JUSTIÇA ELEITORAL
052ª ZONA ELEITORAL DE PONTA PORÃ MS
AÇÃO PENAL ELEITORAL (11528) Nº 0600025-57.2023.6.12.0052 / 052ª ZONA ELEITORAL DE PONTA PORÃ MS
AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL
REU: DIEGO DENCK
Advogado do RÉU: CASSYUS DE CAMARGO PONTES - RS122096
1. Relatório
Trata-se de Ação Penal movida pelo Ministério Público Eleitoral em desfavor de Diego Denck, pela prática, em tese, dos crimes de inscrição eleitoral fraudulenta e de falsificação de documento público para fins eleitorais, previsto nos artigos 289 e 348, ambos do Código Eleitoral.
Narra a denúncia (ID 120866446):
“Fato 01: consta dos autos nº 0600025-57.2023.6.12.0052 que, em data, horário e local incertos, mas anteriormente ao dia 27 de novembro de 2019, o denunciado DIEGO DENCK falsificou/concorreu para a falsificação de documentos públicos para fins eleitorais, quais sejam 01 (um) RG e 01 (um) Certificado de Alistamento Militar em nome de "Diego Rodrigues da Silva", fornecendo ao menos sua fotografia e assinatura para tanto, documentos que posteriormente apresentou à Justiça Eleitoral para se inscrever na 52ª Zona Eleitoral de Ponta Porã/MS (...);
Fato 02: consta dos autos nº 0600025-57.2023.6.12.0052 que, no dia 27 de novembro de 2019, o denunciado DIEGO DENCK, valendo-se dos documentos acima descritos, inscreveu-se fraudulentamente como eleitor na 52ª Zona Eleitoral de Ponta Porã/MS, apresentando-se como "Diego Rodrigues da Silva".
A denúncia foi recebida em 25/10/2023 (ID 120871068).
Citação do réu em 14/11/2023 (ID´s 121526442/ 121526439/ 121592932). Apresentada resposta à acusação (ID 108184647). A defesa apresentou defesa, não arguiu preliminares e requereu a absolvição do réu (ID 122094815).
Antecedentes criminais acostados nos ID´s 121083715/ 121083716/ 121083717/ 121083719/ 121083718/ 121111441/ 121111442/ 121111448/ 121111449/ 121129708/ 121129709/ 121294202/122154122/122154906/122154963.
Designada audiência de instrução e julgamento (ID 122152869), posteriormente redesignada (ID 122156636).
Durante a instrução, em 20/03/2024, procedeu-se à oitiva das testemunhas de acusação Rafael Eduardo Simoni Leite e Lucy Pathy Pitthan dos Santos Silva, da testemunha de defesa Patrícia Stumpf da Silva e o interrogatório do réu Diego Denck. Homologada a desistência da oitiva de testemunha de acusação Izani Pitthan dos Santos (ID 122169010).
Em sede de alegações finais (ID 122171462), o Ministério Público Eleitoral pugnou pela procedência da denúncia, para efeito de condenar o réu Diego Denck às penas dos artigos 348 e 289, ambos da Lei nº 4.737/65 (Código Eleitoral), com incidência da atenuante da confissão espontânea (artigo 65, III, “d”, do Código Penal).
Já a defesa, arguiu que não há provas da materialidade dos delitos imputados ao réu na denúncia, o que existe é mera consulta de dados sem apreensão de documentos, que o réu não compareceu ao Cartório Eleitoral para requerer a confecção do título de eleitor baseado no “kit de documentos falsos” que havia comprado dois anos antes dos fatos descritos na denúncia, que não existe inscrição fraudulenta porque o réu nunca utilizou o título de eleitor nem os documentos do “kit” adquirido em Ponta Porã por receio de retroceder de regime prisional ou ser preso, que os documentos falsos comprados nada tinham a ver com a Justiça Eleitoral e foram confeccionados por terceiro que não sabe identificar, que só esteve em Ponta Porã no ano de 2015 e não no ano do requerimento do título eleitoral. Aduz, ainda, que o caso em questão é correlacionado à investigação informal realizada por pelo menos um ano pela autoridade da Polícia Civil, inclusive com a presença de campanas e acompanhamento do acusado, sem qualquer comunicação ao Juízo, ou ainda, requerimentos para tais diligências, restando ilegal e nulo todo e qualquer ato oriundo de tal procedimento. Arguiu, subsidiariamente, a necessidade de aplicação do princípio da consunção entre o crime-fim (artigo 289, CE) e o crime-meio (artigo 348, CE). Ao final requereu a aplicação do princípio in dubio pro reo e consequente absolvição, alternativamente, em caso de condenação, pugnou pela aplicação da pena no mínimo legal, fixação de regime inicial aberto e substituição da pena corporal por restritivas de direitos (ID 122188864).
É o relatório.
Decido.
2. Fundamentação
Presentes as condições necessárias ao exercício do direito de ação, bem como os pressupostos processuais, bem como inexistentes preliminares a serem analisadas, passo ao exame do mérito de maneira pormenorizada, haja vista que o réu acusado como incurso nas condutas tipificadas nos artigos 289 e 348 do Código Eleitoral.
Artigo 289 do Código Eleitoral
A materialidade delitiva do delito descrito no artigo 289 do Código Eleitoral resta cabalmente demonstrada pelos elementos contidos nos autos, especialmente pelos documentos (i) Requerimento de Alistamento Eleitoral – RAE (ID 116154140 p. 9), (ii) extrato do painel de inconformidades biométricas Grupo 1DBIO052MS2100000300 (ID 116154140 p. 16/17), RG falso em nome de Diego Rodrigues da Silva (ID 116154140 p. 10/11e 35), (iv) Informação de Polícia Judiciária n. 2281411/2023-NO/DPF/PPA/MS (ID 120633552 p. 10-19) e (v) Ofício nº 346/2023/IIGP/CGP/SEJUSP/MS (ID 121887616 p. 53/54).
Dispõe o Código Eleitoral:
Art. 289. Inscrever-se fraudulentamente eleitor:
Pena - Reclusão até cinco anos e pagamento de cinco a 15 dias-multa.
Este dispositivo trata de crime de perigo que se aperfeiçoa mediante a exposição a risco do cadastro eleitoral, bem jurídico que efetivamente resta atingido pela inscrição fraudulenta, independente do deferimento do pedido de alistamento ou do uso do documento pelo eleitor. A conduta típica se realiza no momento em que o agente requer o alistamento eleitoral com violação das leis que o regulam, ou seja, mediante fraude.
Por se tratar de crime formal, a consumação de inscrição fraudulenta ocorre com a inserção de dados falsos em seu requerimento de alistamento eleitoral, independentemente de qualquer resultado posterior.
Segundo o escólio de Marcílio Nunes Medeiros:
O ato de inscrição, para efeito de tipicidade, engloba tanto a inscrição em sentido estrito, entendido como o ingresso do alistando no cadastro eleitoral (art. 42 do CE), como a transferência, na qual o eleitor já inscrito intenta a mudança do domicílio eleitoral (art. 55 do CE).
(...)
A fraude constitui elemento normativo do tipo penal. Ausente a fraude, não se perfaz o tipo penal. A fraude pode consistir na falsidade de documento ou de declaração, na indução ao erro ou ardil.
No que diz respeito ao momento de consumação do delito, destaco iterativa jurisprudência do TSE, segundo a qual “Por se tratar de crime comissivo, o delito descrito no art. 289 do Código Eleitoral se consuma com o comparecimento do eleitor à Justiça Eleitoral para requerer o respectivo alistamento”. (Recurso em Habeas Corpus nº 060057294, Acórdão, Relator(a) Min. Tarcísio Vieira De Carvalho Neto, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 239, Data 04/12/2018).
Relativamente ao dolo, segue o entendimento dominante na Corte Superior Eleitoral, “(...) 4. A leitura do art. 289 do Código Eleitoral evidencia que o crime de inscrição fraudulenta de eleitor não demanda nenhuma finalidade eleitoral específica para sua configuração, de modo que, para subsunção da conduta ao tipo penal, basta a vontade consciente do agente para realizar, mediante expediente ardil, transferência ou inscrição eleitoral (dolo genérico), tal como reconhecido no acórdão recorrido” (Agravo de Instrumento nº 3158, Acórdão, Relator(a) Min. Tarcísio Vieira De Carvalho Neto, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 192, Data 03/10/2019, Página 32/33).
Com efeito, a atitude do réu subsome-se, com exatidão, ao tipo penal lapidado no artigo 289 do Código Eleitoral, porquanto: i) realizou o pedido de alistamento eleitoral utilizando-se de documento falso para tal desiderato; e ii) teve o Requerimento de Alistamento Eleitoral (RAE) deferido pelo Juízo Eleitoral.
Foram ouvidas as testemunhas em juízo, bem como interrogado o réu, conforme transcrições a seguir:
Rafael Eduardo Simoni Leite (testemunha de acusação, Policial Federal – ID 122169114): “Eu recebi o despacho porque veio da Justiça Eleitoral que seriam duas identidades, de Diego Denck e Diego Rodrigues, e o objetivo seria identificar quais das duas identidades seriam verdadeiras, eu concluí que a verdadeira era a de Diego Denck e a falsa de Diego Rodrigues porque o CPF do Diego Rodrigues ele foi emitido quando a pessoa já teria mais de 30 anos de idade, da mesma forma o certificado de alistamento militar, a data do alistamento seria quando essa pessoa teria mais de 30 anos de idade, o que não faz sentido porque no Brasil o alistamento é com 18 anos; não era visível a olho nu a falsificação, era só a questão das datas que chamou a atenção; não conhecia o réu de outras ocorrências policiais; os documentos analisados não foi possível verificar quando foram emitidos e não recordo da data de expedição dos documentos; não sei dizer se foi feito comparativo das digitais constantes dos documentos.”
Lucy Pathi Pitthan dos Santos Silva (testemunha de acusação – ID 122169115): “Trabalho no Cartório de Registro Civil de Laguna Carapã tem um bom tempo, foi antes da pandemia, antes de 2019, não tenho conhecimento de certidões de nascimento falsificadas, eu pessoalmente nunca respondi ofícios judiciais sobre falsificação de certidões; nunca ouvi falar do réu, única vez que vi esse nome foi na intimação que nós recebemos aqui onde está citando o nome dele; não tenho conhecimento sobre a inscrição eleitoral fraudulenta.”
Patrícia Stumpf da Silva (testemunha de defesa, ouvida como informante – ID 122169116): “Ouvida como informante, companheira do réu há 11 anos; eu recordo da época que Diego fez documentos porque ele estava respondendo a um processo e ele tava respondendo uma ação, ele teve um problema de saúde e tava respondendo ao processo dele em domiciliar e ele precisou passar por algumas cirurgias, ficou mais de ano em processo dessas duas cirurgias que foram feitas, no final da fase de recuperação havia um risco de ele ter que regredir o regime, voltara pra onde ele tava pra seguir cumprindo o tempo que faltava, aí foi nesse período, mais ou menos no início de 2018 que ele fez esse documento com o intuito de usar se fosse necessário pra não retornar fazendo uso desse documento; eu não sei como ele conseguiu esse contato, eu lembro que ele fez esse documento e depois recebeu em casa pelo correio, em Porto Alegre, sempre no mesmo endereço; o Diego comprou os documentos falsos, mandou fazer, pagou por esses documentos; não sei dizer como foram feitos esses documentos porque não fui envolvida, não fiz parte disso; não sei dizer de que comarca é a condenação dele, convivo com Diego há 11 anos, não sei sobre ele ter ido ao Cartório se inscrever como eleitor; não sei dizer quanto ele pagou pelos documentos falsos, faz muitos anos, não sei dizer.”
Interrogado o réu Diego Denck em juízo afirmou (ID´s 122169117/ 122169118/ 122169119/ 122169120/ 122169121): “A primeira parte dos documentos que constou ali, se não me engano, uma certidão de nascimento, um RG, um CPF, é isso mesmo, eu efetuei a compra desses documentos, na verdade eu não recebi nem esse alistamento militar nem esse título de eleitor, eu comprei os documentos, infelizmente foi isso que eu fiz, eu tava respondendo na época um processo complicado, um processo da Polícia Federal, e aí saí, fiz algumas cirurgias, na época com medo de ter que voltar porque não queria voltar pra aquele lugar de jeito nenhum, eu acabei comprando, efetuando a compra desses documentos, que não verdade ali constava um RG, um CPF e uma certidão de nascimento, eu fui até Ponta Porã, eu peguei um avião, fui até Campo Grande, peguei um táxi no aeroporto até Ponta Porã, fiquei hospedado ali num hotel que tem pertinho do Shopping China e esse, não me recordo o nome do senhor que veio me atender, ele veio até o hotel, ele veio ao hotel com uma maquininha, colheu minhas digitais ali, colheu as digitais impressas que eu lembro, parecia aquelas folhas de papel de identidade mesmo, ele colheu meus dados e eu efetuei o pagamento e fui embora, questão de uns 20 ou 25 dias esses documentos chegaram pra mim no correio e foi a única fez que eu tive em Ponta Porã pra fazer isso aí; quando eu tive preso eu acabei conhecendo um detento que chamava Rodrigo e ele tinha sido preso por uso de documento falso e eu com medo acabei entrando em contato com ele e ele falou tu vai ter que ir lá em Ponta Porã, tem um cara que faz lá, na época me cobraram 5 mil reais, eu paguei 5 mil reais nesses documentos e foi infelizmente o que aconteceu, eu comprei mesmo esses documentos com medo de ficar foragido e ter que usar; posteriormente eu acabei nunca ficando foragido, nunca precisei usar, portar esses documentos, e até certo ponto que um dia eu olhei pra eles e fui lá picotei e joguei fora, nunca mais vi esses documentos, nunca usei, nunca portei, nunca utilizei; isso da inscrição fraudulenta eleitoral isso eu desconheço, meu advogado me passou a informação que essa inscrição de eleitor foi feita quase 2 anos depois, não teria porque, porque que eu teria interesse em ter um título de eleitor em nome de outra pessoa, qual seria minha vantagem, resumindo eu nunca voltei lá pra fazer título de eleitor, fiquei pensando que de repente com meus dados essa pessoa pode ter criado um título de eleitor pra utilizar pra alguma outra situação, mas eu desconheço esse caso do título de eleitor, eu errei, fu fui ali comprei uma certidão de nascimento, um RG e um CPF, o alistamento militar e o título de eleitor eu nunca recebi eles; não sei dizer sobre a biometria, eu não lembro o nome desse cara, ele era corretor em Ponta Porã, no dia que ele foi no hotel ele levou a maquininha e eu coloquei as digitais ali e no papel, como se fosse pra fazer a identidade, ele disse isso é pra fazer a identidade, eu não teria porque voltar pra fazer o título de eleitor porque até então nunca fiquei foragido, sendo que nem com meu próprio título de eleitor eu acabo não votando e pagando a multa; forneci a fotografia pra pessoa, as impressões digitais, foi tudo feito dentro do hotel onde eu estava hospedado em Ponta Porã; recebi depois em casa os documentos pelo correio e nunca mais estive em Ponta Porã, tive aí só essa vez; se eu não me engano isso foi no início de 2018, entre 2017 e 2018, já tava terminando meus processos de cirurgia, fiz duas cirurgias complicadas, foi quando consegui renovar minha domiciliar um tempo, preocupado com a situação de repente ficar foragido eu queria só ter um RG pra poder circular, mas não com intenção de ter um benefício com isso, ser outra pessoa, abrir conta em banco, nada; não estive em Ponta Porã em 2019; depois que fiz os documentos falsos não voltei mais pra Ponta Porã; fiz RG, tinha CPF também, nesse nome deve constar um CPF porque eu lembro que eu recebi um cartão de CPF, uma identidade e uma certidão de nascimento, foi o que eu recebi, o alistamento militar não recebi e não lembro de ter feito, foi questão de 10 minutos meu contato com a pessoa; nunca estive no Cartório Eleitoral de Ponta Porã; o nome Diego Rodrigues da Silva na época foi uma sugestão da pessoa, ele perguntou tu quer criar outro nome ou pode ser o mesmo nome, eu só falei na época que poderia ser o mesmo nome, mas eu não escolhi número, nada; tenho condenação por tráfico de drogas a 18 anos, não estou foragido, estou trabalhando, sou gerente de pizzaria hoje, trabalho, das 18:30 até meia-noite todo dia, com carteira assinada, outro ritmo de vida; minha condenação saiu em 2019, 2020 por aí, 2021, não lembro, a condenação não transitou em julgado ainda; já fui preso uma outra vez em Santa Catarina por porte de arma, mas não era minha eu tava junto; hoje ganho R$ 2.900,00, tenho esposa, tenho uma filha de 12 que mora com a mãe dela, mas sou responsável por pagar colégio, essas coisas; não sou usuário de drogas; não estou respondendo a outro processo criminal, tenho esse que fui condenado e esse agora que estamos conversando; eu queria resolver isso da maneira mais branda possível, estou em outro ritmo de vida, trabalhando, não queria nenhum tipo de complicação mais na minha vida, isso foram fatos que ocorreram num passado distante já, eu me arrependo, pudesse voltar atrás nunca teria me envolvido, foi um pesadelo que tava passando e agora com esse lance a gente já pensa tudo de novo, agora de repente vem uma coisa que na verdade, praticamente joguei fora porque nunca precisei utilizar o documento porque nunca fiquei foragido, joguei fora; só estive em Ponta Porã essa vez pra fornecer as digitais e foi tirado foto; as assinaturas que constam nos documentos de Diego Silva fui eu que fiz; sobre o certificado de alistamento militar esse eu me recordo de nunca ter produzido, na verdade foi um pacote de compras, eu comprei um RG, um CPF e uma certidão de nascimento, mas o alistamento militar e o título de eleitor eu desconheço até porque eu não teria nenhuma intenção em ter, nunca compareci no Cartório Eleitoral de Ponta Porã, isso foi tudo feito no hotel; a pessoa pelo que eu soube era um cara que trabalhava com isso, vendia documentos falsos, foi me passado pra ir ao encontro dessa pessoa, eu efetuei o pagamento em dinheiro pra ele e ele colheu minha assinatura, minha foto, minhas digitais e mandou os documentos pra minha casa nesse endereço aqui, depois não tive mais contato com essa pessoa, só essa vez.”
Em sede de interrogatório policial, o réu Diego Denck negou a que tenha requerido o título de eleitor perante a 52ª Zona Eleitoral de Ponta Porã/MS e afirmou tanto em sede policial como em juízo, que quando saiu do sistema prisional tinha receio de que seria condenado e por não querer voltar ao cárcere ou ostentar a condição de foragido, soube através de outro preso que poderia “tirar documentos falsos” em Ponta Porã/MS, porém nunca utilizou os referidos documentos e não realizou a inscrição eleitoral em nome de Diego Rodrigues da Silva perante a Justiça Eleitoral, pois quando comprou os referidos documentos o título eleitoral já “fazia parte do kit”.
Entretanto, ao contrário do que afirmou o réu, o sistema da Justiça Eleitoral identificou a inconformidade biométrica que deu origem à presente ação penal, justamente porque houve a constatação de semelhança de 9 (nove) das 10 (dez) digitais coletadas presencialmente no Cartório da 52ª Zona Eleitoral de Ponta Porã/MS por ocasião do Requerimento de Alistamento Eleitoral pelo eleitor que se identificou como Diego Rodrigues Silva, em 27/11/2019 com as digitais do eleitor Diego Denck, cujo Alistamento Eleitoral foi requerido em 03/05/2018 perante a 158ª Zona Eleitoral de Porto Alegre/RS, afastando-se, pois os argumentos expendidos pela defesa.
Não merece prosperar, pois, a alegação de que o título de eleitor tenha não tenha sido requerido pelo réu por não ter feito parte do “pacote de documentos falsos” comprados por ele a fim de escamotear sua condição de foragido do sistema prisional, uma vez restou demonstrado que o réu Diego Denck efetivamente compareceu ao Cartório da 52ª Zona Eleitoral de Ponta Porã aos 27/11/2019 para preencher o Requerimento de Alistamento Eleitoral em nome de Diego Rodrigues Silva momento em que foram coletadas suas digitais para a identificação biométrica, que gerou a inconformidade biométrica entre dois títulos eleitorais, justamente pela similaridade de 9 (nove) das 10 (dez) digitais coletadas no momento do requerimento, bem como tirada sua fotografia e colhida sua assinatura in loco por servidor da Justiça Eleitoral no momento do alistamento (ID 116154140, p. 17/18).
Relevante salientar ainda que, muito embora a conduta, a princípio, também possa ser enquadrada no tipo do artigo 350 do Código Eleitoral - eis que inserida declaração falsa em documento público, para fins eleitorais – a melhor exegese alinha-se ao princípio da especialidade, na medida em que, sendo o documento público um RAE (Requerimento de Alistamento Eleitoral), há previsão legal de um crime específico para tal conduta (artigo 289 do Código Eleitoral), cuja pena é idêntica ao da infração supramencionada (reclusão de até cinco anos de reclusão e pagamento de 5 a 15 dias-multa).
Assim, não merece prosperar a tese da defesa de que não foi comprovada a finalidade eleitoral da conduta imputada ao réu, nem o uso do documento obtido perante a Justiça Eleitoral, uma vez que o tipo penal previsto no artigo 289 do Código Eleitoral não demanda finalidade eleitoral específica para sua configuração, tampouco resultado posterior, conforme explicitado alhures.
Nesse preciso sentido, transcrevo jurisprudência do E. Tribunal Superior Eleitoral e de outros Regionais, litteris:
“AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. CRIME ELEITORAL. ART. 289 DO CÓDIGO ELEITORAL. INSCRIÇÃO FRAUDULENTA DE ELEITOR. INADMISSÃO NA ORIGEM. FUNDAMENTOS NÃO INFIRMADOS. SÚMULA Nº 26/TSE. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. NÃO COMPROVAÇÃO. SÚMULA Nº 28/TSE. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 24/TSE. DOLO ESPECÍFICO. DESNECESSIDADE. CONTINUIDADE DELITIVA. DESÍGNIOS AUTÔNOMOS. INOCORRÊNCIA. REVOLVIMENTO DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. FUNDAMENTAÇÃO RECURSAL. DEFICIÊNCIA. SÚMULA Nº 27/TSE. DESPROVIMENTO. (...) 3. Na espécie, o TRE/GO assentou comprovadas a autoria e a materialidade do crime do art. 289 do Código Eleitoral pelo acervo probatório dos autos, em especial pelo interrogatório do acusado, que confessou ter falsificado dados de terceiros para obter títulos eleitorais e auferir crédito em instituição financeira. Alterar tal conclusão exigiria o reexame do conjunto fático-probatório carreado aos autos, providência vedada nesta instância pela Súmula nº 24/TSE. 4. A leitura do art. 289 do Código Eleitoral evidencia que o crime de inscrição fraudulenta de eleitor não demanda nenhuma finalidade eleitoral específica para sua configuração, de modo que, para subsunção da conduta ao tipo penal, basta a vontade consciente do agente para realizar, mediante expediente ardil, transferência ou inscrição eleitoral (dolo genérico), tal como reconhecido no acórdão recorrido.” (...) (Agravo de Instrumento nº 3158, Acórdão, Relator(a) Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 192, Data 03/10/2019, Página 32/33) G.N.
RECURSO PENAL ELEITORAL - CRIME ELEITORAL - COMPETÊNCIA. 1. A conduta de fazer inserir declarações falsas em Requerimento de Alistamento Eleitoral - RAE amolda-se ao tipo do art. 289 do CE (inscrição fraudulenta), e não ao de falsidade ideológica (art. 350 do CE). 2. Ainda que o Juízo de primeira instância entenda que houve o crime de falsidade material (art. 348 do CE) ou ideológica (art. 350 do CE), deve o feito ser julgado pela Justiça Eleitoral, pois o processo eleitoral se inicia com o alistamento dos eleitores, de modo que, em tese, estaria presente elemento subjetivo "para fins eleitorais" previsto nos mencionados tipos penais. 3. Deu-se provimento ao recurso ministerial para que o feito seja processado e julgado na Justiça Eleitoral.” (TRE-DF - RECURSO CRIMINAL (1ª INSTÂNCIA) n 348361, ACÓRDÃO n 4654 de 16/05/2012, Relator(a) JOSAPHÁ FRANCISCO DOS SANTOS, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-DF, Tomo 093, Data 18/05/2012, Página 03) G.N.
Portanto, a conduta levada a efeito pelo réu se amolda ao tipo previsto no artigo 289 do Código Eleitoral e restou comprovada nos autos.
Por fim, quanto ao argumento aventado pela defesa de que houve uma investigação prévia informal por pelo menos 1 (um) ano pela Polícia Civil sem qualquer comunicação ao Juízo, não merece prosperar uma vez que não há qualquer prova neste sentido colacionada aos autos e que possa ensejar a nulidade aventada.
Da Falsificação de Documento Público para Fins Eleitorais – artigo 348 do Código Eleitoral
Dispõe o Código Eleitoral:
Art. 348. Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro, para fins eleitorais:
Pena – reclusão de dois a seis anos e pagamento de 15 a 30 dias-multa.
O Ministério Público Eleitoral amoldou à conduta delituosa do acusado o tipo penal previsto no artigo 348 do Código Eleitoral.
A materialidade delitiva do delito descrito no artigo 348 do Código Eleitoral resta cabalmente demonstrada pelos elementos contidos nos autos, especialmente pelos documentos (i) Requerimento de Alistamento Eleitoral – RAE (ID 116154140 p. 9), (ii) extrato do painel de inconformidades biométricas Grupo 1DBIO052MS2100000300 (ID 116154140 p. 16/17), RG falso em nome de Diego Rodrigues da Silva (ID 116154140 p. 10/11e 35), (iv) Informação de Polícia Judiciária n. 2281411/2023-NO/DPF/PPA/MS (ID 120633552 p. 10-19) e (v) Ofício nº 346/2023/IIGP/CGP/SEJUSP/MS (ID 121887616 p. 53/54).
O perito papiloscopista constatou em consulta aos prontuários de Identificação Civil no Estado de Mato Grosso do Sul que o RG n.º 2.659.766 SEJUSP/MS possui Prontuário Civil em nome de Diego Rodrigues da Silva, filho de Fátima Alves da Silva e Marcelo Gomes da Silva, nascido aos 20/04/1984 em Laguna Carapã/MS e o RG n.º 2.362.126 SEJUSP/MS, cujo número foi utilizado para realizar o Requerimento de Alistamento Eleitoral, pertence a terceira pessoa, um menor de idade nascido aos 09/12/2005 (ID 116154140 p. 35).
Quanto ao Certificado de Alistamento Militar n. 300656482674 com data de emissão 02/05/2018 não há informações acerca de sua falsidade nos autos, havendo apenas indicação de indícios da falsidade relatados na Informação de Polícia Judiciária n. 2281411/2023 NO/DPF/PPA/MS (ID 121887616 p. 65/73), uma vez que a Polícia Federal informou a impossibilidade de realização da perícia documental sem acesso ao original do documento (ID 121887616 p. 91/92).
Assim, restou comprovada a falsidade do RG n. 2.362.126 SEJUSP/MS apresentado pelo réu à Justiça Eleitoral por ocasião de seu Requerimento de Alistamento Eleitoral em nome de Diego Rodrigues da Silva, conforme informação do Instituto de Identificação do Estado de Mato Grosso do Sul (Ofício nº 346/2023/IIGP/CGP/SEJUSP/MS – ID 121887616 p. 53/54).
Em relação ao crime de falsificação de documento público para fins eleitorais imputado ao réu na exordial acusatória, ainda que o falso tivesse sido comprovadamente praticado pelo réu, configurada estaria a hipótese denominada pela doutrina como ante factum impunível, que ocorre quando o fato precedente que não constitui meio necessário para a realização de outro delito, ou seja, que não constitui crime de passagem obrigatória, se coloca na linha de desdobramento da ofensa (principal) ao bem jurídico tutelado, aplicando-se, nestes casos, o princípio da consunção.
Ao diferenciar os crimes dos artigos 289 e 350 do Código Eleitoral, José Jairo Gomes (Crimes e Processo Penal Eleitorais, 2015, p. 39-40) ensina:
É verdade que o falso pode ser praticado para diversas finalidades, e não apenas para a inscrição eleitoral ilícita. É igualmente exato que o autor do falso pode não coincidir com o autor do delito do art. 289 do CE. No entanto, insta ponderar que, quando o autor do falso for também o sujeito ativo da inscrição fraudulenta, sendo aquele delito cometido justamente para viabilizar este último, é defensável a ocorrência de consunção – nomeadamente sob a forma de ante factum impunível. O falso aí constitui meio ou instrumento necessário para se obter a inscrição. Nesse específico caso, analisados os fatos globalmente, em sua totalidade, sob a ótica da ideia de justiça, não há como negar a existência de crime único, a saber: o de inscrição fraudulenta de eleitor.
É que o falso documental se operou com o exclusivo fim de burlar a Administração Eleitoral. Dúvida não há de que os tipos em questão visam proteger bens jurídicos distintos, a saber: de um lado, a higidez do alistamento eleitoral, de outro, a fé pública eleitoral. No entanto, a caracterização do ante ou post factum impunível não exige que as condutas subsumam tipos penais que tutelem bens jurídicos análogos. Na verdade, o propósito do referido instituto reside em afastar da conduta auxiliar a incidência de um tipo, seja qual for o bem jurídico por ele tutelado.
Ainda segundo a doutrina, deve ser aplicado o princípio da consunção: "a) quando um crime é meio necessário ou normal fase de preparação ou de execução de outro crime; b) nos casos de antefato e pós-fato impuníveis" (Rogério Greco. Curso de Direito Penal, 2016, p. 78).
Com fundamento neste princípio, entende o E. Superior Tribunal de Justiça que “quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido” (Súmula nº 17). Na mesma linha, a jurisprudência das Cortes Eleitorais tem concluído que crime de o uso de documento falso é absorvido pelo crime de inscrição fraudulenta sempre que praticado enquanto etapa para o cometimento deste último. Neste sentido:
RECURSO CRIMINAL - AÇÃO PENAL - INSCRIÇÃO ELEITORAL FRAUDULENTA - ARTIGO 289 DO CÓDIGO ELEITORAL - ELEIÇÕES 2014 - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA - PRELIMINAR EX OFFICIO - VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONGRUÊNCIA E INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ELEITORAL - REJEITADA - DELITO TIPIFICADO NO ART. 289 DO CÓDIGO ELEITORAL - CRIME FORMAL - DOLO GENÉRICO - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - CONDENAÇÃO MANTIDA - CRIME TIPIFICADO NO ART. 304 DO CÓDIGO PENAL - USO DE DOCUMENTO FALSO - CRIME MEIO - SUCESSÃO DE CONDUTAS - APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO - SANÇÃO PENAL AFASTADA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Tendo havido durante todo o processo o efetivo debate entre as partes sobre a ocorrência ou não do crime previsto no Art. 289 do Código Penal, a sua descrição deficitária na denúncia não causa prejuízo. Preliminar de nulidade afastada. Decisão por maioria. 2. O crime de inscrição fraudulenta de eleitor é formal e contenta-se com o dolo genérico. 3. Havendo provas robustas de que o acusado se inscreveu eleitor de forma fraudulenta, a condenação deve ser mantida. 4. O crime de uso de documento falso, quando se der como mera etapa para o cometimento do crime fim, inscrição fraudulenta de eleitor, é por este absorvido, diante da aplicação do princípio da consunção. 5. Recurso parcialmente provido (TRE/MT - Recurso Criminal n 4545, ACÓRDÃO n 26144 de 18/05/2017, Relator ULISSES RABANEDA DOS SANTOS, Publicação: DEJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 25/05/2017, Página 3). (G.N.)
RECURSO CRIMINAL. TRANSFERÊNCIA FRAUDULENTA. FALSIDADE IDEOLÓGICA ELEITORAL. TIPIFICAÇÃO ART. 289 E 350 CÓDIGO ELEITORAL. COMPROVAÇÃO DO VÍNCULO SOCIAL. CONDIÇÕES PARA TRANSFERÊNCIA ATENDIDAS. ATIPICIDADE DA CONDUTA. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. RECURSO CRIMINAL PROVIDO. RECORRENTES ABSOLVIDOS. 1. O conceito de domicílio eleitoral é amplo, pois identifica-se não apenas com o local onde a pessoa resida, mas também onde possua vínculos sociais, afetivos ou patrimoniais. 2. Sendo a falsidade ideológica eleitoral (art. 350 do CE) o meio empregado para a consecução de um crime-fim, pelo princípio da consunção, o agente que se utiliza de declaração de endereço falsa para transferir-se fraudulentamente, responde, exclusivamente, pelo delito do art. 289 do CE. Precedentes. 3. Comprovado por intermédio de documentação idônea que a ré possuía, antes mesmo da formalização do requerimento, vínculo social com o município para o qual pleiteava a transferência de domicílio eleitoral, descabe a alegação de fraude na transferência, por atipicidade da conduta. 4. A declaração de endereço com conteúdo falso utilizada, unicamente, para subsidiar o pedido de transferência deixa de ter potencialidade lesiva quando a parte interessada comprova, por outros meios, que preenche as condições exigíveis para viabilizar sua mudança de domicílio eleitoral. Neste caso a falsificação ideológica eleitoral não tem força para afetar o processo eleitoral, sendo o crime impossível pela ineficácia absoluta do meio (art. 17 do CP). 5. RECURSO CRIMINAL PROVIDO. RECORRENTES ABSOLVIDOS. (TRE/GO - RECURSO CRIMINAL nº 2818, Acórdão de Relator(a) Kisleu Dias Maciel Filho, Publicação: DJ - Diário de justiça, Tomo 201, Data 22/09/2014, Páginas 3 e 4). (G.N.)
Valho-me ainda dos dizeres da Ministra Laurita Vaz, para quem a aplicação do princípio da consunção requer "a existência de ilícitos penais chamados de consuntos, que funcionam apenas como estágio de preparação ou de execução, ou como condutas, anteriores ou posteriores de outro delito mais grave, nos termos do brocardo lex consumens derogat legi consumptae (HC 236.846/MG, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 18/02/2014, DJe 05/03/2014)”.
A potencialidade lesiva do documento falsificado, portanto, esgotou-se na finalidade de praticar o crime de inscrição eleitoral fraudulenta, previsto no artigo 289 do Código Eleitoral.
Dessa forma, impõe-se a absolvição do réu Diego Denck pelo delito de falsificação de documento público para fins eleitorais, previsto no artigo 348 do Código Eleitoral porquanto absorvido pelo crime de inscrição eleitoral fraudulenta previsto no artigo 289 do Código Eleitoral, mediante a aplicação do princípio da consunção.
Passo à dosimetria da pena, com atenção à pena mínima prevista no artigo 284 do Código Eleitoral para crimes punidos com reclusão.
Dosimetria da Pena
Artigo 289 do Código Eleitoral
A pena prevista no artigo 289 do Código Eleitoral é de até 5 anos de reclusão, sem fixação do grau mínimo, e pagamento de 5 a 15 dias-multa.
Segundo o artigo 284 do Código Eleitoral, “sempre que este código não indicar o grau mínimo, entende-se que será ele de quinze dias para a pena de detenção e de um ano para a reclusão”.
Das circunstancias judiciais do art. 59 do CP
a) culpabilidade: a culpabilidade do réu deve ser entendida como o grau de reprovação social dos fatos e do seu autor e é revelada ou aquilatada pela somatória das demais circunstâncias judiciais relacionadas no referido dispositivo legal. Diante da fundamentação acima, não há nenhuma circunstância negativa a configurar maior culpabilidade na conduta da réu; b) antecedentes: as certidões juntadas ao feito não revelam antecedentes criminais em desfavor do réu; c) conduta social e personalidade: em relação à conduta social e personalidade do agente, sua valoração negativa depende da existência de elementos concretos e suficientes que demonstrem a maior periculosidade do réu em relação à sua índole, atitudes, história pessoal e familiar, etapas de seu ciclo vital e seu relacionamento social, entre outros. Contudo, não há nos autos elementos aptos para valorar as respectivas moduladoras; d) motivos do crime: os motivos do crime, ou seja, o alistamento eleitoral fraudulento com o intuito de obter documento com os mesmos dados dos demais documentos falsos adquiridos pelo réu, não destoam da previsão inerente ao próprio tipo; e) circunstâncias: as circunstâncias são normais à espécie, visto que não intensificaram o grau de reprovação social incidente sobre a conduta da ré; f) consequências: as consequências do crime não desbordam das normais à espécie; g) comportamento da vítima: nada a ponderar a respeito.
Considerando a inexistência de circunstância judicial desfavorável, fixo a pena-base no mínimo legal, estabelecendo-a em 1 (um) ano de reclusão e em 5 (cinco) dias-multa.
Circunstâncias agravantes e atenuantes
Ausentes atenuantes.
Presente a agravante genérica elencada no artigo 61, II, “b”, do Código Penal, uma vez que o réu se inscreveu fraudulentamente como eleitor neste Juízo Eleitoral, com utilização de documento falso, a fim de assegurar a impunidade em relação aos crimes anteriormente cometidos, previstos na Lei n. 11.343/2006 e apurados nos autos n. 0011874-73.2015.8.21.0073 nos quais teve a prisão domiciliar concedida em 22/10/2019, conforme informações extraídas do sistema SEEU nos autos n. 8000033-66.2020.8.21.0073 (https://seeu.pje.jus.br/seeu/), motivo pelo qual elevo a pena e fixo-a nesta fase da dosimetria em 1 (um) ano, 2 (dois) meses e 12 (doze) dias de reclusão e 6 (seis) dias-multa.
Causas de aumento e diminuição
Não existem causas de aumento ou diminuição.
Dessa forma, fixo definitivamente a pena em 1 (um) ano, 2 (dois) meses e 12 (doze) dias de reclusão e 6 (seis) dias-multa, à razão unitária de 1/30 do salário-mínimo vigente à data dos fatos para cada dia-multa, nos termos do artigo 287 do Código Eleitoral.
A pena de multa deverá ser atualizada monetariamente até a data do efetivo pagamento (art. 49, § 2º, CP).
Regime de Cumprimento de Pena
O regime inicial para o cumprimento da pena privativa de liberdade será o aberto (art. 33, § 2º, "c", do Código Penal), considerando não ser o réu reincidente e o montante da pena aplicada.
Detração
Como não houve prisão provisória no curso do processo, não há que se falar em detração ou progressão.
Substituição por Pena Restritiva de Direitos
Presentes os requisitos expressos no artigo 44, I a III, do Código Penal, o réu tem direito ao benefício da substituição da pena privativa de liberdade.
Assim, nos termos do art. 44, § 2º, segunda parte do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos em relação ao delito previsto no artigo 289 do Código Eleitoral, quais sejam, prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas (art. 46 do CP) e prestação pecuniária a serem cumpridas nos seguintes termos:
a) prestação de serviços à comunidade: deverá o condenado prestar serviços à comunidade ou entidades públicas, desempenhando tarefas gratuitas (art. 46, § 1º, do CP); a prestação de serviço à comunidade dar-se-á em entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos e outros estabelecimentos congêneres, em programas comunitários ou estatais (art. 46, § 2º, do CP); as tarefas serão atribuídas conforme as aptidões do condenado, devendo ser cumpridas à razão de 1 hora de tarefa por dia de condenação, fixadas de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho (art. 46, § 3º, do CP); o trabalho terá a duração mínima de 8 horas semanais e será realizado aos sábados, domingos e feriados, ou em dias úteis, de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho, nos horários a serem estabelecidos pelo juiz da execução (art. 149, § 1º, da Lei n. 7.210/1984);
b) prestação pecuniária: imponho ao condenado a obrigação de pagar o equivalente a 2 (dois) salários mínimos em favor da conta única do Juízo da 52ª Zona Eleitoral (Caixa Econômica Federal, agência 3214, operação 005, conta corrente 86401084-5). O valor do salário mínimo será aquele vigente à data do pagamento. Faculta-se o parcelamento da quantia total, segundo deliberação do juízo da execução.
Advirto ao réu de que o descumprimento injustificado de quaisquer das penas restritivas de direitos ora impostas ensejará a conversão dessas em pena privativa de liberdade (art. 44, § 4º, do CP).
Sendo cabível a substituição da pena privativa de liberdade, não há falar na sua suspensão condicional, nos termos do art. 77, inciso III, do CP, razão pela qual deixo de apreciar a possibilidade da concessão do "sursis".
Direito de Apelar em Liberdade
Considerando que o réu respondeu ao processo em liberdade, bem como porque não há motivos para a decretação de sua prisão preventiva, concedo a ela o direito de apelar em liberdade.
Bens Apreendidos
Registro que não há bens ou valores a serem destinados.
Reparação do Dano
Deixo de condenar o acusado à reparação prevista no inciso IV, do art. 387 do Código de Processo Penal, porque não aferido dano concreto.
3. Dispositivo
Ante o exposto, nos termos da fundamentação, julgo parcialmente procedente a pretensão punitiva estatal deduzida na denúncia pelo Ministério Público Eleitoral para:
a) condenar o réu Diego Denck pela prática do delito previsto no artigo 289 do Código Eleitoral, à pena de 1 (um) ano, 2 (dois) meses e 12 (doze) dias de reclusão, a ser cumprida em regime inicial aberto e 6 (seis) dias-multa, à razão de 1/30 do salário mínimo vigente à data dos fatos.
A pena privativa de liberdade imposta fica substituída por restritivas de direitos nos termos da fundamentação
b) absolver o réu Diego Denck da acusação da prática do crime previsto no artigo 348 do Código Eleitoral, com fundamento no art. 386, inciso VI, do Código de Processo Penal.
Sem custas, nos termos do artigo 4º da Resolução TSE n. 23.478/2016.
Expeçam-se as comunicações necessárias.
Com o trânsito em julgado: (i) comunique-se o Tribunal Regional Eleitoral competente (art. 15, III, CF) para fins de lançamento do ASE 337 (Suspensão de Direitos Políticos) motivo 8 (Condenação Criminal Eleitoral) no cadastro do eleitor e aos Instituto Nacional de Identificação (nid.drex.srms@pf.gov.br) e Instituto de Identificação do Estado do Rio Grande do Sul (spi@pc.rs.gov.br) para as anotações devidas; (ii) procedam-se às demais diligências e comunicações determinadas no Manual de Práticas Cartorárias da Corregedoria-Regional Eleitoral.
Oportunamente, expeça-se a Guia de Recolhimento Definitiva no sistema BNMP (Banco Nacional de Monitoramento de Prisões) com posterior remessa, acompanhada da documentação pertinente, ao 2º Juizado da 2ª Vara de Execuções Criminais de Porto Alegre – PPL (frpoacent2vec@tjrs.jus.br) para intimação do réu para cumprimento da pena de prestação de prestação pecuniária, considerando que já existe guia de execução distribuída em relação ao condenado Diego Denck (autos n. 8000033-66.2020.8.21.0073 – ID 121083718).
Encaminhe-se cópia da certidão ID 122191701 e documentos ID´s 122188863/ 122188864 ao Tribunal de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil do Rio Grande do Sul - Seccional da Grande Porto Alegre/RS (ted@oabrs.org.br) para complementação da documentação encaminhada anteriormente para fins de eventual análise por parte do órgão disciplinar.
P. R. I. C.
Ponta Porã/MS, na data da assinatura eletrônica.
SABRINA ROCHA MARGARIDO JOÃO
Juíza Eleitoral – 52ª ZE Ponta Porã/MS
(datado e assinado eletronicamente)