JUSTIÇA ELEITORAL
322ª ZONA ELEITORAL DE SETE LAGOAS MG
REPRESENTAÇÃO (11541) Nº 0600532-20.2024.6.13.0322 / 322ª ZONA ELEITORAL DE SETE LAGOAS MG
AUTOR: WANDERSON GERALDO DE SOUZA COSTA
Advogado do(a) AUTOR: ANA CAROLINA SILVEIRA PASSOS - MG213743
NOTICIADA: ELEICAO 2024 GILMAR DE SOUSA BATISTA JUNIOR PREFEITO
Advogado do(a) NOTICIADA: JOAO LUCAS CAVALCANTI LEMBI - MG146183
Vistos, etc.
Trata-se de representação eleitoral proposta por WANDERSON GERALDO DE SOUZA COSTA contra GILMAR DE SOUSA BATISTA JÚNIOR- candidato a prefeito de Sete Lagoas na qual alega que esse vem se utilizando de propaganda proibida por lei ao distribuir material que tem natureza de brinde. Aponta, também, que Jr. Sousa está diminuindo sistematicamente e ilegalmente o tamanho das letras e o nome da candidata a vice, em desacordo com a legislação. Afirma que referida propaganda eleitoral proporciona uma vantagem ao eleitor, uma vez que se constitui em um recurso lúdico pensado para facilitar o engajamento no processo terapêutico de crianças, adolescentes e adultos, analogicamente, como um brinquedo, por exemplo. Aduz que fica evidente essa intenção, uma vez que a propaganda está sendo distribuída intencionalmente na porta das escolas públicas municipais. Diz que mencionados locais são de grande movimento de pessoas, veículos e transeuntes, o que demonstra que a propaganda irregular utilizada pelo candidato alcança um enorme número de pessoas diariamente. Requer tutela de urgência para determinar a imediata proibição de confecção, utilização e distribuição de toda a propaganda eleitoral aqui impugnada, bem como seja intimada a empresa responsável pela confecção, devendo ela, ainda, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, sob pena de multa diária e do cometimento dos crimes de desobediência e de falsidade ideológica, informar a este r. Juízo eleitoral toda a quantidade de exemplares já confeccionados, independentemente de já ter sido emitida a correspondente nota fiscal, fazendo ainda juntar todas as notas fiscais por ventura já emitidas e de todos os comprovantes de pagamentos já efetuados. No mérito, pugna pela confirmação da tutela de urgência e aplicação de multa pela propaganda eleitoral irregular.
Foram juntadas várias fotos e vídeos referentes à distribuição e uso do álbum, cujo exemplar físico foi protocolado na Secretaria da Zona Eleitoral(ID127178074).
Antes de mesmo de determinada sua citação, o representado se adiantou e apresentou defesa aos autos (ID127200433), alegando que o representante não possui legitimidade, pois atua como pessoa física e não como candidato no polo ativo, sendo que sua procuração comprova isso. Aduz que o tamanho do nome da candidata a vice está de acordo com a norma e que a legislação permite variações no nome, podendo ser usado nome pelo qual se é mais conhecido, sendo que pelo País afora é normal o uso de apelidos ou formas abreviadas dos nomes, sendo estratégia publicitária que não compromete o direito do eleitor se manter informado. Quanto ao mérito, afirma que o material, objeto da lide, é mera propaganda e não dá vantagem ao eleitor, sendo o objetivo apenas didático para conhecimento da proposta do candidato a prefeito. Segundo a defesa, o livreto é ferramenta de divulgação de proposta, sem oferecer vantagem e não corrompe o processo eleitoral. Requer extinção do feito sem julgamento de mérito, bem como o indeferimento da liminar.
É o breve resumo dos fatos. Passo à decisão.
Quanto à legitimidade, o representante possui, segundo a lei, direito de demandar sobre a questão (art.3º da Resolução 23608/19/TSE), não exigindo a mesma relação de especificidade ou relação especial do demandante em relação ao objeto da lide.
Assim, não há falar em ilegitimidade ativa.
No mais, o Juízo é competente e se encontram pressupostos e condições da ação.
Passo, pois, a análise do pedido de tutela de urgência.
As tutelas de urgência, porque são medidas voltadas a eliminar ou minorar os males do tempo do processo, têm por fundamento uma situação de perigo. Quanto à tutela de urgência, dispõe o Novo Código de Processo Civil que:
Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
§1º Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.
§2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.
§3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.
A antecipação dos efeitos de tutela jurisdicional é espécie de tutela de urgência, necessária à efetividade do processo, de feição excepcional e natureza satisfativa, não apenas conservativa, como é a cautelar, embora provisória e resultante de sumária cognição, que, nos termos do art. 300 do NCPC, pressupõe elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, além da ausência de perigo de irreversibilidade do provimento antecipado. Nesse sentido, o NCPC positivou dois requisitos que podem dar fundamento à concessão da tutela de urgência, quais sejam, o perito de dano e o risco ao resultado útil do processo. Ambas as expressões, em verdade, representam igual fenômeno, qual seja os males que o tempo pode trazer para o processo ou para direito nele postulado.
Além das situações de urgência que representam verdadeiro fundamento do pleito urgente, o NCPC também estabelece como requisito positivo para a concessão da tutela de urgência a probabilidade do direito, ou seja, a análise em sede de possibilidade de que o autor possui o direito que alega e que está sujeito à situação de perigo. Para que a tutela de urgência seja concedida, ainda que não se exija certeza jurídica sobre o direito do autor, há que se ter ao menos aparência desse direito, e, por isso, o juiz faz a apreciação da existência da pretensão do autor em um juízo de cognição sumária, e não exauriente.
Quanto à propaganda eleitoral, dispõe a Lei das Eleições que:
Art.39. (omissis)
6o É vedada na campanha eleitoral a confecção, utilização, distribuição por comitê, candidato, ou com a sua autorização, de camisetas, chaveiros, bonés, canetas, brindes, cestas básicas ou quaisquer outros bens ou materiais que possam proporcionar vantagem ao eleitor.(Incluído pela Lei nº 11.300, de 2006)
Dispõe o art. 18, § 2º da Resolução nº 23.610/2019 do TSE o seguinte:
Art. 18. São vedadas na campanha eleitoral confecção, utilização, distribuição por comitê, candidata, candidato, ou com a sua autorização, de camisetas, chaveiros, bonés, canetas, brindes, cestas básicas ou quaisquer outros bens ou materiais que possam proporcionar vantagem a eleitora ou eleitor, respondendo a infratora ou o infrator, conforme o caso, pela prática de captação ilícita de sufrágio, emprego de processo de propaganda vedada e, se for o caso, pelo abuso de poder.
Atenta ao caderno probatório, ao observar o material que vem sendo entregue à população, inclusive em porta de escolas, entendo que o mesmo tem sim o condão de auferir vantagem – entretenimento claro – a crianças, principalmente. O livreto não está no mesmo patamar de um adesivo, de um “santinho”, de um panfleto ou informativo. A intenção didática poderia ser alcançada de inúmeras formas, inclusive por mídia social, da qual o Representado é entendido.
Claro que há uma propaganda mais sofisticada, de montagem, na qual o álbum de figurinhas proporciona diversão e, daí, caracteriza uma vantagem para quem recebe, ainda que não seja algo valioso ou alimentício.
A regra prevista no art.18 da Resolução 23.610/19 TSE não é exaustiva, por óbvio. Existem diversas formas de proporcionar um agrado maior ao eleitor, por isso mesmo a expressão “ou quaisquer outros bens ou materiais que possam proporcionar vantagem a eleitora ou eleitor, respondendo a infratora ou o infrator, conforme o caso”.
Vejo, ademais, que no livreto há informação que foram confeccionadas 10.000 (dez mil) exemplares.
Nesse caso, inclusive, numa cidade como Sete Lagoas, com aproximadamente 164 mil eleitores, distribuir um exemplar a cada 16 dessas pessoas, teoricamente, tem plena capacidade de desequilibrar o Pleito de 2024 em relação aos demais candidatos que não se valeram de propagandas desse tipo, por isso mesmo proscrito em lei.
Os vídeos colacionados revelam elementos suficientes e há prova indiciária de que há um oferecimento de vantagem e que se mostra relevante faticamente diante das circunstâncias, como acima fundamentado.
O entendimento do TSE e a legislação pertinente sustentam que a mera entrega de um brinde, sem contexto eleitoral, não configura propaganda antecipada ou irregular, sendo necessária a presença de um pedido de voto ou menção explícita ao pleito. A contrário sensu, ocorrem in casu visivelmente todos elementos que denotam expressivamente um abuso no direito de publicidade que viola a lei ao conceder vantagem ao eleitorado setelagoano, ainda mais na escala a que referi acima (1 unidade para cada 16 eleitores, aproximadamente).
Nesse sentido, a jurisprudência:
EMENTA – ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. PROPAGANDA ELEITORAL. DISTRIBUIÇÃO BRINDES. PODER DE POLÍCIA. SANÇÃO PECUNIÁRIA. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. NÃO PROVIMENTO.
A distribuição de frascos de álcool em gel contendo adesivo de propaganda eleitoral, mormente no contexto de pandemia de COVID-19 configura a distribuição de brinde, o que é vedado pela lei.
A distribuição de propaganda eleitoral em locais proibidos pelo art. 37, §§ 1º e 4º, da Lei nº 9.504/1997 notadamente quando a propaganda ostenta aspecto de brinde, em violação ao disposto no § 6º do art. 39 da Lei das Eleições
constitui infração instantânea, o que torna prescindível, para a incidência da correspondente sanção pecuniária, a prévia notificação do responsável, na medida em que se verifica inviável a regularização da publicidade ou a restauração do bem. Confiram-se os seguintes precedentes do TSE: AgR-Respe nº 0605160-95/SP, rel. Min. Og Fernandes, Dje 7.8.2019; AgRREspe nº 060532897/SP, rel. Min. Jorge Mussi, Dje 25.6.2019; AgR-AgR-Respe nº 72-75/RJ, rel. Min. Luis Felipe Salomão, Dje
22.9.2020. REI nº 060084213 Acórdão nº 060084213 PARNAMIRIM – RN Relator(a): Des. FERNANDO DE ARAUJO JALES COSTA_1Julgamento: 09/02/2021 Publicação: 11/02/2021 09/02/2021
Verificado nos autos não só o pedido explícito de votos em diversas postagens, o que por si só já denota a ilicitude da conduta do recorrente, em notória afronta ao art. 36–A da Lei nº 9504/97, mas também a intenção de obter vantagem por meio de oferecimento de brinde, capaz de influenciar os eleitores e, em contrariedade à vedação contida no § 6º do art. 39 da mencionada Lei das Eleições. A violação a estes dois dispositivos, somada à grande quantidade de postagens e utilização de recursos que potencializam a sua divulgação justificam a aplicação da multa acima do mínimo legal.
PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO, A FIM DE REFORMAR A SENTENÇA E APLICAR A MULTA PREVISTA NO ART. 36, §3º, DA LEI Nº 9.504/97, NO VALOR DE R$ 8.000,00 (OITO MIL REAIS). DETERMINAÇÃO DE IMEDIATA EXCLUSÃO DAS POSTAGENS REPUTADAS ILÍCITAS. RE nº. 060056229 Acórdão RESENDE– RJ Relator(a): Des. Claudio Luis Braga Dell Orto Julgamento: 05/11/2020 Publicação:05/11/2020
Quanto à desproporcionalidade no nome, já sendo inclusive objeto de outra representação com as mesmas partes, mantenho o mesmo posicionamento já proferido naqueles autos. No caso, constato que também houve ofensa ao § 4º, do artigo 36, da Lei das Eleições, vez que o nome da vice está em tamanho bem inferior ao nome do candidato a prefeito, além de ter suprimido seu sobrenome, em desacordo com o registro do TSE. No caso, além de veicular propaganda irregular por oferta de brinde, tenho que a veiculação de propaganda sem o nome correto da vice pode desequilibrar ao pleito em razão do fato de que o eleitorado tem o direito de saber quem são os candidatos e seus respectivos vices, garantindo a transparência e a publicidade do pleito eleitoral.
O princípio da Isonomia ou da Paridade de Armas é uma das principais vigas de sustentação do Direito Eleitoral Brasileiro, e tem por objetivo assegurar que todos os candidatos e candidatas autuem sob as mesmas regras de modo que nenhum dos contendores possa auferir qualquer benefício não autorizado para os demais. Toda e qualquer burla à legislação de regência configura vantagem não autorizada em lei e exige repressão imediata. O perigo na demora da prestação jurisdicional se faz presente.
Daí, entendo presentes os fundamentos da necessidade do deferimento da tutela antecipada, mormente diante do curtíssimo prazo até as Eleições do dia 06 de outubro e o desequilíbrio de poderes entre o candidato que faz uso de distribuição de brinde e os demais que não fazem
Portanto, de modo a conferir efetividade à lisura da propaganda eleitoral, urge que seja intimado o Representado e aplicada multa inibitória para evitar que o ilícito se repita.
Ante o exposto, DEFIRO a tutela de urgência para determinar a imediata proibição de confecção, utilização e distribuição de toda a propaganda eleitoral aqui impugnada, sob pena de multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais), além de outras medidas legais cabíveis, como busca e apreensão do material.
Citar o representando para, querendo, apresentar defesa em 02(dois) dias.
Publique-se no Mural Eletrõnico.
Intime-se a Gráfica SGB IMPRESSOS GRAFICOS LTDA, para que apresente as notas fiscais e o quantitativo de livretos contratados. Prazo: 24 horas, sob pena de incorrer em crime. Não há que se falar em aplicação de astreintes contra a gráfica, vez que não é parte nesse processo.
Tudo cumprido, vista ao MPE. A seguir, conclusos.
Sete Lagoas, 18 de Setembro de 2024.
Marina Rodrigues Brant
Juíza Eleitoral