TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DE SÃO PAULO
JUÍZO DA 128ª ZONA ELEITORAL DE SÃO LUIZ DO PARAITINGA SP
Processo nº 0600708-36.2024.6.26.0128
Classe Processual: AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (11527)
AUTOR: PROMOTOR ELEITORAL DO ESTADO DE SÃO PAULO
INVESTIGADO: TIAGO MAGNO DE OLIVEIRA
ADVOGADO: IZABELLE PAES OMENA DE OLIVEIRA LIMA - OAB/SP196272-A
ADVOGADO: LEANDRO PETRIN - OAB/SP259441-A
INVESTIGADO: JOSE GUILHERME CORREA GOMES
ADVOGADO: IZABELLE PAES OMENA DE OLIVEIRA LIMA - OAB/SP196272-A
ADVOGADO: LEANDRO PETRIN - OAB/SP259441-A
INVESTIGADO: IVAN CARLOS CORREA
ADVOGADO: IZABELLE PAES OMENA DE OLIVEIRA LIMA - OAB/SP196272-A
ADVOGADO: LEANDRO PETRIN - OAB/SP259441-A
INVESTIGADO: CRISTIANO ALVES LINO
ADVOGADO: IZABELLE PAES OMENA DE OLIVEIRA LIMA - OAB/SP196272-A
ADVOGADO: LEANDRO PETRIN - OAB/SP259441-A
FISCAL DA LEI: PROMOTOR ELEITORAL DO ESTADO DE SÃO PAULO
Vistos.
Trata-se de Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL em face de TIAGO MAGNO DE OLIVEIRA, prefeito do município de LAGOINHA-SP, JOSÉ GUILHERME CORRÊA GOMES, candidato eleito para o cargo de prefeito do município de Lagoinha, IVAN CARLOS CORRÊA, candidato eleito para o cargo de vice-prefeito do município de Lagoinha e CRISTIANO ALVES LINO, candidato à reeleição para o cargo de vereador (eleito suplente), com fundamento no art. 22 da Lei Complementar n.º 64/90 e no § 12, do artigo 73, da Lei n° 9.504/1997, por meio da qual imputa aos investigados a prática de atos que configuram abuso de poder político (de autoridade) e econômico.
Consta da inicial que os investigados, abusando de poder político e econômico, praticaram condutas de cunho eleitoreiro, que beneficiaram candidatos, desequilibrando, assim, as eleições no Município de Lagoinha.
A primeira imputação refere-se à utilização de telefone corporativo da Secretaria de Finanças de Lagoinha, para fins de propaganda do à época candidato “Zeca” (José Guilherme), antes do prazo previsto na Lei nº 9.504/97.
A segunda imputação, atribui a utilização, pelo então prefeito Tiago Magno, da festa agropecuária de Lagoinha (Expolag) para favorecer os candidatos investigados Zeca (José Guilherme) e Ivan Carlos Corrêa.
A terceira imputação narra a distribuição de cestas básicas (com alimentos arrecadados na festa Expolag) em ano eleitoral, com a participação e postagens em rede social do investigado Cristiano Alves Lino (vereador e à época candidato à reeleição).
Alega a parte autora que restou configurada a prática de abuso de poder político e econômico quando da realização e utilização da festa Expolag 2024, uma vez que:
“Comparados os valores gastos em 2023 (R$ 249.853,00) e 2024 (R$ 860.368,00), vê-se que, em 2024, o ente público, sob a direção do requerido Tiago, atual prefeito e apoiador do requerido José Guilherme (candidato a prefeito eleito), despendeu, para a realização da EXPOLAG, 300% a mais do que no ano de 2023.”
Esclarece que, no tocante à arrecadação de alimentos em período eleitoral, foi expedida a Recomendação Eleitoral nº 01/2024 ao prefeito e secretários municipais de Lagoinha.
Busca o investigante:
I. Seja aplicada a sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos oito anos subsequentes à eleição, cassação de seus registros de candidaturas (diplomas ou mandatos), bem como aplicação de multa aos requeridos José Guilherme Corrêa Gomes (Zeca), Ivan Carlos Corrêa (Ivan do Tonho Branco) e Cristiano Alves Lino (Tano do Tonho Branco).
II. Seja aplicada a sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos oito anos subsequentes à eleição em que se verificaram os abusos acima narrados, multa e recomposição do erário, nos termos acima especificados, ao requerido Tiago Magno de Oliveira.
Com a petição inicial (ID nº 134349314), foram juntados documentos (ID nºs 134349326 até 134350423).
Os investigados foram notificados, nos termos do artigo 22, I, "a", da Lei Complementar nº 64/1990 (ID nº 134530160, ID nº 134531227, ID nº 134531228, ID nº 1344626184, ID nº 1344626185, ID nº 134702054 e ID nº 134739549).
Defesa apresentada (ID nº 134811174) com documentos (ID nº 134811177 até ID nº 134811186).
Em defesa, arguiu-se, preliminarmente, a inépcia da petição inicial, em razão de as provas terem sido apresentadas em nuvem.
Ainda, em preliminar, postulou o reconhecimento de ilegitimidade dos investigados José Guilherme Côrrea Gomes e Ivan Carlos Corrêa, ante a ausência de descrição de conduta por eles praticada.
No mérito, afastou a alegação de abuso de poder político e econômico pela realização da festa Expolag, afirmando que o evento não teve nenhuma relação com a campanha eleitoral e com as eleições de 2024.
Refutou a imputação de doação de cestas básicas em ano eleitoral, alegando que a mencionada ação está pautada em lei municipal e o programa estava em execução nos anos anteriores à eleição, configurando a exceção prevista no §10º do art. 73, da Lei nº 9.504/97.
De igual modo, no que tange à alegação de utilização irregular de aparelho celular, afirma que não há prova de que a publicação se originou de número corporativo e tampouco de que havia ciência do uso por parte dos investigados.
O Ministério Público Eleitoral se manifestou, postulando o reconhecimento da intempestividade da apresentação da defesa, por parte do investigado Ivan Carlos Correa (ID nº 134881003).
Bradou pelo afastamento da preliminar de inépcia da inicial, juntando aos autos os vídeos, os quais foram extraídos das redes sociais dos investigados.
No tocante à alegação de ilegitimidade dos investigados José Guilherme e Ivan Carlos Correa, afirma que a conduta e participação de ambos foram descritas na petição inicial e, por serem beneficiários da conduta, devem figurar no polo passivo (ID nº 134881003).
Apresentada manifestação dos investigados, busca-se afastar a alegação de intempestividade da defesa apresentada por Ivan Carlos Correa, sob o argumento de que, por haver mais de um réu, o prazo para apresentar defesa é comum.
Por sua vez, quanto aos vídeos juntados aos autos, afirma-se que não há prática de conduta irregular (ID nº 134987716).
As partes ofereceram alegações finais (ID nº 135068303 e ID nº 135101677).
Atendendo à determinação judicial, o Ministério Público Eleitoral juntou os respectivos vídeos com áudio (ID nº 135160922 e seguintes).
Por sua vez, os investigados se manifestaram (ID nº 135304193).
É O RELATÓRIO.
FUNDAMENTO E DECIDO.
Preliminarmente, rejeito a arguição de inépcia da petição inicial por provas anexadas em ambiente nuvem, uma vez que, posteriormente, os vídeos foram juntados aos autos (ID nº 134881004 até ID nº 134882415), possibilitando-se, assim, o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa.
De igual modo, não merece ser acolhida a alegação de inépcia da petição inicial por falta de descrição da conduta dos investigados José Guilherme Gomes Correa e Ivan Carlos Gomes.
Nos termos do artigo 22, inciso XIV, da Lei Complementar nº 64/90, o candidato beneficiado pela conduta abusiva deve figurar no polo passivo da ação de investigação.
No presente caso, há de se reconhecer que, na petição inicial, encontra-se detalhadamente descrita a conduta que favoreceu a candidatura dos investigados José Guilherme Gomes Correa e Ivan Carlos Correa, e, por conseguinte, não restou configurada a alegada inépcia.
No mais, quanto à alegação ministerial de intempestividade da defesa, apresentada pelo investigado Ivan Carlos Correa, pontuo que ela não merece prosperar.
Isso porque, havendo pluralidade de réus, o prazo para a defesa começa a correr da juntada aos autos da comprovação da notificação do último investigado, nos termos do art. 231, §1º do Código de Processo Civil, não caracterizando, assim, in casu, a intempestividade da defesa e o consequente reconhecimento da revelia.
Não bastasse, nos termos do art. 345, I, do CPC, havendo pluralidade de réus e algum deles contestar a ação, o efeito material da revelia não se aplica ao réu revel caso os fundamentos sejam comuns.
Nesse sentido:
RECURSO ELEITORAL. ELEIÇÕES MUNICIPAIS 2020. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL AIJE. FRAUDE A COTA DE GÊNERO. Preliminar de suspeição do Juízo não conhecimento. A suspeição deve ser formulada em petição específica dirigida ao juízo. Art. 146 do CPC. Preliminar. Da deficiência da representação processual dos recorridos (pelos recorrentes) rejeitada. Necessidade de intimação das partes para regularização. Providência determinada e cumprida. Juntada da procuração. Preliminar de nulidade do processo - Inadequação do rito processual à demanda apresentada rejeitada. Dos mandados de citação se extrai a notificação para apresentação de defesa no prazo de 5 (cinco) dias, conforme art. 22, I a da LC nº 64/90. Mérito: Revelia não caracterizada. Pluralidade de investigados. A defesa apresentada no prazo de lei por um dos réus impede os efeitos da revelia. Desnecessidade de litisconsórcio passivo com os candidatos suplentes em sede de AIJE, no bojo da qual se discute fraude à cota de gênero. Precedentes. TSE. Retorno dos autos à origem para prosseguimento do feito. Processo que não se encontra maduro para julgamento. O pedido de condenação por litigância de má-fé deve ser formulado em recurso próprio e não em sede de contrarrazões, Recurso provido em parte. Prejudicado pedido de efeito suspensivo. (TRE-MG - RE: 0601138-16.2020.6.13.0087 CATAS ALTAS DA NORUEGA - MG 060113816, Relator: Marcos Lourenco Capanema De Almeida, Data de Julgamento: 29/09/2021, Data de Publicação: DJEMG-, data 07/10/2021).
NO MÉRITO
Na presente ação, proposta pelo Ministério Público Eleitoral, pretende-se apurar a ocorrência de condutas vedadas e abuso de poder praticados pelos investigados
Nos termos do artigo 22 da Lei Complementar nº 64/90, cabe à Justiça Eleitoral apurar o abuso de poder econômico e político, em prol de determinados candidatos ou partido político, em consonância ao disposto na Constituição Federal no tocante aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (artigo 37).
DO ABUSO DE PODER ECONÔMICO
Abuso de poder econômico ocorre quando há utilização excessiva de recursos patrimoniais em prol de determinada candidatura.
A legislação eleitoral disciplina a questão nos dispositivos abaixo mencionados:
Artigo 14, § 9º Constituição Federal:
Art. 14 [...].
§ 9º Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.
Artigo 237 do Código Eleitoral:
Art. 237. A interferência do poder econômico e o desvio ou abuso do poder de autoridade, em desfavor da liberdade do voto, serão coibidos e punidos.
Artigos 19 e 22 da Lei Complementar 64/90:
Art. 19. As transgressões pertinentes à origem de valores pecuniários, abuso do poder econômico ou político, em detrimento da liberdade de voto, serão apuradas mediante investigações jurisdicionais realizadas pelo Corregedor-Geral e Corregedores Regionais Eleitorais.
Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito: [...].
Para Adriano Soares da Costa, abuso de poder econômico configura “vantagem dada a uma coletividade de eleitores, indeterminada ou determinável, beneficiando-os pessoalmente ou não, com a finalidade de obter-lhes o voto” (COSTA, Adriano Soares da. Instituições de Direito Eleitoral. 8. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009).
Oportuno consignar a definição que segue:
“a realização de ações (ativas ou omissivas) que consubstanciam mau uso de recurso, estrutura, situação jurídica ou direito patrimoniais em proveito ou detrimento de candidaturas.
Para a configuração do ilícito, é necessário que a conduta abusiva tenha em vista processo eleitoral em curso ou futuro. Normalmente, ocorre durante o período de campanha, embora também possa acontecer antes de seu início, no denominado período de pré-campanha ou mesmo em época ainda mais recuada. Mas é certo que na ausência de liame eleitoral, não há como caracterizar o abuso do poder econômico como ilícito eleitoral, já que o patrimônio, em regra, é disponível.
Dispõe o artigo 237, caput, do Código Eleitoral: "A interferência do poder econômico e o desvio ou abuso do poder de autoridade, em desfavor da liberdade do voto, serão coibidos e punidos". O processo eleitoral e as eleições assim viciadas são anuláveis, conforme proclama o artigo 222 do mesmo código.” (Tribunal Regional Eleitoral de Pará TRE-PA - Recurso Eleitoral: RE 0600405-33.2020.6.14.0019 MONTE ALEGRE - PA)
Na hipótese dos autos, tem-se a ocorrência de abuso de poder econômico em razão da forma como foi realizada a festa Expolag 2024, da distribuição de cestas básicas com alimentos angariados no evento, bem como da utilização de celular corporativo em favor da candidatura do investigado.
DO ABUSO DE PODER POLÍTICO
Abuso de poder político pode ser entendido como desvio de finalidade no exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta que atente contra a normalidade e a legitimidade das eleições, nos termos do artigo 14, § 9º da Constituição Federal.
Consoante o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral:
“[o] abuso de poder político configura-se quando a normalidade e a legitimidade do pleito são comprometidas por atos de agentes públicos que, valendo-se de sua condição funcional, beneficiam candidaturas em manifesto desvio de finalidade” (RO–El 0603975–98/PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJE 10/12/2021). (Tribunal Superior Eleitoral TSE: REspEl 0600896-07.2020.6.26.0213 OSASCO - SP 060089607)
"o abuso do poder político ocorre quando agentes públicos se valem da condição funcional para beneficiar candidaturas (desvio de finalidade), violando a normalidade e a legitimidade das eleições" (AgR-REspe nº 36.357/PA, rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 27.4.2010).
“caracteriza-se o abuso de poder quando demonstrado que o ato da Administração, aparentemente regular e benéfico à população, teve como objetivo imediato o favorecimento de algum candidato” (Tribunal Superior Eleitoral. Recurso Especial Eleitoral nº 25.074/RS).
Como preceitua Emerson Garcia, verifica-se a ocorrência do abuso de poder político quando o agente público se vale de seu poder para agir em benefício próprio ou de terceiros, visando a obter vantagens em campanha eleitoral:
“Pode-se dizer que o administrador público que não direciona seu obrar para o interesse público, mas sim em benefício próprio ou alheio, visando o pleito que se aproxima, incorre em flagrante violação a toda ordem de princípios estabelecidos na Constituição da República, os quais erigem-se como consectários lógicos e razão de ser do próprio Estado Social e Democrático de Direito” (Garcia, Emerson. Abuso de Poder Político. Abuso de Poder nas Eleições. Meios de Coibição. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2000)
Da análise do conteúdo probatório, verifica-se que o investigado Tiago Magno, na época prefeito, em segundo mandato, valendo-se da influência política e da utilização de recursos do erário, praticou atos de abuso de poder econômico e político em benefício dos demais investigados, que se valeram do seu apoio.
Nesse ponto específico, cabe mencionar o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral quanto ao abuso do poder político no sentido de que "[...] só pode ser praticado por quem detém a condição de agente público e se vale de sua condição funcional para desequilibrar o pleito eleitoral em benefício de sua candidatura ou de terceiros"(RO nº 1656-56/RR, rel. Min. LUÍS ROBERTO BARROSO, julgado em 13.12.2018, DJe de 15.3.2019).
DO EVENTO EXPOLAG 2024
Como já destacado anteriormente, na hipótese sub judice, a forma de realização do evento Expolag 2024 ensejou a caracterização de abuso de poder econômico e político.
De acordo com o demonstrado, em 2024, ocorreu expressivo aumento do valor gasto pelo Município de Lagoinha para a realização do evento, uma vez que:
“Comparados os valores gastos em 2023 (R$ 249.853,00) e 2024 (R$ 860.368,00), vê-se que, em 2024, o ente público, sob a direção do requerido Tiago, atual prefeito e apoiador do requerido José Guilherme (candidato a prefeito eleito), despendeu, para a realização da EXPOLAG, 300% a mais do que no ano de 2023.” (ID nº 134811174).
A parte autora afirma que a realização do evento em 2024, nos moldes como fora feito, beneficiou a candidatura dos investigados.
Por sua vez, arguem os investigados que o evento Expolag é uma tradição no Município de Lagoinha:
“Apesar de a festa ser realizada desde 1993, a Expolag foi declarada Patrimônio Cultural do município de Lagoinha pela Lei Complementar nº 787/2012, que erigiu a realização do festejo como obrigação do Município, a ser cumprida no mês de agosto de cada ano (Documento 02).
Art.1º – Fica declarada Patrimônio Cultural do município de Lagoinha – SP a Exposição Agropecuária, Torneio Leiteiro, Rodeio e Shows – EXPOLAG, que deverá ser realizada pelo Executivo Municipal no mês de agosto de cada ano, em dias a ser definidos pela administração pública municipal.”
Ressaltam ainda que, na gestão do investigado Tiago Magno, sempre foi realizada a festa Expolag, sendo tal fato apto a afastar a imputação de prática de abuso de poder, uma vez que a máquina pública não teria sido movimentada para oferecer benefício aos eleitores.
No tocante ao evento Expolag, os investigados juntaram aos autos:
1. Lei Complementar nº 787, de 27 de novembro de 2012, que “Declara Patrimônio Cultural do município de Lagoinha – SP a Exposição Agropecuária, Torneio Leiteiro, Rodeio e Shows – EXPOLAG, e dá outras providências correlatas” (ID nº 134811177).
2. Lei Complementar nº 990, de 15 de agosto de 2018, que “Declara Patrimônio Cultural do município de Lagoinha – SP a Exposição Agropecuária, Torneio Leiteiro, Rodeio e Shows – EXPOLAG, e dá outras providências correlatas” (ID nº 134811178).
3. Publicações do Evento Expolag 2019, 2022 e 2023 (ID nº 134811179).
4. Vídeo do investigado Tiago Magno divulgando a venda de ingressos para a Expolag 2023 (ID nº 134811182).
5. Vídeo propaganda Expolag 2023 – 30 anos (ID nº 134811181).
6. Vídeo do investigado Tiago Magno realizando propaganda Expolag 2023 – 30 anos (ID nº 134811183).
7. Vídeo do investigado Tiago Magno junto com o cantor Luan Pereira em propaganda da Expolag (ID nº 134811184).
Pois bem, do exame dos autos, constata-se que o evento Expolag figura como uma festa tradicional no Município de Lagoinha (ID nº 134811177 e ID nº 134811178).
Contudo, o cerne da questão não está na realização do evento, mas sim na forma como foi feita a festa e sua divulgação em 2024.
Nesse contexto, insta consignar que, da análise do acervo probatório, restou demonstrado que, no ano de 2024, o evento foi vinculado à campanha eleitoral dos investigados José Guilherme Correa, Ivan Carlos e Cristiano Alves Lino.
Em vídeo de divulgação da Festa Expolag 2024 (ID nº 1351160928), feito pelo investigado José Guilherme, foi incluída sua propaganda eleitoral, com a menção textual “PREFEITO ZECA 22 VICE IVAN DO TONHO BRANCO” durante todo o vídeo.
Cumpre ressaltar que o mencionado vídeo (ID nº 1351160928) é encerrado com o seguinte texto:
“PREFEITO ZECA VICE IVAN DO TONHO BRANCO 22 PL”
No documento, também consta o seguinte texto:
“Em 2019, com juntamente (sic) o Prefeito Tiago Magno, foi retomada a nossa tradicional Expolag, que havia sido extinta em 2017. A Expolag é um evento de grande importância pra a (sic) nossa cidade, carregando mais de 30 anos de história e tradição.
Sua continuidade é essencial para manter vivas nossas tradições e promover o desenvolvimento local, além de celebrar a cultura da nossa cidade.
VEM COM A GENTE É ZECA 22 PRA PREFEITO ”
Verifica-se que a realização do evento foi ligada à campanha eleitoral na forma de propaganda:
“PREFEITO ZECA VICE IVAN DO TONHO BRANCO 22 PL”
VEM COM A GENTE É ZECA 22 PRA PREFEITO ”
Desta forma, tem-se comprovado que a festa Expolag 2024 foi promovida às custas do erário municipal e houve indevida vinculação do evento com o fim de promoção pessoal e propaganda dos candidatos investigados.
Ao apreciar o aspecto econômico, há de se ponderar que o valor de R$ 860.368,00 (oitocentos e sessenta mil e trezentos e sessenta e oito reais), despendido para a realização do evento em 2024 foi mais que o triplo do valor gasto no evento do ano anterior (R$ 249.853,00 - duzentos e quarenta e nove mil, oitocentos e cinquenta e três reais) (ID nº 134349314).
Ainda, sob o ponto de vista econômico da realização do evento, há de se considerar que, no ano de 2023, ocorreu a venda de ingressos no valor de R$ 40,00 (quarenta reais) e R$ 60,00 (sessenta reais) (ID nº 134349314 e ID nº 134811182).
Em relação ao valor utilizado para a realização do evento, os investigados alegaram que:
“em comparação com os custos suportados em 2023, foram apresentados pela Prefeitura Municipal de Lagoinha ao Ministério Público Estadual (ID 134349358), que apontou a necessidade de adaptação da estrutura do local para que se tornasse acessível a pessoas com deficiência (PCD), resultando na ampliação das arquibancadas e na disponibilização de banheiros químicos adaptados, que, no ano de 2023, não estavam incluídos no contrato mencionado na inicial, de modo a ser verificar que os valores apontados não são indicativos de qualquer irregularidade, muito menos uma irregularidade eleitoral.” ( ID nº 134811174)
Ao analisar os argumentos mencionados pelos investigados, constata-se que não são aptos a justificar o expressivo aumento no valor despendido com a realização da festa.
Outrossim, o investigado Tiago Magno, ao realizar a propaganda da festa de 2024, por vezes, enaltece a dimensão do evento:
“para agradecer por conseguir fazer a maior festa do Vale do Paraíba” (ID nº 135160956).
“voltamos para mostrar que a nossa cidade merece uma festa deste porte uma festa grande” (ID nº 135160957).
Nesse cenário, verifica-se que, em 2024, buscou-se ampliar significativamente a dimensão da festa.
Assim, depreende-se que, embora a festa tenha sido realizada nos anos anteriores, é de se ponderar que, inegavelmente, no ano de 2024, o evento alcançou uma magnitude inédita, aliado à benesse da entrada solidária (não cobrança de ingresso), evidenciando a intenção dos investigados de utilizar a comemoração Expolag para interesses próprios, em prol das campanhas eleitorais e promoção pessoal.
Ou seja, além do montante três vezes maior para fazer frente às despesas do evento, houve, de outro lado, em 2024, a dispensa da cobrança do valor do ingresso, o que reforça a utilização da festa para fins eleitoreiros.
Evidente que a condição funcional do investigado Tiago Magno, então prefeito do município, possibilitou que fosse efetuado o gasto de R$ 860.368,00 (oitocentos e sessenta mil, trezentos e sessenta e oito reais) na realização do evento Expolag, bem como permitiu a arrecadação e distribuição de alimentos.
Assim, restou demonstrado que a realização e divulgação da festa Expolag 2024 teve a nítida intenção de promoção pessoal e obtenção de votos.
DA GRAVIDADE DA CONDUTA PRATICADA
Vinculação da campanha à divulgação do evento
No que se refere à configuração da prática de abuso político e econômico, cumpre mencionar que não mais se exige que a potencialidade da conduta praticada tenha o condão de alterar o resultado da eleição, bastando a gravidade das circunstâncias.
Nos termos do art. 22, inciso XVI, da LC nº 64/1990:
"para a configuração do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam".
Há de se examinar a gravidade das condutas praticadas pelos investigados, que se deu em razão da indevida utilização da máquina administrativa, por meio da forma de realização e divulgação da festa Expolag 2024, arrecadação de alimentos e irregular doação de cestas básicas.
Os vídeos juntados pelo Ministério Público (ID nº 134881004 até ID nº 134882415) comprovam que, com nítida finalidade eleitoral, houve a vinculação das pessoas e candidaturas dos investigados ao evento, evidenciando, assim, a prática de conduta grave que acarreta inaceitável favorecimento na disputa do pleito.
No caso dos autos, comprovou-se que houve o emprego de recursos do erário para a realização da festa Expolag 2024, sendo o evento utilizado para impulsionar a candidatura dos investigados José Guilherme, Ivan Carlos e Cristiano Alves Lino, bem como serviu para promoção pessoal de Tiago Magno.
Destaco, ainda, que a realização de evento de grande porte, promovido com recurso público, com contratações artísticas, acarreta a aglomeração de eleitores e, em se tratando de pequeno colégio eleitoral (5.569 eleitores), torna evidente a gravidade da conduta que feriu o princípio da isonomia entre os candidatos.
DA PRÁTICA DE CONDUTA VEDADA
A lei nº 9.504/1997 disciplina, nos artigos 73 até o 78, as condutas proibidas aos agentes públicos no período da campanha eleitoral.
A vedação imposta busca garantir a igualdade entre os candidatos na disputa. Sobre a questão, oportuna a explanação do Supremo Tribunal Federal:
A Lei nº 9.504/97 trouxe inovações importantes em prol da lisura das eleições e, essencialmente, da igualdade de oportunidades entre os candidatos, estabelecendo vedações aos agentes públicos durante a campanha eleitoral e penalidades de multa, de cassação do registro e até mesmo do diploma dos candidatos beneficiados pelo uso da máquina administrativa em favor de partidos ou candidatos.
Tais condutas foram tipificadas como ilícitos eleitorais a fim de mitigar eventual vantagem competitiva por parte dos agentes públicos em virtude do instituto da reeleição, introduzido em nossa Carta Política por meio da Emenda Constitucional nº 16, de 4 de junho de 1997.
Nesse sentido, o Tribunal Superior Eleitoral afirmou, em casos envolvendo a prática das condutas vedadas, que a normalidade e a legitimidade do pleito, previstas no art. 14, § 9º, da Constituição Federal, decorrem da ideia de igualdade de chances entre os competidores , entendida como a necessária concorrência livre e equilibrada entre os partícipes da vida política, sem a qual se compromete a própria essência do processo democrático (REspe nº 695-41/GO, Rel. Min. Gilmar Mendes , DJe de 26/6/15).
Na mesma linha,
"[o] Tribunal Superior Eleitoral definiu que as normas disciplinadoras das condutas vedadas aos agentes públicos em campanha eleitoral têm por finalidade evitar a utilização da máquina administrativa em benefício de determinada candidatura, prejudicando as demais" (REspe nº 798-72/RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJe de 11/12/14).
Tais normas vieram a conferir maior concretude ao princípio da isonomia ou paridade de armas entre os candidatos , uma vez que a Lei Complementar nº 64/90, conquanto já houvesse instituído procedimentos para a apuração e a repressão contra os abusos de poder em suas diversas modalidades - econômico, de autoridade e dos meios de comunicação -, em detrimento da liberdade do voto, exigia, para a caracterização da prática abusiva, sua potencialidade para interferir no resultado das eleições, o que dificultava sobremaneira a efetividade das sanções legais e, por conseguinte, reduzia o alcance da proteção aos bens jurídicos tutelados pelo art. 14, § 9º, da Carta Política.(Ação Direta de Inconstitucionalidade: ADI 71178 DF)
Para sua configuração “é suficiente a demonstração da sua prática e respectiva tipificação legal. Significa dizer, sua caracterização tem natureza objetiva, independentemente de sua influência no pleito, ou mesmo a potencialidade lesiva ou a gravidade da conduta realizada” (RepEsp 0603729-25.2022.6.21.0000 PORTO ALEGRE - RS 060372925).
Cabe ressaltar que, como mencionado no julgado acima, busca-se coibir a indevida utilização da máquina administrativa em benefício de candidaturas específicas, violando, assim, os princípios de impessoalidade e moralidade.
Da análise do acervo probatório, constatam-se as seguintes práticas de condutas vedadas:
DA UTILIZAÇÃO DE BEM PÚBLICO
Configura prática de conduta vedada o uso de bem pertencente ao município em campanha eleitoral.
Art. 73, inciso I - utilização de bem público
Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:
I - ceder ou usar, em benefício de candidato, partido político ou coligação, bens móveis ou imóveis pertencentes à administração direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, ressalvada a realização de convenção partidária;
Nos autos, foi comprovada a utilização de recursos públicos no montante expressivo de R$ 860.368,00 (oitocentos e sessenta mil, trezentos e sessenta e oito reais) para a realização do evento Expolag 2024.
De igual modo, demonstrou-se que as candidaturas dos investigados foram vinculadas ao evento, violando o princípio de igualdade entre os candidatos.
Consta dos autos (ID nº 134349346):
CONTRATO CELEBRADO ENTRE O MUNICÍPIO DE LAGOINHA/SP, E A EMPRESA A. M. FIGUEIRA EVENTOS, REFERENTE À CONTRATAÇÃO DE EMPRESA PARA FORNECIMENTO DA ESTRUTURA, ORGANIZAÇÃO E EXECUÇÃO DA FESTA DE PEÃO DE BOIADEIRO “EXPOLAG 2024”
Valor global R$ 578.468,00 (quinhentos e setenta e oito mil, quatrocentos e sessenta e oito reais).
Inegável, portanto, que o poder público municipal custeou a realização do evento Expolag, que foi inaceitavelmente utilizado em prol da promoção pessoal e campanha dos investigados.
Ainda, no tocante à mencionada hipótese de conduta vedada, ocorreu a indevida utilização de telefone corporativo da Secretaria de Finanças de Lagoinha para fins de propaganda do a época candidato “Zeca” (José Guilherme), antes do prazo previsto na Lei nº 9.504/97.
Da análise do vídeo juntado aos autos, constata-se que o número de telefone 12 – 9 9760 4758 pertence ao município de Lagoinha e é destinado à Secretaria de Finanças (ID nº 134882415).
Ficou evidenciado que, em maio de 2024, o telefone de propriedade do município de Lagoinha foi utilizado para a realização de campanha do então pré-candidato, o investigado José Guilherme Correa (ID nº 134349331).
DA DISTRIBUIÇÃO DE CESTAS BÁSICAS
In casu, alega-se que houve a distribuição de cestas básicas de forma irregular, em período eleitoral, configurando a conduta vedada disposta no artigo 73, § 10 da Lei 9.504/97:
Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:
§ 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa.
Em defesa, os investigados sustentaram que a doação de cestas básicas está prevista pela Lei Municipal nº 984/2018, configurando, assim, exceção à conduta vedada (ID n. 134811173).
Foi juntada aos autos cópia da Lei nº 984/2018, que “CRIA O PROGRAMA SOCIAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ALIMENTOS, VOLTADO PARA FAMÍLIAS DE BAIXA RENDA E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS” (ID nº 134811185), bem como o registro da despesa empenhada com alimentos no ano de 2023 (ID nº 134811186).
Não obstante o alegado pelos investigados, da análise do conjunto probatório (ID nº 135161413, ID nº 135161414 e ID nº 135161417) constata-se que a distribuição dos alimentos não guarda relação com o programa previsto em lei, uma vez que tais mantimentos foram obtidos em troca da “entrada solidária” na Expolag 2024.
Conforme mencionado em vídeo pelo investigado Tiago Magno, no evento foram arrecadados mais de 13.000 (treze mil) quilos de alimentos não perecíveis (ID nº 135161414).
Houve ampla divulgação da arrecadação e distribuição dos alimentos arrecadados (ID nº 135161413, ID nº 135161414 e ID nº 135161417).
Nesse contexto, a arrecadação e doação de alimentos serviu para realizar a promoção pessoal e alavancar a candidatura dos investigados que tiveram suas imagens atreladas à referida distribuição.
Senão, vejamos: o dispositivo legal acima mencionado proíbe que a Administração Pública realize a distribuição de bens, valores ou benefícios em ano eleitoral. Como exceção, será autorizada a distribuição nas hipóteses de calamidade pública, estado de emergência ou se proveniente de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior.
Denota-se que não há proibição de continuidade do programa social. Contudo, busca-se inibir que a distribuição de bens seja realizada com desvio de finalidade, não sendo, todavia, necessário demonstrar o caráter eleitoreiro do agente.
Nesse sentido, entendimento do Tribunal Superior Eleitoral:
ELEIÇÕES 2014. RECURSO ORDINÁRIO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE) POR SUPOSTA CONDUTA VEDADA E ABUSO DO PODER POLÍTICO. GOVERNADOR E VICE-GOVERNADOR. CONCESSÃO DE TRÊS BENEFÍCIOS FISCAIS EM ANO ELEITORAL. NÃO CARACTERIZAÇÃO DA CONDUTA VEDADA DO ART. 73, § 10, DA LEI 9.504/97.
(...)
3. Apesar de o acórdão do TRE da Paraíba concluir pela inexistência de caráter eleitoreiro para afastar a caracterização da conduta vedada, entende-se, no ponto, que a hipótese dos autos merece outra leitura. Isso porque esta Corte já firmou a compreensão de que, para caracterizar a conduta vedada prevista no art. 73, § 10, da Lei 9.504/97, não é necessário demonstrar caráter eleitoreiro ou promoção pessoal do agente público, bastando a prática do ato ilícito (AgR- REspe 36.026 [42074-81]/BA, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO JUNIOR, DJe de 5.5.2011). E, segundo o voto proferido pela eminente Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, exarado na Rp 3296- 75/ DF, julgado em 9.2.2017, Rel. designado Min. HERMAN BENJAMIN: a norma legal que fundamenta esta Representação - art. 73, I, da Lei 9.504/97 - tem como propósito impedir, a um só tempo, que agentes públicos, utilizando-se da máquina governamental, realizem condutas que, por presunção legal, possam afetar a igualdade de oportunidades entre os candidatos nos pleitos eleitorais, independentemente de sua repercussão, análise que será feita no momento da aplicação das sanções, com observância da proporcionalidade em caso de eventual procedência da Representação. (...)
(Recurso Ordinário nº 171821, Relator Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJE de 28/06/2018)
Considero caracterizada a prática de conduta vedada disposta no artigo 73, § 10 da Lei 9.504/97. Sobre o tema, cabe destacar o seguinte julgado:
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DE RORAIMA RECURSO ELEITORAL (11548) – 0600183–64.2020.6.23 .0003 Relator.: Des. MOZARILDO MONTEIRO CAVALCANTI RECORRENTE: UESLEY CUNHA SANTIAGO, RAIMUNDO NONATO MOURAO DE MELO, JOAO ELI SOUSA SILVA Advogado dos RECORRENTES: HENRIQUE KEISUKE SADAMATSU – RR0000208 RECORRIDO: PROMOTOR ELEITORAL DO ESTADO DE RORAIMA REPRESENTANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE RORAIMA RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ABUSO DE PODER . PRELIMINAR. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. REJEIÇÃO. DISTRIBUIÇÃO DE CESTAS BÁSICAS EM ANO ELEITORAL . CONDUTA VEDADA. ART. 73, X, DA LEI N. 9 .504/97. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. 1 . Na AIJE por abuso do poder político não há litisconsórcio passivo necessário entre os candidatos beneficiados e o autor da conduta ilícita. 2. Caracteriza conduta vedada a distribuição de cestas básicas a eleitores em ano eleitoral, com a presença dos candidatos e sem identificação objetiva dos beneficiários de programa social regularmente instituído e em andamento. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os Juízes do Tribunal Regional Eleitoral de Roraima, por maioria, em conhecer do recurso para, no mérito, negar–lhe provimento, nos termos do voto relator . Boa Vista (RR), 24 de novembro de 2021. Des. MOZARILDO MONTEIRO CAVALCANTI Relator (TRE-RR - REl: 06001836420206230003 ALTO ALEGRE - RR 060018364, Relator: Des. Mozarildo Monteiro Cavalcanti, Data de Julgamento: 24/01/2022, Data de Publicação: 09/03/2022).
DA CONDUTA DO INVESTIGADO CRISTIANO ALVES LINO
A disposição contida no artigo 73, inciso IV, proíbe o uso promocional na distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeados ou subvencionados pelo poder público, sendo vedado o desvio de finalidade para favorecer candidaturas:
Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:
(...)
"IV - fazer ou permitir uso promocional em favor de candidato, partido político ou coligação, de distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeados ou subvencionados pelo poder público."
Para a tipificação da conduta descrita acima, basta o enquadramento objetivo à disposição legal.
Consta dos autos que o investigado Cristiano, valendo-se da condição de vereador, realizou postagem de foto junto aos alimentos angariados, vinculando sua imagem à arrecadação e distribuição (ID nº 134882414).
Na mencionada publicação, consta o seguinte texto:
“05/09 Vereador Tano do Tonho Branco.
No dia de hoje estive acompanhando e fiscalizando os alimentos que foram arrecadados na doação solidária da expolag. Com a finalidade em saber como está sendo a distribuição e quais requisitos para receber as cestas e também tive acesso à lista das pessoas que receberam.
Ainda teremos mais distribuições e eu continuarei acompanhando de perto!
Att; Vereador Tano do Tonho Branco”
Cabe ressaltar que a página na qual ocorreu a referida publicação era utilizada pelo investigado para realizar sua campanha eleitoral:
“Olá meus amigos passando aqui para pedir seu voto e apoio. E dizer que podem contar cmg (sic).
Aqui vocês tem voz!
Quero continuar sendo aquele vereador que é tbm (sic) seu amigo, aquele que tira um tempo para conversar com vcs (sic), que leva pro (sic) executivo seu problema que retorna à você com respostas e soluções. Que não deixa vc (sic) na mão!
Já faço e quero continuar fazendo, quero poder contribuir cada vez mais com melhorias em nossa cidade. Conto com todos vocês!
TANO DO TONHO BRANCO” (ID nº 134882414).
Desta forma, verifica-se que ocorreu desvio de finalidade da prerrogativa que o cargo de vereador lhe confere, por isto teve acesso aos alimentos doados e utilizou a distribuição em prol de sua candidatura.
Comprovou-se que o investigado Cristiano Alves Lino buscou vincular sua imagem a doação de cestas básicas, configurando a prática de conduta vedada disposta no artigo 73, inciso IV da Lei 9.504/97.
Nesse sentido:
"o uso de programa social custeado pelo erário, para fins de promoção de candidatura, caracteriza a conduta vedada do art. 73, IV, da Lei nº 9.504/97" (AgR-REspe nº 192-98/CE, rel. Min. LUCIANA LÓSSIO, julgado em 12.2.2015, DJe de 18.3.2015).
DA POTENCIALIDADE DA CONDUTA ALTERAR O RESULTADO DA ELEIÇÃO
Em que pese o potencial de influenciar no resultado da eleição não figure como condição para a tipificação da conduta abusiva, este fato pode ser considerado para demonstrar a reprovabilidade da conduta. Nesse sentido:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO ORDINÁRIO DESPROVIDO. CONTRADIÇÃO. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. INCONFORMISMO. PRETENSÃO DE REEXAME DA MATÉRIA. INCONFORMISMO.
[...].
2. Embora a mensuração dos reflexos eleitorais da conduta não seja fator determinante para a configuração do abuso, nada impede que tal juízo possa ser considerado pelo julgador, para efeito de ponderação jurídica sob o aspecto do princípio da razoabilidade, que deve nortear a esfera eleitoral.
3. Esta Corte já consignou que, "para se caracterizar o abuso de poder, impõe-se a comprovação, de forma segura, da gravidade dos fatos imputados, demonstrada a partir da verificação do alto grau de reprovabilidade da conduta (aspecto qualitativo) e de sua significativa repercussão a fim de influenciar o equilíbrio da disputa eleitoral (aspecto quantitativo). A mensuração dos reflexos eleitorais da conduta, não obstante deva continuar a ser ponderada pelo julgador, não constitui mais fator determinante para a ocorrência do abuso de poder, agora revelado, substancialmente, pelo desvalor do comportamento"(AIJE 0601779-05, rel. Min. Luís Felipe Salomão, DJE de 11.3.2021).
[...]
(ED-RO-El nº 0603879-89/BA, rel. Min. Sérgio Banhos, julgados em 23.9.2021, DJe de 1º.10.2021)
No caso em tela, analisando as provas, mostra-se patente que as condutas abusivas e vedadas praticadas foram aptas a desequilibrar o resultado das eleições, uma vez que a candidatura dos investigados foi beneficiada, restando violado o princípio da isonomia entre os candidatos.
Destaque-se, ainda, que o Município de Lagoinha conta com apenas 5.569 (cinco mil, quinhentos e sessenta e nove) eleitores.
Neste cenário, cabe ressaltar que os investigados José Guilherme e Ivan Correa receberam 1.688 (mil, seiscentos e oitenta e oito) votos, o que equivale a 37,86% dos votos (ID nº 134373527).
Por sua vez, o segundo colocado obteve 1.187 (mil, cento e oitenta e sete) votos, o que equivale a 26,62% (ID nº 134373527), sendo de 501 votos a diferença.
Assim, evidente a demonstração da gravidade da conduta, que beneficiou a candidatura dos investigados e foi apta para acarretar o desequilíbrio das eleições (ID nº 134373527).
DO JULGAMENTO
Por fim, considero que os investigados praticaram ou foram beneficiados por atos de abuso de poder político e econômico, bem como ilícitos de conduta vedada.
O conteúdo probatório comprovou a prática de condutas que macularam a legitimidade e a lisura das eleições de 2024 no Município de Lagoinha.
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a presente Ação de Investigação Judicial Eleitoral para condenar os investigados JOSÉ GUILHERME CORRÊA GOMES e IVAN CARLOS CORRÊA:
I. à MULTA no valor de 5 mil UFIR, nos termos do § 4º do artigo 73 da Lei n. 9.504/97, pela prática de conduta vedada aos agentes públicos;
II. à CASSAÇÃO dos diplomas expedidos pela Justiça Eleitoral para os cargos de Prefeito e Vice-Prefeito do Município de LAGOINHA-SP, pela violação ao disposto nos § § 5º e 10 do artigo 73, da Lei nº 9.504/97, bem como pela prática de abuso de poder econômico e político, nos termos do artigo 22, inciso XIV, da Lei Complementar nº 64/1990;
III. à INELEGIBILIDADE para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos subsequentes à eleição em que se verificou o abuso, nos termos do artigo 22, inciso XIV, da Lei Complementar nº 64/1990.
Quanto ao investigado CRISTIANO ALVES LINO:
I. à MULTA no valor de 5 mil UFIR, nos termos do § 4º do artigo 73 da Lei nº 9.504/97, pela prática de conduta vedada aos agentes públicos;
II. à CASSAÇÃO do registro de candidatura, pela violação ao disposto nos § § 5º e 10, do artigo 73, da Lei nº 9.504/97;
III. à INELEGIBILIDADE para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos subsequentes à eleição em que se verificou o abuso, nos termos do artigo 22, inciso XIV, da Lei Complementar nº 64/1990.
Quanto ao investigado TIAGO MAGNO DE OLIVEIRA:
I. à MULTA no valor de 5 mil UFIR, nos termos do § 4º do artigo 73 da Lei nº 9.504/97, pela prática de conduta vedada aos agentes públicos;
II. à INELEGIBILIDADE para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos subsequentes à eleição em que se verificou o abuso, nos termos do artigo 22, inciso XIV, da Lei Complementar nº 64/1990.
Deixo de aplicar a penalidade de recomposição ao erário, uma vez que a apuração de eventual prática de improbidade administrativa deve ser apurada em autos próprios, havendo a notícia de procedimento administrativo para este fim já em trâmite (SISMP Digital nº 0435.0000034/2024).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
São Luiz do Paraitinga, na data da assinatura eletrônica.
ANA LETÍCIA OLIVEIRA DOS SANTOS
Juíza da 128ª Zona Eleitoral