JUSTIÇA ELEITORAL
330ª ZONA ELEITORAL DE PATOS DE MINAS MG
AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (11527) Nº 0600642-92.2024.6.13.0330 / 330ª ZONA ELEITORAL DE PATOS DE MINAS MG
REPRESENTANTE: DIRETORIO PARTIDO DEMOCRATICO TRABALHISTA PDT
Advogado do(a) REPRESENTANTE: DOUGLAS COUTINHO DE FREITAS - MG99928-A
INVESTIGADA: LUCIENE AMARO DE OLIVEIRA E OUTROS
Advogado das INVESTIGADAS e INVESTIGADOS: EMERSON RAFAEL CUNHA GONTIJO - MG157394
Trata-se de Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) proposta pelo PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA – PDT, de Patos de Minas-MG, representado neste ato pelo se presidente DANIEL AMORIM GOMES, em face de LUCIENE AMARO DE OLIVEIRA, LUCI FERREIRA DE OLIVEIRA LEAL, MARIA HELENA DE QUEIROZ, MARILENE PEREIRA SILVA, RAFAELA PEREIRA DA FONSECA, STEFANE APARECIDA PEREIRA BRAGA, ALESSANDRO DOS REIS, AMARILDO FERREIRA SILVA, DEUSDETH DA SILVA PEREIRA, GIOVANNI QUINTINO MAGALHÃES, JÚLIO CÉSAR GONÇALVES, LÁSARO BORGES DE OLIVEIRA, MARCELO CAIXETA BRAGA, MARINHO DOS SANTOS ROCHA, OMAR GONÇALVES DO AMARAL, ORLANDO ALVES PEREIRA, VALDIR REIS DE JESUS e WALTER GERALDO DE ARAÚJO, candidatas e candidatos pelo partido político REPUBLICANOS, nas Eleições Municipais 2024, ao cargo de Vereador do Município de Patos de Minas/MG.
Em apertada síntese, o autor afirma que o Partido REPUBLICANOS, que requereu as candidaturas das investigadas e investigados nas Eleições 2024, utilizou-se de candidatura fictícia, uma vez que teria apresentado a candidata LUCIENE AMARO DE OLIVEIRA que, desde o princípio, teria a finalidade apenas de preencher a cota de gênero e, com isso, possibilitar a participação do partido e dos demais candidatos no pleito 2024.
Também afirma que, conforme resultado apurado nas eleições, a mencionada candidata teria obtido 05(cinco) votos, sendo que quando, em 2023, candidata ao Conselho Tutelar de Patos de Minas teria obtido 144 (cento e quarenta e quatro) votos; que ela não realizou atos de campanha para si própria, mas para o a campanha do candidato Marinho dos Santos Rocha, presidente do Republicanos; que na prestação de contas da candidata registra ausência de movimentação financeira; que a candidata não teria recebido nenhum voto na sua própria seção eleitoral (seção 192), ou seja, não teria sequer votado em si mesma.
Conclui o investigante que a candidatura de LUCIENE AMARO DE OLIVEIRA foi levada a registro pelo partido REPUBLICANOS apenas para cumprir formalmente a cota de gênero exigida pela legislação eleitoral.
Requer, ao final, invalidação de todas as candidaturas elencadas no Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários – DRAP, do Republicanos, e consequente Inelegibilidade pelo prazo legal de todos os envolvidos, a nulidade dos votos recebidos por seus candidatos, bem como a cassação de seus diplomas.
O investigante protesta por provar o alegado por todos os meios e formas em direito admitidos, em especial, a juntada dos documentos inclusos e o depoimento pessoal das investigadas e dos investigados.
A defesa, comum a todos os investigados, alega, em síntese, que a investigada sempre soube de sua candidatura, tendo colocado seu nome à disposição para convenção partidária; que a candidata Luciene Amaro de Oliveira é pessoa simples e com conduta social discreta, razão pela qual não utilizou das redes sociais para atos de campanha; que realizou postagens na fase de pré-campanha referindo-se ao senhor Marinho Rocha, como ato de gratidão pelo apoio que ele deu quando da candidatura ao conselho tutelar; que a votação inexpressiva da candidata reflete um fato comum nas eleições em Patos de Minas, onde diversos candidaturas têm número pequeno de votos; que na prestação de contas da candidata encontram-se registrados a mesma quantidade e os mesmos materiais que foram oferecidos pelo então candidato à prefeito a todos os candidatos ao cargo de vereador pelos oito partidos que compuseram a coligação majoritária. Afirma que a candidata Luciene esteve presente em convenção, anuiu com sua candidatura, forneceu documentos necessários para o registro da candidatura, recebeu materiais para campanha; e que ainda que o “Investigante possua a sanha de se fazer justiça, apurando possíveis irregularidades, não pode os demais componentes da Chapa serem prejudicados por atos particulares da Candidata em questão, posto que, não houve aqui, ciência alguma dos demais Candidatos da chapa pelos atos praticados pela Senhora Luciene Amaro em sua campanha que culminou com a votação citada.” Requereu ao final a improcedência dos pedidos.
A defesa não carreou documentos aos autos nem apresentou rol de testemunhas.
Em decisão judicial, após analisados e decididos os requerimentos das partes, foi declarada a desnecessidade da abertura da instrução, dispensando-se da realização de audiência, tendo em vista os fatos alegados na inicial serem passíveis de comprovação pelos documentos acostados aos autos (ID. 133267429).
O Ministério Público Eleitoral, em parecer final, opinou pela improcedência da presente ação (ID. 133295267).
É o relatório. Decido.
FUNDAMENTAÇÃO
Conforme decisão de ID. 133256362, a ação comporta análise no estado em que se encontra, sem necessidade de dilação probatória, com fundamento no art. 355, I, do CPC c/c art. 47-B, III da Res.-TSE nº 23.608/2019, pelo que, considerando o princípio da primazia do mérito, julgo antecipadamente a lide.
Presentes as condições para o regular exercício da ação e os pressupostos processuais, inexistentes questões preliminares a serem decididas, passo ao julgamento do mérito.
A Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) é um instrumento essencial no sistema eleitoral brasileiro, concebido para apurar e sancionar condutas que comprometam a lisura e a legitimidade do processo eleitoral.
O objetivo primordial da AIJE é coibir o abuso de poder econômico, o abuso do poder político e a utilização indevida dos meios de comunicação, garantindo a igualdade de oportunidades entre os candidatos e a normalidade do pleito. A sua aplicação é crucial para assegurar a integridade do sistema democrático e a confiança dos cidadãos nas instituições eleitorais.
Dispõe o artigo 22 da Lei Complementar nº 64/1990 que: “Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político [...]”
O Tribunal Superior Eleitoral, na Súmula nº 73/2024, reconhece a Ação de Investigação Judicial Eleitoral – AIJE como instrumento processual adequado para a apuração da fraude à cota de gênero. Eis o teor da mencionada Súmula:
Súmula-TSE n. 73
O TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL, no uso das atribuições que lhe confere o art. 23, inciso XV, do Código Eleitoral, resolve aprovar a proposta de edição do seguinte verbete de súmula:
A fraude à cota de gênero, consistente no desrespeito ao percentual mínimo de 30% (trinta por cento) de candidaturas femininas, nos termos do art. 10, § 3º, da Lei n. 9.504/97, configura-se com a presença de um ou alguns dos seguintes elementos, quando os fatos e as circunstâncias do caso concreto assim permitirem concluir: (1) votação zerada ou inexpressiva; (2) prestação de contas zerada, padronizada ou ausência de movimentação financeira relevante; e (3) ausência de atos efetivos de campanhas, divulgação ou promoção da candidatura de terceiros. O reconhecimento do ilícito acarretará: (a) a cassação do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (Drap) da legenda e dos diplomas dos candidatos a ele vinculados, independentemente de prova de participação, ciência ou anuência deles; (b) a inelegibilidade daqueles que praticaram ou anuíram com a conduta, nas hipóteses de Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE); (c) a nulidade dos votos obtidos pelo partido, com a recontagem dos quocientes eleitoral e partidário (art. 222 do Código Eleitoral), inclusive para fins de aplicação do art. 224 do Código Eleitoral.
A AIJE em análise tem como fulcro a alegação de fraude à cota de gênero, que se configura quando um partido político lança candidaturas fictícias com o único propósito de cumprir o percentual mínimo estabelecido pela legislação eleitoral (art. 10, §3º, da Lei nº 9.504/97). Tal prática, quando comprovada, demonstra um desrespeito à finalidade da norma, que busca promover a participação efetiva das mulheres na política, e não apenas o preenchimento formal de vagas.
In casu, a parte autora alega que a candidatura de LUCIENE AMARO DE OLIVEIRA seria fictícia, lançada apenas para cumprir a cota de gênero, sem qualquer interesse real na disputa eleitoral.
O investigante fundamenta suas alegações no fato de a candidata ter obtido apenas 05 (cinco) votos, apresentar prestação sem movimentação financeira, não ter realizado atos de campanha em prol da própria candidatura e sim para outro candidato, não ter a candidata sequer votado em si mesma.
Por outro lado, não prospera a alegação da defesa de que os problemas pessoais da candidata teriam prejudicado sua campanha, assim como a alegação de que a votação inexpressiva é fato histórico nas eleições no município de Patos de Minas. Nem o fato de ter a candidata recebido doação de materiais de campanha são suficientes para comprovar atos efetivos de campanha e, ainda que a senhora Luciene não tenha realizado campanha em favor do presidente do Partido Republicanos, senhor Marinho dos Santos Rocha, o fato de ela não ter votado nem em si própria, demonstra o total desinteresse pela sua candidatura, corroborando a afirmação de candidatura fictícia, realizada somente para atender a cota de gênero. Com efeito, consta dos autos que o partido REPUBLICANOS registrou 18 (máximo permitido considerando o número de cadeiras a serem ocupadas) candidaturas ao cargo de vereador nas eleições municipais em Patos de Minas, sendo 12 do gênero masculino e 06 do feminino, de modo que a ausência de uma candidatura feminina impediria o registro pelo não cumprimento da cota de gênero prevista na legislação de regência da matéria.
Destarte, verifico em relação à candidata LUCIENE AMARO DE OLIVEIRA que são fatos comprovados nos autos que ela obteve votação inexpressiva (05 votos), apresentou prestação de contas sem movimentação financeira, não realizou atos efetivos de campanha, inclusive sem usar as redes sociais; que, apesar de comparecer em sua seção eleitoral (seção 192), nenhum voto foi computado em seu favor, ou seja, não votou em si mesma (ID 133210880). Dessa forma o julgamento do mérito se resume a questões de direito.
Portanto, a procedência dos pedidos é medida que se impõe. Contudo, quanto a sanção de inelegibilidade, prevista no art. 22, inciso XIV, da LC nº 64/1990, entendo que está comprovada a prática da fraude pelos investigados MARINHO DOS SANTOS ROCHA e LUCIENE AMARO DE OLIVEIRA, na medida em que agiram em conjunto no ato do registro da candidatura. O Primeiro, como presidente do partido político e a segunda, como candidata fictícia. Porém não há prova nos autos de que os demais investigados hajam contribuído para a prática do ato.
Em face do exposto julgo PROCEDENTE o pedido em razão da ocorrência de fraude à cota de gênero, decorrente do descumprimento da norma do art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/1997 c/c art. 17, § 4º-A, da Resolução TSE nº 23.609/2019 e, em consequência, determino:
A desconstituição do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP) do Partido REPUBLICANOS do município de Patos de Minas, nas eleições de 2024;
A nulidade dos votos de legenda obtidos pelo Partido REPUBLICANOS do município de Patos de Minas e dos votos nominais recebidos por todos os seus candidatos e candidatas ao cargo de vereador, no pleito de 2024;
A cassação do diploma do candidato eleito pelo Partido REPUBLICANOS do município de Patos de Minas, investigado JÚLIO CÉSAR GONÇALVES, bem como de todos os suplentes do partido;
A inelegibilidade dos investigados MARINHO DOS SANTOS ROCHA e LUCIENE AMARO DE OLIVEIRA, pelo prazo de 8 (oito) anos subsequentes à eleição municipal de 2024, nos termos do art. 22, inciso XIV da Lei Complementar n° 64/90.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Ocorrendo o trânsito em julgado ou havendo decisão dos Tribunais em grau de recurso, conforme dispõe o art. 257, § 2º do Código Eleitoral, proceda o Cartório Eleitoral ao reprocessamento/retotalização dos votos dos candidatos e candidatas ao cargo de vereador nas eleições municipais de 2024 do município de Patos de Minas, oficiando-se a Câmara Municipal para ciência e providências pertinentes.
Cumpra-se.
Paulo Sérgio Vidal
Juiz da 330ª ZE/MG