JUSTIÇA ELEITORAL
029ª ZONA ELEITORAL DE ROLIM DE MOURA RO
REPRESENTAÇÃO (11541) Nº 0600040-82.2024.6.22.0029 / 029ª ZONA ELEITORAL DE ROLIM DE MOURA RO
REPRESENTANTE: ALDAIR JULIO PEREIRA
Advogado do(a) REPRESENTANTE: KAMILA BARBOSA DOS SANTOS LOPES BORGES - RO12157
REPRESENTADO: JULIANO SILVERIO
Advogados do(a) REPRESENTADO: SHARLESTON CAVALCANTE DE OLIVEIRA - RO4535, MANOEL VERISSIMO FERREIRA NETO - RO3766-A, JUACY DOS SANTOS LOURA JUNIOR - RO656-A
I - RELATÓRIO:
Trata-se de representação ajuizada por Aldair Júlio Pereira em face de Juliano Silvério, todos já qualificados nos autos.
Alega que é prefeito municipal e que o representado, reiteradamente, vem gravando vídeos e materiais contendo mentiras com o objetivo de vinculá-lo ao governo do presidente Lula, com ímpeto de prejudicar sua candidatura, o que traduziria campanha negativa antecipada.
Houve determinação da emenda da inicial (id. 122203302) para que o representante declinasse os endereços eletrônicos (link), o que o fez (id. 122203302).
Ao final, pugnou pela retirada dos vídeos da internet, bem como aplicação de multa.
Intimado, o representado apresentou defesa (id. 122211812) alegando, inicialmente, que o representante não apresentou provas, indícios e circunstâncias do suposto fato irregular a criar um liame entre a conduta e o suposto ato ilícito.
Alega ainda, que os vídeos apresentados não demonstram qualquer transgressão, pedido de voto ou propaganda negativa, tampouco atinge o caráter do represente.
Ao final, pugna pela improcedência dos pedidos.
Aberto vista ao MPE para manifestação, transcorreu-se o prazo em branco. (Id 122218288)
É o relato do necessário.
II - FUNDAMENTAÇÃO:
Há nos autos provas suficientes para o deslinde da causa, nos termos dos arts. 139, inciso II e 355, inc. I, ambos do CPC e 5.º inciso LXXVIII, da Constituição Federal, não se vislumbrando a necessidade de produção de outras elementos, sem que isso afigure cerceamento de defesa. Neste sentido: STJ, 1ª Turma, AgRg nos EDcl no REsp 1136780/SP, Rel. Ministro Luiz Fux, j. em 6/4/2010, DJe 3/8/2010; TRF5 - Apelação Civel: AC 367338 AL 2001.80.00.006638-0 e TJRO Proc. nº: 10000720070006540.
Não foram deduzidas preliminares.
MÉRITO:
Dispõe a Constituição Federal:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
[...]
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;
A jurisprudência é pacífica no que tange ao dever do Estado de assegurar o livre exercício da liberdade de expressão, que inclui, inclusive, o direito à crítica. Veja-se entre outros:
“Agravos regimentais no recurso especial eleitoral. Propaganda eleitoral na televisão. Art. 45, iii, da lei n° 9.504/97. Questão de fundo. Direito à crítica. Liberdade de expressão e de imprensa. Pressupostos ao adequado funcionamento das instituições democráticas. Preferred position da liberdade de expressão e seus corolários na seara eleitoral. Desprovimento. 1. A liberdade de expressão reclama proteção reforçada em um Estado Democrático de Direito "não porque ela é uma forma de auto-expressão, mas porque ela é essencial à autodeterminação coletiva" [...] 2. Conquanto inexista hierarquia formal entre normas constitucionais, é possível advogar que os cânones jusfundamentais da liberdade de imprensa e de informação atuam como verdadeiros vetores interpretativos no deslinde de casos difíceis (hard cases). [...]”. (grifei)
(Ac. de 18.08.2016 no AgR-REspe nº 214551, rel. Min. Luiz Fux.)
ELEIÇÕES 2012. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. PEDIDO DE DESISTÊNCIA FORMULADO PELA COLIGAÇÃO AVANÇA PINDA COM EXPERIÊNCIA. DESISTÊNCIA HOMOLOGADA. ELEIÇÕES 2012. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PARQUET ELEITORAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. PROPAGANDA ELEITORAL NEGATIVA VEICULADA EM IMPRENSA ESCRITA. CONTEÚDO DE INTERESSE PÚBLICO COLETIVO. POSIÇÃO PREFERENCIAL DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO E SEUS COROLÁRIOS NA SEARA ELEITORAL. POSSIBILIDADE DE REVALORAÇÃO JURÍDICA DOS FATOS DELINEADOS NO ACÓRDÃO REGIONAL EM SEDE EXTRAORDINÁRIA. MANUTENÇÃO DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO ATACADA. DESPROVIMENTO. 1. A exteriorização de opiniões, por meio da imprensa escrita, sejam elas favoráveis ou desfavoráveis, faz parte do processo democrático, não podendo, bem por isso, ser afastada, sob pena de amesquinhá-lo e, no limite, comprometer a liberdade de expressão, legitimada e legitimadora do ideário de democracia. 2. In casu, infere-se da moldura fática delineada no acórdão regional que as notícias veiculadas no jornal local, "Jornal Pindense", cujo conteúdo encerra crítica a outro candidato, não desbordam do limite da liberdade de expressão, porquanto encontram-se ancoradas em indubitável interesse público.
[...]
(TSE - RESPE: 68579 PINDAMONHANGABA - SP, Relator: LUIZ FUX, Data de Julgamento: 06/09/2016, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Volume -, Tomo 205, Data 25/10/2016, Página 30/31)
LIBERDADE DE EXPRESSÃO E PLURALISMO DE IDEIAS. VALORES ESTRUTURANTES DO SISTEMA DEMOCRÁTICO. INCONSTITUCIONALIDADE DE DISPOSITIVOS NORMATIVOS QUE ESTABELECEM PREVIA INGERÊNCIA ESTATAL NO DIREITO DE CRITICAR DURANTE O PROCESSO ELEITORAL. PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL AS MANIFESTAÇÕES DE OPINIÕES DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO E A LIBERDADE DE CRIAÇÃO HUMORISTICA.
1. A Democracia não existirá e a livre participação política não florescerá onde a liberdade de expressão for ceifada, pois esta constitui condição essencial ao pluralismo de ideias, que por sua vez é um valor estruturante para o salutar funcionamento do sistema democrático.
2. A livre discussão, a ampla participação política e o princípio democrático estão interligados com a liberdade de expressão, tendo por objeto não somente a proteção de pensamentos e ideias, mas também opiniões, crenças, realização de juízo de valor e críticas a agentes públicos, no sentido de garantir a real participação dos cidadãos na vida coletiva.
3. São inconstitucionais os dispositivos legais que tenham a nítida finalidade de controlar ou mesmo aniquilar a força do pensamento crítico, indispensável ao regime democrático. Impossibilidade de restrição, subordinação ou forçosa adequação programática da liberdade de expressão a mandamentos normativos cerceadores durante o período eleitoral.
4. Tanto a liberdade de expressão quanto a participação política em uma Democracia representativa somente se fortalecem em um ambiente de total visibilidade e possibilidade de exposição crítica das mais variadas opiniões sobre os governantes.
5. O direito fundamental à liberdade de expressão não se direciona somente a proteger as opiniões supostamente verdadeiras, admiráveis ou convencionais, mas também aquelas que são duvidosas, exageradas, condenáveis, satíricas, humorísticas, bem como as não compartilhadas pelas maiorias. Ressalte-se que, mesmo as declarações errôneas, estão sob a guarda dessa garantia constitucional.
6. Ação procedente para declarar a inconstitucionalidade dos incisos II e III (na parte impugnada) do artigo 45 da Lei 9.504/1997, bem como, por arrastamento, dos parágrafos 4º e 5º do referido artigo. (grifei).
(STF - DJe nº 44/2019 Divulgação: sexta-feira, 01 de março de 2019. Publicação: quarta-feira, 06 de março de 2019)
A resolução TSE 23.610/19, que dispõe sobre a propaganda eleitoral, traz a seguinte redação:
Art. 27. É permitida a propaganda eleitoral na internet a partir do dia 16 de agosto do ano da eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 57- A) . ( Vide, para as Eleições de 2020, art. 11, inciso II, da Resolução nº 23.624/2020 )
§ 1º A livre manifestação do pensamento de pessoa eleitora identificada ou identificável na internet somente é passível de limitação quando ofender a honra ou a imagem de candidatas, candidatos, partidos, federações ou coligações, ou divulgar fatos sabidamente inverídicos, observado o disposto no art. 9º-A desta Resolução. (Redação dada pela Resolução nº 23.671/2021)
§ 2º As manifestações de apoio ou crítica a partido político ou a candidata ou candidato ocorridas antes da data prevista no caput deste artigo, próprias do debate democrático, são regidas pela liberdade de manifestação.
Para melhor compreensão fática e jurídica, transcrevo partes dos vídeos ora em análise:
Vídeo 1 (Id 122205885)
https://www.instagram.com/reel/C9AlO_lJkP0/?igsh=MXhmNG9waWJ2cm82Nw==
Representado: "ele classificou a direito e a esquerda como se fosse igual, as propostas da direita iguais da esquerda".
Representante: (...)
Representado: "Realmente a gente vive debaixo desse teto"
Representado: "é, nós da direita, conservadores a gente tem uma interpretação sobre o que aconteceu nas eleições, só que a gente está sendo calado e perseguido.
representante: (...) quer trabalhar um projeto de direito, trabalhe um projeto de forma diferente, um projeto inteligente.
Representado: "ele acabou de falar que a direita é burra, que a gente não tem projetos inteligentes".
representante: (...) "brigando e soltando fake news pra todo lado em cima da atual gestão"
Representado: "Fake news é falar que o o Lula é a favor do aborto? que o Lula é a favor das drogas? que o Lula vai acabar com o Brasil? que o Lula é amigo de ditador?"
Representante: (...)
Representado: "é meus amigos, ficou bem claro que o atual gestor tem um lado de centro-esquerda, e você, que é de direita conservador você vai concordar com isso?"
Vídeo 2 (Id 122205885)
https://www.instagram.com/reel/C9dfgvBO2Qu/?igsh=cmpzbnI5MHN5dmRv
Falas do representado:
Sabia que as CPIs são importantes para o município? Será que Rolim de Moura anda tudo mil maravilhas? que nada pode ser investigado? e eu falo pra vocês o seguinte: a gente tem que criar urgentemente uma CPI sobre o lixo. Da maneira que ta sendo pago, da maneira que tá sendo criada essas licitações, tanto ela na coleta seletiva quanto na na normal, já vieram algumas pessoas me comentar sobre essa situação
CPIs sobre transportes escolares, se realmente aquele valor que está sendo pago pelo transporte escolares nas linhas, nas zonas rurais, é aquele valor que tem que ser pago.
CPIs sobre os imóveis alugados, tipo, escolas particulares que estão sendo alugadas pelo município sendo que talvez a gente construindo salas aí trazendo melhor qualidade para os nossos alunos, nossas crianças,
CPIs também sobre os veículos alugados. Isso mesmo. A secretaria de obras utiliza ainda aluguel de alguns veículos aí para dar manutenção na cidade. Será que adquirir um veículo exclusivo para prefeitura não seria melhor?
E tem uma CPI que a gente tem que fazer urgentemente é sobre os terrenos abandonados. Olha só. Deveria esses terrenos que não estão pagando impostos ir pra leilão. Mas ninguém vê leilão, notícia lugar nenhum que tá indo pra leilão, simplesmente acontece de serem quitados esses impostos. E simplesmente algumas empresas, algumas pessoas da nossa cidade ficam com ele né? É muito engraçado. Por isso precisamos urgentemente ter CPI sim, para investigar esse tipo de situação.
Como se observa então não há que se falar em propaganda eleitoral negativa, tratando-se apenas da manifestação do pensamento nos limites assegurados pela Constituição.
Com efeito, o conceito de propaganda eleitoral negativa, conforme entendimento do TSE, "pressupõe o pedido explícito de não voto ou ato que, desqualificando pré candidato, venha a macular sua honra ou imagem ou divulgue fato sabidamente inverídico" (Ac. de 5.9.2023 no AgR-REspEl nº 060123159, rel. Min. Benedito Gonçalves.).
No vídeo 1, por exemplo, (https://www.instagram.com/reel/C9AlO_lJkP0/?igsh=MXhmNG9waWJ2cm82Nw==) , o representado fez apenas comentários a uma entrevista dada pelo autor, não lhe dirigindo nem pedindo explicitamente que não se votasse nele.
De igual forma no vídeo 2 (https://www.instagram.com/reel/C9dfgvBO2Qu/?igsh=cmpzbnI5MHN5dmRv), o que se tem é o protesto pela abertura de CPIs para tratar de assuntos diversos que, segundo o representado, reclamariam investigação.
Em ambas as publicações, cuida-se de mera crítica política que não ultrapassou os limites da liberdade de expressão, sendo próprio do debate democrático.
III - DISPOSITIVO:
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTEs os pedidos, e, por conseguinte, extingo o feito com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC.
Publique-se, registre-se e intimem-se.
Após o trânsito em julgado, arquive-se.
Rolim de Moura/RO, datado e assinado eletronicamente.
EDUARDO FERNANDES RODOVALHO DE OLIVEIRA
Juiz Eleitoral - 29ª Zona