JUSTIÇA ELEITORAL
077ª ZONA ELEITORAL DE CABROBÓ PE
AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (11527) Nº 0600397-53.2024.6.17.0077 / 077ª ZONA ELEITORAL DE CABROBÓ PE
REQUERENTE: PROMOTOR ELEITORAL DO ESTADO DE PERNAMBUCO
INVESTIGADO: ELIOENAI DIAS SANTOS FILHO, JANNYKLEI MARQUES DE ARAUJO SANTOS, ALEXSANDRO FREIRE CAVALCANTE, ELIOENAI DIAS SANTOS, ELIEL AUGUSTO DE SOUZA SANTOS, LUIS CARLOS ALVES DE SOUSA, CABROBÓ PARA O TRABALHO NÃO PARAR! [REPUBLICANOS/PP/PDT/MDB/DC/PSB/AVANTE/FEDERAÇÃO BRASIL DA ESPERANÇA - FE BRASIL(PT/PC DO B/PV)] - CABROBÓ - PE
INVESTIGADA: GEORGIA FERNANDA TORRES DE OLIVEIRA
INTERESSADO: JOSETE PEDRO XAVIER DE LIMA, ROZILDA XAVIER DE LIMA MONTEIRO
Representantes do(a) INVESTIGADO: GABRIEL HENRIQUE XAVIER LANDIM DE FARIAS - PE47980, THIAGO LUIZ GOMES LIMA - PE46259, CAIO CESAR GOMES NOGUEIRA FERRAZ - PE37613
Representantes do(a) INVESTIGADA: GABRIEL HENRIQUE XAVIER LANDIM DE FARIAS - PE47980, CAIO CESAR GOMES NOGUEIRA FERRAZ - PE37613, THIAGO LUIZ GOMES LIMA - PE46259
Representantes do(a) INTERESSADO: GABRIEL HENRIQUE XAVIER LANDIM DE FARIAS - PE47980, CAIO CESAR GOMES NOGUEIRA FERRAZ - PE37613, THIAGO LUIZ GOMES LIMA - PE46259
Representante do(a) INTERESSADO: EDSON NOGUEIRA FERRAZ - PE33214
Representante do(a) INVESTIGADO: HELIO FERNANDES FREIRE DE MENEZES - PE13486
Representante do(a) INVESTIGADO: EDSON NOGUEIRA FERRAZ - PE33214
Representante do(a) INVESTIGADO: THIAGO LUIZ GOMES LIMA - PE46259
Representante do(a) INVESTIGADO: THIAGO LUIZ GOMES LIMA - PE46259
Representantes do(a) INVESTIGADO: HELIO FERNANDES FREIRE DE MENEZES - PE13486, EDSON NOGUEIRA FERRAZ - PE33214
TERCEIRO INTERESSADO: UNIAO BRASIL - CABROBO- PE- MUNICIPAL
ADVOGADO do(a) TERCEIRO INTERESSADO: MARIA STEPHANY DOS SANTOS
ADVOGADO do(a) TERCEIRO INTERESSADO: DELMIRO DANTAS CAMPOS NETO
1 – RELATÓRIO
Trata-se de pedido cautelar de busca e apreensão formulado pelo Ministério Público Eleitoral em desfavor de ELIOENAI DIAS SANTOS FILHO, GEORGIA FERNANDA TORRES DE OLIVEIRA, JOSETE PEDRO XAVIER DE LIMA, ROSILDA XAVIER DE LIMA MONTEIRO, COLIGAÇÃO “CABROBÓ PARA O TRABALHO NÃO PARAR!”, POSTO LIMARQUES 1 (LIMA E MARQUES LTDA.) e POSTO VALDIVINO 2 (POSTO VALDIVINO COMBUSTÍVEIS LTDA.), todos já qualificados nos autos, visando à obtenção de provas relacionadas a possíveis condutas de captação ilícita de sufrágio e abuso do poder econômico e político no município de Cabrobó/PE, notadamente a distribuição massiva de combustíveis a eleitores.
O pedido de tutela de urgência (de natureza cautelar) foi deferido no ID 123509580. Determinou-se a realização de busca e apreensão nos seguintes endereços e estabelecimentos:
Posto Limarques 1 (Lima e Limarques Ltda.): pessoa jurídica de direito privado, CNPJ nº 11.963.931/0001-01, localizado na Rodovia BR 428 (Avenida Nilo Coelho), km 10, loja 1, Município de Cabrobó/PE, CEP 56.180-000;
Posto Valdivino 2 (Posto Valdivino Combustíveis Ltda.): pessoa jurídica de direito privado, CNPJ nº 25.188.215/0002-90, localizado na Rua Coronel Higino Pires da Silva, nº 441, Centro, Cabrobó/PE, CEP 56.180-000; e
Escola Municipal “José Nilton Bione de Andrade”: localizada na Rua Lídia de Souza Santos, s/n, Bairro Alto do Cemitério, Cabrobó/PE, CEP 56.180-000, que tem por diretora/responsável a investigada Rozilda Xavier de Lima Monteiro.
O representante do Ministério Público requereu a inclusão de outro endereço no mandado de busca e apreensão, qual seja, aquele referente ao Posto Valdivino 1 (ID 123527485), o que foi igualmente deferido (ID 123527716). Nesta mesma ocasião determinou-se a citação das partes rés para contestarem o pedido (cautelar) e indicarem provas que pretendiam produzir.
Houve pedido de restituição dos aparelhos celulares pertencentes aos Srs. Luiz Carlos Alves de Souza e Alexsandro Freire Cavalcante (IDs 123552111 e 123552174, respectivamente).
Os relatórios e autos circunstanciados relativos aos mandados de busca e apreensão foram juntados no ID 123561087. O representante do Ministério Público ainda solicitou autorização expressa para extração dos dados armazenados nos aparelhos celulares e nas câmeras de segurança apreendidos.
Este juízo indeferiu o pedido de restituição dos aparelhos celulares e, concomitantemente, autorizou a adoção das providências relacionadas ao acesso, extração e obtenção dos dados armazenados nos aparelhos celulares e nas câmeras de monitoramento (ID 123582822).
Citados, os réus contestaram o pedido de tutela de urgência nos IDs 123775643, 123806296, 123814363 e 123947530.
O Ministério Público Eleitoral apresentou o pedido principal no ID 123997961, inclusive mediante a juntada do laudo pericial e do procedimento preparatório (IDs 124018169 e 124034713, respectivamente).
Houve retificação do polo passivo, que passou a ser composto pelas seguintes pessoas: ELIOENAI DIAS SANTOS FILHO, GEORGIA FERNANDA TORRES DE OLIVEIRA, ELIOENAI DIAS SANTOS, ELIEL AUGUSTO DE SOUZA SANTOS, JANNYKLEI MARQUES DE ARAUJO SANTOS, LUÍS CARLOS ALVES DE SOUZA e ALEXSANDRO FREIRE CAVALCANTE.
O Parquet argumentou, resumidamente, que: foi apreendida uma quantia aproximada de R$ 55.548,58 de vales-combustível, com emissão em período aproximado ao objeto das investigações; não só no dia 28/09/2024, como também em tantos outros dias ocorreram “carreatas” sem comunicação a Justiça Eleitoral e mediante a distribuição massiva de vales-combustível; os diálogos mostraram que ELIEL, irmão do prefeito de Cabrobó, GALEGO DE NANAI, negociou diretamente a emissão dos vales-combustível, inclusive orientando os valores e quantidades a serem emitidos, tudo isso tratado diretamente com o gerente do POSTO LIMARQUES 1, Luís Carlos; também foi possível vislumbrar NANAI (ELIOENAI DIAS SANTOS), pai do Prefeito de Cabrobó, enviando os comprovantes de transferências, realizando o pagamento dos vales, mediante a utilização de uma empresa sediada no Piauí e de “laranjas”; a conduta dos réus, além de configurar abuso de poder econômico, nos termos do art. 22, caput e inciso XIV, da Lei Complementar nº 64/90, também consubstancia a captação ilícita de sufrágio descrita no art. 41-A da Lei nº 9.504/97.
Pretende, assim, a cassação dos diplomas dos eleitos a Prefeito e Vice-Prefeita de Cabrobó/PE, a declaração de inelegibilidade de todos os representados e a aplicação da multa prevista no art. 41-A da Lei nº 9.504/97.
Recebida a petição inicial, determinou-se a citação das partes rés para oferecerem defesa ampla, juntada de documentos e rol de testemunhas (ID 124149724). Ademais, determinou-se a restituição dos aparelhos celulares apreendidos aos seus proprietários.
Jannyklei Marques de Araújo Santos e Alexsandro Freire Cavalcante, sócios-administradores dos postos Limarques 1 e Valdivino 2, respectivamente, ofereceram contestação nos IDs 124572511 e 124581902. Aquela alegou, preliminarmente, a sua ilegitimidade passiva. No mérito, negaram qualquer conluio com os candidatos, afirmando que os abastecimentos ocorreram mediante pagamento regular, sem vinculação eleitoral. Sustentaram, ainda, a licitude da atividade comercial e a ausência de provas de fornecimento gratuito de combustível.
Luiz Carlos Alves de Souza ofereceu contestação no ID 124582370, basicamente aventando a tese de nulidade da apreensão do seu aparelho celular.
Elioenai Dias Santos Filho e Georgia Fernanda Torres de Oliveira ofereceram contestação nos IDs 124612841 e 124613015, respectivamente. Esta alegou, preliminarmente, a nulidade da apreensão do aparelho celular do funcionário do Posto Limarques 1, assim como a sua ilegitimidade passiva. No mérito, asseveraram, em síntese, que: não há provas de participação direta, nem tampouco de ciência a respeito dos fatos; não há prova de que tenham distribuído combustível para pessoas participarem de evento político; a carreata foi realizada por alguns candidatos a vereadores e foi comunicada à Polícia Militar; os contra-vales foram emitidos em diferentes datas, algumas delas incompatíveis com o dia da carreata; a emissão de contra-vales é corriqueira nos postos de combustível investigados; não houve comprovação de abuso do poder econômico que tenha causado efetivo desequilíbrio no pleito eleitoral, sobretudo porque houve uma diferença de 7.875 votos em relação aos candidatos da oposição; a Escola Municipal José Nilton Bione de Andrade estava aberta no dia 28/09/2024 em razão da realização de um curso de reciclagem pelos bombeiros civis de Cabrobó/PE, e não para a prática de atos de cunho eleitoral.
Elioenai Dias Santos e Eliel Augusto de Souza Santos ofereceram contestação no ID 124612911. Alegaram, preliminarmente, a nulidade da apreensão do aparelho celular do Sr. Luís Carlos. No mérito, argumentaram, em suma, que: não há qualquer menção acerca da sua participação na distribuição de combustível a eleitores; a carreata foi promovida por alguns candidatos a vereadores; os contra-vales foram emitidos em diferentes datas, algumas delas incompatíveis com o dia da carreata; a emissão de contra-vales é corriqueira nos postos de combustível investigados; não houve comprovação de abuso do poder econômico que tenha causado efetivo desequilíbrio no pleito eleitoral, mormente porque houve uma diferença de 7.875 votos em relação aos candidatos da oposição.
Em seguida, autorizou-se a habilitação do UNIÃO BRASIL – CABROBÓ/PE na condição de terceiro interessado e determinou-se a designação de audiência de instrução e julgamento (ID 124622078).
Porém, em virtude do deferimento parcial da medida liminar no Habeas Corpus Criminal nº 0601230-11.2024.6.17.0000 (ID 124622666), que suspendeu qualquer análise e perícia no aparelho celular apreendido, determinou-se a suspensão do trâmite processual até o julgamento definitivo do aludido remédio constitucional (ID 124639375).
Denegou-se a ordem de Habeas Corpus e, consequentemente, revogou-se a liminar outrora concedida (ID 125150764).
Na sequência, este juízo designou audiência de instrução e julgamento conjunta (ID 125260884). Foram ouvidas duas testemunhas arroladas pelo Ministério Público e pelo UNIÃO BRASIL e uma arrolada pelos réus Elioenai Dias Santos e Eliel Augusto de Souza Santos (ID 125282800). As demais testemunhas foram dispensadas pelas partes.
Encerrada a fase de instrução processual, o representante do Ministério Público Eleitoral apresentou suas alegações finais no ID 125322347. Opinou pela parcial procedência da AIJE, destacando que a prova produzida em contraditório judicial e em sede se investigação confirma a prática de abuso de poder econômico aliada à captação ilícita de sufrágio, levados a efeito no contexto fático e jurídico descrito na petição inicial. Em relação aos investigados Luís Carlos Alves de Souza (Gerente do Posto Limarques 1); Jannyklei Marques de Araujo Santos (Sócio-administrador do Posto Limarques 1); e Alexsandro Freire Cavalcante (Sócio-administrador do Posto Valdivino 2), argumentou que não há como sustentar a reprovação político-eleitoral das suas condutas.
As defesas reiteraram as suas teses anteriores, insistindo na ausência de provas diretas de oferecimento de vantagem a eleitores específicos. Acrescentaram, ademais, que o Posto Limarques, indicado como ponto central da suposta “carreata abastecida”, encontrava-se, no momento das gravações e fotografias, completamente vazio, de modo que fica evidente a inexistência de qualquer distribuição de combustível naquele local. Além do mais, questionaram a parcialidade do depoimento da testemunha Candicy.
É o relatório do necessário. Fundamento e decido.
2 – FUNDAMENTAÇÃO
2.1 – PRELIMINARES AO MÉRITO
2.1.1 – Ilegitimidade passiva
As rés Jannyklei Marques de Araújo Santos e Georgia Fernanda Torres de Oliveira ventilaram a tese de ilegitimidade passiva.
Certifico, porém, que esta questão se confunde com o próprio mérito do processo, porquanto reclama o exercício da cognição sobre a extensão e alcance dos dispositivos legais e do entendimento jurisprudencial aplicáveis ao caso.
Nesse cenário, tem-se que deve ser aplicada a chamada teoria da asserção ou da prospettazione (em contraposição à teoria da apresentação ou da exposição), segundo a qual o exame da legitimidade ad causam deve ser realizado in statu assertionis, ou seja, à luz das afirmações constantes na petição inicial, sem qualquer inferência sobre a veracidade das alegações ou a probabilidade de êxito da pretensão deduzida.
Confira-se, a propósito, o seguinte precedente do STJ:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS MATERIAIS E MORAIS DECORRENTES DE "ASSÉDIO SEXUAL" SOFRIDO NO INTERIOR DE COMPOSIÇÃO DO METRÔ. ALEGADA RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DA TRANSPORTADORA. INTERESSE DE AGIR E LEGITIMIDADE AD CAUSAM. EXISTÊNCIA. TEORIA DA ASSERÇÃO. (...) 2. No âmbito do STJ, prevalece a chamada teoria da asserção ou da prospettazione (em contraposição à teoria da apresentação ou da exposição). Sob essa ótica, o exame da legitimidade ad causam e do interesse processual deve ser realizado in statu assertionis, ou seja, à luz das afirmações do autor constantes na petição inicial, sem qualquer inferência sobre a veracidade das alegações ou a probabilidade de êxito da pretensão deduzida. (...). (STJ – Resp 1678681/SP – Quarta Turma – Rel.: Ministro Luiz Felipe Salomão – DJ 07.12.2017)
Deixo, portanto, para apreciar esta questão no tópico apropriado, inclusive como forma de prestigiar o princípio da primazia do julgamento do mérito.
2.1.2 – Nulidade da busca e apreensão
Diversos réus alegaram a nulidade da busca e apreensão do aparelho celular do Sr. Luiz Carlos Alves de Souza (gerente do Posto Limarques 1).
Pondero, todavia, que a regularidade do aludido meio de prova já foi reconhecida tanto nos presentes autos quanto no Habeas Corpus Criminal autuado sob o nº 0601230-11.2024.6.17.0000.
A fim de que não restem dúvidas, transcrevo os trechos mais relevantes de cada um dos atos decisórios:
Decisão de ID 123509580:
(...) o Ministério Público Eleitoral apresentou indícios concretos e substanciais que demonstram, ao menos em sede de cognição sumária, a possível prática de condutas ilícitas eleitorais, consistentes na distribuição massiva de combustíveis a eleitores.
(...) in casu, conforme consta na informação juntada no ID 123499393, a carreata não foi comunicada à Justiça Eleitoral com a antecedência necessária, a fim de que fosse possível o controle dos respectivos gastos eleitorais.
Além do mais, há indicativos de que o valor dos vales combustíveis é incompatível com a limitação de 10 (dez) litros de combustível por veículo.
(...)
A respeito da validade das provas, destaco que, ao julgar o Tema 979, o Supremo Tribunal Federal (STF) fixou a seguinte tese: “No processo eleitoral, é ilícita a prova colhida por meio de gravação ambiental clandestina, sem autorização judicial e com violação à privacidade e à intimidade dos interlocutores, ainda que realizada por um dos participantes, sem o conhecimento dos demais. - A exceção à regra da ilicitude da gravação ambiental feita sem o conhecimento de um dos interlocutores e sem autorização judicial ocorre na hipótese de registro de fato ocorrido em local público desprovido de qualquer controle de acesso, pois, nesse caso, não há violação à intimidade ou quebra da expectativa de privacidade”.
(...)
No que se refere à amplitude da busca e apreensão, deve ser realizada de forma abrangente, contemplando a coleta de documentos, vales combustíveis, imagens das câmeras de segurança e outros itens que possam ter relação com os fatos sob investigação.
Anoto, neste particular, que não é necessária a especificação minuciosa dos documentos a serem apreendidos, pois o alcance da medida se justifica pela própria natureza dos atos investigados. A generalidade, nesse caso, não configura ilegalidade, mas sim uma medida de cautela indispensável para a eficácia da diligência. (...)
Decisão de ID 123582822:
(...) a decisão de ID 123509580 foi bastante clara no sentido de que: “a diligência deverá abranger a apreensão de documentos, vales combustíveis, ordens de abastecimento, registros de pagamentos, imagens das câmeras de segurança e outros itens QUE POSSAM ESTAR RELACIONADOS AOS FATOS INVESTIGADOS.”
Assim, presume-se que, ao efetuar a busca e apreensão dos aparelhos celulares, a Polícia Federal considerou que possuem algum vínculo com os fatos ora investigados.
Registro, a propósito, que a obtenção do conteúdo de conversas e mensagens armazenadas em aparelho de telefone celular ou smartphones não se subordina aos ditames da Lei nº 9.296/96.
Com efeito, o acesso ao conteúdo armazenado em telefone celular ou smartphone, quando determinada judicialmente a busca e apreensão destes aparelhos, não ofende o art. 5º, inc. XII, da CRFB, porquanto o sigilo a que se refere o aludido preceito constitucional é em relação à interceptação telefônica ou telemática propriamente dita, ou seja, é da comunicação de dados, e não dos dados em si mesmos.
Na pressuposição da ordem de apreensão de aparelho celular ou smartphone está o acesso aos dados que neles estejam armazenados, sob pena de a busca e apreensão resultar em medida írrita, dado que o aparelho desprovido de conteúdo simplesmente não ostenta virtualidade de ser utilizado como prova.
Aliás, é assente no STJ o entendimento no sentido de que são lícitas as provas obtidas de aparelhos celulares quando recolhidos em cumprimento de mandado de busca e apreensão, independente de autorização posterior para acesso aos seus dados, por ser o objetivo final do instituto (AgRg no RHC n. 125.734/SP, Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, DJe 26/11/2021). (...)
Acórdão proferido no Habeas Corpus Criminal - 0601230-11.2024.6.17.0000:
No caso em apreço, como já exposto, a existência de indícios razoáveis acerca da materialidade da infração supostamente cometida pelos então candidatos torna legítima a decretação da medida de busca e apreensão, conforme previsto na alínea "e" e "h" do §§ 1º e 2º do artigo 240 do Código de Processo Penal, visando resguardar elementos probatórios indispensáveis à apuração dos fatos em sede de Ação de Investigação Judicial Eleitoral1, procedimento preparatório eleitoral - PPE2, inquérito policial3 e, eventualmente, em ação penal.
(...) a decisão que defere a medida cautelar, cuja cópia segue no id.30094012 destes autos, está bem fundamentada e conta com todos os elementos formais individualizadores da medida judicial determinada, como endereço da diligência, pessoas investigadas, motivo e objeto da diligência.
Naturalmente, em razão da impossibilidade fática de prever todo e qualquer elemento probatório encontrado, possui cláusula final aberta, atinente a "outros itens que possam ter relação com os fatos sob investigação".
O respectivo mandado de id. 30094014, espelhou adequadamente o comando judicial, inexistindo amplitude indevida da decisão autorizadora, devassamento irregular sem delimitação (fishing expedition) ou procura especulativa por provas. Pelo contrário.
Depreende-se dos autos que a busca e apreensão foi realizada em estrita consonância com seu objetivo principal, bem delineado na decisão e no respectivo mandado judicial. Também não houve recolhimento de provas aleatórias, sem prévia suspeita, não havendo que se falar em afronta a direitos fundamentais.
(...)
Considerando que o objetivo da medida de busca e apreensão não reside no aparelho celular em si, mas sim nas informações contidas em sua memória, firmou-se no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que a apreensão do dispositivo implica, necessariamente, a possibilidade de acesso aos dados nele armazenados.
(...)
Não obstante, houve decisão judicial específica nesse sentido (id.123582822 da AIJE n.º 0600397-53.2024.6.17.0077). (...)
Assim, considerando que não existe nenhum vício formal ou material na busca e apreensão realizada neste processo, impõe-se, como medida de rigor, a rejeição da preliminar ao mérito em comento.
2.1.3 – Parcialidade da testemunha Candicy Saraiva Caldas
Alguns dos réus também alegaram parcialidade da testemunha Candicy Saraiva Caldas.
Esclareço, no entanto, que os argumentos trazidos nas alegações finais e os respectivos documentos comprobatórios deveriam ter sido apresentados por ocasião da audiência de instrução e julgamento, para fins de contraditar a testemunha (art. 457 do CPC), sob pena de preclusão.
De qualquer forma, conforme será melhor abordado no tópico atinente ao mérito, o depoimento da testemunha Candicy pouco ou nada contribuiu para o esclarecimento dos fatos.
Vale dizer, o julgamento pautou-se essencialmente nas provas pericial e documental, e não na prova oral (testemunhal), razão pela qual, ainda que se concluísse pela parcialidade da testemunha, inexistiria qualquer prejuízo aos réus ("pas de nullité sans grief").
2.2 – MÉRITO
Trata-se de Ação de Investigação Judicial Eleitoral ajuizada em razão da suposta prática de captação ilícita de sufrágio e abuso do poder econômico e político no município de Cabrobó/PE, caracterizada pela distribuição massiva e indiscriminada de vales-combustível a eleitores.
As provas que instruíram o pedido cautelar, tais como vídeos, imagens, Boletim de Ocorrência lavrado pela Polícia Civil e Certidão de Ocorrência lavrada pela Polícia Federal, indicam, dentre outras coisas, pagamentos sendo realizados mediante a entrega de vales-combustível, assim como a existência de grandes filas nos postos de combustíveis Limarques e Valdivino no dia 28/09/2024 (data da carreata), sendo que praticamente todos os veículos continham adesivos ou outros elementos característicos dos candidatos Elioenai Dias Santos Filho e Georgia Fernanda Torres de Oliveira.
Consoante mencionado no tópico anterior, a prova oral pouco colaborou para elucidar os fatos, uma vez que as testemunhas arroladas pelo Ministério Público e pelo União Brasil basicamente reiteraram (de forma bastante superficial) aquilo que já haviam dito por ocasião da investigação preliminar - que havia grandes filas de carros nos postos de combustível desta cidade no dia da carreata -, sem apresentar fatos novos ou relevantes.
Por outro lado, as provas obtidas a partir do cumprimento dos mandados de busca e apreensão são extremamente relevantes, na medida em que foram apreendidos vales-combustível totalizando aproximadamente R$ 55.548,58, além de celulares dos gerentes dos postos Limarques 1 - Luís Carlos Alves de Souza - e Valdivino - Alexsandro Freire Cavalcante do Posto Valdivino - e HDs de sistemas de gravação digital (DVR) (cf. ID 124034713).
As conversas extraídas do celular do gerente do Posto Limarques 1, Sr. Luís Carlos Alves de Souza, transcritas no relatório elaborado pela Polícia Federal (ID 124018169), demonstram categoricamente a negociação e emissão de vales-combustíveis com Eliel Augusto de Souza Santos (irmão do Prefeito), o qual deu orientações sobre valores e quantidades, bem como os pagamentos efetuados por Elioenai Dias Santos (pai do Prefeito), por intermédio de empresas sediadas no Piauí e de "laranjas".
Estes dados confirmam que os réus distribuíram massivamente vales-combustível a eleitores para que participassem de uma carreata.
Atento à tese defensiva, friso que, embora as filmagens e fotografias não sejam suficientes, por si sós, para atestar a existência de grandes filas no Posto Limarques 1, houve a apreensão de diversos vales-combustível naquele local, além da comprovação de participação direta do pai e do irmão do Prefeito na negociação, emissão e pagamento.
Ademais, ainda que a emissão de contra-vales nos postos de combustível desta cidade seja uma prática recorrente (o que me parece crível), nenhum dos réus, mormente aqueles dois responsáveis pela negociação e pagamento (Elioenai e Eliel), aprestou qualquer justificativa plausível para a emissão de tantos vales-combustível justamente no período eleitoral e próximo à carreata da campanha do candidato reeleito.
É inegável, portanto, a finalidade eleitoral da distribuição dos vales-combustível, inclusive porque a utilização de “laranjas” para realização dos pagamentos denota uma tentativa (frustrada) de desvinculação dos envolvidos.
Como se não bastasse, os fechamentos de caixa que acompanham o relatório da Polícia Federal (ID 124034713) comprovam uma discrepância significativa na movimentação financeira dos postos nos dias 26, 27 e 28 de setembro de 2024. A título de exemplo, em 28/09 (dia da carreata) há informação da entrada de R$ 183.155,71, saída de R$ 56.803,20, resultando em um saldo de R$ 126.352,51, enquanto que nos outros dias (imediatamente anteriores) o saldo foi de apenas R$ 2.390,60 e R$ 10.202,40.
Outro ponto que chama atenção no dia 28/09 diz respeito às formas de pagamento: mais de R$ 40.000,00 a prazo, R$ 36.000,00 a título de contra-vales e R$ 42.000,00 a título de “reforço de caixa”.
No que se refere ao Posto Valdivino, malgrado não tenham sido apreendidos vales-combustível, as imagens e fotografias são claras a respeito da distribuição massiva de combustíveis no dia da carreata (28/09/2024) para eleitores identificados com as cores e adesivos dos candidatos Elioenai Dias Santos Filho e Georgia Fernanda Torres de Oliveira.
Com efeito, em uma das conversas via WhatsApp envolvendo o gerente do Posto Limarques 1 foi enviado por equívoco e posteriormente deletado um comprovante de transferência bancária realizada pelo pai do Prefeito (Elioenai) em favor do Posto Valdivino.
Além disso, constou o seguinte no relatório da Polícia Federal (ID 124034713): “(...) durante a diligência no Posto Valdivino 2, esta Autoridade Policial foi informada pelo gerente que os recibos de abastecimentos estavam em outro posto, levando à expedição de um novo mandado para tal endereço. Na nova sede (Posto Valdivino 1), a contabilista relatou que os recibos já haviam sido retirados por terceiros, não encontrando-se registros remanescentes.”
No que tange aos fatos ocorridos na Escola Municipal “José Nilton Bione de Andrade”, além de não terem sido apreendidos quaisquer ilícitos por ocasião do cumprimento do mandado de busca e apreensão, as filmagens e especialmente o depoimento das testemunhas foram completamente inconclusivos quanto à prática de qualquer conduta vedada.
Nesse contexto, reconheço que a prova produzida, tanto sob o crivo do contraditório quanto em sede se investigação, confirma a prática de abuso de poder econômico (art. 22 da LC nº 64/90), aliada à captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei nº 9.504/1997).
Confira-se, ilustrativamente, o seguinte precedente do TSE, que trata de caso praticamente idêntico àquele discutido nos presentes autos:
ELEIÇÕES 2020. AGRAVOS EM RECURSOS ESPECIAIS ELEITORAIS. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. PREFEITO E VICE-PREFEITO ELEITOS. ABUSO DE PODER ECONÔMICO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. DOAÇÃO MASSIVA DE COMBUSTÍVEIS A ELEITORES. CONFIGURAÇÃO DOS ILÍCITOS. CONFORMIDADE DA DECISÃO RECORRIDA COM A JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. SÚMULA N. 30 DESTE TRIBUNAL SUPERIOR. AGRAVOS EM RECURSOS ESPECIAIS AOS QUAIS SE NEGA PROVIMENTO. 1. A incidência da regra prevista no art. 260 do Código Eleitoral alcança apenas os feitos que possam alterar o resultado das eleições, como é o caso dos autos, pois a procedência da ação pode resultar na alteração do resultado do pleito majoritário ocorrido no Município de Cachoeira Alta em 2020. 2. Não ofende os arts. 275, 489 e 1.022 do Código de Processo Civil a decisão, devidamente fundamentada, que diverge das teses defendidas pela parte. 3. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral firmou-se no sentido de que a instauração de procedimento preparatório eleitoral pelo Ministério Público não ofende o art. 105-A da Lei 9.504/1997 4. A análise de formação do litisconsórcio passivo necessário, com a inclusão de supostos responsáveis pelas condutas ilícitas ou beneficiários destas, exigiria o reexame de fatos e provas, vedado em recurso especial, conforme o entendimento consolidado na Súmula n. 24 deste Tribunal Superior. 5. A distribuição massiva de combustíveis, sem controle ou vinculação dos beneficiados com a participação em atos políticos, visando à obtenção de voto dos eleitores, que se revele apta a comprometer a normalidade das eleições e a causar desequilíbrio entre os candidatos configura captação ilícita de sufrágio e abuso de poder econômico. 6. Pelo quadro fático delineado no acórdão e constante da decisão recorrida, conclui-se que a decisão proferida pelo Tribunal de origem harmoniza-se com a orientação deste Tribunal Superior, a atrair a incidência da Súmula n. 30 deste Tribunal Superior. 7. Agravos em recursos especiais aos quais se nega provimento, com determinação de imediata execução do julgado. (Ac. de 3.5.2024 no AgR-TutCautAnt nº 060019961, rel. Min. Cármen Lúcia)
A jurisprudência do TSE exige o preenchimento cumulativo dos seguintes requisitos para a configuração da captação ilícita de sufrágio: "(i) a prática das condutas de doar, oferecer, prometer ou entregar bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza ao eleitor, capituladas no art. 41-A da Lei nº 9.504/1997, pelo candidato ou por terceiro; (ii) a finalidade eleitoral da conduta; e (iii) a participação, direta ou indireta, do candidato ou, ao menos, seu consentimento, anuência, conhecimento ou ciência quanto aos fatos que resultaram na prática do ilícito eleitoral." (RO 1858-66, rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 20.2.2019).
No presente caso, a distribuição massiva de vales-combustível preenche satisfatoriamente os dois primeiros requisitos, haja vista que caracteriza vantagem pessoal aos eleitores durante o período eleitoral, com a evidente finalidade de obter os seus votos. Nesse sentido: REspe 355-73, rel. Min. Luiz Fux, DJE de 31.10.2016.
A anuência dos candidatos Elioenai Dias Santos Filho e Geórgia Fernanda Torres de Oliveira é inequívoca, tanto pelo benefício direto das suas candidaturas (para Prefeito e Vice-Prefeita) quanto pela participação do pai (Elioenai Dias Santos) e do irmão (Eliel Augusto de Souza Santos) do então candidato ao cargo de Prefeito no esquema de aquisição e distribuição de combustíveis.
Quanto ao abuso do poder econômico, para a sua configuração, exige-se o emprego desproporcional de recursos patrimoniais, com gravidade suficiente para comprometer a lisura e a normalidade do pleito e a paridade de armas entre os candidatos, assim como se requer a comprovação da participação direta ou indireta do beneficiário nos fatos ilícitos para a imposição de inelegibilidade, cuja natureza é personalíssima (AgR-REspEl 0600049-30, rel. Min. Benedito Gonçalves, DJE de 29.3.2022; REspe 458-67, rel. Min. Luiz Fux, DJE de 15.2.2018; REspe 418-63, rel. Min. Gilmar Mendes, DJE de 23.9.2016).
Nos termos do art. 22, inc. XVI, da LC nº 64/90, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam.
Ademais, prevalece no TSE que a comprovação da participação indireta do candidato nos fatos, mediante anuência, é apta a atrair a imposição de inelegibilidade, como se infere do acórdão proferido no ED-RO-El 2244-91, rel. Min. Edson Fachin, DJE de 2.5.2022.
No presente caso, a vultuosidade dos valores (R$ 55.548,58 em vales-combustível apreendidos) e a distribuição massiva e organizada de combustíveis a eleitores demonstram a gravidade concreta da conduta. Como abordado anteriormente, os relatórios periciais e os dados extraídos dos aparelhos celulares apreendidos revelaram um esquema estruturado, com articulação de valores e quantidades por parentes do candidato, que se utilizaram de “laranjas”.
Vale dizer, a conduta alcançou grande número de eleitores, os quais acabaram influenciados pela benesse ofertada pela campanha dos réus. Daí a manifesta quebra da legitimidade do processo eleitoral, algo suficiente para deflagrar a reprimenda contra esse tipo de anormalidade.
Nesse sentido:
ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE). PRELIMINARES. NULIDADE DAS PROVAS COLHIDAS POR MEIO DE PROCEDIMENTO PREPARATÓRIO ELEITORAL - PPE. INDEFERIMENTO INICIAL. AUSÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. REJEITADAS. MÉRITO. ENTREGA MASSIVA E INDISCRIMINADA DE COMBUSTÍVEL EM TROCA DE VOTOS. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO CONFIGURADA (ARTIGO 41-A DA LEI 9.504/97). RESPONSABILIDADE DO ENTÃO CANDIDATO A PREFEITO. ABSOLVIÇÃO DO ENTÃO CANDIDATO A VICE- PREFEITO, ANTE A FALTA DE PROVAS DA SUA PARTICIPAÇÃO. EXISTÊNCIA DE PROVAS ROBUSTAS E CONCLUSIVAS QUANTO À PRÁTICA DE ABUSO DE PODER. RECURSOS CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDOS. 1 - Nos termos da pacífica jurisprudência deste Regional e do TSE, a distribuição indiscriminada e sem controle de combustíveis, configura a captação ilícita de sufrágio, nos termos do art. 41 - A da Lei 9.504/97. No caso, o ilícito praticado em diversos Postos de combustíveis no município de Quirinópolis/GO, onde se realizaram abastecimentos. 2 - A distribuição maciça e sem o efetivo controle de combustíveis no referido município, durante o pleito eleitoral, também configurou o ilícito tipificado no art. 22 da LC 64/94, abuso de poder econômico, uma vez que os abastecimentos tidos como irregulares, registraram movimentações financeiras consideráveis, revelando a sua gravidade. 3 - Configuração da captação ilícita de sufrágio e o abuso de poder econômico em relação ao recorrente Gilmar Alves da Silva. 4 - Consoante jurisprudência desta Corte, "não havendo elementos probatórios suficientes a considerar o vice-prefeito como autor ou partícipe dos ilícitos eleitorais a ele imputados, deve-se afastar as sanções a ele impostas". Precedente. 5 - Provimento do recurso para absolver Antônio José Pereira, então candidato a vice-prefeito, das sanções a ele impostas. 6 - Desprovimento do recurso apresentado por Gilmar Alves da Silva. RECURSO ELEITORAL nº060075138, Acórdão, Relator(a) Des. Márcio Antônio De Sousa Moraes Júnior, Publicação: DJE - DJE, 22/01/2024.
Esclareço, outrossim, que, ao contrário do que pretendem fazer crer os réus, a distribuição dos combustíveis nos moldes realizados no dia 28/09/2024 não se insere entre os gastos eleitorais permitidos pelos arts. 35 da Resolução TSE nº 23.607/2019 e 13, § 3º, da Resolução TSE nº 23.610/2019, incluído pela Resolução TSE nº 23.732/2024, que limitam o abastecimento para carreatas a 10 (dez) litros por veículo e exigem comunicação prévia – de 24 (vinte e quarto) horas – à Justiça Eleitoral, o que não foi observado pelos candidatos.
Impõe-se, pois, como medida de rigor, a declaração de inelegibilidade não só dos candidatos, como também daqueles que contribuíram para a prática do ato, quais sejam, Elioenai (responsável pelo pagamento) e Eliel (responsável pela negociação com os postos de combustíveis).
Em relação aos investigados Luís Carlos Alves de Souza (Gerente do Posto Limarques 1), Jannyklei Marques de Araujo Santos (Sócio-administrador do Posto Limarques 1) e Alexsandro Freire Cavalcante (Sócio-administrador do Posto Valdivino 2), acolho o parecer do representante do Ministério Público.
Malgrado sejam figuras importantes na dinâmica dos fatos, o acervo probatório não revelou envolvimento direto nos abusos para além da relação comercial de venda de combustíveis.
Isto é, não há comprovação de que os sócios-administradores dos postos de combustível doaram ou contribuíram com as distribuições de combustíveis, mas tão somente operaram a venda do produto, de tal sorte que a distribuição com finalidade eleitoreira ficou por conta das pessoas ligadas aos candidatos.
Como consectário lógico, não há como sustentar a reprovação político-eleitoral da conduta dos investigados Luís Carlos Alves de Souza (Gerente do Posto Limarques 1), Jannyklei Marques de Araujo Santos (Sócio-administrador do Posto Limarques 1) e Alexsandro Freire Cavalcante (Sócio-administrador do Posto Valdivino 2).
3 – DISPOSITIVO
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados nesta Ação de Investigação Judicial Eleitoral, para o fim de:
(i) Reconhecer a prática de abuso de poder econômico e a captação ilícita de sufrágio por parte de ELIOENAI DIAS SANTOS FILHO e GEORGIA FERNANDA TORRES DE OLIVEIRA, candidatos aos cargos de Prefeito e Vice-Prefeita nas Eleições 2024 em Cabrobó/PE;
(ii) Determinar a cassação dos diplomas de ELIOENAI DIAS SANTOS FILHO e GEORGIA FERNANDA TORRES DE OLIVEIRA, nos termos do art. 22, inc. XIV, da LC nº 64/1990. Atente-se ao fato de que, de acordo com o art. 15 da LC nº 64/90, a declaração de nulidade do diploma fica condicionada ao trânsito em julgado ou à publicação de decisão proferida por órgão colegiado. Seguindo essa linha de raciocínio, o § 2º do art. 257 do Código Eleitoral, incluído pela Lei nº 13.165, de 2015, prevê que: “O recurso ordinário interposto contra decisão proferida por juiz eleitoral ou por Tribunal Regional Eleitoral que resulte em cassação de registro, afastamento do titular ou perda de mandato eletivo será recebido pelo Tribunal competente com efeito suspensivo”;
(iii) Declarar a inelegibilidade dos réus ELIOENAI DIAS SANTOS FILHO, GEORGIA FERNANDA TORRES DE OLIVEIRA, ELIOENAI DIAS SANTOS, ELIEL AUGUSTO DE SOUZA SANTOS pelo prazo de 8 (oito) anos, a contar da eleição de 2024, nos termos do art. 22, inc. XIV, da LC nº 64/90; e
(iv) Determinar a comunicação imediata ao TRE/PE, nos exatos termos do art. 15, parágrafo único, da LC nº 64/90.
Além do mais, condeno exclusivamente os réus ELIOENAI DIAS SANTOS FILHO e GEORGIA FERNANDA TORRES DE OLIVEIRA ao pagamento da multa prevista no art. 41-A da Lei das Eleições (Ac. de 6/3/2018 no RO n. 222952, rel. Min. Rosa Weber), que fixo em R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para cada um deles.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se as partes e o representante do Ministério Público Eleitoral.
Havendo recurso, intime(m)-se o(a)(s) recorrido(a)(s) para oferecimento de contrarrazões, remetendo-se os autos, em seguida, ao TRE/PE.
Oportunamente, arquivem-se os autos, com observância das formalidades legais.
Cabrobó/PE, datado e assinado eletronicamente.
FELIPPE LOTHAR BRENNER
Juiz Eleitoral da 77ª ZE