partidária anterior – partido Avante – ante sua impugnação à validade da filiação ao PDT com a data de 04/07/2024.

O art. 14, §3.º, V, da CRFB considera a filiação partidária como condição de elegibilidade:

Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: [...]

§ 3º São condições de elegibilidade, na forma da lei: [...]

V – a filiação partidária;

O art. 9.º da Lei nº 9.504/1997 (Lei das Eleições), tratando do tema da filiação partidária, determina que o candidato deverá possuir domicílio eleitoral na circunscrição pelo prazo de seis meses e, nesse mesmo prazo, estar com a filiação deferida pelo partido.

Embora o agravante tenha buscado, inicialmente, o reconhecimento da filiação ao PDT com a data de 04/04/2024, de modo a atender tempestivamente à respectiva condição de elegibilidade, a providência foi negada pelo Judiciário Eleitoral em procedimentos ajuizados pelo candidato (ID 72050399, p. 8). Por fim, o candidato formalizou a desistência quanto a este pleito.

Porém, o PDT lançou a filiação do candidato com a data de 04/07/2024. Em relação a essa inserção no sistema Filia, o agravante alega vício. A própria agremiação reconhece o equívoco e declara que lançou a filiação no sistema sem a autorização do candidato, vez que o intuito deste e do partido era que a filiação ocorresse em 04/04/2024, não em 04/07/2024 (ID 72003778).

Em caso de pluralidade de filiações, sendo possível identificar as datas de sua ocorrência, é mantida a filiação  mais recente, desconstituída a anterior, como regulamenta o art. 23, § 4º-A, da Resolução TSE nº 23.596/2019:

Art. 23. [...]

§ 4º-A O juízo decidirá: (Incluído pela Resolução nº 23.668/2021)

I - pela manutenção do vínculo partidário mais recente, quando for possível estabelecer o momento em que as filiações ocorreram; (Incluído pela Resolução nº 23.668/2021)

O reconhecimento da inconsistência do vínculo partidário ao PDT, com seu consequente cancelamento, tem como efeito o restabelecimento do vínculo anterior, ao Avante, prescindindo-se de prova a respeito, visto tratar-se de filiação preexistente.

A filiação efetivada erroneamente, à revelia do filiado, tem semelhança com o abuso de filiação, para o qual há regulamentação expressa na Resolução TSE nº 23.596/2019, que determina, em casos assim, a anulação do vínculo:

Art. 23 [...]

§ 7º Verificados indícios de falsidade, abuso, fraude ou simulação na inclusão do registro de filiação ou na sua retificação, o juiz eleitoral dará ciência ao Ministério Público Eleitoral para as providências cabíveis e apuração de eventual responsabilidade pela prática de crimes eleitorais. [...]

§ 9º Comprovados os ilícitos de que trata o § 7º deste artigo em processo judicial, criminal ou não, no qual assegurado ampla defesa e contraditório, a filiação será anulada, devendo seu cancelamento ser efetivado após a decisão judicial da qual não caiba recurso com efeito suspensivo. (Incluído pela Resolução nº 23.668/2021)

É inequívoca a vontade, manifestada pelo eleitor de não se filiar ao PDT na data de 04/07/2024. razão pela qual desistiu da filiação, judicialmente, até mesmo quanto à data de 04/04/2024. Por outro lado, o partido reconheceu o próprio erro na filiação fora do prazo solicitado pelo candidato. Deve prevalecer, assim, a liberdade de associação assegurada constitucionalmente (art. 5º, XVII, da CFRB).

A jurisprudência eleitoral tem privilegiado a vontade do eleitor de não se ver filiado, em casos nos quais o próprio grêmio admite o erro na inserção da filiação:

ELEIÇÕES 2024. REGISTRO DE CANDIDATURA. DEFERIMENTO NA ORIGEM. FILIAÇÃO. PARTIDO DOS TRABALHADORES. PARTIDO DA MULHER BRASILEIRA. COEXISTÊNCIA. REGRA. PREVALÊNCIA DA MAIS RECENTE. ÚLTIMA FILIAÇÃO NÃO REQUERIDA PELO CANDIDATO. AUSÊNCIA DE FICHA DE FILIAÇÃO. INFORMAÇÃO DE ERRO PELO PARTIDO. REVERSÃO DA FILIAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO.
1. No caso, o requerimento de registro candidatura foi apresentado pelo Partido dos Trabalhadores em Indiaroba, contudo, consta na certidão do FILIA que, no dia no dia 06.04.2024, ele teria se filiado ao Partido da Mulher Brasileira (PMB), o que ensejou o cancelamento automático da filiação ao PT, como determina o art. 22 da Lei 9.096/95.
2. Verificou–se que o candidato não requereu filiação ao PMB, grei que sequer se encontra com diretório válido na localidade desde 2017, estando também com o diretório estadual suspenso por ausência de prestação de contas, ademais o próprio partido, através do diretório nacional, informa que a filiação do candidato ao PMB decorreu de erro.
3. Em se tratando de filiação partidária, deve prevalecer, em regra, a vontade da pessoa filiada, a qual não deve ser obrigada a permanecer associado a nenhum partido, sob pena violação ao direito constitucional de livre associação (art. 5º, XVII e XX, da CRFB/1988), mormente diante de indícios da existência de ato de filiação sobre o qual sequer tinha conhecimento o filiado.
4. Nesse contexto, desarrazoado impor ao candidato um prejuízo em razão de sua desfiliação automática ao PT, consequência direta de filiação posterior ao PMB, em relação à qual há fortes indícios de ter sido efetivada em procedimento no mínimo equivocado.
5. Desprovimento do recurso. (TRE-SE, REl nº 060016718, Acórdão, INDIAROBA – SE, Relator(a): Des. Cristiano Cesar Braga De Aragao Cabral, Julgamento: 24/09/2024, Publicação: 24/09/2024, grifou-se)

Em prestígio à manifestação de vontade do eleitor, amparada pela liberdade de associação, deverá prevalecer a filiação ao Avante, por reversão decorrente da nulidade, que ora se reconhece, da filiação ao PDT.

Por conseguinte, o recorrente, por estar filiado ao Avante desde 02/04/2022, preenche a condição de elegibilidade para o deferimento do registro de candidatura (arts. 14, §3º, V, da CRFB, e 9.º, caput, da Lei nº 9.504/1997), pois filiado ao partido antes de 06/04/2024, data-limite do calendário eleitoral de 2024 para que os candidatos cumpram o requisito.

Ante o exposto, em juízo de retratação, dou provimento ao agravo interno para cancelar a filiação do recorrente ao PDT, reputando hígida sua filiação ao Avante desde 02/04/2022, a qual deverá ser restabelecida no sistema Filia, e defiro o pedido de registro da sua candidatura ao cargo de vereador pelo Avante.

Julgamento monocrático autorizado pelos artigos 84, VIII, e 81, XXIV, b, do RITREMG.

P. I.

 

 

Juiz VINÍCIUS DINIZ MONTEIRO DE BARROS

Relator