JUSTIÇA ELEITORAL
315ª ZONA ELEITORAL DE JUIZ DE FORA MG
REPRESENTAÇÃO (11541) Nº 0600244-93.2024.6.13.0315 / 315ª ZONA ELEITORAL DE JUIZ DE FORA MG
REPRESENTANTE: ELEICAO 2024 MARIA MARGARIDA MARTINS SALOMAO PREFEITO
Advogado do(a) REPRESENTANTE: JONATAS MORETH MARIANO - DF29446
REPRESENTADO: ELEICAO 2024 CHARLLES THOMACELLI EVANGELISTA PREFEITO
Advogado do(a) REPRESENTADO: GUSTAVO HENRIQUE LEAL SANT ANA VIEIRA - MG96554
Vistos etc.
MARIA MARGARIDA MARTINS SALOMÃO, candidata a Prefeita de Juiz de Fora, e a COLIGAÇÃO VAI PRA FRENTE, JUIZ DE FORA, interpuseram REPRESENTAÇÃO ELEITORAL, com pedido de TUTELA DE URGÊNCIA, em face de CHARLLES THOMACELLI EVANGELISTA, candidato ao mesmo cargo, e a COLIGAÇÃO JUIZ DE FORA NO CORAÇÃO, alegando que o primeiro demandado veiculou, em 20.09.2024, áudio em rádio com o seguinte conteúdo: "O PT e Margarida defendem o aborto", "O PT e Margarida defendem a liberação das drogas" e "O PT e Margarida defendem a ideologia de gênero", induzindo os eleitores ao erro, uma vez que nenhuma das três pautas mencionadas – liberação das drogas, aborto e apoio à ideologia de gênero, fazem parte do seu Plano de Governo ou são defendidas em suas propagandas políticas, e não há documento oficial ou diretriz do Partido dos Trabalhadores que promova a ideologia de gênero, concluindo com o pedido de tutela de urgência para a retirada do áudio das rádios, que restou indeferida pelas razões contidas em ID 127580067, e no mérito pugnou pela concessão do direito de resposta.
O representado apresentou contestação (ID 127603128), arguindo preliminar de improcedência da inicial, com base no artigo 32, III, "b", da Resolução 23.608/2019, do Tribunal Superior Eleitoral, que assim dispõe: “Serão observadas as seguintes regras no caso de pedido de direito de resposta relativo à ofensa veiculada: III - no horário eleitoral gratuito: b) o pedido deverá especificar o trecho considerado ofensivo ou inverídico e ser instruído com a mídia da gravação do programa, acompanhada da respectiva transcrição do conteúdo”.
No mérito, negou ofensa à honra da autora e afirmou que as falas transcritas não se tratam de desinformação, pois "a posição política e ideológica da candidata Representante, e de seu Partido, é notória" e que "não se discute, na referida propaganda, o plano de governo da candidata Representante, mas sim quais os valores ela defende para a sociedade brasileira e, consequentemente, para os cidadãos de Juiz de Fora/MG", acrescentando que não há, no áudio, censura à posição da autora ou de seu partido. Por fim, apresentando capturas de tela da página do Facebook da representante, matérias jornalísticas do site do Partido dos Trabalhadores, e vídeo da sessão da Comissão de Educação da Câmara de Deputados, requereu a improcedência do pedido.
O Ministério Público Eleitoral, no r. parecer em ID 127638828, opinou, preliminarmente, pela declaração de prevenção deste Juízo da 315ª Zona Eleitoral em relação ao feito de nº 0600235-38.2024.6.13.0152, que trata de propaganda eleitoral de conteúdo similar, vinculada na televisão, em curso na 152ª Zona Eleitoral, e no mérito, pela improcedência da ação, por entender que a propaganda discutida não incorreu em nenhuma das situações do artigo 31 da Resolução 23.608/2019, tratando-se somente de discussão sobre a ideologia política das partes, normais no período eleitoral.
É o relatório.
Decido.
Inicialmente rejeito, com a devida venia, o pedido de indeferimento da inicial, considerando que o áudio discutido foi juntado em ID 127575516, com transcrição de seu conteúdo, cumprindo o citado artigo 32, III, "b", da Resolução 23.608/2019.
Quanto à conexão com o processo em curso na 152ª Zona Eleitoral, a arguição deve ser apresentada àquele Juízo, já que não vislumbro a possibilidade de avocá-lo para esta 315ª Zona Eleitoral.
Ultrapassada essas questões, passo à análise do mérito, e o faço para conceder o direito de resposta, pelos fatos e fundamentos que passo a expor.
A mesma Resolução 23.608/2019 prevê em seu artigo 31 que: “A partir da escolha de candidatas ou candidatos em convenção, é assegurado o exercício do direito de resposta à candidata, ao candidato, ao partido político, à federação de partidos ou à coligação atingidos, ainda que de forma indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social, inclusive provedores de aplicativos de internet e redes sociais (Lei nº 9.504/1997.
Afirmação caluniosa é atribuir crime a pessoa que sabe ser inocente. Já as afirmações difamatórias e injuriosas são, respectivamente, a imputação ofensiva contra a honorabilidade com a intenção de desacreditar a pessoa na sociedade em que vive, e provocar desprezo ou menosprezo público, enquanto a segunda – injúria, se caracteriza pela ofensa que venha atingir a pessoa, em desrespeito a seu decoro, a sua honra, a seus bens ou a sua vida.
Os artigos 6º-A e 58, caput, e a Lei nº 9.096/1995, artigo 11-A, caput e § 8º), com Redação dada pela Resolução nº 23.672/2021, em seu Parágrafo único, dispõe que: “Se o pedido versar sobre a utilização, na propaganda eleitoral, de conteúdo reputado sabidamente inverídico, inclusive veiculado originariamente por pessoa terceira, caberá à representada ou ao representado demonstrar que procedeu à verificação prévia de elementos que permitam concluir, com razoável segurança, pela fidedignidade da informação.
Pois bem.
Os áudios em análise são de propaganda eleitoral, feitos pelo Representado, no qual afirma, repita-se, que: 1 - "O PT e Margarida defendem o aborto"; 2 - , "O PT e Margarida defendem a liberação das drogas" e 3 - "O PT e Margarida defendem a ideologia de gênero".
Primeiramente ressalto que, embora a Representante não tenha informado em qual(ais) rádio(s) o(s) áudio(s) foi(ram) veiculado(s), não houve negativa, pelo Representado, da existência e veiculação em sua propaganda eleitoral, razão pela qual conclui-se que de fato foram propagados.
Em relação ao primeiro tema - aborto, o Representado apresentou captura de tela em que a Representante critica a política Fátima Pelaes por ser contra o aborto em casos de estupro, e matéria jornalística informando que a Representante foi contrária ao projeto que visava dificultar o aborto no referido caso, constando que "a Representante posicionou-se contra projeto de lei que dificultava ainda mais as regras abortivas, manifestando-se favorável a legalização completa do aborto" (g.n.). Todavia,
não é possível inferir o induvidoso apoio da Representante à legalização do aborto em casos diversos dos previstos em Lei.
Sobre a liberação das drogas, afirma:"A política de descriminalização das drogas, implementada vergonhosamente pelo Governo Federal, sob a liderança do Partido dos Trabalhadores, é pública e notória, sendo defendida até mesmo no sítio eletrônico da referida agremiação partidária, sendo o artigo acima uma simples exemplificação da questão", referindo-se ao artigo intitulado "A quem interessa criminalizar o usuário de drogas?", publicado no site do Partido dos Trabalhadores, mas sem apresentar elemento seguro que indique que a Representada apoie a legalização das drogas, já que o referido artigo trata da descriminalização do uso de drogas, situações aparentemente semelhantes, mas substancialmente diversas.
E apesar de revestido o tema de alguma polêmica, entende Juliana Theodoro, Mestra em Comunicação Social, sobre ideologia de gênero que "é uma expressão usada pelos críticos da ideia de que os gêneros são, na realidade, construções sociais. Para os defensores desta "ideologia" não existe apenas o gênero masculino e feminino, mas um espectro que pode ser muito mais amplo do que somente a identificação com o masculino ou o feminino. A chamada "ideologia de gênero" representaria o conceito que sustenta a identidade de gênero. Consiste na ideia de que os seres humanos nascem iguais, sendo a definição de masculino e feminino um produto histórico-cultural, desenvolvido pela sociedade. Isso significa que a percepção de uma pessoa sobre seu gênero não é uma escolha, é um entendimento sobre a sua identidade e sobre como ela se reconhece enquanto indivíduo, independentemente do seu sexo biológico”.
E afirma o Representado, que embora a ideologia de gênero não conste no Plano de Governo da Representante, a mesma "entabulou medidas atinentes a ideologia de gênero sempre que pode", citando o Plano de Promoção e Defesa dos Direitos da População LGBTQIA+, o Dia de Visibilidade Trans e a edição de decreto sobre o uso do nome social no Poder Executivo de Juiz de Fora. Neste tema estão ausentes todas as hipóteses previstas em Lei para se garantir o direito de resposta.
Importante ressaltar que nada obsta que tanto os candidatos, quanto os seus partidos, tenham posições distintas a respeito dos três temas, e que os exponham ou exponham os posicionamentos de seus concorrentes. Faz parte do debate democrático, ainda mais durante as campanhas eleitorais.
O que a Lei preserva é que não seja de forma caluniosa, difamatória, injuriosa ou de maneira sabidamente inverídica. E no presente caso, não se pode afirmar de maneira induvidosamente verídica, que a Representada aborda dois dos três temas, da forma como apresentada pelo Representado, como a defesa do aborto fora das hipóteses legais, e a legalização das drogas, o que vale dizer que, apesar de não vislumbrar conteúdo calunioso, injurioso ou difamatório, restou configurada a desinformação nas falas do Representado, que utilizou de informações sobre a Representante e de seu Partido de forma incompleta, o que poderá criar no eleitorado a percepção de que é desejo da Representante a legalização de drogas e do aborto fora das atuais previsões legais.
Pelo exposto, JULGO EM PARTE PROCEDENTE o pedido de direito de resposta, que ocorrerá em áudio de 1 (um) minuto, veiculado em rádio, no horário destinado à COLIGAÇÃO JUIZ DE FORA NO CORAÇÃO, nos termos do artigo 32, III, "d" e "e", da Resolução nº 23.608/2019, do TSE, para permitir que a Representante esclareça seu posicionamento, caso deseje, acerca das afirmativas do Representado sobre a legalização de drogas e o aborto fora das atuais previsões legais.
Intimem-se, nos termos do artigo 32, III, "f" e "g", da Resolução nº 23.608/2019, do TSE, devendo a resposta ser veiculada no(s) mesmo(s) horário(s) do áudio discutido, a ser demonstrado pela autora.
P.R.I.
Com o trânsito em julgado, dar baixa e arquivar.
Juiz de Fora, 25 de setembro de 2024.
PAULO TRISTÃO MACHADO JÚNIOR
Juiz Eleitoral