TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DE MATO GROSSO DO SUL
JUÍZO DA 034ª ZONA ELEITORAL DE BANDEIRANTES MS
AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL nº 0600635-45.2024.6.12.0034 e nº 0600633-75.2024.6.12.0034
PROCEDÊNCIA: BANDEIRANTES - MATO GROSSO DO SUL
AUTOR: PROMOTOR ELEITORAL DO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL
INVESTIGADA: MARCILENE DE SOUZA BRUM
ADVOGADO: MARCIO ANTONIO DE SOUSA - OAB/MS22925
INVESTIGADO: VALDIR PERES PEREIRA
ADVOGADO: MARCIO ANTONIO DE SOUSA - OAB/MS22925
INVESTIGADO: CICERO CASSIANO DE SA
ADVOGADO: MARCIO ANTONIO DE SOUSA - OAB/MS22925
INVESTIGADA: KALLYANE DE OLIVEIRA SILVEIRA
ADVOGADO: MARCIO ANTONIO DE SOUSA - OAB/MS22925
INVESTIGADO: VALDINEI JOSE DE SOUZA PINTO
ADVOGADO: MARCIO ANTONIO DE SOUSA - OAB/MS22925
INVESTIGADO: ASSIS FERREIRA DE CARVALHO NETO
ADVOGADO: MARCIO ANTONIO DE SOUSA - OAB/MS22925
INVESTIGADA: MARIA JOSE JANUARIA
ADVOGADO: MARCIO ANTONIO DE SOUSA - OAB/MS22925
INVESTIGADO: SEBASTIAO PREGENTINO DE LIMA
ADVOGADO: MARCIO ANTONIO DE SOUSA - OAB/MS22925
INVESTIGADO: MANOEL FERREIRA DE CARVALHO
ADVOGADO: MARCIO ANTONIO DE SOUSA - OAB/MS22925
INVESTIGADO: JOSE MARCIO DOS SANTOS
ADVOGADO: MARCIO ANTONIO DE SOUSA - OAB/MS22925
INVESTIGADO: AUZENIR ALVES DE SOUZA
ADVOGADO: MARCIO ANTONIO DE SOUSA - OAB/MS22925
INVESTIGADO: WILLIANS DIAS DE FREITAS
ADVOGADO: MARCIO ANTONIO DE SOUSA - OAB/MS22925
INVESTIGADO: CRISTIANO LEZISAAMON TIAGO
ADVOGADO: MARCIO ANTONIO DE SOUSA - OAB/MS22925
INVESTIGADO: ADEVALDO FREITAS DE SOUZA
ADVOGADO: MARCIO ANTONIO DE SOUSA - OAB/MS22925
SENTENÇA
Vistos.
Trata-se das Ações de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) conexas nº 0600635-45.2024.6.12.0034, ajuizada pelo Ministério Público Eleitoral, e nº 0600633-75.2024.6.12.0034, proposta pelo então candidato Eugenio Fernandes Junior, em face dos candidatos ao cargo de vereador pelo partido União Brasil de Bandeirantes, MS, quais sejam, Valdir Peres Pereira (eleito), Cicero Cassiano de Sá (suplente), Kallyane de Oliveira Silveira (suplente), Valdinei Jose de Souza Pinto (suplente), Assis Ferreira de Carvalho Neto (suplente), Maria José Januária (suplente), Sebastião Pregentino de Lima (suplente), Manoel Ferreira de Carvalho (suplente), Marcilene de Souza Brum (suplente) e José Márcio dos Santos (suplente), bem como de Auzenir Alves de Souza (subscritor da ata de convenção partidária), Cristiano Lezisaamon Tiago e Adevaldo Freitas de Souza (subscritores do DRAP n. 0600633-75.2024.6.12.0034 e delegados do partido União) e Willians Dias de Freitas (vice-presidente do União Brasil de Bandeirantes) por suposta fraude à quota de gênero, nos termos do art. 10, §3º da Lei 9.504/97 c/c art. 22, XIV, da LC 64/90.
O pedido de tutela antecipada para suspender a diplomação do candidato eleito e dos suplentes foi indeferido (ID 123375089 dos autos nº 060063545.2024.6.12.0034 e ID 123277309 dos autos nº 0600633-75.2024.6.12.0034 ).
Foi determinada a conexão entre as supracitadas AIJES (ID 123375089 dos autos n. 0600635-45.2024.6.12.0034), considerando a identidade de pedido e causa de pedir e do polo passivo, nos termos do art. 96-B da Lei 9.504/97 e art. 55 do Código de Processo Civil.
Citados, os investigados apresentaram defesa (ID 123407451 dos autos nº 060063545.2024.6.12.0034 e ID 123398221 dos autos nº 0600633-75.2024.6.12.0034 ), na qual foi pleiteada a ilegitimidade passiva dos réus (com exceção de Marcilene de Souza Brum) e, no mérito, a improcedência do pedido, alegando inexistência da fraude à cota de gênero e a regularidade do DRAP e dos votos destinados à chapa proporcional pela ausência de prova robusta de fraude eleitoral, nos termos do art. 22, inciso XIV da LC 64/90.
Audiência de instrução realizada em 12/03/2025 (ID 123407451 dos autos nº 060063545.2024.6.12.0034 e ID 123513726 dos autos nº 0600633-75.2024.6.12.0034) na qual foram tomados os depoimentos dos réus Marcilene de Souza Brum, Cicero Cassiano de Sá e Sebastião Pregentino de Lima e realizada a oitiva das testemunhas Mário José de Souza e Éder Monteiro de Abreu e dos informantes Gelson Guimarães e Carlos Brum Medeiros.
Alegações finais apresentadas pelos representados (D 123524221 dos autos nº 060063545.2024.6.12.0034 e ID 12352431 dos autos nº 0600633-75.2024.6.12.0034), pugnando pela improcedência da AIJE ante a ausência de prova robusta de fraude eleitoral e abuso de poder político ou econômico, ilegitimidade passiva dos réus e ausência de irregularidade no DRAP do Partido União Brasil de Bandeirantes.
O autor da AIJE 0600633-75.2024.6.12.0034, em alegações finais (ID 123515778), requereu a procedência dos pedidos para o reconhecimento da fraude à cota de gênero e do abuso de poder político com aplicação de multa e declaração de inelegibilidade da candidata investigada como fictícia, anulação do DRAP da chapa proporcional do União Brasil de Bandeirantes e a consequente nulidade dos votos atribuídos à legenda e aos demais candidatos não eleitos, pugnando pelo recálculo dos quocientes eleitoral e partidário.
O Ministério Público Eleitoral, em alegações finais (ID 123569680 dos autos nº 0600633-75.2024.6.12.0034 e ID 123597361 dos autos nº 060063545.2024.6.12.0034), reiterou os termos da inicial, requerendo a procedência dos pedidos para fins de cassação do DRAP do partido União Brasil de Bandeirantes referente às eleições proporcionais de 2024; cassação dos diplomas de todos os candidatos eleitos e suplentes vinculados ao referido DRAP; declaração de inelegibilidade de Marcilene de Souza Brum e de todos os demais representados e declaração de nulidade dos votos atribuídos ao partido União Brasil nas eleições proporcionais de 2024 em Bandeirantes, com a consequente recontagem dos quocientes eleitoral e partidário, nos termos do art. 222 e 224 do Código Eleitoral.
É o relatório. Passo a decidir.
Ab initio, cabe a apreciação das preliminares intentadas nas contestações.
Com relação à preliminar de ilegitimidade passiva de todos os candidatos ao cargo de vereador do União Brasil de Bandeirantes, com exceção de Marcilene de Souza Brum, a qual, segundo a defesa, seria a “única pessoa apontada como responsável”, bem como dos subscritores do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários e subscritores da ata de convenção partidária, deixo de acolhê-la, com fulcro na Súmula 73 do TSE, in verbis:
A fraude à cota de gênero, consistente no desrespeito ao percentual mínimo de 30% (trinta por cento) de candidaturas femininas, nos termos do art. 10, § 3º, da Lei n. 9.504/97, configura-se com a presença de um ou alguns dos seguintes elementos, quando os fatos e as circunstâncias do caso concreto assim permitirem concluir: (1) votação zerada ou inexpressiva; (2) prestação de contas zerada, padronizada ou ausência de movimentação financeira relevante; e (3) ausência de atos efetivos de campanhas, divulgação ou promoção da candidatura de terceiros. O reconhecimento do ilícito acarretará: (a) a cassação do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (Drap) da legenda e dos diplomas dos candidatos a ele vinculados, independentemente de prova de participação, ciência ou anuência deles; (b) a inelegibilidade daqueles que praticaram ou anuíram com a conduta, nas hipóteses de Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE); (c) a nulidade dos votos obtidos pelo partido, com a recontagem dos quocientes eleitoral e partidário (art. 222 do Código Eleitoral), inclusive para fins de aplicação do art. 224 do Código Eleitoral. (grifo nosso)
Pelo teor da citada súmula, constata-se que a procedência dos pedidos formulados em AIJE por fraude à quota de gênero tem como efeito a cassação do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP) da legenda e dos diplomas dos candidatos a ele vinculados, assim como consequências jurídicas para os candidatos vinculados à legenda responsável pelo ilícito, no caso em tela, o União Brasil de Bandeirantes, bem como para os responsáveis pelo processo de escolha dos candidatos. Assim sendo, é imprescindível que tais sujeitos, diretamente afetados por eventual procedência do pedido, ocupem o polo passivo da demanda, exercendo o contraditório e ampla defesa.
A petição inicial descreve as condutas imputadas aos representados, as quais consubstanciam, no mínimo, em concordância com a escolha dos candidatos que compuseram a chapa proporcional, denotando a concorrência com a prática do ato impugnado, fato capaz de ensejar as sanções previstas na LC 64/90. Nesse sentido o entendimento do colendo Tribunal Superior Eleitoral:
A inelegibilidade decorrente da prática de abuso é sanção personalíssima, que se impõe "a quantos hajam contribuído para a prática do ato [abusivo]" (art. 22, XIV da LC nº 64/1990). Essa contribuição deve, portanto, ser avaliada considerando–se a conduta de cada pessoa frente ao padrão de comportamento que lhe era exigível.” (AIJE 060098627, relator o ministro Benedito Gonçalves, julgado em 31/10/2023, publicado em 20/03/2024).
Nesse diapasão, não se acolhe a preliminar referente à inépcia da petição inicial, porquanto os fatos imputados estão devidamente descritos mediante exposição da prática de supostos atos de abuso de poder político consistentes em indicação de candidaturas fictícias, em desacordo ao previsto no parágrafo 3º do artigo 10 da Lei 9.504/1997, não havendo se falar em ausência de elementos mínimos da ocorrência de fraude à cota de gênero.
Por fim, não prospera a preliminar aventada na petição de ID 123581620 pelos réus acerca de nulidade da prova unilateral produzida pelo Ministério Público Eleitoral, porquanto foi oportunizada à defesa a possibilidade de contraditá-la, bem como houve oitiva dos investigados devidamente acompanhados de seu advogado, sob o crivo do contraditório e ampla defesa, em audiência de instrução (ID 123514392, 123514306, 123514307, 123514308, 123514311, 123514309 e 123514310).
Passo então à análise do mérito.
Cuidam os autos de alegação de fraude em registro de candidatura feminina com caráter meramente formal, desvirtuando a cota de incentivo à participação de mulheres na política. Sendo condição de regularidade dos atos partidários, o preenchimento do percentual mínimo deve se dar no momento do registro da candidatura, substituição ou preenchimento de vaga remanescente e, na impossibilidade da observância da cota de gênero, deverá a agremiação partidária providenciar, em sede de diligências no processo DRAP, a diminuição do total de candidaturas lançadas do sexo oposto.
É sabido que, historicamente, a disputa política brasileira foi precipuamente marcada pela presença masculina, tendo as mulheres adquirido capacidade eleitoral ativa somente com o Código Eleitoral de 1932, ou seja, há menos de um século. Em consonância com os ditames da igualdade material, o legislador infraconstitucional buscou, através da cota de gênero, estimular as mulheres a ocupar cargos públicos eletivos.
A Lei 9.504/97, com redação dada pela Lei 12.034/2009, estabelece que:
Art. 10 [...]
§ 3º Do número de vagas resultante das regras previstas neste artigo, cada partido ou coligação preencherá o mínimo de 30% (trinta por cento) e o máximo de 70% (setenta por cento) para candidaturas de cada sexo.
Busca-se, com a observância da norma, a alteração da situação estrutural de exclusão de mulheres dos quadros da política, forçando, sob pena de decote do número de candidatos masculinos, que as agremiações abram espaço para o registro de candidaturas femininas.
A fraude à cota de gênero, na medida em que autoriza o registro de número maior de candidaturas masculinas, viola a norma eleitoral e o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral se firmou no sentido de que referida conduta pode ser considerada uma modalidade de abuso de poder, sendo possível sua análise por meio de Ação de Investigação Judicial Eleitoral:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. FRAUDE. PERCENTUAIS DE GÊNERO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO.
[...]
4. É possível verificar, por meio da ação de investigação judicial eleitoral, se o partido político efetivamente respeita a normalidade das eleições prevista no ordenamento jurídico - tanto no momento do registro como no curso das campanhas eleitorais, no que tange à efetiva observância da regra prevista no art. 10, § 3º, da Lei das Eleições - ou se há o lançamento de candidaturas apenas para que se preencha, em fraude à lei, o número mínimo de vagas previsto para cada gênero, sem o efetivo desenvolvimento das candidaturas.
5. Ainda que os partidos políticos possuam autonomia para escolher seus candidatos e estabelecer quais candidaturas merecem maior apoio ou destaque na propaganda eleitoral, é necessário que sejam assegurados, nos termos da lei e dos critérios definidos pelos partidos políticos, os recursos financeiros e meios para que as candidaturas de cada gênero sejam efetivas e não traduzam mero estado de aparências. Recurso especial parcialmente provido. (Recurso Especial Eleitoral 24342, Acórdão, Relator Min. Henrique Neves Da Silva, DJe de 11/10/2016). (grifo nosso).
Assim, a AIJE constitui via adequada para aferição de eventual prática de fraude para contornar a exigência legal de registro mínimo de 30% de candidaturas femininas nas eleições proporcionais. Constatado que ambas as ações conexas foram ajuizadas até a data da diplomação (12/11/2024 e 04/12/2024), resta assentada a regularidade do manejo das presentes ações à hipótese dos autos.
A peça inaugural de ID 122341979 dos autos do RCand 0600275-13.2024.6.12.0034 referente ao Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários do União Brasil de Bandeirantes, MS, nas Eleições 2024, elencou como candidatos ao cargo de vereador 07 (sete) homens e 03 (três) mulheres, em exata consonância com o percentual mínimo de candidatura de sexo exigido pela Lei das Eleições, a saber:
Nº do candidato Nome do candidato
44777 VALDIR PERES
44000 CICERO CASSIANO DE SÁ
44444 KALLYANE SILVEIRA
44555 VALDINEI PORTO
44789 ASSIS FERREIRA DE CARVALHO NETO
44222 MARIA JOSE JANUARIA
44123 SEBASTIÃO PREGENTINO DE LIMA
44456 MANOEL FERREIRA DE CARVALHO
44567 MARCILENE DE SOUZA BRUM
44100 JOSE MARCIO DOS SANTOS
Em resumo, o quadro fático trazido pelos representantes referente à candidatura de Marcilene de Souza Brum consiste em: votação irrisória (seis votos), inexistência de arrecadação de recursos ou gastos eleitorais, prestação de contas zeradas, ausência de participação efetiva da candidata em prol de sua candidatura, inexistência de propaganda eleitoral em redes sociais e atos de campanha e ausência de comparecimento da própria candidata às urnas.
Diante desse cenário, insta salientar que o Tribunal Superior Eleitoral firmou histórica jurisprudência no leading case de Jacobina/BA (AgR-AREspE 0600651-94, red. para o acórdão Min. Alexandre de Moraes, DJE de 30.6.2022), assentando que a obtenção de votação zerada ou pífia das candidatas, a prestação de contas com idêntica movimentação financeira e a ausência de atos efetivos de campanha são suficientes para evidenciar o propósito de burlar o cumprimento da norma que estabelece a cota de gênero. Eis a ementa do referido julgado:
ELEIÇÕES 2020. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. FRAUDE À COTA DE GÊNERO. ART. 10, § 3º, DA LEI 9.504/97. CONFIGURADO. PROVIMENTO. 1. A fraude à cota de gênero de candidaturas femininas representa afronta aos princípios da igualdade, da cidadania e do pluralismo político, na medida em que a ratio do art. 10, § 3º, da Lei 9.504/1997 é ampliar a participação das mulheres no processo político-eleitoral. 2. Ação de Investigação Eleitoral julgada improcedente na origem, consubstanciada na fraude à cota de gênero, considerando a juntada extemporânea de documentos pelas candidatas revéis, o que é vedado pela norma processual vigente e importa em efetivo prejuízo diante da reforma da sentença então condenatória. 3. Existência de elementos suficientemente seguros para a condenação dos Investigados, diante da comprovação do ilícito eleitoral: (i) as 4 (quatro) candidatas não obtiveram nenhum voto; (ii) as contas apresentadas são absolutamente idênticas, em que registrada uma única doação estimável realizada pela mesma pessoa, no valor de R$ 582,00 (quinhentos e oitenta e dois reais); (iii) não houve atos efetivos de campanha; (iv) não tiveram nenhuma despesa; (v) não apresentaram extratos bancários ou notas fiscais; e (vi) o Partido das Investigadas não investiu recursos em suas campanhas. 4. Caracterizada a fraude e, por conseguinte, comprometida a disputa, observam-se as seguintes consequências: (i) a cassação dos candidatos vinculados ao DRAP, independentemente de prova da sua participação, ciência ou anuência; (ii) a inelegibilidade àqueles que efetivamente praticaram ou anuíram com a conduta; e (iii) a nulidade dos votos obtidos pela Coligação, com a recontagem do cálculo dos quocientes eleitoral e partidários, nos termos do art. 222 do Código Eleitoral. Cumprimento imediato, independente de publicação. 5. Recurso Especial provido. (AgR-AREspE 0600651-94, red. para o acórdão Min. Alexandre de Moraes, DJE de 30.6.2022). (grifo nosso)
No mesmo sentido, julgados mais recentes do Tribunal Superior Eleitoral:
ELEIÇÕES 2020. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. FRAUDE À COTA DE GÊNERO . ART. 10, § 3º, DA LEI 9.504/97. CANDIDATURA FICTÍCIA . CONFIGURAÇÃO. SÍNTESE DO CASO 1. O Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe manteve a sentença de improcedência do pedido formulado em ação de impugnação de mandato eletivo ajuizada em desfavor dos candidatos ao cargo de vereador registrados pelo Partido dos Trabalhadores (PT) nas Eleições de 2020, com fundamento em suposta fraude à cota de gênero. 2 . Seguiu–se à interposição de recurso especial. ANÁLISE DO RECURSO ESPECIAL 3. Extrai–se do voto condutor do aresto regional as seguintes premissas fáticas do caso concreto: i) a candidata Sônia Alves obteve apenas um voto e a candidata Tânia de Rildo obteve 2 votos, não tendo sequer votado em si mesma; ii) o cônjuge da candidata Tânia de Rildo realizou campanha para outro candidato ao mesmo cargo do mesmo partido; iii) as candidatas não realizaram campanha eleitoral, nem mesmo nas redes sociais; iv) as candidatas não realizaram nenhum gasto de campanha nem receberam doações, com exceção de doação de serviços contábeis e advocatícios. 4 . A partir do leading case do caso de Jacobina/BA (Agravo em Recurso Especial 0600651–94, red. para o acórdão Min. Alexandre de Moraes, DJE de 30.6 .2022), a jurisprudência do Tribunal tem reiteradamente assentado que “a obtenção de votação zerada ou pífia das candidatas, a prestação de contas com idêntica movimentação financeira e a ausência de atos efetivos de campanha são suficientes para evidenciar o propósito de burlar o cumprimento da norma que estabelece a cota de gênero, quando ausentes elementos que indiquem se tratar de desistência tácita da competição” (REspEl 0600001–24, rel. Min. Carlos Horbach, DJE de 13.9 .2022). Na mesma linha: REspEl 0600239–73, rel. Min. Alexandre de Moraes, DJE de 25 .8.2022; AgR–REspEl 0600446–51, rel. Min. Benedito Gonçalves, DJE de 15 .8.2022. 5. Na espécie, tendo sido revelado que as candidatas Tânia Monteiro de Carvalho (“Tânia de Rildo”) e Maria Sônia Alves de Oliveira (“Sônia Alves”) obtiveram votação pífia, não tiveram movimentação financeira na campanha, não realizaram atos de campanha e não fizeram a divulgação de sua candidatura nas suas redes sociais, evidencia–se a configuração da prática de fraude à cota de gênero. CONCLUSÃO Recurso especial eleitoral provido, com determinação. (TSE - REspEl: 06004587820206250028 CANINDÉ DE SÃO FRANCISCO - SE 060045878, Relator.: Min. Sergio Silveira Banhos, Data de Julgamento: 16/03/2023, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 48). (grifo nosso)
ELEIÇÕES 2020. AGRAVOS REGIMENTAIS EM AGRAVOS EM RECURSOS ESPECIAIS ELEITORAIS. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. FRAUDE À COTA DE GÊNERO . § 3º DO ART. 10 DA LEI N. 9.504/1997 . PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. ELEMENTOS PROBATÓRIOS SUFICIENTES PARA CARACTERIZAÇÃO DA FRAUDE. CONFORMIDADE DA DECISÃO RECORRIDA COM A JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. SÚMULA N . 30 DESTE TRIBUNAL SUPERIOR. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. 1. De acordo com a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a comprovação da concomitância de (a) votação zerada ou inexpressiva, (b) não realização de atos de campanha em benefício próprio, (c) ausência de movimentação financeira relevante ou prestação de contas zerada e (d) divulgação ou promoção da candidatura de terceiros é suficiente para a caracterização de fraude à cota de gênero . 2. A presença, no acervo fático–probatório delineado pela decisão recorrida, dessas circunstâncias é suficiente para a caracterização do ilícito. 3. Pelo contorno fático delineado no acórdão e constante da decisão agravada, é de se concluir que a decisão proferida pelo Tribunal de origem harmoniza–se com as orientações deste Tribunal Superior, a atrair a incidência da Súmula n . 30. 4. Agravos regimentais aos quais se nega provimento. (TSE - AREspEl: 06000015420216240023 LAURO MÜLLER - SC 060000154, Relator.: Min . Cármen Lúcia, Data de Julgamento: 20/04/2023, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 82). (grifo nosso)
Das provas constantes nos autos — incluindo documentos, depoimentos extrajudiciais e judiciais, bem como a oitiva de testemunhas — é possível extrair os seguintes elementos de convicção:
Marcilene de Souza Brum possuía perfis ativos em redes sociais à época do registro de sua candidatura, contudo, não realizou qualquer tipo de propaganda eleitoral fixa em tais plataformas. As publicações realizadas foram exclusivamente temporárias (do tipo "stories"), sem possibilidade de comprovação posterior. As imagens acostadas pelos réus, que supostamente retratariam atos de campanha da candidata, carecem de autenticação quanto à data em que teriam sido produzidas. Quando indagada sobre atos efetivos de campanha, a candidata apresentou respostas vagas e imprecisas;
A representada obteve apenas seis votos, presumivelmente provenientes de familiares. Testemunhas ouvidas declararam sequer ter conhecimento de sua candidatura, diante da total ausência de materiais ou atividades de campanha em locais públicos ou redes sociais;
Marcilene é pessoa de condição simples, mãe solo de uma criança, e exercia, à época, dois empregos: trabalhava das 5h às 12h em uma padaria e das 17h às 23h em um restaurante. Conforme relatado em depoimento, chegou a laborar até depois da meia-noite na véspera da eleição, razão pela qual levantou-se tardiamente no domingo e perdeu o horário de votação — fato inusitado para alguém que disputa um cargo eletivo. Testemunhas confirmaram que a candidata compareceu ao local de votação apenas após o encerramento da votação, denotando desinteresse na disputa eleitoral;
Em depoimento extrajudicial, Marcilene não recordava seu número de campanha e, em juízo, não soube informar sequer o slogan utilizado;
Quando questionada sobre as atribuições do cargo de vereadora, remuneração e número de assessores, a candidata apresentou respostas genéricas e evasivas, como “buscar melhorias” e “falar com o prefeito”, admitindo que não pesquisou previamente sobre a função pública almejada, o que evidencia seu desconhecimento e desinteresse quanto ao exercício efetivo do mandato;
A própria representada afirmou conhecer o então Prefeito Edervan Gustavo Sprotte, candidato à reeleição pela coligação União Brasil/Progressistas, tendo sido convidada por ele a registrar sua candidatura e
Por fim, Marcilene relatou dificuldades na abertura de conta bancária de campanha e informou que não recebeu quaisquer recursos financeiros do partido, o que resultou em prestação de contas zerada. Afirmou, ainda, que, embora inicialmente pretendesse contratar cabos eleitorais, desistiu diante da ausência de apoio financeiro, optando por não solicitar auxílio de terceiros. Em contraponto, a candidata Kallyane de Oliveira Silveira declarou, em depoimento extrajudicial, que recebeu apoio da chapa majoritária para contratação de cabo eleitoral e realizou efetiva campanha.
Dentre os fatos elencados, a ausência de propaganda eleitoral na rede social da candidata é fato que salta aos olhos, uma vez que, com parcos recursos próprios, sem auxílio financeiro do partido político e com falta de tempo hábil, já que possuía dois empregos e um filho pequeno para criar, as redes sociais, por serem gratuitas e abrangerem um grande número de pessoas, seriam os veículos mais efetivos para a propagação de campanha eleitoral.
Também chama atenção no depoimento judicial da representada o fato de ter trabalhado na véspera da eleição em restaurante até depois da meia-noite, algo incomum para um candidato, que, na véspera do pleito, costuma realizar seus últimos atos de campanha.
Conforme informado pela própria investigada, por ter laborado até avançado horário, adentrando a madrugada, acabou acordando tarde no dia seguinte e perdeu a hora da votação. Apesar de Marcilene demonstrar surpresa com o horário do fechamento dos portões nos locais de votação, insta sobrelevar que, desde 2022, o encerramento das eleições no Mato Grosso do Sul se dá às 16 h. A candidata, todavia, permaneceu alheia aos informes da Justiça Eleitoral, algo incomum para quem está participando ativamente da disputa eleitoral.
A única conclusão plausível para a ausência de atos efetivos de campanha, ignorância em relação às atribuições do cargo, desinteresse no que tange ao processo eleitoral, incluindo o horário de votação, é a de que não ocorreu candidatura de fato. Não se trata de um fato isolado, como a baixa votação, mas uma sucessão de fatos que demonstram uma candidatura meramente formal.
Ressalta-se que a alegação de Marcilene em depoimento judicial de que inicialmente possuía vontade de disputar o cargo, porém ao longo do processo foi desanimando, pois os eleitores só teriam interesses financeiros, não se mostrou suficiente para sustentar a tese defensiva de que não houve burla à norma que garante a reserva mínima de vagas às mulheres. Uma candidatura só é efetiva quando há um movimento político para impulsioná-la e as provas documentais, testemunhais e depoimentos colacionados aos autos confirmam que a pretensa candidata não estava, efetivamente, envolvida com o processo eleitoral.
Com relação ao argumento de que os representantes não se pronunciaram sobre o fato de que diversos candidatos homens também obtiveram votação ínfima no município, vale salientar que a norma contra a qual se investiga a violação dissimulada tem a natureza de ação afirmativa voltada à garantia do direito de representação feminina, sendo desnecessária a comparação entre a votação obtida por candidatos do gênero masculino e aquela obtida pelo grupo feminino.
Sublinhe-se, outrossim, que os relatos extrajudiciais das candidatas mulheres (Marcilene de Souza Brum, Kallyane de Oliveira Silveira e Maria José Januária) não foram utilizados isoladamente para embasamento da convicção, mas sim em conjunto com as demais provas dos autos, inclusive depoimento pessoal. Ademais, o artigo 23 da LC 64/90 é claro ao estabelecer:
“O Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral”.
Assim, comprovou-se, na hipótese, que Marcilene de Souza Brum tinha total desinteresse na corrida eleitoral, circunstância reforçada pelas contradições em seus depoimentos, ausência de atos efetivos de campanha, votação pífia, falta de comparecimento ao local de votação no horário estipulado pela Justiça Eleitoral e negligência com o processo eleitoral.
Os investigados, além de não terem carreado aos autos prova idônea acerca da veracidade da candidatura de Marcilene, aduziram que a demanda consistiria em “trama arquitetada pelo reclamante em conluio com pessoas interessadas em tomar o poder da Câmara Municipal de Bandeirantes”. Todavia, não foi apenas o candidato da oposição que ajuizou a ação de investigação judicial eleitoral, mas também o Ministério Público Eleitoral, órgão fiscal do ordenamento jurídico.
Dessarte, verifico razão assistir aos representantes, pois, embora devidamente cumpridos os percentuais de gênero pelo partido político ao momento do registro de candidatura (70% de candidaturas masculinas e 30% femininas), colhe-se contexto probatório suficientemente robusto para a caracterização do ilícito de fraude à cota de gênero.
Cumpre repisar que, para a procedência do pedido contido em AIJE baseada em fraude à cota de gênero, é imprescindível que esteja demonstrado um inequívoco e efetivo prejuízo à isonomia entre homens e mulheres pretendida pelo legislador decorrente de uma intencional burla ao preenchimento do percentual mínimo, o que efetivamente restou comprovado nos autos.
A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, quanto aos elementos suficientes para a caracterização da fraude à cota de gênero, assenta-se no sentido de que não se inclui a necessidade de comprovação do dolo e da má-fé, necessários, tão somente, para fins de análise da inelegibilidade. Nesse sentido:
ELEIÇÕES 2020. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. IMPROCEDÊNCIA . PRELIMINAR. ILEGITIMIDADE PASSIVA DE PESSOA JURÍDICA FIGURAR EM AIJE. MÉRITO. FRAUDE À COTA DE GÊNERO . ART. 10, § 3º, DA LEI 9.504/97. CANDIDATURA FICTÍCIA . CARACTERIZAÇÃO. PROVIMENTO. SÍNTESE DO CASO.
[...]
4. A partir do leading case do caso de Jacobina/BA (AgR–AREspE 0600651–94, red. para o acórdão Min. Alexandre de Moraes, DJE de 30 .6.2022), a jurisprudência deste Tribunal tem reiteradamente assentado que "a obtenção de votação zerada ou pífia das candidatas, a prestação de contas com idêntica movimentação financeira e a ausência de atos efetivos de campanha são suficientes para evidenciar o propósito de burlar o cumprimento da norma que estabelece a cota de gênero, quando ausentes elementos que indiquem se tratar de desistência tácita da competição" (REspEl 0600001–24, rel. Min. Carlos Horbach, julgado em 18 .8.2022). Na mesma linha: REspEl 0600239–73, rel. Min . Alexandre de Moraes, DJE de 25.8.2022; AgR–REspEl 0600446–51, rel. Min . Benedito Gonçalves, DJE de 15.8.2022.
[...]
6. A votação irrisória ou zerada, prestação de contas zerada, não realização de propaganda eleitoral em favor de suas candidaturas e realização de campanha eleitoral em prol de candidatura masculina de seu partido são elementos suficientemente robustos para a caracterização do ilícito de fraude à cota de gênero, sendo despiciendo a análise da existência ou não do elemento subjetivo (consilium fraudis), consistente na intenção de fraudar a lei, bastando, para tal, o seu desvirtuamento finalístico. (TSE - AREspEl: 060017063 BELO HORIZONTE - MG, Relator.: Min. Sergio Silveira Banhos, Data de Julgamento: 30/03/2023, Data de Publicação: 14/04/2023). (grifo nosso)
Nessa toada, consoante os elementos antes indicados, está evidenciada a fraude ao disposto no art. 10, §3º, da Lei 9.504/97, mediante o lançamento de candidatura fictícia sem o empenho mínimo para a promoção efetiva de candidatura feminina. No caso vertente, é explícito que Marcilene foi utilizada como instrumento para que o partido cumprisse formalmente o dispositivo legal anuindo com a utilização de sua candidatura de forma fraudulenta, razão pela qual se faz imprescindível a sanção de inelegibilidade para a investigada. Deixo, todavia, de aplicar-lhe a multa requestada pelos representantes, porquanto em sede de AIJE inexiste previsão legal nesse sentido.
No que se refere aos demais candidatos, não prospera o argumento de que não poderiam ser alcançados pelos efeitos da eventual fraude, uma vez que o reconhecimento da obtenção do registro do partido por meio de ato fraudulento é incíndível em relação a todos os integrantes da chapa, sejam titulares ou suplentes. Isso porque todos, em maior ou menor medida, concorreram para a formação do quociente partidário — elemento essencial para a definição do número de cadeiras obtidas pela legenda, bem como da ordem de suplência.
Todavia, quanto à sanção de inelegibilidade, é imprescindível a análise do elemento subjetivo — a intenção de fraudar a lei —, o que restou comprovado nos autos exclusivamente em relação à própria Marcilene de Souza Brum.
Além dos candidatos do União Brasil, os autores das Ações de Investigação Judicial Eleitoral também atribuíram a prática de fraude a Auzenir Alves de Souza, em razão de sua condição de subscritor da ata da convenção partidária e secretário dos trabalhos convencionais; a José Márcio dos Santos, na qualidade de presidente do diretório partidário; a Willians Dias de Freias, por ocupar a vice-presidência da agremiação; bem como a Cristiano Lezisaamon Tiago e Adevaldo Freitas de Souza, ambos na condição de delegados do União Brasil e subscritores do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (Drap).
Todos esses envolvidos teriam concorrido, de forma direta, para a coaptação de candidata fictícia, oferecendo-lhe apoio logístico e institucional com o objetivo de simular uma participação ativa nas etapas preliminares do processo eleitoral, especialmente durante as prévias partidárias.
Apesar das condutas acima narradas, não há nos autos, efetivamente, provas quanto ao elemento subjetivo envolvendo a fraude à cota de gênero em relação aos demais candidatos e aos responsáveis pelos atos de formalização das candidaturas, tendo sido a fraude a eles vinculada tão somente em razão do cargo ocupado e atribuições dele decorrentes.
Por consectário lógico, não havendo elementos probatórios incontestes do elemento subjetivo, tais como declarações da ciência, anuência e conluio com a fraude, deixo de impor-lhes a sanção de inelegibilidade, a qual se restringe à candidata fictícia Marcilene de Souza Brum, persistindo, todavia, quanto aos demais candidatos, as consequências previstas na Súmula 73 do TSE (cassação do DRAP da legenda e dos diplomas dos candidatos a eles vinculados e nulidade dos votos obtidos pelo partido). É nesse sentido, inclusive, que vem decidindo os Tribunais Eleitorais:
“[...] caracterizada a fraude e, por conseguinte, comprometida a disputa, não se requer, para fim de perda de diploma de todos os candidatos beneficiários que compuseram as coligações, prova inconteste de sua participação ou anuência, aspecto subjetivo que se revela imprescindível apenas para impor a eles inelegibilidade para eleições futuras” (REspe n. 0000193-92.2016.6.18.0018, ministro Jorge Mussi, DJe de 4 de outubro de 2019).
ELEIÇÕES 2020. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. FRAUDE À COTA DE GÊNERO. ART . 10, § 3º, DA LEI 9.504/97. LANÇAMENTO DE CANDIDATURAS FICTÍCIAS. VOTAÇÃO PÍFIA, INEXISTÊNCIA DE ATOS DE CAMPANHA, PRESTAÇÕES DE CONTAS PADRONIZADAS . ELEMENTOS INDICATIVOS DE FRAUDE CARACTERIZADOS. ALEGAÇÃO DE DESISTÊNCIA TÁCITA EM RAZÃO DE DIFICULDADES PESSOAIS. AUSÊNCIA DE PROVAS DO FATO DESCONSTITUTIVO. FRAUDE À COTA DE GÊNERO CARACTERIZADA . RECURSO PROVIDO. 1. A fraude à cota de gênero prevista no art. 10, § 3º, da Lei nº 9 .504/97 caracteriza–se pelo lançamento de candidaturas femininas fictícias e inviáveis, com o intuito de viabilizar o lançamento de um número maior de candidatos homens. 2. Nos termos da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, consolidada por meio do verbete da Súmula TSE 73, "configura–se com a presença de um ou alguns dos seguintes elementos, quando os fatos e as circunstâncias do caso concreto assim permitirem concluir: (1) votação zerada ou inexpressiva; (2) prestação de contas zerada, padronizada ou ausência de movimentação financeira relevante; e (3) ausência de atos efetivos de campanhas, divulgação ou promoção da candidatura de terceiros". 3 . A desistência tácita da candidatura não é vedada pelo ordenamento jurídico, contudo a alegação deve estar acompanhada de prova de situação suficientemente grave a dar ensejo à desistência, bem como de que houve início de campanha eleitoral. 4. Alegações genéricas, como os problemas decorrentes da pandemia de Covid–19, ou não demonstradas por elementos mínimos de prova, não são suficientes para comprovar a desistência tácita, mormente quando presentes circunstâncias e indícios que induzem à conclusão de que as candidaturas eram fictícias. 5 . As candidaturas fictícias não são apenas aquelas registradas sem o consentimento ou sem a vontade da candidata, tampouco se restringem às hipóteses em que há conluio entre as candidatas fictícias e o partido político, circunstância que consubstancia requisito essencial à caracterização da fraude na cota de gênero. 6. Verificada situação em que duas das candidatas registradas tiveram votação irrisória (1 e 2 votos); não votaram em si mesmas; apresentaram prestação de contas com movimentação financeira irrisória; e não realizaram nenhum ato de campanha, bem como que não houve comprovação das alegadas desistências tácitas, resta configurada a fraude à cota de gênero. 7 . À míngua de elementos que indiquem que, apesar de terem consentido com o lançamento das candidaturas, as candidatas fictícias tivessem ciência da fraude e havendo elementos que indicam que o consentimento delas foi viciado, pois não receberam nenhum apoio do partido para a realização da campanha, não se aplica a sanção de inelegibilidade . 8. Recurso provido para o fim de reconhecer a fraude à cota de gênero e: (a) cassar o Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP) apresentado pelo Partido Social Liberal – PSL de Figueira nas Eleições 2020; (b) cassar os diplomas de todos os candidatos a ele vinculados; (c) declarar a nulidade dos votos obtidos pelo Partido Social Liberal – PSL de Figueira/PR nas Eleições 2020; e (d) determinar ao juízo da 119ª Zona Eleitoral que dê imediato cumprimento à decisão e proceda à retotalização dos votos, com a recontagem dos quocientes eleitoral e partidário. (TRE-PR - REl: 06005441920206160119 FIGUEIRA - PR 060054419, Relator.: Claudia Cristina Cristofani, Data de Julgamento: 22/08/2024, Data de Publicação: DJE-185, data 28/08/2024).
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO ELEITORAL EM AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO (AIME). ELEIÇÕES 2016. FRAUDE. ART. 14, § 10, DA CF/88. COTA DE GÊNERO. ART. 10, § 3º, DA LEI 9.504/97. CANDIDATURAS FICTÍCIAS. CONFIGURAÇÃO. A COMPROVACAO DE FRAUDE MACULA A CHAPA PROPORCIONAL, PORQUANTO O VÍCIO ESTÁ NA ORIGEM. PRECEDENTE DO TSE. CASSAÇÃO DOS MANDATOS ELETIVOS DOS CANDIDATOS ELEITOS E DOS EVENTUAIS SUPLENTES DA CHAPA PROPORCIONAL. NULIDADE DOS VOTOS ATRIBUÍDOS À MENCIONADA COLIGAÇÃO. RECONTAGEM DOS VOTOS E NOVO CÁLCULO DO QUOCIENTE ELEITORAL. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE E ERRO MATERIAL NO ACÓRDÃO EMBARGADO. PRETENSÃO DE REDISCUSSÃO DOS FUNDAMENTOS DO VOTO CONDUTOR DO ACÓRDÃO EMBARGADO. EMBARGOS DESPROVIDOS. 1. a 4. (...) 5. Para a aplicação da sanção de cassação do registro ou do diploma na AIME, que é o caso dos autos, basta a mera condição de beneficiário do ato de abuso, ao passo que somente se cogita da sanção de inelegibilidade quando houver prova da responsabilidade subjetiva do sujeito passivo por meio de uma conduta comissiva ou omissiva apurada na análise do caso concreto. Precedentes.6 (...) (TRE-GO - Recurso Eleitoral nº 1-90.2017.6.09.0046, Acórdão de 16/12/2019, Relator (a) Juiz Alderico Rocha Santos, Publicado em Sessão, Data 16/12/2019).
Ante o exposto, com fulcro no artigo 10, § 3º, da Lei 9.504/1997, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados nas AIJES nº 0600633-75.2024.6.12.0034 e 0600635-45.2024.6.12.0034 e determino: (i) a cassação do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (Drap) do União Brasil de Bandeirantes e dos diplomas dos candidatos a ele vinculados; (ii) a nulidade dos votos obtidos pelo partido, com a recontagem dos quocientes eleitoral e partidário (art. 222 do Código Eleitoral), com determinação de nova totalização dos resultados e (iii) a inelegibilidade por 8 (oito) anos da candidata fictícia Marcilene de Souza Brum.
Transitada em julgado a sentença:
a) Procedam-se às anotações devidas no Sistema CAND e SISTOT e à nova totalização dos resultados da eleição proporcional na circunscrição de Bandeirantes, MS e
b) Comunique-se o fato à Câmara Municipal de Bandeirantes, para a posse do respectivo eleito.
Publique-se. Registre-se. Intime-se.
Bandeirantes, MS, data da assinatura digital.
FELIPE BRIGIDO LAGE
Juiz da 34ª Zona Eleitoral