TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DE MATO GROSSO DO SUL
CARTÓRIO DA 038ª ZONA ELEITORAL DE COSTA RICA MS

 

REPRESENTAÇÃO n.º 0600036-94.2024.6.12.0038

REPRESENTANTE: REPUBLICANOS - COSTA RICA - MS - MUNICIPAL

Advogado do(a) REPRESENTANTE: KAYRON BRENO RODRIGUES FERREIRA - MS24323

REPRESENTADO: PAULO REIS DOS SANTOS JUNIOR, CLEVERSON ALVES DOS SANTOS

Advogados do(a) REPRESENTADO: ADRIELLY MARTINS RODOVALHO - MS22782, KLEBER ROGERIO FURTADO COELHO - MS17471
Advogado do(a) REPRESENTADO: KLEBER ROGERIO FURTADO COELHO - MS17471

 

 

Vistos etc.

 

O Partido Republicanos, por seu órgão provisório de Costa Rica/MS, representado pela Presidente Liliane de Campos, ajuizou representação eleitoral em face de Paulo Reis dos Santos Júnior, Chefe de Divisão Administrativa I, e de Cleverson Alves dos Santos, Prefeito Municipal, todos qualificados nos autos, argumentando que o primeiro representado tem realizado propaganda extemporânea, com divulgação de jingle eleitoral em grupo de Whatsapp, em apoio ao segundo representado, pré-candidato à reeleição para o mesmo cargo que ocupa nas eleições de 2024. Salientou que o arquivo em vídeo contempla imagens do segundo representado sonorizado por jingle que contempla expressões e frases equivalentes a pedido explícito de voto, a exemplo de “ele tá na boca do povo, vai estourar de novo”, “bota para estourar, respeita meu prefeitão”, “quem vai ganhar é meu prefeito”, entre outros. Ressaltou que o segundo representado participa do grupo de Whatsapp em que houve a divulgação do arquivo, contudo, não tomou nenhuma atitude para coibir a conduta. Afirmou que a conduta, além de vedada, desequilibra a igualdade de condições na disputa entre os pré-candidatos, comprometendo a lisura do pleito eleitoral vindouro. Postulou, em tutela provisória de urgência, que os requeridos se abstenham de publicar ou compartilhar o referido conteúdo em qualquer mídia social. Por fim, requereu a condenação dos requeridos em multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

 

O pedido de tutela provisória de urgência, formulado liminarmente, foi deferido para que os representados se abstivessem de publicar ou compartilhar o vídeo em qualquer mídia social, conforme decisão interlocutória (ID 122220364).

 

Os representados foram citados (ID 122230973 e ID 122230974) e apresentaram contestação em petições separadas (ID 122232527 e ID 122232505), entretanto, com idêntico conteúdo. Disseram que inexiste jingle produzido em favor do segundo representado, sendo música do cantor nacional Rey Vaqueiro, disponível no Youtube, Spotify e outros streamings, com o nome ‘Ele tá na boca do povo’, com mais de 30 mil acessos, tando que virou trend no TikTok, com vídeos que ultrapassam 180 mil visualizações, bastando pesquisar com o tema ‘Respeita Meu Prefeito’. Solicitaram, preliminarmente, a denunciação da lide ao cantor Rey Vaqueiro, e a retificação do polo ativo, com a juntada dos documentos pessoais. Compararam o caso em tela com a representação eleitoral n. 0600002-22.2024.6.12.0038, que tramitou neste juízo, e ensejou a responsabilização de outro pré-candidato por propaganda antecipada em razão de divulgação de jingle, afirmando que as hipóteses são distintas. Mencionaram que a mera exaltação de qualidade pessoais do pré-candidato não configura pedido explícito de voto, sendo permitido pela legislação eleitoral. Requereram a improcedência do pedido e a condenação do requerente em litigância de má-fé.

 

O Ministério Público Eleitoral, em parecer (ID 122242987), opinou pela procedência da pretensão contida na inicial, com a condenação dos representados às sanções de multa pecuniária, conforme Lei 9.504/97 e Res. TSE 23.610/19.

 

É o relatório. DECIDO.

 

1. Preliminares.

 

As preliminares arguidas pelos representados não vingam.

 

Não há falar em denunciação da lide, por três motivos distintos, porém igualmente relevantes: primeiro, porque o procedimento em tela não admite hipótese de intervenção de terceiros; segundo, porque mesmo se fosse admitido, não estariam presentes os requisitos para a denunciação da lide, na forma do art. 125 do CPC; terceiro, porque a controvérsia não envolve direitos autorais.

 

Também não há sentido no pedido de retificação do polo ativo, afinal, inexiste qualquer incorreção nesse sentido. Ademais, está nos autos o documento pessoal de identificação da representante do partido político (ID 122219771), sendo que não há qualquer indício de falsidade quanto à assinatura na procuração outorgando poderes ao Advogado par a propositura desta demanda (ID 122219768).

 

2. Mérito.

 

O art. 36, caput, da Lei 9.504/97 c/c Res. TSE 23.610/19 e 23.738/2024, esclarece que a propaganda eleitoral, assim compreendida como um conjunto de técnicas e procedimentos que são realizados pelas coligações, partidos e candidatos, com a finalidade de captar e conquistar o voto do eleitor, somente é permitida a partir do dia 16 de agosto de 2024. Essa regra, de clareza meridiana, impõe que todos aqueles que pretendem disputar cargos eletivos não podem divulgar a sua candidatura e nem mesmo pleitear votos antes do referido marco temporal.

 

Nessa compreensão, o art. 36-A da lei 9.504/97, cujo conteúdo está replicado no art. 3º da Res. TSE 23.610/19, autoriza que os filiados ou pré-candidatos se utilizem dos meios de comunicação ou mídias sociais para enaltecer suas qualidades pessoais, mencionar a pretensa candidatura, falar das ações políticas desenvolvidas e das que pretendem desenvolver e, até mesmo, pedir apoio político (vide art. 36-A, § 1º, da Lei 9.504/97 e art. 3º, § 2º, da Res. TSE 23.610/19), desde que inexista pedido explícito de voto ou qualquer dispêndio de recursos financeiros por parte do pré-candidato. Também é permitida a divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive nas redes sociais, blogs, sítios eletrônicos pessoais e aplicativos (art. 3º, V, com redação dada pela Res. TSE 23.732/24), dentre eles o Whatsapp.

 

Seguindo a evolução legislativa, a Res. TSE 23.671/21 incluiu o art. 3º-A, caput, à Res. TSE 23.610/24, pelo qual restou definido que se considera propaganda antecipada passível de multa “aquela divulgada extemporaneamente cuja mensagem contenha pedido explícito de voto, ou que veicule conteúdo eleitoral em local vedado ou por meio, forma ou instrumento proscrito no período de campanha”.

 

Em interpretação a esses dispositivos legais, firmou-se o entendimento de que expressões equivalentes ao pedido explícito de voto também estão proibidas.

 

É o que se convencionou chamar de palavras mágicas”. Nesse sentido é a posição do TSE: “(…) À luz da jurisprudência deste Tribunal Superior, o pedido explícito de votos pode ser aferido por meio da utilização de ‘palavras mágicas’ (…)” (Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial Eleitoral nº060071858, Acórdão, Min. Raul Araujo Filho, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 01/12/2023).

 

Esse cenário resultou na inclusão do parágrafo único ao art. 3º-A da Res. TSE 23.610/19, pela Res. TSE 23.732/24, estabelecendo que “o pedido explícito de voto não se limita ao uso da locução ‘vote em’, podendo ser inferido de termos e expressões que transmitam o mesmo conteúdo” (grifei).

 

Portanto, além do pedido explícito de voto, compreende-se na vedação legal as expressões equivalentes e os atos estruturados/organizados de campanha.

 

No caso, o requerente apresentou arquivo em mídia (vídeo) contemplando imagens do segundo representado, Prefeito Municipal e pré-candidato à reeleição, sonorizado por música que contém a seguinte letra (arquivo juntado no movimento 122219775):

 

(…) Ele té na boca do povo, vai estourar de novo e do lado de lá, os pião ficando louco, é o povo que manda, o homem tem pressão, bota pra estourar, respeita meu prefeitão. Ele tá na boca do povo, vai estourar de novo, e do lado de lá, os pião ficando louco, é o povo que manda, o homem tem pressão, bota pra estourar, respeita meu prefeitão. Tá na boca do povo e estorou e não tem jeito, tem que respeitar quem vai ganhar é meu prefeito. Tá na boca do povo e estou e não tem jeito, tem que respeitar quem vai ganhar é meu prefeito (…)”.

 

Embora incerto o autor, verifico que houve criação/montagem de um arquivo audiovisual contemplando imagens do segundo representado, sonorizado por música já existente (Meu Prefeito’ ou ‘Respeita Meu Prefeito’, de autoria do cantor/compositor Rey Vaqueiro, disponível nas mais diversas plataformas de streaming, como Youtube, Spotify etc.), com objetivo claro de impulsionar a pretensa candidatura do segundo representado à reeleição, não só enaltecendo sua figura pública, mas promovendo pedido explícito de voto, ainda que mediante expressões equivalentes, em inescondível ato estruturado de campanha.

 

Realmente, a hipótese não se caracteriza como jingle, como bem salientaram os representados em suas contestações, de modo que o caso difere daquele julgado por este juízo nos autos da representação eleitoral n. 0600002-22.2024.6.12.0038, envolvendo o então pré-candidato Waldeli dos Santos Rosa. Não obstante, ainda assim, o conteúdo produzido e compartilhado constitui ato de propaganda eleitoral em período proscrito, porquanto extrapola o permissivo legal (art. 36-A da Lei 9.504/97 e art. 3º da Res. TSE 23.610/19), consoante disciplina o art. 3º-A da Res. TSE 23.61/19.

 

Há prova de que o arquivo em mídia (vídeo) foi compartilhado pelo primeiro representado em grupo de Whatsapp aberto denominado “Costa Rica em Debate”, com diversos participantes, dentre eles o segundo representado (vide ID122219772 e ID 122219773), o qual não adotou qualquer postura para coibir a conduta. Ademais, noto que o segundo representado não impugnou especificamente o fato de que teve contato com o arquivo audiovisual por meio do grupo de Whatsapp, não demonstrando providências concretas para a cessação da conduta do primeiro representado – o qual, aliás, ocupa cargo em comissão no Município de Costa Rica/MS, por ele próprio nomeado – ou mesmo para evitar a propagação do conteúdo, que inevitavelmente ocorreria por simples compartilhamentos, ao se deparar com material de nítido viés de propaganda eleitoral em seu benefício. Ou seja, também está provado o efetivo conhecimento da propaganda eleitoral pelo pré-candidato beneficiado, sendo que ele nada fez para que a conduta cessasse.

 

Vale ressaltar que, por se tratar de grupo de Whatsapp aberto, cuja inscrição se dá livremente por qualquer pessoa, podendo chegar até 1.024 membros, tem-se amplitude da mensagem compartilhada apta a ensejar potencial lesivo, notadamente diante de eleitorado de 22.467 de Costa Rica/MS, causando efetivo comprometimento ao princípio da igualdade de condições entre os concorrentes.

 

As provas permitem clara identificação de propaganda eleitoral antecipada, porquanto a mensagem contida no arquivo em mídia (vídeo) remete à disputa eleitoral e ao apoiamento explícito à reeleição do atual Prefeito Municipal, com intento de movimentar o eleitorado à adesão da pretensa candidatura, refletindo ato estruturado de campanha, o que se mostra vedado pela legislação eleitoral.

 

Desse cenário, extrai-se a responsabilidade pessoal de ambos representados.

 

O art. 36, § 3º, da Lei 9.504/97, c/c art. 2º, § 4º, da Res. TSE 23.610/19, estabelece as consequências jurídicas para a hipótese de propaganda eleitoral antecipada (ou extemporânea), a saber: A violação do disposto neste artigo sujeitará o responsável pela divulgação da propaganda e, quando comprovado o seu prévio conhecimento, o beneficiário à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), ou ao equivalente ao custo da propaganda, se este for maior”.

 

Nesse raciocínio, com relação à dosimetria da multa, é relevante enfatizar que não há informação de contumácia dos representados em realização de propaganda antecipada (v.g., condenações pretéritas); o arquivo em mídia (vídeo) foi compartilhado em grupo de Whatsapp aberto (‘Costa Rica em Debate’), conduta com aptidão para conspurcar a igualdade de oportunidades entre os pretendentes ao mesmo cargo, todavia, não há informação de que houve replicação do conteúdo em outros grupos ou em mídias sociais diversas (Instagram, Facebook, TikTok, Kwai, X, Telegram e assemelhados); os representados, ao que tudo indica, mantiveram conduta colaborativa, porquanto inexiste indício de publicação ou compartilhamento do arquivo em mídia (vídeo) após a intimação para cumprimento da decisão proferida liminarmente. Diante dessas circunstâncias, à luz da proporcionalidade e/ou razoabilidade, entendo que a multa deve ser aplicada em valor mínimo, qual seja, R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para cada representado, conforme balizas definidas pelo art. 36, § 3º, da Lei 9.504/97, c/c art. 2º, § 4º, da Res. TSE 23.610/19.

 

ISSO POSTO, com fundamento no art. 36, caput, art. 36-A, e art. 96, da Lei 9.504/97, c/c arts. 2º, 3º e 3º-A da Res. TSE 23.610/19, e art. 487, I, do CPC, julgo procedente a pretensão sancionatória contida na petição inicial, e o faço para, mantendo a decisão proferida liminarmente (ID 122220364), CONDENAR os representados Paulo Reis dos Santos Júnior e Cleverson Alves dos Santos, ambos qualificados nos autos, individualmente, à sanção pecuniária consistente em multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para cada um.

 

Sem custas e honorários de sucumbência.

 

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

 

Costa Rica/MS, 15 de agosto de 2024.

 

Francisco Soliman – Juiz Eleitoral (38ª ZE)