JUÍZO DA 13ª ZONA ELEITORAL DO TOCANTINS





Trata-se de requerimento por meio do qual o candidato GESIEL ORCELINO DOS SANTOS apresenta seu Requerimento de Registro de Candidatura – RRC, para participar das eleições de 2024.


No id 122405352, a COMISSÃO PROVISÓRIA MUNICIPAL DO PARTIDO REPUBLICANOS DE OLIVEIRA DE FÁTIMA/TO impugnou o registro de candidatura aduzindo, em síntese, que o requerente está inelegível, pois possui Tomada de Contas Especial julgada irregular com identificação de responsabilidade pessoal, na condição ex-Prefeito do Município de Oliveira de Fátima/TO, em que teve aplicação de multa e imputação de débito pelo TCE/TO, passível de atrair a inelegibilidade do art. 1º, inc. I, “g”, da LC n.º 60/94, nos termos do Tema 1287 do STF.


Para corroborar suas alegações, o impugnante apresentou o Acórdão nº 03/2019 do TCE e outros documentos relativos ao referido acórdão.


Intimado, o requerente, ora candidato, apresentou contestação alegando ilegitimidade ativa do impugnante e requerendo a improcedência da impugnação (id 122457388).


É o relatório.


Nos termos do art. 1º, I, g, da Lei Complementar n. 64/90, com redação dada pela Lei Complementar nº 135/2010, são inelegíveis:


Art. 1º São inelegíveis:

I - para qualquer cargo:

g) os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição; (Redação dada pela Lei Complementar nº 135, de 2010) (Vide Lei Complementar nº 184, de 2021).


No caso dos autos, o impugnado, no exercício do mandato de Prefeito do Município de Oliveira de Fátima, teve suas contas relativas aos fundos de saúde e assistência social, referente aos anos de 2013, 2014, 2015 e 2016, julgadas irregulares pelo TCETO, em decisão definitiva, transitada em julgado, conforme Acórdão nº 03/2019 (id 122405361 e 122405413).


Nota-se que embora o candidato tenha interposto o Recurso Ordinário nº 1949/2019 objetivando reformar o Acórdão nº 03/2019, o TCE deu parcial provimento e fastou alguns dos débitos imputados, mantendo suas demais disposições (id 122405414, fl. 3).


Verifica-se do referido Acórdão que o gestor teve as contas julgadas irregulares por práticas que configuram improbidade administrativa que causaram efetivo e comprovado prejuízo ao erário (art. 10 da Lei 8.429/92).


Destacam-se as seguintes irregularidades insanáveis que configuram atos dolosos de improbidade administrativa, mantidas pelo TCETO (id 122405361, fls. 2-3):


a) Item 2.06 do processo nº 5534/2017: locação de caminhão basculante, Pregão Presencial nº 010/2013. Pelo pagamento de despesa com a manutenção deste caminhão que por contrato era de responsabilidade do contratado, deve ser imputado débito de R$ 720,00 (setecentos e vinte reais), a ser atualizado desde o dia 31/12/2013 (item 9.3.22 do voto).


b) Item 2.09 do processo nº 5536/2017: aquisição de combustível no ano de 2014. Não há comprovação do abastecimento e/ou utilização de parte do gasto com combustíveis, deve ser imputado débito de R$ 342.991,72 (trezentos e quarenta e dois mil novecentos e noventa e um reais e setenta e dois centavos), a ser atualizado desde o dia 31/12/2014 (item 9.3.7 do voto).


c) Item 2.12 do processo nº 5537/2017: aquisição de combustível no ano de 2015. Não há comprovação do abastecimento e/ou utilização de parte do gasto com combustíveis, deve ser imputado débito de R$ 287.016,73 (duzentos e oitenta e sete mil dezesseis reais e setenta e três centavos), a ser atualizado desde o dia 31/12/2015 (item 9.3.8 do voto).


d) Item 2.05 do processo nº 5538/2017: compra de fogos de artifícios – processo municipal nº 354/2016. Por não comprovar o recebimento dos fogos de artifícios e a sua utilização em proveito da municipalidade, deve ser imputado débito de R$ 5.020,00 (cinco mil e vinte reais), a ser atualizado desde o dia 18/02/2016 (data do pagamento) (item 9.3.47 do voto).


e) Item 2.15 do processo nº 5538/2017: aquisição de combustível no ano de 2016. Não há comprovação do abastecimento e/ou utilização de parte do gasto com combustíveis, deve ser imputado débito de R$ 316.329,11 (trezentos e dezesseis mil trezentos e vinte e nove reais e onze centavos), a ser atualizado desde o dia 31/12/2016 (item 9.3.9 do voto).


Diante disso, concluiu o TCETO pela irregularidade das contas do candidato, relativas aos fundos de saúde e assistência social, referente aos anos de 2013, 2014, 2015 e 2016 (id 122405361).


Outrossim, do exame detido do Acórdão nº 03/2019 o TCETO ainda revela outras irregularidades que também mereceram censura e julgamento desfavorável ao ora impugnado; todavia, no corpo da presente peça, elencaram-se apenas, a título exemplificativo, as irregularidades mais graves e que redundaram em evidentes e vultosos prejuízos ao erário.


Em síntese, a causa de inelegibilidade prevista no art. 1º, inciso I, alínea g, da LC nº 64/90 pressupõe: a) rejeição de contas; b) irregularidade insanável, por ato doloso de improbidade administrativa; c) decisão definitiva exarada por órgão competente; d) ausência de suspensão da decisão de rejeição de contas pelo Poder Judiciário.


No caso em tela, restam cumpridos todos os requisitos exigidos pela Lei Complementar nº 64/90.


Com efeito, in casu, o órgão competente para julgamento da tomada de Contas Especial é o Tribunal de Contas, sem a necessidade de posterior julgamento ou confirmação pelo Poder Legislativo, conforme tese fixada pelo STF no Tema 1287 da Repercussão Geral:


EMENTA: REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO. TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. CONSTATAÇÃO DE IRREGULARIDADES EM EXECUÇÃO DE CONVÊNIO INTERFEDERATIVO. IMPUTAÇÃO DE DÉBITO E MULTA A EX-PREFEITO. COMPETÊNCIA DA CORTE DE CONTAS. TEMAS 157 E 835 DA REPERCUSSÃO GERAL. DELIMITAÇÃO. CONTROLE EXTERNO EXERCIDO COM FUNDAMENTO NOS ARTIGOS 70, 71 E 75 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. APLICAÇÃO DE SANÇÕES ADMINISTRATIVAS QUE NÃO SE SUBMETE A POSTERIOR JULGAMENTO OU APROVAÇÃO DO ATO PELO PODER LEGISLATIVO LOCAL. CONTROVÉRSIA CONSTITUCIONAL DOTADA DE REPERCUSSÃO GERAL. REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AGRAVO CONHECIDO PARA NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. 1. No âmbito da tomada de contas especial, é possível a condenação administrativa de Chefes dos Poderes Executivos municipais, estaduais e distrital pelos Tribunais de Contas, quando identificada a responsabilidade pessoal em face de irregularidades no cumprimento de convênios interfederativos de repasse de verbas, sem necessidade de posterior julgamento ou aprovação do ato pelo respectivo Poder Legislativo. 2. Recurso extraordinário com agravo desprovido. (ARE 1436197 RG, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 18-12-2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-039 DIVULG 29-02-2024 PUBLIC 01-03-2024).


De outra parte, a rejeição de contas – no presente caso concreto – caracteriza-se pela irregularidade insanável.


Insanáveis, conforme JOSÉ JAIRO GOMES1, “são as irregularidades graves, decorrentes de condutas perpetradas com dolo ou má-fé, contrárias ao interesse público; podem causar dano ao erário, enriquecimento ilícito, ou ferir princípios constitucionais reitores da Administração Pública”.


A jurisprudência do TSE entendia que irregularidades insanáveis são as que apresentam “nota de improbidade” (Recurso Especial Eleitoral nº 23.345 – Rel. Caputo Bastos – j. 24.09.2004). Agora, com a edição da LC nº 135/10, o legislador estabeleceu que a inelegibilidade deve ser imputada àqueles que “tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa”.


Novamente, JOSÉ JAIRO GOMES explica que “o requisito de que a inelegibilidade também configure ‘ato doloso de improbidade administrativa’ tem a única finalidade de estruturar a inelegibilidade (...). Destarte, não há falar em condenação em improbidade administrativa, mas apenas em apreciação e qualificação jurídica de fatos e circunstâncias relevantes para a estruturação da inelegibilidade em apreço” (op. cit., pp. 178/179).


Das irregularidades apontadas e do inteiro teor das decisões listadas, observa-se que o impugnado, na qualidade de gestor, cometeu faltas graves e que, em tese, configuram ato doloso de improbidade administrativa.


No mesmo passo, o TSE tem assentado que “para efeito da apuração da inelegibilidade prevista na alínea g do inciso I do art. 1º da LC nº 64/90, não se exige o dolo específico, basta para a sua configuração a existência do dolo genérico ou eventual, o que se caracteriza quando o administrador deixa de observar os comandos constitucionais, legais ou contratuais que vinculam sua atuação” (Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 273-74 – Rel. Min. Henrique Neves – j. 07.02.2013).


Logo, verificada a rejeição das contas pelo TCE em razão das irregularidades insanáveis e, ausente qualquer notícia de provimento judicial que tenha suspendido ou desconstituído as referidas decisões, há de ser reconhecida a inelegibilidade por 8 anos.


Nesse ponto, importa ressaltar que o processo nº 0004312-89.2024.8.27.2737, mencionado pelo impugnado em sua contestação, não possui nenhuma relação com os presentes autos, notadamente porque naquele processo ele pede a anulação dos Decretos Legislativos nº 10/2022 e nº 12/2023, emitidos pela Câmara Municipal de Oliveira de Fátima quanto a rejeição das contas de 2016 e 2017, ao tempo o Acórdão nº 3/2019, mencionado na impugnação, refere à Tomada de Contas Especial do TCETO, e que como dito anteriormente, não é submetido à aprovação da Casa Legislativa, como não o foi.


Assim, nota-se claramente que o processo nº 0004312-89.2024.8.27.2737 não possui nenhuma relação com o Acórdão nº 3/2019, como pode ser aferido da análise daqueles autos, ou mesmo da decisão juntada pelo impugnado no id 122457384.


Diante do exposto, o Ministério Público Eleitoral manifesta-se:


a) Pelo deferimento da impugnação;


b) Pelo INDEFERIMENTO do registro de candidatura de GESIEL ORCELINO DOS SANTOS.



Cristalândia – TO, 2 de setembro de 2024.



JANETE INTIGAR

Promotora Eleitoral