TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DA BAHIA
RECURSO ELEITORAL (11548) - 0600010-43.2024.6.05.0151 - Nova Ibiá - BAHIA
RELATOR: Juiz DANILO COSTA LUIZ
RECORRENTE: AVANTE - NOVA IBIA - BA - MUNICIPAL
ADVOGADO: CARLOS CONRADO DE SOUZA NUNES - OAB/SE4618
RECORRIDO: VALDIVINO XAVIER DA SILVA
ADVOGADO: ANTONIO EDUARDO OLIVEIRA DAMASCENA CAFE - OAB/BA81060
ADVOGADO: SAVIO MAHMED QASEM MENIN - OAB/BA22274-A
FISCAL DA LEI: PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL
EMENTA
Recurso Eleitoral. Propaganda Eleitoral Antecipada Negativa. Veiculação em Redes Sociais. Não configuração. Fato anterior à publicação da legislação de regência. Manutenção da sentença de primeiro grau. Desprovimento.
1. A publicação de mensagens, em redes sociais, destituídas de conteúdo eleitoral, constituem meros indiferentes eleitorais;
2. Descaracterizada a propaganda eleitoral antecipada, não há porque se falar em meio proscrito;
3. Para fins de configuração de propaganda eleitoral irregular, faz-se necessário que a conduta tenha ocorrido após o início da vigência da Legislação que disciplina a matéria;
4. Recurso a que se nega provimento.
ACORDAM os Membros do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, à unanimidade, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.
Sala das Sessões do TRE da Bahia, 09/05/2024
Des(a). Eleitoral DANILO COSTA LUIZ
EMENTA
Recurso Eleitoral. Propaganda Eleitoral Antecipada Negativa. Veiculação em Redes Sociais. Não configuração. Fato anterior à publicação da legislação de regência. Manutenção da sentença de primeiro grau. Desprovimento.
1. A publicação de mensagens, em redes sociais, destituídas de conteúdo eleitoral, constituem meros indiferentes eleitorais;
2. Descaracterizada a propaganda eleitoral antecipada, não há porque se falar em meio proscrito;
3. Para fins de configuração de propaganda eleitoral irregular, faz-se necessário que a conduta tenha ocorrido após o início da vigência da Legislação que disciplina a matéria;
4. Recurso a que se nega provimento.
RELATÓRIO
Trata-se de recurso eleitoral interposto por AVANTE – DIRETÓRIO MUNICIPAL, em face de sentença prolatada pelo Juiz da 151ª Zona Eleitoral, que julgou improcedente o pedido formulado em sede de Representação, consubstanciada na divulgação de propaganda eleitoral antecipada de índole negativa, com utilização de artifício de Inteligência Artificial.
A sentença de primeiro grau rechaçada não vislumbrou, nos fatos carreados aos autos, indicativo de pedido negativo de voto, considerando a conduta do representado dentro dos limites de liberdade de expressão.
Em suas razões (Id. 49957235), o recorrente aduz que a publicação do representado, ora recorrido, em sua rede social, possuía o intuito de ludibriar o eleitor, denegrindo a imagem dos postulantes, além de caracterizar, em seu entendimento, pedido de não voto, requerendo, com isso, o provimento do recurso e a consequente reforma integral da sentença combatida.
O recorrido, em contrarrazões (Id. 49957240), pugna pela manutenção da decisão guerreada, sob o fundamento de que a questão de mérito foi examinada em sintonia com as provas constantes dos autos.
Com vista dos fólios, o Procurador Regional Eleitoral manifesta-se pelo desprovimento do recurso, destacando que "no caso, o que se verifica é a divulgação de postagens no perfil do recorrido no Instagram, que são caracterizadas pelo tom de superficialidade, não indo além de opiniões pessoais com suposto viés de crítica de natureza política, de modo que estão, portanto, salvaguardadas pelo direito à liberdade de expressão (...)” (Id 45958822).
Devidamente relatado, remeta-se os autos à Secretaria Judiciária para inclusão em pauta de julgamento.
TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL
GABINETE DO JUIZ DANILO COSTA LUIZ
| REFERÊNCIA-TSE | : 0600010-43.2024.6.05.0151 |
| PROCEDÊNCIA | : Nova Ibiá - BAHIA |
| RELATOR | : DANILO COSTA LUIZ |
RECORRENTE: AVANTE - NOVA IBIA - BA - MUNICIPAL
RECORRIDO: VALDIVINO XAVIER DA SILVA
REFERÊNCIA-TRE :
VOTO
Por oportuno, reproduzo a seguir o voto de minha lavra proferido na sessão do dia 06 de maio de 2024, com previsão de início às 17h:
Inicialmente, presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço da presente irresignação.
Consoante relatado, trata-se de recurso eleitoral interposto por Avante – Diretório Municipal, contra sentença proferida pela 151ª ZE, que julgou improcedente o pedido formulado por suposta prática de propaganda eleitoral antecipada de índole negativa, com utilização de artifício de Inteligência Artificial.
Aduz o recorrente, em síntese, que o recorrido estaria promovendo propaganda eleitoral antecipada negativa, consistentes em postagens de cunho político, em sua rede social, com o intuito de ridicularizar e denegrir a imagem do pré-candidato Márcio Tarantine.
Complementa que por se tratar de apoiador do Pastor Bruno,
líder evangélico, o recorrido tenta vincular a figura do pré-candidato
Marcio Tarantine a figuras diabólicas em uma busca de denegrir a sua
imagem junto à comunidade religiosa do município.
O recorrente arremata que o desiderato do recorrido é utilizar suas redes sociais para incitar o ódio, demonstrando em suas falas o viés separatista e discriminatório, uma vez que, em suas publicações, utiliza-se de artifício de Inteligência Artificial, denominada deep fake, para criar uma figura artificial do pré-candidato, conduta essa que, no seu entendimento, se enquadraria no disposto nos arts. 9º e 9º-B da Res.-TSE nº 23.610/2019 (seção de desinformação na propaganda eleitoral).
O ponto fulcral da querela cinge-se à veiculação de conteúdo político-eleitoral gerado por meio de inteligência artificial. O tema é palpitante, dada a recente novidade legislativa, considerando a diversidade de hipóteses fáticas possíveis e a plausibilidade de moldar um entendimento mais adequado, conforme os desdobramentos que as decisões judiciais sobre essa matéria proporcionarão, sendo certo que a jurisprudência somente será solidificada ao longo das eleições.
Primeiramente, com o intuito de deliberar sobre enquadramento mais adequado da conduta perpetrada pelo recorrido, faz-se necessário tecer uma digressão sobre as novas tecnologias e o efeito disso na propaganda eleitoral.
É nítido o crescente predomínio das tecnologias digitais, havendo a valorização crescente da informação nessa nova estrutura de comunicação, pois as notícias circulam em alta velocidade e atingem um quantitativo de pessoas até então inimagináveis.
Não se pode negar que as novas mídias trouxeram mais possibilidades e praticidade na comunicação implicando uma maior liberdade de propagação de informação, de maneira que as informações, muitas das vezes são divulgadas sem que se saiba a fonte e/ou transmissor e tal característica fica mais marcante com o surgimento das redes sociais.
Nessa linha de raciocínio, a informação disseminada no âmbito digital possui um alto poder de influenciar os receptores da mensagem e, consequentemente, a opinião pública. Dessa forma, o dinamismo proporcionado pela rede mundial de computadores, permite a rápida difusão da informação, assim como proporciona a rápida propagação de desinformação.
É certo que os grupos políticos recorrem, com a proximidade de um pleito eleitoral, à variedade de instrumentos de comunicação de massa, com o interesse em firmar ou ampliar a credibilidade de um candidato, em exaltar sua retidão de caráter e honestidade, ou até mesmo com o intuito contrário, de distorcer, macular ou denegrir.
Certamente, a divulgação de propaganda negativa pode provocar sérios danos à imagem de suas vítimas, podendo ser devastadora para a campanha adversária, principalmente, quando se utiliza de informação desprovida de certeza.
Com isso, como bem discorre o jurista José Jairo Gomes “As novas tecnologias não podem ser alijadas do debate político-eleitoral. Elas já fazem parte da vida contemporânea e dão relevante contribuição ao processo democrático, pois não só contribuem para a organização e realização das eleições, mas também facilitam o diálogo, a crítica e a discussão política no espaço público”.
Nesse contexto, exatamente em virtude do poder de alcance e da influência que uma informação possui, ao ser difundida na internet, fazia-se necessário disciplinar as regras do uso da propaganda eleitoral no ciberespaço.
Para tanto, o Tribunal Superior Eleitoral regulamentou, de maneira inédita, o uso da inteligência artificial (IA) na propaganda eleitoral, com o desiderato principal de combater a desinformação, de forma que os atuais dispositivos legais visam coibir a difusão de fatos notoriamente inverídicos ou descontextualizados com potencial para causar danos ao equilíbrio do pleito ou à integridade do processo eleitoral.
Pois bem.
Trazidas tais considerações prévias, adentremos no arcabouço probatório trazido aos autos (Id. 49957202 49957204, 49957205, 49957206, 49957207). As imagens evidenciam que a conduta do recorrido subsumisse ao disposto nos arts. 3º- A e C, da Res.-TSE nº 23.610/2019, tendo em vista que veiculou conteúdo político-eleitoral em meio proscrito.
Vejamos o que prevê o art. 3º-A e C, da Resolução 23.610/2019:
Art. 3º-A. Considera-se propaganda antecipada passível de multa aquela divulgada extemporaneamente cuja mensagem contenha pedido explícito de voto, ou que veicule conteúdo eleitoral em local vedado ou por meio, forma ou instrumento proscrito no período de campanha. (Incluído pela Resolução nº 23.671/2021)
(...)
Art. 3º-C. A veiculação de conteúdo político-eleitoral em período que não seja o de campanha eleitoral se sujeita às regras de transparência previstas no art. 27-A desta Resolução e de uso de tecnologias digitais previstas nos arts. 9º-B, caput e parágrafos, e 9º-C desta Resolução, que deverão ser cumpridas, no que lhes couber, pelos provedores de aplicação e pelas pessoas e entidades responsáveis pela criação e divulgação do conteúdo. (Incluído pela Resolução nº 23.732/2024)
(Grifos acrescidos pelo relator)
Infere-se da legislação de regência que é considerada propaganda eleitoral antecipada passível de multa aquela divulgada fora do período permitido e cuja mensagem contenha pedido explícito ou subentendido de voto ou que veicule conteúdo eleitoral em local vedado ou por meio, forma ou instrumento não permitido no período de campanha.
Percebe-se, com isso, que a Corte Superior sedimentou um limite de forma para os atos de pré-campanha, não sendo possível nesta fase o que é vedado na própria campanha eleitoral.
Destarte, além de ater-se ao conteúdo delineado na norma, a divulgação da pretendida candidatura não pode adotar as formas vedadas expressa ou implicitamente pela lei para a propaganda permitida a partir de 15 de agosto do ano da eleição, sob pena de a pré-campanha poder mais que a própria campanha, expondo o sistema à inconsistência.
Em resumo, a partir de uma interpretação sistemática das novas regras eleitorais e com o objetivo de proporcionar justo equilíbrio no princípio da igualdade de forças entre os candidatos, forçoso reconhecer que os atos de pré-campanha, sejam eles a favor ou de índole ruinosa de possíveis candidatos, possuem limites de forma, restando proibida a sua veiculação, como regra, através de meios que não são lícitos no período permitido, previsto no art. 36 da Lei das Eleições.
Note-se, no caso em tela, que o recorrido realiza, por mais de uma vez, publicações em stories (duração de 24 horas) do Instagram com visível conteúdo político-eleitoral, exibindo, em sua rede social, imagens manipuladas mediante tecnologia digital, em flagrante descumprimento ao disposto nos arts. 9º-B e C, da Resolução nº 23.610/2019.
Nesse ponto, é pertinente transcrever a supracitada norma:
Art. 9º-B. A utilização na propaganda eleitoral, em qualquer modalidade, de conteúdo sintético multimídia gerado por meio de inteligência artificial para criar, substituir, omitir, mesclar ou alterar a velocidade ou sobrepor imagens ou sons impõe ao responsável pela propaganda o dever de informar, de modo explícito, destacado e acessível que o conteúdo foi fabricado ou manipulado e a tecnologia utilizada. (Incluído pela Resolução nº 23.732/2024)
§ 1º As informações mencionadas no caput deste artigo devem ser feitas em formato compatível com o tipo de veiculação e serem apresentadas: (Incluído pela Resolução nº 23.732/2024)
(...)
Art. 9º-C É vedada a utilização, na propaganda eleitoral, qualquer que seja sua forma ou modalidade, de conteúdo fabricado ou manipulado para difundir fatos notoriamente inverídicos ou descontextualizados com potencial para causar danos ao equilíbrio do pleito ou à integridade do processo eleitoral. (Incluído pela Resolução nº 23.732/2024)
(Grifos acrescidos pelo relator)
Assentadas tais premissas, não resta dúvida da ilicitude da conduta do recorrido, passível de sanção pecuniária, por veiculação de conteúdo eleitoral por instrumento vedado no período de campanha.
Por fim, considerando que as publicações rechaçadas foram realizadas mediante stories da rede social Instagram, não é mais possível a remoção.
Por todo o exposto, voto pelo provimento do recurso, para reformar a sentença combatida e determinar ao recorrido que se abstenha de veicular novamente conteúdos político-eleitorais em meio interdito, sob pena de sanção correspondente a R$ 1.000,00 (mil reais) por cada postagem irregular, além de aplicar a multa, no patamar mínimo, de R$ 5.000,00 (Cinco mil reais), com fulcro no art. 57-D da Lei 9.504/1997.
Pois bem.
Na sessão do dia 06 de maio de 2024, após ter sido proferido o voto do relator, o Desembargador Presidente do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia, Abelardo Paulo da Matta Neto, pediu vista dos autos.
Quando da última sessão de julgamento (09/05/24), o vistor apresenta seu voto divergindo do relator, entendendo que as provas colacionadas aos autos não revelam a ocorrência de propaganda eleitoral antecipada negativa, por considerar que os conteúdos divulgados na rede social não evidenciam, nem apontam qualquer referencia às eleições 2024, ao revés constitui mera crítica política, amparada pela liberdade de expressão, prevista nos arts. 4º, 5º e 9º da CF.
Enfatizou, assim, que, na ausência de conteúdo eleitoral, as mensagens constituirão meros indiferentes eleitorais, e não havendo conteúdo eleitoral, não há porque se falar em meio proscrito.
Acrescenta o vistor que a publicação do representado, objeto da controvérsia, ocorreu em 22 de fevereiro de 2024, data em que a Resolução nº 23.732/2024, que promoveu as alterações na Res.-TSE nº 23.610/2019, ainda não havia sido publicada, de maneira que as vedações descritas nos arts. 9º- B e C ainda não estavam em vigor.
Deveras, considerando que o fato objeto da publicação refutada ocorreu somente em mês anterior a vigência da legislação de regência, não havendo assim, que se falar em sanção pela utilização de meio que à época não era proibido.
Por derradeiro, necessário asseverar que a referida data da postagem rechaçada não foi apontada na defesa do recorrido, sendo habilmente notada pelo Eminente vistor.
Tais considerações proporcionaram a mudança do meu entendimento, de maneira que passo a acolher, in totum, as ponderações apresentadas pelo excelentíssimo presidente deste Regional.
Feitas essas considerações, refluo para votar pelo DESPROVIMENTO do recurso, mantendo a sentença proferida pelo Juízo Zonal.
1 - Gomes, José Jairo. Direito Eleitoral. 18ª Edição. Pág 553.