JUSTIÇA ELEITORAL
054ª ZONA ELEITORAL DE SANTA QUITÉRIA CE
AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (11527) Nº 0600607-82.2024.6.06.0054 / 054ª ZONA ELEITORAL DE SANTA QUITÉRIA CE
AUTOR: PROMOTOR ELEITORAL DO ESTADO DO CEARÁ
REU: JOSE BRAGA BARROZO, FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO, KYLVIA MARIA DE LIMA OLIVEIRA, FRANCISCO LEANDRO FARIAS DE MESQUITA, FRANCISCO EDINEUDO DE LIMA FERREIRA
Advogados do(a) REU: RAIMUNDO AUGUSTO FERNANDES NETO - CE6615, ESIO RIOS LOUSADA NETO - CE18190
Advogados do(a) REU: RAIMUNDO AUGUSTO FERNANDES NETO - CE6615, WALDIR XAVIER DE LIMA FILHO - CE10400
Advogado do(a) REU: PEDRO AGUIAR CARNEIRO FILHO - CE30315
Advogados do(a) REU: JOAO ALBERTO ROLIM MESQUITA - MA12015, OTONIEL DOS SANTOS REGADAS DE CARVALHO - MA8740000-A, JOSE AUGUSTO CUTRIM GOMES JUNIOR - PI17336, RODRIGO NUNES BRITO - CE48410, LALLESK ROLIM MESQUITA - MA16794, ARNON AFIF ALTINO COELHO DA SILVA COSTA - MA20732
Advogado do(a) REU: CARLOS NAGERIO COSTA - CE29372
AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ELEIÇÃO MUNICIPAL DE 2024. CANDIDATOS ÀS ELEIÇÕES MAJORITÁRIA E PROPORCIONAL. ABUSO DO PODER ECONÔMICO E DO PODER POLÍTICO. OCORRÊNCIA. APOIO VELADO DE FACÇÃO CRIMINOSA ÀS CANDIDATURAS IMPUGNADAS. ESTRATÉGIA E AÇÕES CONCATENADAS POR INTEGRANTES DO COMANDO VERMELHO VOLTADAS A INTIMIDAÇÃO, COAÇÃO E EXPULSÃO DE ELEITORES E APOIADORES DE CANDIDATURA ADVERSÁRIA. OBSTRUÇÃO DE ATOS LEGÍTIMOS DE CAMPANHA ELEITORAL. ESVAZIAMENTO DE COMÍCIOS DE DETERMINADO CANDIDATO A PREFEITO. COMPRA DE VOTOS DE ELEITORES POR MEIO DE DOAÇÃO DE ENTORPECENTES. ENTREGA DE VEÍCULO DE LUXO A TRAFICANTE QUE FIGURA COMO LIDERANÇA DA FACÇÃO CRIMINOSA EM RETRIBUIÇÃO A SEU APOIO. RECRUTAMENTO DE CRIMINOSOS PARA TUMULTUAR O PROCESSO POLÍTICO DE SANTA QUITÉRIA. ABSTENÇÃO SIGNIFICATIVA DE ELEITORES CARACTERIZADA. VITÓRIA ELEITORAL FRAUDULENTA DE DOIS DOS TRÊS CANDIDATOS APOIADOS PELO CRIME ORGANIZADO. PROCEDÊNCIA DA AIJE. CASSAÇÃO DOS DIPLOMAS DOS CANDIDATOS ELEITOS GRAÇAS AO APOIO DO CRIME ORGANIZADO. DECRETAÇÃO DE INELEGIBILIDADE DE TODOS OS PROMOVIDOS, POR OITO ANOS.
01. Processo eleitoral tumultuado por meio de pichações em vários bairros de Santa Quitéria com ameaças contra eleitores e apoiadores do então candidato a Prefeito Tomás Figueiredo, e com a indicação de que as ameaças partiam do Comando Vermelho, identificado pela sigla CV.
02. Ocorrência recorrente de ameaças a eleitores por meio de mensagens de áudio, distribuídas através de redes sociais, tais como Instagram e Whatsapp.
03. Intimidação de eleitores para que apoiassem e votassem nos candidatos apoiados pela facção criminosa, tudo sob pena de sofrerem depredação em seus estabelecimentos comerciais e seus veículos, caso contivessem adesivos de campanha do candidato proscrito.
04. Recomendação expressa de criminoso recrutado por líder da facção criminosa para que seus subordinados fizessem pichações contra o então candidato Tomás Figueiredo, mas ocultassem qualquer demonstração de apoio ao então candidato José Braga Barrozo.
05. Reiteração de pichações eventualmente apagadas por agentes da força pública, e expulsão de eleitores às vésperas do dia da votação.
06. Entrega de veículo de luxo a liderança do Comando Vermelho, homiziado dentro da Favela da Rocinha no Rio de Janeiro, como meio de retribuir seu apoio operacional criminoso às candidaturas escolhidas pelo crime organizado.
06. Atos de fraude eleitoral comprovados por meio de: a) relatórios técnicos produzidos pelo Departamento de Inteligência da Polícia Civil do Estado do Ceará, a partir da extração de dados de dois aparelhos celulares apreendidos em poder de Daniel Claudino de Sousa, vulgo “Da30”; b) prova testemunhal idônea, consistente em depoimentos de delegado de polícia civil e delegado de polícia federal, ambos escalados para investigar os atos de intimidação, coação e expulsão de eleitores, bem como para tentar restabelecer a ordem pública em Santa Quitéria, durante as eleições de 2024.
07. Abuso de poder político e econômico caracterizados, mediante subtração da liberdade de escolha de significativa parcela do eleitorado.
08. Procedência da ação, com a consequente cassação dos diplomas conferidos aos outrora candidatos José Braga Barrozo e Francisco Gardel Farias de Mesquita, bem como decretação de inelegibilidade de todos os acionados, pelo prazo de 08 (oito) anos. Inteligência do art. 237 do Código Eleitoral, do art. 22, incisos XIV e XVI, da LC nº 64/90, do art. 74 da Lei nº 9.504/97 e do art. 7º da Resolução TSE nº 23.735/2024.
I. RELATÓRIO
O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL ajuizou AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL POR ABUSO DE PODER POLÍTICO E ECONÔMICO contra JOSÉ BRAGA BARROZO, FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO, KYLVIA MARIA DE LIMA OLIVEIRA, FRANCISCO LEANDRO FARIAS DE MESQUITA e FRANCISCO EDNEUDO DE LIMA FERREIRA, e para tanto aduziu em sua exordial que:
a) O período das eleições municipais em Santa Quitéria/CE foi marcado por coações eleitorais e ameaças praticadas pela organização criminosa Comando Vermelho contra determinado candidato ao cargo de prefeito, seus apoiadores e alguns eleitores, eis que desde o início da campanha, em meados de agosto de 2024, chegaram ao conhecimento do Ministério Público Eleitoral notícias de atos criminosos praticados em detrimento à normalidade e legitimidade do pleito;
b) Diversos muros foram pichados com palavras de ordem do Comando Vermelho contra o candidato Tomas Antônio Albuquerque de Paula Pessoa, conhecido como “Tomás Figueiredo”, com coações e ameaças para quem apoiasse e votasse neste. As pichações emitiam as seguintes mensagens: “FORA TOMÁS”, “QUEM APOIAR O TOMÁS VAI ENTRAR NO PROBLEMA COM O CV E A TROPA DO PAULINHO MALUCO”, “QUEM APOIAR O TOMÁS VAI ENTRAR NA BALA”, “QUEM APOIAR O 15 VAI MORRER”, conforme vasto acervo documental juntado aos autos, valendo salientar que “Paulinho Maluco” é o apelido de Anastácio Ferreira Paiva, também conhecido como “Doze”, líder do Comando Vermelho na região do Sertão Central do Estado do Ceará, sendo uma indivíduo de alta periculosidade, que possui uma vasta ficha de antecedentes criminais por tráfico de drogas e homicídios, e contra quem pesam mandados de prisão em aberto, porém encontra-se foragido, escondido na Rocinha, no Rio de Janeiro/RJ, de onde controla o tráfico de drogas em vários municípios do Estado do Ceará e decreta execuções de seus rivais;
c) "Paulinho Maluco"/"Doze" possui como braço-direito o indivíduo chamado Francisco Girvando Ferreira de Oliveira, conhecido como "Rikelme" ou "Vandim", que também foi um dos mandantes dos crimes eleitorais praticados, e também das pichações com ameaças contra as pessoas que apoiavam o candidato Tomas, seja participando dos seus eventos de campanha, seja meramente utilizando adesivos em casas e veículos, receberam mensagens pelo whatsapp e ligações com ameaças de morte ou ordens de expulsão da cidade, assim como ameaças de incêndio em casas e de danos a veículos, conforme fotos, áudios e diálogos extraídos de aparelhos celulares em anexo;
d) O Ministério Público Eleitoral instaurou procedimento, ouviu o candidato Tomas, o qual declarou que: d.1) desde a primeira semana da campanha não conseguia realizar seus eventos, nem visitar eleitores; d.2) pessoas que trabalhavam na sua campanha foram ameaçadas pelo Comando Vermelho desde o primeiro evento, bem como eleitores tinham medo de recebê-lo em suas casas e sofrer represálias; d.3) ainda nas eleições de 2020, também foi alvo de tais ameaças do Comando Vermelho, época em que disputou o cargo de prefeito com os mesmos adversários (José Braga Barrozo e Lígia Protásio, atualmente prefeito e vice-prefeita); d.4) o prejuízo à normalidade das eleições municipais em 2024 foi de tamanha gravidade que até a Justiça Eleitoral foi atacada, tanto que em meados de setembro, o Cartório Eleitoral recebeu ligação de um integrante do Comando Vermelho, que se dirigiu a um dos servidores ameaçando atacar a unidade do órgão e matar todos, caso a Justiça não “parasse” com as decisões contra os “manos” do CV, conforme Termo de Oitiva do servidor e Chefe do Cartório Eleitoral desta 54ª Zona Eleitoral; d.5) até aquele momento não existia qualquer decisão da Justiça Eleitoral contra integrantes da organização criminosa, mas já havia investigações da Polícia Federal e Polícia Civil contra integrantes do Comando Vermelho; d.6) a intenção dos criminosos era amedrontar não apenas o candidato e seus apoiadores/eleitores, mas também instituições, servidores e autoridades, em total atentado à normalidade e legitimidade do pleito;
e) A Polícia Federal instaurou o Inquérito Policial nº 0600503-90.2024.6.06.0054 e representou por busca e apreensão nos autos de n º 0600507-30.2024.6.06.0054, tendo como alvos a Sra. Kylvia Maria, candidata a vereadora, apontada pela PF como uma das envolvidas com o grupo criminoso, bem como Luciano Maia, apontado como ex-aliado do Tomás, que passou a apoiar José Braga Barrozo, após Tomás se recusar a negociar com o Comando Vermelho;
f) O Ministério Público Eleitoral instaurou Procedimento Investigatório Criminal e identificou como um dos autores das coações e ameaças a pessoa de Daniel Claudino Sousa, vulgo “DA30”, o qual é titular de uma das linhas telefônicas, que encaminhava mensagens e fazia ligações coagindo eleitores, através do whatsapp, e na condição de integrante do Comando Vermelho, reside no Rio de Janeiro/RJ, mas veio para Santa Quitéria/CE, a mando das lideranças do Comando Vermelho, para praticar as coações eleitorais e diversos outros crimes comuns em Santa Quitéria e municípios vizinhos;
g) As informações da polícia apontavam que o indivíduo estava fortemente armado, já tinha matado pessoas em Varjota (município vizinho) e estava disposto a matar eleitores em Santa Quitéria, razão por que o MPE requereu a medida cautelar de busca e apreensão e a prisão preventiva de Daniel Claudino Sousa, que foram devidamente deferidas e cumpridas na semana das eleições, tendo sido ele preso preventivamente, após operação conjunta do Ministério Público Eleitoral, GAECO/MPCE e a Polícia Civil do Estado do Ceará, e na ocasião seus aparelhos celulares foram apreendidos e submetidos à extração dos dados;
h) Até aquele momento, o MPE já tinha certeza de que os atos criminosos tinham causado prejuízo à normalidade e legitimidade das eleições e promovido a desigualdade entre os candidatos, contudo, ainda não tinha certeza sobre o real motivo e interesse da organização criminosa em intervir nas eleições municipais de Santa Quitéria, nem qual dos demais candidatos estava sendo beneficiado diretamente pelos atos criminosos ou tendo participação;
i) A partir da análise dos dados extraídos dos aparelhos celulares de Daniel Claudino, autorizado por este juízo, o MPE constatou que a organização criminosa agiu para beneficiar o candidato JOSÉ BRAGA BARROZO, atual prefeito de Santa Quitéria, reeleito, e os relatórios das extrações de dados dos aparelhos celulares apreendidos, bem como outras provas de procedimentos criminais, são documentos que, na presente ação, por cautela, o Ministério Público juntou em caráter sigiloso, acessíveis apenas ao juiz e às partes, pois trazem elementos de diversos crimes (não apenas crimes eleitorais), que instruem investigações criminais ainda em andamento;
j) Entre as provas dos crimes eleitorais, destacam-se diálogos em que integrantes do Comando Vermelho afirmam que deveriam pichar muros apenas com as frases “FORA TOMAS” e “TROPA DO CV”, “TROPA DO PAULINHO MALUCO”, mas não poderiam mencionar o nome do “BRAGA” nas pichações e coações, e no grupo de Whatsapp dos integrantes do Comando Vermelho, o traficante “Rikelme”, braço-direito do “Paulinho Maluco”, assim ordena: "Casas que tiver fotos do Tomas podem comprar spray e picha", "carro pode quebrar os vidros","moto pode quebrar os retrovisores", "problema de quem for votar nele", "quando forem picha não pode botar o nome do Braga não ok". (diálogo da pág 14 do relatório técnico 239/2024);
k) A organização criminosa adotou a estratégia de demonstrar claramente ser contra o TOMÁS e prejudicar a candidatura deste, mas não deixar transparecer o apoio ao candidato JOSÉ BRAGA BARROZO, a fim de, obviamente, não levantar suspeitas, nem prejudicar o candidato que eles pretendiam beneficiar, sendo certo que em várias conversas do grupo, os integrantes do CV mencionavam o candidato a prefeito com a sigla BG;
l) No dia 16/08/2024, um integrante do "CV" divulga uma foto da candidata Kylvia e sinaliza que já poderiam divulgar fotos dos candidatos, pois todos os vereadores do "bg" estavam postando nas redes sociais, e daí se percebe que a organização criminosa também estava acompanhando a movimentação dos candidatos a vereadores aliados ao prefeito. A intenção era ter representantes no Executivo e também no Legislativo, tanto assim que o traficante "RIKELME", no dia 16/08/24, emitiu uma ordem no grupo do Whatsapp, sinalizando aos demais integrantes que a campanha política estava começando: “VAMOS PRA CIMA MOSTRAR NOSSA FORÇA”, “TEMOS KYLVIA LIMA E GABRIEL FILHO E O BG PARA PREFEITO”, “VAMOS APOIAR OS NOSSOS, VAMOS EM BUSCA” (diálogo da pág. 9 do relatório técnico 239/2024), e pelo contexto é possível afirmar que “BG” refere-se a JOSÉ BRAGA BARROZO, conhecido por Braguinha, prefeito eleito de SANTA QUITÉRIA;
m) Em 22 de agosto de 2024, às 00:29:10, "RIKELME" encaminha um cartaz de um evento da campanha do TOMÁS e autoriza a quebrarem carros e motos, bem como envia também uma imagem com ameaças aos que estivessem com adesivos de TOMÁS em seus veículos, bem como aos bares que abrissem e sediassem concentrações políticas dele (pag. 17, relatório 249/2024);
n) As provas apresentadas revelam o quanto a organização criminosa estava engajada na campanha de José Braga Barrozo, tanto assim que paravam até de discutir sobre a comercialização de drogas na cidade, apenas para tratar dos assuntos da campanha do Braga, sendo oportuno contextualizar ainda que as organizações criminosas agem visando apenas alcançar seus interesses, quais sejam, obter mais lucro e mais poder, pois no crime organizado não há espaço para preferências gratuitas a autoridades políticas, tampouco há qualquer compromisso do crime organizado com os princípios democráticos-representativos, nem com o exercício da soberania popular;
o) Em 2024 foi possível descobrir que o Comando Vermelho intervém nas eleições municipais de Santa Quitéria desde 2020, porque o exercício do mandato de prefeito por José Braga Barrozo é útil para os interesses da organização criminosa, sendo tal candidato aliado de pessoas envolvidas com a organização criminosa e até mantém alguma dessas pessoas nos quadros da administração pública, razão por que resulta notória a movimentação do crime organizado para se expandir cada vez mais e deixar de ser apenas o “poder paralelo”, passando a se infiltrar nas estruturas do próprio Estado;
p) Em Santa Quitéria, por tudo o que foi apurado e agora apresentado, essa finalidade pode ser facilmente alcançada, e por isso mesmo é preciso invalidar diplomas dos eleitos e declarar inelegibilidade daqueles que optaram por meios nada democráticos para vencer as eleições, notadamente porque o MPE obteve conhecimento de que dois servidores públicos da Prefeitura de Santa Quitéria, 03 meses antes das eleições, foram até o Rio de Janeiro para negociar com Anastácio Paiva Ferreira (vulgo "Paulinho Maluco" ou "Doze"), levando um veículo para a organização criminosa, conforme Relatório Técnico 007.2024 (anexo sigiloso), destacando-se que ambos os servidores seriam da confiança do candidato José Braga Barrozo, um deles lotado no seu gabinete;
q) Realizadas diligências iniciais, verificou-se a veracidade das informações, pois Francisco Edneudo de Lima Ferreira e Francisco Leandro Farias de Mesquita, os quais ocupam cargos comissionados no município de Santa Quitéria, realizaram uma rápida viagem para o Rio de Janeiro, entre os dias 19/07/2024 e 21/07/2024, e segundo o apurado, os servidores partiram de Fortaleza no dia 19/07/2024, rumo ao Rio de Janeiro, chegando na capital na noite do dia 20/07/2024, a bordo do veículo Mitsubishi Eclipse Cross, de cor branca, placa SBJ4I74, bem como retornaram juntos, no mesmo avião, na noite do dia 21/07/2024, consoante informações confirmadas pela Companhia Aérea (GOL);
r) Constatou-se que o veículo utilizado na viagem foi deixado no Rio de Janeiro, nas mãos do líder do Comando Vermelho da região, Anastácio Pereira Paiva, o "Doze", e foi posteriormente encontrado no dia 17/12/2024, na casa do traficante "Doze", situada na Rocinha/RJ, em operação deflagrada pela Polícia Civil do Estado do Ceará, com apoio do GAECO/MPRJ, conforme imagem abaixo, extraída do vídeo (aos 36 minutos), disponibilizado no link: https://www.youtube.com/watch?v=zX1ay6qI5AU, de modo que a partir disso, restou desvendado o interesse da facção criminosa pela candidatura de José Braga Barrozo;
s) Cabe frisar que Francisco Edineudo de Lima Ferreira ocupa cargo de Coordenador do Gabinete do Prefeito, enquanto Francisco Leandro Farias de Mesquita ocupa cargo de Assessor Técnico no órgão municipal de trânsito, ambos foram nomeados por JOSÉ BRAGA BARROZO, e segundo informações da Policia Civil do Estado do Ceará, o servidor municipal Francisco Leandro possui envolvimento com a organização criminosa Comando Vermelho e com o líder "Doze"/"Paulinho Maluco", sendo preso em flagrante em 2020, outrora apontado pela polícia como motorista da facção, responsável pelo transporte de drogas, sendo tais informações foram confirmadas pelo Ministério Público após consultas aos processos constantes na sua folha de antecedentes criminais;
t) O Ministério Público apurou que Francisco Leandro ocupou cargo temporário de motorista na Prefeitura de Santa Quitéria, de 2021 a 2023 (período do mandato de José Braga Barrozo), com salário de R$1.800,00 (um mil e oitocentos reais), e em 2024, Francisco Leandro foi nomeado pelo prefeito para o cargo comissionado de Assessor Técnico, lotado na Secretaria de Cidadania e Segurança, com salário de R$3.000,00 (três mil reais);
u) Em paralelo, a então candidata a vereadora Kylvia Lima, aliada política de José Braga Barrozo, possui estreita relação com o acusado Daniel Claudino Sousa (DA30), que foi encaminhado pelo Comando Vermelho para praticar crimes eleitorais em Santa Quitéria e encontra-se preso preventivamente, tanto assim que: u.1) foram encontradas diversas conversas no aparelho celular do acusado, nas quais observa-se que Kylvia Lima é bastante próxima do Daniel Claudino e também dos líderes do "CV", chegando a tratar o DA30 como " meu cabo eleitoral preferido", e num destes diálogos telemáticos Kylvia agradece apoio financeiro do Comando Vermelho na sua campanha; u.2) além do apoio com divulgações e fornecimento de cestas básicas a eleitores, e em outro trecho da conversa, Daniel Claudino enviou áudio mencionando gastos com compra de votos para Kylvia: "Eu acho que eu já gastei mais dinheiro do que o Braga com você nessa política". Conforme diálogos do Relatório 234.2024, além de apoiar financeiramente e com divulgações, DA3O ameaçava candidatos adversários de KYLVIA; u.3) no trecho: "botar e o vereador de lá pra ralar kkk", que DA30 usou importava em fazer uso de violência e coação com candidatos em favor de Kylvia, e esta tinha conhecimento disso; u.4) o MPE encontrou foto dos dois juntos em encontros do candidato com seus aliados, dentre eles, a candidata Kylvia, que é filiada ao Partido Progressista (PP), da mesma coligação do partido do prefeito - Partido Socialista Brasileiro (PSB) - para eleições majoritárias;
v) Os crimes eleitorais em Santa Quitéria foram iniciados logo no início da campanha, em meados de agosto de 2024, sendo noticiado em diversos veículos da imprensa, de modo que: v.1) ainda no dia 19/08/2024 houve uma audiência com os representantes dos candidatos ao cargo de prefeito, no Fórum de Santa Quitéria, presidida pela autoridade judicial, com participação do MPE, tendo por finalidade a tentativa de um acordo entre os candidatos quanto à definição dos dias em que cada um faria seus eventos da campanha, a fim de garantir a igualdade de oportunidades e a normalidade das eleições, considerando, sobretudo, o número reduzido de policiais para garantia da segurança da população durante os eventos; v.2) essa iniciativa foi adotada em diversos municípios, inclusive no município de Hidrolândia, pertencente a esta Zona, onde as eleições ocorreram tranquilamente nesse aspecto; v.3) conforme ata anexa, foi elaborado um calendário de eventos e definido os dias em que cada candidato teria direito de exclusividade para fazer seu evento, e naquela oportunidade todos os presentes concordaram com o estabelecido, contudo, dias depois de ter aceitado o acordo, o candidato José Braga Barrozo resolveu desrespeitar o ajuste e marcar os eventos quase todos os dias, conforme sua conveniência; v.4) o desrespeito ao acordo teve início na ultima semana de agosto (período em que já tinham começado as coações), quando marcou 06 (seis) eventos em 04 (quatro) dias seguidos, utilizando o dia 31/08/2024, que seria de outro candidato; v.5) tl fato originou a Representação nº 0600314-15.2024.6.06.0054 e inúmeras outras, uma vez que, com a quebra do pacto, foi iniciada uma disputa acirrada entre os candidatos para realização dos eventos, com representações diárias, causando verdadeiro tumulto processual; v.6) a conduta do representado naquela época já demonstrava que não estava comprometido com a normalidade do pleito e igualdade entre os candidatos, pois enquanto um dos candidatos não conseguia realizar seus eventos em razão da violência psicológica praticada pelo Comando Vermelho aos cidadãos, José Braga Barrozo usou e abusou do seu favoritismo perante os criminosos, já que conseguia realizar eventos todos os dias, em todos os cantos do município, aproveitando que os seus apoiadores/eleitores estavam livres de coações e ameaças; v.7) após decisão judicial determinando a abstenção de realização de qualquer evento no dia 31/08/2024, o candidato José Braga Barrozo, novamente, agiu com desrespeito, pois marcou evento para o mesmo dia, mudando apenas o local, e ainda, em tom de provocação à Justiça Eleitoral, inseriu a seguinte legenda: "aaah você quer me calar? NINGUÉM PARA MAIS ESSA ONDA!"; v.8) naquela época, a "Onda Antidemocrática" já estava instalada em Santa Quitéria, e após o juízo emitir a segunda decisão judicial proibindo a realização de qualquer evento naquela data, oficiando as Polícias Militar, Civil e Federal para garantir o cumprimento da ordem judicial, finalmente o candidato resolveu não realizar o evento; v.9) tal conduta, no contexto lamentável em que Santa Quitéria já vivenciava, é digna de ser relatada nesta ação, pois revestiu-se de gravidade suficiente para demonstrar a intenção de José Braga Barrozo em abalar o equilíbrio entre os candidatos e causar prejuízo à normalidade das eleições, sendo a conduta é ainda mais reprovável, porque ao mesmo tempo em que descumpriu acordo chancelado pelo juízo, o candidato também tentou descumprir ordem judicial, de molde a comprovar que José Braga Barrozo tinha conhecimento do benefício que podia usufruir diante dos crimes praticados pela organização criminosa em detrimento da candidatura do seu adversário e da liberdade dos eleitores;
w) Houve a fruição dessa vantagem indevida, que comprometeu a lisura das eleições, de modo que não restam dúvidas ao MPE que José Braga Barrozo foi beneficiado pelas coações eleitorais e ameaças praticadas por integrantes do Comando Vermelho, atos que violaram gravemente os princípios democráticos, a normalidade e legitimidade das eleições municipais, além do que os fatos relatados e as provas apresentadas indicam que os candidatos acionados agiram em conluio com o crime organizado para obter sucesso nas eleições municipais, sendo que JOSÉ BRAGA BARROZO desviou o poder da sua autoridade enquanto prefeito para fins ilícitos, pois designou servidores públicos municipais para a empreitada criminosa ou com esta anuiu;
x) Resulta igualmente evidente que houve abuso do poder econômico, pois um veículo foi levado até o Rio de Janeiro como parte de um "negócio" ilícito entre o Chefe do Poder Executivo e os criminosos do Comando Vermelho, visando manter-se no poder a qualquer custo, com gravidade suficiente para afetar a normalidade das eleições, o equilíbrio entre os candidatos e macular a legitimidade do certame;
y) Tais fatos configuram abuso dos poderes políticos e econômicos, nos termos do art. 237 do Código Eleitoral, do art. 22, XVI da LC nº 64/90, do art. 74 da Lei nº 9.504/97, do art. 7º da Resolução TSE nº 23.735/2024, e por tal motivo a ação deve ser julgada procedente para os fins de que: a) sejam cassados os diplomas de JOSÉ BRAGA BARROZO e FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO, por terem praticado/concorrido/se beneficiado para a prática de abuso de poder político e econômico, nos termos do artigo 22, caput e inciso XIV, da LC nº 64/90, c/c o art. 14, § 9º, da CF/88; b) seja decretada a inelegibilidade de todos os demandados, tanto para esta eleição, como para os 8 (oito) anos seguintes, pela prática de abuso de poder econômico e político, nos termos do art. 22, "caput", XIV, da LC nº 64/90, c/c o art. 14, § 9º, da CF/88.
Este juízo proferiu Decisão (ID. 124580907) promovendo a organização dos autos. Ademais, determinou que fossem colocados sob sigilo os documentos relativos a feitos criminais que tramitam ou tramitaram perante a justiça comum (Ids. 124580450, 124580451, 124580453, 124580454). Por fim, determinou que fosse aguardado o cumprimento do mandado de citação de FRANCISCO EDINEUDO DE LIMA FERREIRA.
O Cartório Eleitoral (ID. 124582839) providenciou a atualização da autuação para incluir os advogados, conforme procuração ad judicia, documento ID 124580424 e registrou sigilo nos documentos relativos a feitos criminais que tramitam ou tramitaram perante a Justiça Comum (Id’s. 124580450, 124580451, 124580453, 124580454).
Em seguida, foi acostada certidão de citação de FRANCISCO EDNEUDO DE LIMA FERREIRA (ID. 124584041), atestando que se procedeu a citação com hora certa, entregando cópia do Mandado de Citação e contrafé a Lindalva Onofre Lima Ferreira, mãe do destinatário, em 28.01.2025 (ID. 124584680) que ficou ciente do inteiro teor da citação e não se recusou a assinar. Ainda, a Senhora Lindalva Onofre Lima Ferreira foi informada de que a citação se deu com hora certa, conforme previsão no CPC/2015 (arts. 252 a 254), considerando-se o representado citado para todos os efeitos legais.
KYLVIA MARIA DE LIMA OLIVEIRA e FRANCISCO EDNEUDO DE LIMA FERREIRA vieram aos autos formular pedido de habilitação (ID. 124585418 e 124585423). O Cartório providenciou a atualização da autuação (ID. 124591685), e em seguida foi certificada a juntada de informações recebidas do SISBAJUD (ID. 124625904), bem como foi certificado em 03.02.2025 (ID. 124654927) o decurso do prazo legal para apresentação de defesa, sem nenhuma manifestação de KYLVIA MARIA DE LIMA OLIVEIRA e FRANCISCO EDNEUDO DE LIMA FERREIRA.
FRANCISCO LEANDRO FARIAS DE MESQUITA (ID. 124579825), FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO (ID. 124580414) e JOSÉ BRAGA BARROZO (ID. 124580431) apresentaram contestação, e em sede preliminar, FRANCISCO LEANDRO FARIAS DE MESQUITA alegou a declaração de nulidade do Relatório Técnico Nº 007/2024, pugnando pelo seu desentranhamento dos autos. JOSÉ BRAGA BARROZO, por seu turno, pugnou pelo indeferimento da inicial alegando ilegitimidade passiva. Pleiteia que sejam colacionados aos autos os laudos, perícias e demais boletins e documentos policiais constantes no Processo nº 0600473-94.2020.6.06.0054, a fim de que se tenham elementos que demonstrem a insatisfação do crime organizado para com o ex-prefeito, Sr. TOMÁS. Pugnou ainda pela juntada do inteiro teor das conversas extraídas e/ou ainda contidas nos telefones celulares de posse ou propriedade de DANIEL, vulgo DA30, em sua integralidade, bem como das demais realizadas nos processos criminais ou inquéritos mencionados. FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO enfatizou que não havia, em qualquer momento, menção ao seu nome na inicial, não havendo prova nos autos, que o ligue, direta ou diretamente as alegações efetuadas pela parte autora. Reitera os pedidos de juntada de provas constantes do Processo nº 0600473-94.2020.6.06.0054.
Em virtude da arguição de questões preliminares nas contestações acima mencionadas, bem como da juntada de documentos, este juízo oportunizou a apresentação de réplica para o autor (ID. 124606414), sendo esta apresentada pelo Ministério Público Eleitoral (ID. 124797217).
Por decisão saneatória de 01.04.2025, este juízo: a) REJEITOU a preliminar de nulidade do Relatório Técnico Nº 007/2024; b) REJEITOU a preliminar de ilegitimidade passiva suscitada por JOSÉ BRAGA BARROZO; c) INDEFERIU o pedido de juntada do inteiro teor das conversas extraídas e/ou ainda contidas nos telefones celulares de posse ou propriedade de DANIEL, vulgo DA30, em sua integralidade, bem como das demais realizadas nos processos criminais ou inquéritos mencionados, porque seria inviável e desnecessário promover a transcrição de todas as conversas encontradas no aparelho, sendo imprescindível que se relatasse apenas aquilo que interessa ao esclarecimento dos fatos investigados; d) observou que, quanto ao requerimento para que fossem colacionados aos autos os laudos, perícias e demais boletins e documentos policiais constantes no Processo nº 0600473-94.2020.6.06.0054, a fim de que se tivesse elementos que demonstrassem a insatisfação do crime organizado para com o ex-prefeito TOMÁS FIGUEIREDO, o pedido tinha cariz genérico, sem especificação de quais seriam as provas constantes daqueles autos e que, de fato, interessariam à sua defesa, tendo salientado ainda que os documentos constantes da AIJE nº 0600473-94.2020.6.06.0054 são públicos e os réus possuem amplo acesso às provas ali contidas, de modo que já poderiam ter instruído suas defesas com os documentos que reputassem pertinentes; e) através de decisão pretérita (ID. 124580907), este juízo já havia determinado o sigilo de alguns documentos (Ids. 124580450, 124580451, 124580453, 124580454) anexados à contestação deste investigado para preservar os dados pessoais de terceiros estranhos à lide, e isso foi devidamente registrado pelo Cartório Eleitoral; f) relativamente às alegações levantadas por FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO no sentido de que os fatos imputados e descritos na inicial eram dirigidos unicamente ao candidato à reeleição, José Braga Barrozo, não podendo atingir o demandado, então candidato à vice, este juízo salientou a existência de litisconsórcio passivo necessário, nos termos da Súmula nº 38 do TSE, pois em demandas que visem à cassação de registro, diploma ou mandato, a cassação refere-se à toda a chapa majoritária; g) decretou a revelia dos acionados KYLVIA MARIA DE LIMA OLIVEIRA e FRANCISCO EDNEUDO DE LIMA FERREIRA, os quais deixaram decorrer em branco os prazos legais que dispunham para oferecerem suas contestações; h) reconheceu concluída a fase postulatória, e por isso mesmo ordenou ao cartório eleitoral que procedesse o agendamento de audiência de instrução, com a necessária brevidade, para que nela fossem ouvidas as 03 (três) testemunhas do rol do autor (ID. 124520647, fls. 27), as 06 (seis) testemunhas apontadas na contestação de FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO (ID. 124580414, fls. 05/06), bem como as 06 (seis) testemunhas apontadas na contestação de JOSÉ BRAGA BARROZO (ID. 124580431, fls. 83).
Em cumprimento ao decisório acima referido, a serventia eleitoral agendou a audiência instrutória una para ter lugar no dia 14.04.2025, a contar das 13:30hs, e emitiu as respectivas intimações (ID. 124584041), e na sequência, ainda em 28.01.2025 o Dr. Carlos Nagério Costa requereu habilitação nos autos para atuar como patrono do acionado FRANCISCO EDNEUDO DE LIMA FERREIRA, e na mesma data o Dr. Pedro Aguiar Carneiro Filho requereu habilitação para atuar em nome da acionada FRANCISCO EDNEUDO DE LIMA FERREIRA.
A seguir, o MPE declarou ciência quanto à decisão saneatória, e na sequência o cartório eleitoral certificou a realização dos expedientes intimatórios, contudo, em 09.04.2025, a defesa do promovido JOSÉ BRAGA BARROZO pugnou pelo adiamento da audiência, alegando a necessidade de diligências documentais prévias, contudo, na mesma data o pleito restou indeferido por este juízo, pelos motivos seguintes: a) quanto à juntada do Boletim de Ocorrência nº 553-832/2025, inexistia óbice legal, seja porque tal documento se referia a um dos promovidos destes autos, seja porque noticiava circunstâncias fáticas que diziam respeito à sua alegada apresentação espontânea na Delegacia Regional de Sobral; b) relativamente ao compartilhamento de provas produzidas no Inquérito Policial nº 0600503-90.2024.6.06.0054, não cabia à parte acionada transferir seu ônus probatório ao juízo, inclusive porque eventuais provas já produzidas na aludida ação penal poderiam ser coligidas aos autos pela própria defesa, desde que dissessem respeito a fatos relevantes articulados na petição inicial do MPE; c) quanto à pretendida redesignação da audiência instrutória agendada nestes autos, o que se observava nos autos era que: c.1) os patronos dos promovidos desta AIJE ficaram devidamente intimados da audiência instrutória em 04.04.2025, através do DJ do TRE-CE de 04.04.2025, às páginas 185/189 (Id. 124836159), ao passo que a Pauta de Julgamento nº 30/2025, do egrégio TRE-CE somente foi publicada em 08.04.2025, conforme demonstrado documentalmente pelo nobre causídico peticionante; c.2) os prints de tela trazidos aos autos que indicavam solicitação de sustentação oral NÃO comprovam a data em que foram formulados, contudo, por imperativo lógico foram formulados somente após 08.04.2025, quando o patrono do acionado JOSÉ BRAGA BARROZO já se encontrava devidamente intimado sobre a audiência instrutória desta AIJE; c.3) havendo eventual conflito de datas, dispõe a legislação processual que deveria ter prevalência a intimação realizada em data anterior, e no caso em exame se trata da intimação emitida por este juízo da 54ª Zona Eleitoral; c.4) no instrumento procuratório que acompanhava a contestação ofertada em nome do promovido JOSÉ BRAGA BARROZO figuravam dois patronos, quais sejam o Dr. RAIMUNDO AUGUSTO FERNANDES NETO, OAB/CE nº 6615, e o Dr. WALDIR XAVIER DE LIMA FILHO, OAB/CE nº 10.400, razão por que a eventual participação do primeiro causídico em sustentação oral junto ao egrégio TRE-CE não impediria que o promovido se fizesse representar na audiência instrutória pelo segundo patrono (ID. 124846333).
A seguir, o habilidoso patrono do promovido JOSÉ BRAGA BARROZO ainda interpôs recurso de embargos de declaração, em 10.04.2025, às 16:59hs, no bojo do qual suscitou oníricas omissões e contradições (ID. 124851562). E no mesmo dia 10.04.2025, às 17:47hs, o MPE requereu a juntada de documentos extraídos de ação penal que tramita perante o egrégio TRE/CE contra alguns dos acionados, dentre eles os integrantes da chapa majoritária de Santa Quitéria que restou diplomada, e cujo compartilhamento havia sido autorizado pela nobre relatoria da Corte (ID. 124851298).
Por decisão de 13.04.2025, este juízo conheceu, mas negou provimento aos aclaratórios ofertados pela defesa do primeiro acionado, e para tanto pontuou que: a) poder-se-ia falar em omissão no decisório caso este juízo não tivesse apreciado algum dos pedidos nela formulados, mas isso não se verifica no caso em exame, pois o embargante formulou três pedidos, e todos eles foram apreciados, contudo, somente o primeiro foi acolhido, ao passo que os demais foram rejeitados; b) é pacífico o entendimento cristalizado na jurisprudência brasileira, no sentido de que o julgador não está obrigado a responder a todas as questões e teses jurídicas levantadas pela parte se, da análise que fez dos autos, encontrou razões suficientes para formar a sua convicção; c) não corresponde à verdade a alegativa de que, através do Sistema SIMBA, o Ministério Público Eleitoral já teve acesso a dados decorrentes de movimentações financeiras dos investigados José Braga Barrozo, Francisco Leandro Farias de Mesquita e Francisco Edneudo de Lima Ferreira, pois a mera existência do Pedido de Cooperação Técnica 028-MPCE-000596-21 não tinha o condão de viabilizar o acesso do órgão ministerial a tais dados, sem que isso tenha sido expressamente deferido por este juízo eleitoral; d) o próprio embargante reconhecera, ainda que por via oblíqua, o caráter falacioso de seu argumento de que a disponibilização antecipada de determinadas provas ao MPE importaria em violação aos postulados da paridade de armas, do contraditório, e da ampla defesa, tanto assim que rogara pela rejeição de tal pleito ministerial, e assim procedeu ainda na petição de 09.04.2025, que rogava pelo adiamento da audiência instrutória; e) o embargante não necessitava de quebra de sigilo bancário para deter conhecimento sobre sua própria movimentação financeira, e quanto aos dados obtidos a partir da quebra dos sigilos bancário, fiscal e financeiro de quaisquer outros acionados, caso necessário seriam disponibilizados nos autos para todas as partes ainda durante a instrução processual, que obviamente NÃO se confundia com o momento da colheita da prova oral; f) poder-se-ia falar em violação ao contraditório, à ampla defesa, ou à paridade de armas, caso fosse concedido ao MPE o direito de acostar qualquer outro meio de prova após o encerramento da instrução; g) inexiste qualquer dispositivo legal, seja no Código Eleitoral, seja no CPC/2015, dispondo que a prova oral somente poderia ser coletada após serem juntados aos autos todos os demais meios de prova disponíveis, e quanto a isso é imperativo salientar que há muitas décadas que a legislação brasileira se afastou do sistema da “prova tarifada”, razão por que inexiste hierarquia entre os meios de prova, e tampouco a prova oral pode ser concebida como sendo de 2ª categoria (ID. 124856762).
Adiante, ainda na manhã de 14.04.2025, a defesa dos promovidos JOSÉ BRAGA BARROZO e FRANCISCO GARDEL MESQUITA requereu a juntada de ofícios que tinham sido dirigidos às testemunhas por si arroladas, com o fito de cientificá-los acerca do ato audiencial.
Realizou-se a audiência instrutória una em 14.04.2025, e logo em seu início foi suscitada questão de ordem pela defesa dos investigados José Braga Barrozo e Francisco Gardel Mesquita Ribeiro, os quais alegaram que não tiveram acesso aos dados referentes as quebras dos sigilos bancários e telefônicos dos investigados, bem como informaram que não tiveram tempo de analisar os documentos juntados pelo MPE, aos 10.04.2025, que sua disponibilização só teria sido foi concedida poucas horas antes deste ato instrutório, e finalizaram pugnando novamente pela redesignação da audiência instrutória. Ato contínuo, este juízo ponderou que: a) inexistiam documentos outros além daqueles que foram objeto do compartilhamento de prova que havia sido deferido pelo nobre relator da Ação Penal Originária que tramita perante o egrégio TRE/CE; b) todos os documentos novos repousavam nos autos desde 10.04.2025, mesma data em que os patronos dos dois primeiros acionados haviam interposto recurso de embargos de declaração; c) o acervo de documentos novos era módico, tanto assim que o próprio juízo conseguira examiná-lo integralmente em menos de 30 (trinta) minutos, ainda na manhã que antecedeu a audiência. Por tais motivos, a questão de ordem foi rejeitada, e com ela pereceu a 3ª tentativa de adiamento da audiência instrutória. Ponderou ainda o MM Juiz Eleitoral que apenas se fosse estritamente necessário seria designada nova data para realização de outra audiência, sobretudo por dicção expressa do art. 22, V da LC nº 64/90.
Em seguida deu início a oitiva das testemunhas arroladas pela parte autora, na seguinte ordem: 1) Marcos Aurélio Elias de França (Delegado de Polícia Civil), 2) Francisco José Martins da Silva (Delegado de Polícia Federal) e 3) Tomás Antônio Albuquerque de Paula Pessoa (Candidato a Prefeito), que foi ouvido como declarante. Dando seguimento ao ato foram realizadas as oitivas das testemunhas arroladas pelo investigado Francisco Gardel Mesquita Ribeiro, na seguinte ordem: 1) Raimundo Nonato Pinto Borges, 2) Antônio Robson Chaves Muniz (ouvido como declarante), 3) Tiago Teixeira Soares Brito, 4) José Roberto Carlos Cavalcante (ouvido como declarante). Continuando com as oitivas dos depoentes arrolados pela defesa, deu-se início aos depoimentos das testemunhas apresentadas pelo investigado José Braga Barrozo. Assim, foi inquirido o 1º depoente daquela rol, Sr. Arildson de Souza Loureiro, o qual foi contraditado pelo MPE, sob o argumento de que o mesmo foi cogitado para ser candidato a vice-prefeito na chapa com José Braga Barrozo, no pleito eleitoral de 2024, bem como compôs a pasta da secretaria de segurança pública durante a gestão do José Braga de 2020 a 2024, no pleito eleitoral de 2024. Concedida a palavra os advogados de defesa, estes se posicionaram contra a contradita apresentada. A seguir, o MM Juiz decidiu ouvir a testemunha apenas como declarante, tendo em vista o aspecto notório veiculado na reportagem publicada pelo blog “A Voz de Santa Quitéria” em meados do primeiro semestre do ano de 2024, cujo conteúdo (disponível em: https://avozdesantaquiteria.com.br/noticia/54650/ari-loureiro-retorna-ao-grupo-politico-de-braguinha-e-tem-nome-cotado-para-vice) foi previamente conferido pelo magistrado, o qual constatou não apenas a cogitação de que o contraditado integrasse a chapa para disputa das eleições majoritárias em 2024, como ainda fotografia que evidenciava proximidade e confiança recíproca entre o depoente e o primeiro acionado.
No curso da audiência, o MM Juiz Eleitoral verificou que os causídicos Dr. Pedro Aguiar Carneiro Filho (OAB/CE n.º 30.315) e Carlos Nagério Costa (OAB/CE n.º 29.372) deixaram à audiência sem qualquer comunicação prévia ao juízo. Continuando as oitivas, seguiram-se as oitivas na seguinte ordem: 2º depoente Douglas Willian de Araújo Lira (ouvido como declarante), 3ª depoente Bruna de Sousa Pereira (ouvida como declarante). Adiante, foi dispensada a pedido do advogado de defesa, Dr. Raimundo Augusto Fernandes Neto, a oitiva da testemunha Ian Mateus de Brito Castro. Empós, foi requerida pela parte investigada redesignação da audiência, para oitivas das testemunhas de defesa que não compareceram a esta audiência, a seguir nominadas: a) Luzia Raquel Andrade da Silva, b) Denis Anderson da Rocha Bezerra, c) José Jeová Souto Mota, d) Oseias Montenegro Barbosa. Logo após, o MM Juiz Eleitoral concedeu a palavra ao MPE para se manifestar acerca do requerimento de nova audiência. A representante do MPE ponderou que as testemunhas faltosas não eram indispensáveis à produção de prova, pois Oseias Montenegro Barbosa e Luzia Raquel Andrade da Silva não acompanharam as investigações relevantes, as quais foram conduzidas pelo Delegado Regional Dr. Marcos Aurélio e pelo Delegado de Polícia Federal, Dr. Francisco José Martins da Silva, ambos já inquiridos em juízo.
Em sequência, o MM Juiz Eleitoral INDEFERIU a designação de nova audiência para ouvir as testemunhas Luzia Raquel Andrade da Silva, Oseias Montenegro Barbosa, Denis Anderson da Rocha Bezerra e José Jeová Souto Mota, e assim o fez pelos motivos seguintes: a) a defesa dos acionados José Braga Barrozo e Francisco Gardel Mesquita Ribeiro trouxe aos autos 07 (sete) ofícios notificatórios supostamente recebidos por testemunhas por si arroladas, dentre as quais 05 (cinco) se fizeram presentes, contudo, os 02 (dois) ofícios pretensamente recebidos por JOSÉ JEOVÁ SOUZA MOTA e DENIS ANDERSON DA ROCHA BEZERRA continham apenas a data de recebimento e assinaturas ilegíveis, razão por que seria impossível atestar que tais assinaturas efetivamente haviam partido das aludidas testemunhas; b) a defesa poderia ter provado de forma consistente que as assinaturas haviam partido do punho dos respectivos destinatários, e para tanto poderiam ter submetido aqueles documentos a reconhecimento de firma em cartório, ou mesmo poderiam ter optado pela via da notificação extrajudicial, com diligência realizada por serventuário a quem é conferida fé pública por lei; c) no caso específico da testemunha JOSÉ JEOVÁ SOUZA MOTA, por se tratar de deputado estadual, goza da prerrogativa constitucional (CF/88, art. 53, §6º) de se recusar a depor sobre informações recebidas ou prestadas em razão do exercício do mandato, nem sobre as pessoas que lhes confiaram ou deles receberam informações; d) os parlamentares, para preservar sua liberdade de atuação assim como a independência do Parlamento, acham-se desobrigados do dever de prestar depoimento em juízo, relativamente às informações recebidas ou prestadas em razão do exercício do mandato; e) como consectário natural dessa prerrogativa constitucional, mesmo no âmbito do processo penal, resta legalmente impossível que o juiz aplique contra o parlamentar qualquer uma das sanções previstas nos arts. 218 e 219 do CPP, tais como condução coercitiva e multa, e por muito maior razão seria legalmente inadmissível a condução de um parlamentar para ser ouvido numa AIJE, cuja natureza é extrapenal; f) relativamente às testemunhas Luzia Raquel Andrade da Silva e Oseias Montenegro Barbosa, a defesa sequer se deu ao trabalho de comprovar que as mesmas teriam sido previamente convocadas a participar da audiência instrutória, e por isso mesmo não restava devidamente demonstrada a alegada recusa injustificada de ambas; g) especificamente quanto à testemunha Luzia Raquel Andrade da Silva, ainda que a mesma tivesse comparecido, seria recusada pelo juízo por se trata de testemunha suspeita, nos moldes do art. 447, §3º, inciso II do CPC/2015, eis que por determinação do Juízo Eleitoral da 54ª Zona, não apenas foi cumprido mandado de busca e apreensão na residência da dita senhora, como ainda foi ela afastada das funções de funcionária terceirizada da Delegacia Regional de Santa Quitéria, ante os ponderáveis indícios de que estaria repassando informações policiais sigilosas a um réu foragido, que integra a facção Comando Vermelho.
Adiante, o MM Juiz Eleitoral indagou às partes sobre o interesse das mesmas em requererem diligências, e em resposta o MPE informou não ter qualquer diligência a requerer, entretanto, o advogado de defesa, Dr. Fernandes Neto, requereu as seguintes diligências: 1) Acesso à documentação referente aos dados da quebra de sigilo financeiro e telemático de todas as partes promovidas; 2) Oitiva de Luciano Maia, como testemunha referida 3) Oitiva de Daniel Claudino, conhecido como "DA30", como testemunha referida; 4) Oitiva dos promovidos Francisco Edineudo e Francisco Leandro como testemunhas referidas; 5) Expedição de ofício requisitório à Delegacia de Polícia Civel de Santa Quitéria para que apresentasse boletins de ocorrência policial relacionados a ameaças contra eleitores, expulsão de eleitores de suas casas, danos patrimoniais e obstrução de atos de campanha durante o período eleitoral de 2024. Concedida a palavra ao MPE, a Dra. Julia, manifestou-se pelo indeferimento dos pedidos de diligências da defesa, argumentando que as provas já produzidas são suficientes e que as diligências solicitadas seriam inócuas, tendo ponderado ainda que a quebra de sigilo bancário não foi produzida e que as provas já existentes são suficientes para o objeto da ação. Argumentou ainda, que a oitiva de Luciano Maia, Daniel Claudino, Francisco Edneudo e Francisco Leandro não acrescentaria informações relevantes ao processo, pois Luciano Maia já foi ouvido pela Polícia Federal e negou qualquer envolvimento, ao passo que Daniel Claudino já prestou depoimento em sede de acordo de colaboração premiada. Aduziu mais que Francsico Edneudo e Francsico Leandro são partes no processo e não podem ser ouvidos como testemunhas. Por fim, argumentou que a remessa de ofício requisitório à Delegacia de Polícia Civil de Santa Quitéria para juntar boletins de ocorrência seria inócua, pois as pessoas tinham medo de formalizar denúncias e, portanto, não haveria registros formais desses fatos. Por fim, este juízo consignou que em virtude da longa duração da audiência instrutória (somente concluída às 22:45hs) decidiria sobre as diligências requeridas logo após a disponibilização deste Termo de Audiência nos autos, tendo determinado que logo em seguida os autos retornassem conclusos para apreciação das pretendidas diligências (ID. 124863493).
Providenciada a juntada de todas as mídias de áudio e vídeo dos depoimentos coletados na audiência instrutória una, a MM Juíza Eleitoral titular da 54ª Zona reassumiu suas funções, contudo, declarou-se suspeita por motivo de foro íntimo (ID. 124865125).
Comunicada tal circunstância à douta Presidência do egrégio TRE/CE, esta emitiu a Portaria nº 342/2025, designando o magistrado subscritor para prosseguir atuando no feito, em substituição à eminente Juíza Eleitoral titular (ID. 124878543).
Adiante, por decisão de 24.04.2025, este juízo apreciou e indeferiu os pedidos de diligência formulados na audiência instrutória una, e para tanto salientou que: a) segundo o art. 5°, §1º da LC nº 64/90 “as testemunhas do impugnante e do impugnado serão ouvidas em uma só assentada”, e consoante o § 2° do mesmo dispositivo, “nos 5 (cinco) dias subsequentes, o Juiz, ou o Relator, procederá a todas as diligências que determinar, de ofício ou a requerimento das partes”; b) é necessário ponderar que somente devem ser deferidas diligências que sejam efetivamente necessárias ao deslinde da causa, e quanto a isso cabia ponderar que até mesmo no âmbito do processo penal era recomendado ao juízo a rejeição de diligências inúteis ou protelatórias, notadamente por força da consolidada a jurisprudência do STJ e do TSE, nesse sentido; c) era perceptível a nenhuma utilidade nas diligências solicitadas pela defesa dos dois primeiros acionados, isto porque: c.1) a quebra de sigilo bancário não foi produzida, quer logo após o recebimento formal da petição inicial, quer em momento anterior à colheita da prova oral, e segundo se depreende da manifestação do MPE ao final da audiência, este evidenciou desistência tácita daquele pleito; c.2) a oitiva de Luciano Maia, Daniel Claudino, Francisco Edneudo e Francisco Leandro não acrescentaria informações relevantes ao processo, eis que: c.2.1) Luciano Maia já fora ouvido pela Polícia Federal e negou qualquer envolvimento nos fatos descritos na exordial do MPE; c.2.2) Daniel Claudino já prestara depoimento em sede de acordo de colaboração premiada; c.2.3) Francisco Edneudo e Francisco Leandro figuram ambos como promovidos nesta AIJE e por isso mesmo não poderiam ser ouvidos como testemunhas; d) quanto à pretendida remessa de ofício requisitório à Delegacia de Polícia Civil de Santa Quitéria para juntar boletins de ocorrência seria inócua, pois segundo as duas testemunhas do rol ministerial, ambos delegados, os eleitores por eles ouvidos de maneira informal, normalmente moradores de residências que tiveram seus muros com pichações veiculando ameaças do Comando Vermelho demonstraram medo de formalizar denúncias, razão por que resultava clara a inexistência de registros formais desses fatos. Por tudo isso, foram denegadas as diligências e ordenada a intimação do MPE e patronos da defesa para que ofertassem suas alegações finais no prazo comum de 02 (dois) dias, após o que os autos deveriam retornar conclusos para sentença (ID. 124878720).
Em prosseguimento, a serventia eleitoral certificou a intimação dos advogados de defesa através do DJE de 28.04.2025, bem como a intimação do MPE, por comunicação eletrônica do Sistema PJE (ID. 124886865).
Por petição formalizada em 30.04.2025, às 21:00hs, veio aos autos a peça de alegações finais de JOSÉ BRAGA BARROZO e FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO, através da qual ratificaram as teses já expostas em suas contestações (ID. 124898266), e às 22:26hs do mesmo dia foi ofertada a peça de alegações finais de FRANCISCO LEANDRO FARIAS DE MESQUITA (ID. 124898288).
O MPE, a seu turno, ofertou suas alegações finais somente em 06.05.2025 (Id. 124905232), isto porque sua intimação se verificou em 04.05.2025, às 16:34hs, conforme se observa na aba de comunicações processuais deste feito.
Finalmente, os autos me vieram conclusos para sentença em 01.05.2025.
É o relatório. Decido.
II. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 Circunstâncias preliminares
2.1.1 Indevida juntada de documentos após o encerramento da instrução
Em sua peça de alegações finais, os promovidos JOSÉ BRAGA BARROZO e FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO anexaram documentos novos, a saber: a) Portaria nº 265/2024, de 18.03.2024, destinada à exoneração de Francisco Edneudo de Lima Ferreira do cargo de coordenador administrativo de gestão da comunicação institucional do Município de Santa Quitéria; b) mensagem telemática enviada ao cartório eleitoral da 54ª Zona, em 29.04.2025, às 10:45hs, encaminhando requerimento do primeiro acionado, anexado em formato pdf; c) requerimento do primeiro acionado solicitando emissão de certidão sobre dia e hora de concessão de acesso de documentos anexados aos autos da AIJE em epígrafe, por petição do MPE formalizada em 10.04.2024; d) decisão proferida pelo juízo eleitoral deste 54ª Zona, em 31.08.2024, nos autos do Proc. nº 0600314-15.2024.6.06.0054; e) planilha contendo o calendário de eventos da propaganda eleitoral de 2024, a serem realizados pelos quatro candidatos de Santa Quitéria nas eleições majoritárias; f) fotografias do então candidato Tomás Figueiredo e de eventuais apoiadores, extraídas do perfil de Instagram do mesmo.
É forçoso observar que, à exceção do pedido de certidão dirigido ao Cartório Eleitoral da 54ª Zona, todos os demais documentos são anteriores ao encerramento da instrução processual deste AIJE, e estavam disponíveis aos dois primeiros acionados. E quanto ao pedido de certidão, este se mostra desnecessário, eis que o tema relativo aos documentos acostados pelo MPE, através de petição anterior à audiência una de instrução realizada em 14.04.2025, às 13:30hs, foi abordado pela defesa e examinado pelo juízo logo no momento inaugural da audiência, ficando inclusive consignado em ata, senão vejamos:
“Aos 14 de abril de 2025, às 13h30, na sala de audiência do Cartório Eleitoral da 54.ª Zona de Santa Quitéria, Estado do Ceará, pela plataforma Microsoft Teams, presente o MM Juiz Eleitoral da 54.ª Zona Eleitoral, Dr. MAGNO GOMES DE OLIVEIRA. Ao pregão compareceu o Ministério Público Eleitoral, autor da presente Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), representado pelos promotores, Dra. Júlia Leite Sampaio Lemos, Dr. Guilherme Miranda Maia e Dr. Irapuan da Silva Dionizio Júnior. Compareceram igualmente o Dr. Raimundo Augusto Fernandes Neto (OAB/CE n.º 6.615) e o Dr. Waldir Xavier de Lima Filho (OAB/CE n.º 10.400), representando os investigados José Braga Barrozo (Candidato a Prefeito) e Francisco Gardel Mesquita Ribeiro (Candidato a Vice-Prefeito), bem como o Dr. João Alberto Rolim Mesquita (OAB/MA n.º 12.015), representando o investigado Francisco Leandro Farias de Mesquita, o Dr. Pedro Aguiar Carneiro Filho (OAB/CE n.º 30.315), representando a investigada Kylvia Maria de Lima Oliveira, e o Dr. Carlos Nagério Costa (OAB/CE n.º 29.372), representando o investigado Francisco Edineudo de Lima Ferreira. Aberta a Audiência de Instrução, na forma da Lei, foi arguida questão de ordem pela defesa dos investigados José Braga Barrozo e Francisco Gardel Mesquita Ribeiro, os quais alegaram que não tiveram acesso aos dados referentes as quebras dos sigilos bancários e telefônicos dos investigados, bem como informaram que não tiveram tempo de analisar os documentos juntados pelo MPE, aos 10.04.2025, que sua disponibilização só foi concedida poucas horas antes deste ato instrutório, e finalizaram pugnando novamente pela redesignação da audiência instrutória. Em seguida, o MM Juiz Eleitoral ponderou que: a) inexistiam documentos outros além daqueles que foram objeto do compartilhamento de prova que havia sido deferido pelo nobre relator da Ação Penal Originária que tramita perante o egrégio TRE/CE; b) todos os documentos novos repousavam nos autos desde 10.04.2025, mesma data em que os patronos dos dois primeiros acionados haviam interposto recurso de embargos de declaração; c) o acervo de documentos novos era módico, tanto assim que o próprio juízo conseguira examiná-lo integralmente em menos de 30 (trinta) minutos, ainda na manhã que antecedeu a audiência. Destarte, por tais motivos o MM Juiz Eleitoral INDEFERIU a 3ª tentativa de adiamento da audiência instrutória. Ponderou ainda o MM Juiz Eleitoral que apenas se fosse estritamente necessário seria designada nova data para realização de outra audiência, sobretudo por dicção expressa do art. 22, V da LC nº 64/90”.
Verifico igualmente que também o MPE procedeu com a juntada extemporânea de documentos em sua peça de alegações finais, os quais consistiram basicamente em prints de tela que noticiam: a) 80 (oitenta) militares e 13 (treze) viaturas do Exército Brasileiro que teriam chegado em Santa Quitéria no dia 04.10.2024, para reforçar o contingente de força pública na véspera e no dia da votação (Id. 124905233 a 124905235); b) ação do crime organizado para tentar interferir nas eleições municipais de Santa Quitéria (Id. 124905238 a 124905243); c) matéria jornalística do Gazeta do Povo que alude à preocupação do TSE sobre as tentativas de infiltração das organizações criminosas nas eleições municipais (Id. 124905244 a 124905250); d) matéria jornalística do jornal “O Povo” de 17.09.2024 que noticiou o cumprimento de 23 (vinte e três) mandados de busca e apreensão em Santa Quitéria contra suspeitos de integrar o Comando Vermelho e que estariam atuando durante as eleições (Id. 124905251 a 124905254).
Resta forçoso concluir que os documentos novos, juntados tanto pelos defensores dos dois primeiros acionados, quanto pelo MPE, poderiam e deveriam ter sido acostados aos autos por meio da contestação, ou através de petições intermediárias, ou ainda por ocasião da audiência una de instrução, mas nunca após o encerramento da instrução processual, sob pena de subverter o princípio do devido processo legal, tão frequentemente enaltecido pelos próprios patronos dos acionados José Braga Barrozo e Francisco Gardel Mesquita Ribeiro. Com efeito, caso admitida a juntada serôdia de tais documentos, este juízo estaria ignorando o princípio da preclusão, além do que seria compelido a reabrir a instrução, para conceder vistas dos autos ao MPE e aos patronos da defesa habilitados nos autos, a fim de que pudessem se manifestar sobre os aludidos documentos novos.
Vale salientar que a jurisprudência emanada do Colendo TSE se mostra absolutamente refratária à juntada tardia de documentos em ações de natureza eleitoral, senão vejamos:
PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2018. DIRETÓRIO NACIONAL DO PARTIDO LIBERAL - PL. PERCENTUAL DE IRREGULARIDADES DE 2,18% SOBRE O VALOR RECEBIDO DO FUNDO PARTIDÁRIO. CONTAS APROVADAS COM RESSALVAS E DETERMINAÇÕES.1. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral não admite a juntada de documentos com alegações finais quando intimado o partido para prestar diligências, em razão dos efeitos da preclusão. 2. O conhecimento de documentos juntados a destempo depende do preenchimento dos requisitos do parágrafo único do art. 435 do Código de Processo Civil e da demonstração, pela parte interessada, da relevância e pertinência da prova apresentada em momento tardio.3. A saída de recursos da conta bancária do Fundo Partidário deve ser comprovada por documento fiscal idôneo emitido em nome do partido e com descrição detalhada do produto adquirido e/ou serviço prestado, sob pena de rejeição das contas. Constitui irregularidade a emissão de cheque sem comprovação da respectiva despesa.4. Os gastos com hospedagem e passagens aéreas devem ser comprovados por faturas emitidas por empresas de viagem, das quais constem nome do beneficiário, datas e itinerários, e por notas fiscais emitidas por estabelecimentos hoteleiros. O vínculo partidário está comprovado em casos nos quais os hóspedes são dirigentes partidários, inclusive de notoriedade pública. Irregularidade mantida parcialmente.5. O pagamento de serviços advocatícios deve ser comprovado por nota fiscal acompanhada de relatório completo das atividades de consultoria desenvolvidas ou de atuação em processos contenciosos, sendo devida a demonstração de que a contratada atuou em prol das atividades partidárias e vedada a atuação na defesa de causas individuais, nos termos da legislação vigente no exercício financeiro de 2018. Irregularidade mantida.6. Para comprovar as despesas com serviços de táxi, o prestador de contas deve apresentar, além de nota fiscal, voucher e tabela pormenorizada do serviço prestado, com número, nome do usuário, locais de embarque e desembarque, data e valor da corrida, procedimento não realizado pelo partido.7. O gasto efetuado com recurso público deve observar a economicidade e a eficiência. O partido não justificou a contratação de empresa de serviço de vigilância patrimonial em valor cinco vezes superior ao salário-base fixado no dissídio coletivo da categoria. Contrariedade a outros princípios, como os da transparência, da moralidade e da razoabilidade, na manutenção da terceirização do serviço. Irregularidade mantida.8. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral não presume a irregularidade de despesas com empresa que tenha dirigente partidário como sócio. Contudo, exige-se maior rigor na fiscalização desses gastos para aferição de conflitos de interesse. Apresentação de notas fiscais, contrato e relatórios com descrição genérica, os quais não permitem aferir a regularidade dos gastos de consultoria e assessoria legislativa com a empresa cujo sócio mantém relação direta com o partido. Irregularidade mantida.9. A descrição pormenorizada, em nota fiscal, de serviço prestado ao partido permite aferir a regularidade da despesa com evento e alimentação.10. Impossibilidade de pagamento, com recursos do Fundo Partidário, de juros e multas decorrentes de atrasos nas obrigações civis.11. De acordo com a jurisprudência deste Tribunal Superior, a determinação de suspensão de repasses de recursos públicos imposta aos diretórios regionais deve ser cumprida pelo órgão nacional a partir da publicação da decisão, não da data em que comunicada pelos tribunais regionais eleitorais. Irregularidade mantida.12. A ausência de repasse mínimo para o Instituto Álvaro Valle descumpre o inc. IV do art. 44 da Lei n. 9.096/1995. A quantia não transferida para a pessoa jurídica criada para educação política deve ser restituída ao erário.13. A jurisprudência deste Tribunal Superior é no sentido de que apenas despesas administrativas em benefício da mulher não são suficientes para cumprimento da política afirmativa.14. O partido não cumpriu o percentual mínimo de 5% em programas de participação da mulher na política. Contudo, a unidade técnica atestou que a agremiação, nas eleições de 2018, utilizou recursos financeiros suficientes para sanar a falha, nos termos do art. 55-A da Lei n. 9.096/1995.15. Irregularidade identificada pela Procuradoria-Geral Eleitoral apenas no parecer final não deve ser conhecida em razão dos efeitos da preclusão, nos termos do § 6º do art. 36 da Resolução n. 23.607/2019 deste Tribunal Superior.16. Total de irregularidades nas despesas com utilização do Fundo Partidário no montante de R$ 1.049.620,38. Persistência de falhas que comprometem percentual do Fundo Partidário recebido no exercício da ordem de 2,18% (R$ 48.245.121,22).17. Aplicados ao caso os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, a aprovação das contas com ressalvas é medida que se impõe.18. Contas aprovadas com ressalvas e determinação de recolhimento dos valores irregulares ao erário. Prestação de Contas nº060023630, Acórdão, Relator(a) Min. Cármen Lúcia, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 20/03/2024.
PRESTAÇÃO DE CONTAS. DEMOCRACIA CRISTÃ. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2020. CONJUNTO DE IRREGULARIDADES. RECURSOS DE FONTE VEDADA E NÃO COMPROVAÇÃO DE DESPESAS. TRANSAÇÕES ENTRE PARTES RELACIONADAS. GRAVIDADE. PRECEDENTES. DESAPROVAÇÃO. 1. Consoante disposto no art. 31 da Lei nº 9.096/95 (art. 12 da Res.-TSE nº 23.604/2019), é vedado aos partidos receber, direta ou indiretamente, recursos de fonte vedada. No caso, a Asepa, em consulta à base de dados do FILIAWEB, constatou que os doadores da legenda, pessoas físicas ocupantes de cargos públicos demissíveis ad nutum e temporários - segundo informações da RAIS 2020 -, não eram filiados à grei no exercício de 2020, sendo, portanto, ilícitas as doações no valor de R$9.377,00 (nove mil, trezentos e setenta e sete reais). 2. Em razão do caráter jurisdicional das prestações de contas, a defesa é a última oportunidade para produção de provas, motivo pelo qual deve ser indeferida a juntada de documentos em alegações finais ante a ocorrência da preclusão (PC nº 0600432-34, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe de 19.5.2023). 3. Conforme dispõe o art. 18 da Res.-TSE nº 23.604/2019, a comprovação dos gastos com recursos do Fundo Partidário requer apresentação de documento fiscal idôneo que contenha descrição detalhada de emitente e destinatário, produto adquirido ou serviços prestados. Nos termos do referido dispositivo, admite-se, ainda, qualquer outro meio idôneo de prova para tal finalidade. Nesse sentido é a jurisprudência desta Corte, segundo a qual "a ausência de documentação fiscal e demais documentos previstos no art. 18 da Res.-TSE 23.464 impede a verificação da regularidade dos gastos, bem como a análise da vinculação dessas despesas com a atividade partidária" (PC nº 0600410-73, Rel. Min. Sergio Banhos, DJe de 3.2.2022). 4. O Parquet e a Asepa identificaram débitos na conta 101054-9, que movimenta recursos do Fundo Partidário, desacompanhados de documentos que dão suporte a despesas no montante de R$ 52.319,08 (cinquenta e dois mil, trezentos e dezenove reais e oito centavos) e de R$ 37.593,03 (trinta e sete mil, quinhentos e noventa e três reais e três centavos), respectivamente. 5. É indevido o uso de verbas públicas sem lastro em documentação idônea, o que impõe o ressarcimento aos cofres públicos desses valores (PC nº 0600219-91, Rel. Min. Sérgio Banhos, DJe de 28.3.2023). 6. É irregular despesa com seguro de veículo, no montante de R$ 6.143,14 (seis mil, cento e quarenta e três reais e quatorze centavos), sem lastro documental idôneo, a teor do disposto nos arts. 44, § 1º, da Lei nº 9096/95 e 36, § 2º, da Res.-TSE nº 23.604/2019, valor que deverá ser recolhido ao Erário, atualizado. 7. Afasta-se parcialmente a irregularidade nas despesas com manutenção de veículos de propriedade do partido, quais sejam: aquisição de amortecedores para o veículo Azera FQZ2758 e peças diversas para o veículo Santa Fé OMP0743. Mantém-se, contudo, a irregularidade no valor de R$1.300,00 (mil e trezentos reais), referente à aquisição de 2 (dois) pneus sem identificação do veículo destinatário e, consequentemente, sem vinculação do gasto com a atividade partidária, conforme exigido pelos arts. 44, § 1º, da Lei nº 9096/95 e 36, § 2º, da Res.-TSE 23.604/2019 e pela jurisprudência do TSE (PC nº 0601826-13, Rel. Min. Sergio Banhos, DJe de 11.5.2022), devendo o partido ressarcir essa quantia ao Erário, atualizada. 8. Quanto às despesas com pessoal no montante de R$ 18.013,79 (dezoito mil, treze reais e setenta e nove centavos), verifica-se que o pagamento de gratificação de desempenho a profissional da tesouraria não se mostrou exorbitante, guardando equivalência com a bonificação paga no exercício anterior. Ainda que se questione o pagamento de adicionais aos funcionários das agremiações, em respeito à autonomia partidária, não seria da competência da Justiça Eleitoral se imiscuir em questões afetas à administração interna dos partidos, notadamente quando constatada, pela documentação apresentada, a vinculação da despesa com as atividades partidárias (PC nº 268-60, Rel. Min. Admar Gonzaga, DJe de 6.6.2019, e PC nº 247-55, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 1º.3.2018). 9. Mantém-se a irregularidade no valor de R$ 1.580,12 (mil, quinhentos e oitenta reais e doze centavos), relativa ao pagamento de mensalidade que teve como beneficiário grupo de profissionais da advocacia no Estado de São Paulo, sem demonstração cabal de que consistia em serviço específico de acompanhamento processual, uma vez que os boletos não descrevem o tipo de serviço prestado, referindo-se apenas às contribuições mensais, as quais devem ser suportadas exclusivamente pelo advogado inscrito na entidade. No caso, não há evidências de que tais gastos foram necessários ao desempenho das atividades jurídico-partidárias, nos termos dos arts. 44, § 1º, da Lei nº 9096/95 e 36, § 2º, da Res.-TSE nº 23.604/2019. Nessa linha: PC nº 0600477-67, referente às contas do DC do exercício financeiro de 2019, Rel. Min. Carlos Horbach, DJe de 29.5.2023. 10. O partido apresentou tempestivamente o instrumento de sublocação firmado com a Fundação Social Democrata Cristã (ID nº 157931678), o que confirma o ajuste entre as partes mediante documentação comprobatória idônea, apta a corroborar os dispêndios no valor de R$40.000,00 (quarenta mil reais), realizados à luz dos arts. 18 e 36, § 2º, da Res.-TSE nº 23.604/2019. O citado ajuste faz, inclusive, referência ao contrato de locação firmado entre os proprietários do imóvel - Flávio Carvalho de Vasconcelos e Sérgio Carvalho de Vasconcelos - e a fundação partidária. Os questionamentos acerca do contrato de locação entre a fundação e o senhorio do imóvel devem ser apresentados na prestação de contas da fundação que estão sob fiscalização de foro próprio. 11. Mostrou-se regular o dispêndio com serviço de áudio para instalação de música de espera no aparelho telefônico da sede partidária, no montante de R$1.154,50 (mil, cento e cinquenta e quatro reais e cinquenta centavos), diante da juntada de cheques nominais emitidos em favor da empresa contratada, comprovantes bancários e notas fiscais com descrição dos serviços, o que atende o comando da norma de regência e a jurisprudência do TSE (PC nº 0601831-35, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 10.6.2022). 12. A contratação de periódicos usualmente se dá por adesão e por meio de assinatura semestral e/ou anual e com pagamento mensal mediante emissão de boleto. Não há dúvida, conforme documentos juntados aos autos, de que o partido era assinante d'O Estado de S. Paulo (Estadão), sendo regular a despesa no montante de R$ 1.537,89 (mil, quinhentos e trinta e sete reais e oitenta e nove centavos). 13. A agremiação deixou de atender os requisitos inscritos no art. 18 da Res.-TSE nº 23.604/2019 para gastos diversos no total de R$ 1.167,47 (mil, cento e sessenta e sete reais e quarenta e sete centavos), valor a ser devolvido ao Erário, atualizado. 14. A jurisprudência do TSE "não presume a irregularidade nas contratações, custeadas com recursos públicos, de empresa cujo corpo societário mantenha vínculo com dirigente do partido, ante a ausência de previsão legal, de maneira que as reflexões obedecem a critérios, segundo as particularidades de cada caso. Não obstante, a hipótese reclama maior rigor na sua análise em função de a figura do prestador de serviços se confundir com a do dirigente partidário, além de acentuar a possibilidade de conflito de interesses" (PC nº 0600477-67, Rel. Min. Carlos Horbach, DJe de 29.5.2023). 15. Quanto às despesas de publicidade com a empresa Maxam Serviços de Marketing Ltda. no valor de R$63.000,00 (sessenta e três mil reais), verifica-se que se trata de prestação de serviços sucessiva - visto que há registro dessa contratação nas prestações de contas do DC referentes a vários exercícios -, a qual, diante dos mesmos apontamentos da Asepa, inclusive de contratação entre partes relacionadas, foi considerada regular no julgamento da PC nº 0601831-35 (exercício 2016) e da PC nº 0600273-57 (exercício 2018), Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 10.6.2022 e de 8.3.2023, respectivamente, e da PC nº 0600477-67 (exercício 2019), Rel. Min. Carlos Horbach, DJe de 29.5.2023. 16. No caso, foram anexados documentos fiscais e contratos regularmente preenchidos, nos termos do art. 18 da Res.-TSE nº 23.604/2019. Nesse contexto, não havendo elementos que revelem que a despesa é superfaturada e/ou que a situação descrita afeta a transparência da transação entre as partes, mostram-se regulares tais dispêndios. 17. Sobre o tema, o Ministro Benedito Gonçalves, relator da PC nº 0601831-35, DJe de 10.6.2022, referente ao exercício de 2016, do DC, discorreu ser despicienda, via de regra, a exigência de provas complementares nos casos em que anexada nota fiscal devidamente preenchida, à exceção da hipótese de haver dúvida justificável quanto à idoneidade dos documentos apresentados ou da própria execução dos serviços. 18. Quanto ao valor de R$ 23.500,00 (vinte e três mil e quinhentos reais), pago à empresa Garum Serviços de Marketing, nota-se que tal contratação também vem sendo considerada regular desde a prestação de contas do DC do exercício de 2016, apesar dos apontamentos da Asepa, inclusive de contratação entre partes relacionadas, diante da apresentação de notas fiscais e contrato de prestação de serviços, com detalhamento das atividades desenvolvidas. Confiram-se, nesse sentido: PC nº 0601831-35 (exercício de 2016), Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 10.6.2022; PC nº 0600422-87 (exercício de 2017), Rel. Min. Carlos Horbach, DJe de 7.2.2022; PC nº 0600273-57 (exercício de 2018), Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 8.3.2023; e PC nº 0600477-67 (exercício de 2019), Rel. Min. Carlos Horbach, DJe de 29.5.2023. 19. Mostrou-se irregular o abastecimento de combustível no estabelecimento de propriedade do presidente da agremiação, no valor de R$30.362,13 (trinta mil, trezentos e sessenta e dois reais e treze centavos), haja vista que, nos termos assinalados pelo órgão técnico: (i) não houve demonstração de finalidade das viagens para comprovar sua vinculação com as atividades partidárias; (ii) pagamentos foram feitos em duplicidade e de forma antecipada, sem justificativa razoável; (iii) as notas fiscais emitidas posteriormente para abatimento de tal crédito não discriminam os veículos abastecidos; e (iv) não foram juntados os respectivos cupons de abastecimento. 20. No julgamento da PC nº 0600422-87, DJe de 7.2.2022, e da PC nº 0600477-67, DJe de 29.5.2023, relativas aos exercícios de 2017 e 2019, ambas do DC e de relatoria do Ministro Carlos Horbach, este Tribunal reconheceu "a irregularidade das despesas com a aquisição de combustíveis no posto de propriedade do presidente do partido, em função do conflito de interesses, haja vista a influência direta do dirigente na transação e a impossibilidade de se comprovar a sua economicidade". 21. O conjunto de irregularidades alcança R$ 139.841,97 (cento e trinta e nove mil, oitocentos e quarenta e um reais e noventa e sete centavos), valor equivalente a 6,97% dos recursos do Fundo Partidário aplicados pela legenda em 2020. Assim como deliberado por esta Corte Superior no julgamento das contas do DC referentes aos exercícios de 2016 (PC nº 0601831-35, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 10.6.2022) e 2017 (PC nº 0600477-67, Rel. Min. Carlos Horbach, DJe de 29.5.2023) - em que o percentual tido por irregular também ficou em torno de 6% e cujos apontamentos foram semelhantes e até idênticos aos dos presentes autos, ainda que o percentual irregular seja relativamente baixo -, a prestação de contas deve ser desaprovada ante a constatação de irregularidades graves que comprometem a sua higidez, notadamente as repetidas contratações entre partes relacionadas nos últimos exercícios, a exemplo das despesas com combustíveis em estabelecimento do presidente do partido, a evidenciar conflito de interesses nas transações. 22. Em face das irregularidades e observada a aplicação da sanção de forma proporcional, determina-se a devolução ao Erário, com recursos próprios e valor atualizado, de R$130.464,97 (cento e trinta mil, quatrocentos e sessenta e quatro reais e noventa e sete centavos), relativos ao uso irregular de verbas públicas, acrescidos de multa de 5%, conforme preceitua o § 5º do art. 48 da Res.-TSE nº 23.604/2019. 23. O partido deverá, ainda, recolher ao Tesouro Nacional R$ 9.377,00 (nove mil, trezentos e setenta e sete reais), referentes aos recursos de fonte vedada (art. 14, § 1º, da Res.-TSE nº 23.604/2019), atualizados e com recursos próprios (PC nº 0601762-03, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 6.5.2022). 24. O fato de a grei não ter atingido a cláusula de desempenho não impede a completude do título judicial, e as questões relativas ao seu cumprimento serão examinadas em execução. Precedentes.25. Contas partidárias desaprovadas, com determinações Prestação de Contas Anual nº 060034828, Acórdão, Relator(a) Min. André Ramos Tavares, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 15/12/2023.
PRESTAÇÃO DE CONTAS. DIRETÓRIO NACIONAL. PARTIDO SOCIALISMO E LIBERDADE (PSOL). EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2018. CONJUNTO DE IRREGULARIDADES. BAIXO PERCENTUAL. INEXISTÊNCIA DE ÓBICES RELEVANTES À FISCALIZAÇÃO. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. PRECEDENTES. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. 1. Em razão do caráter jurisdicional das prestações de contas, a defesa é a última oportunidade para produção de provas, motivo pelo qual deve ser indeferido requerimento para juntada de documento em alegações finais ante a ocorrência da preclusão (PC nº 0600432-34, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe de 19.5.2023).2. Nos termos assinalados pelo Parquet, persiste a inconsistência contábil entre receitas declaradas no SPCA e registros dos extratos bancários no total de R$51.953,00 (cinquenta e um mil, novecentos e cinquenta e três reais), uma vez que, a despeito de demonstrados o meio para captação de doações e sua titularidade, consoante o § 2º do art. 7º da Res.-TSE nº 23.546/2017, os valores informados pelo partido são discrepantes daqueles apontados pelo órgão ministerial (ID nº 157102149, fls. 9-21). Ademais, a legenda não demonstrou o lançamento no extrato bancário da conta corrente Outros Recursos das receitas questionadas pelo MPE nos valores de R$4.000,00 (quatro mil reais), referente a doação efetuada por cheque, e R$8.590,00 (oito mil, quinhentos e noventa reais), referente a doações efetuadas por transferência eletrônica, o que impossibilita atestar a regularidade dos registros efetuados. 3. Segundo jurisprudência do TSE, "a regular escrituração contábil - com documentação que comprove a entrada e a saída de recursos recebidos e aplicados - é imprescindível para que a Justiça Eleitoral exerça a fiscalização sobre as contas" (PC nº 0601364-22, Rel. Min. Carlos Horbach, DJe de 26.6.2023). 4. A emissão e a apresentação do recibo eleitoral são etapas imprescindíveis para atestar a regularidade na arrecadação de recursos. No caso, embora seja possível identificar o doador, o PSOL deixou de apresentar o recibo de doação no valor de R$20,00 (vinte reais). A despeito do valor irrisório no contexto das contas, essa inobservância constitui irregularidade insanável, conforme previsto no art. 11, I e § 1º, da Res.-TSE nº 23.546/2017. Nesse sentido: PC nº 994-34, Rel. Min. Og Fernandes, DJe de 19.12.2019.5. A comprovação dos gastos com recursos do Fundo Partidário, segundo o disposto no art. 18 da Res.-TSE nº 23.546/2017, requer apresentação de documento fiscal idôneo que contenha descrição detalhada de emitentes e destinatários, produto adquirido ou serviços prestados. Nos termos do referido dispositivo, admite-se, ainda, qualquer outro meio idôneo de prova para tal finalidade.6. Quanto às despesas com assessoria de imprensa no montante de R$60.000,00 (sessenta mil reais), além de notas fiscais, o PSOL efetivamente juntou aos autos, ainda na fase de diligências, contrato de prestação de serviços com a aludida empresa, cujo objeto é prestação de serviços de assessoria e comunicação, e relatórios que detalham serviços realizados de produção de conteúdo, assessoria de imprensa e preparação para entrevistas, sabatinas e debates, com indicação dos links dos eventos envolvidos, cumprindo, pois, o que determina a legislação de regência (arts. 18 e 35, § 2º, da Res.-TSE nº 23.546/2017) e a jurisprudência desta Corte (PC nº 266-61, Rel. Min. Rosa Weber, DJe de 2.6.2017).7. No que se refere a pagamento a profissional autônomo no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais), o PSOL apresentou, na fase de diligências, comprovante de transferência bancária, RPA preenchido, no qual consta assinatura da beneficiária, e, apesar de ausente número de inscrição no INSS, informou a respectiva inscrição. Juntou, ainda, relatório que detalha atividades desenvolvidas referentes a consultoria para elaboração de programa partidário, cumprindo, assim, o que determina a legislação competente (arts. 18 e 35, § 2º, da Res.-TSE nº 23.546/2017) e a jurisprudência do TSE (PC nº 311-94, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 31.5.2019, e PC nº 245-80, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, DJe de 12.3.2021).8. A apresentação de recibos de pagamento a autônomo (RPA), acompanhados de certidão do Serviço de Gerenciamento de Informações Partidárias (SGIP), foi suficiente para comprovar a regularidade da despesa no valor de R$53.794,12 (cinquenta e três mil, setecentos e noventa e quatro reais e doze centavos) e, consequentemente, das contribuições previdenciárias patronais de 20% recolhidas ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) no montante de R$ 9.690,34 (nove mil, seiscentos e noventa reais e trinta e quatro centavos).9. Os repasses no valor de R$874.211,26 (oitocentos e setenta e quatro mil, duzentos e onze reais e vinte e seis centavos) para diretórios regionais que se encontravam impedidos de receber cotas do Fundo Partidário impõem ressarcimento atualizado da quantia correspondente ao Erário. Precedentes.10. A apresentação das faturas emitidas pelas agências de turismo, das quais se extraem nomes dos beneficiários, datas e itinerários, afigura-se suficiente para comprovar a materialidade dos gastos com transporte aéreo e hospedagens, visto que o partido evidenciou o vínculo da despesa com a atividade partidária por meio de relatório, conjunto de notícias e fotografias.11. A orientação jurisprudencial até então consolidada nesta Corte era no sentido de que os encargos decorrentes da não utilização de passagens aéreas e hospedagens, quando não justificados, não encontram previsão no art. 44 da Lei nº 9.096/95, devendo ser restituídos tais valores, se pagos com verbas públicas (PC nº 291-06, Rel. Min. Edson Fachin, DJe de 19.6.2019, e AgR-PC nº 274-38, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe de 10.8.2017).12. Em nova reflexão sobre o tema, este Tribunal decide nesta assentada que "pagamento de encargos por eventos dessa natureza (desistência, no-show, cancelamento etc.) pode ser admitido até um valor razoável, tendo em vista a dinâmica da vida partidária e a possibilidade de cancelamento de eventos e de compromissos da grei e dos seus integrantes", e, com base em um juízo de proporcionalidade, "não deve ser considerado irregular o gasto com encargos por cancelamento de voos e de diárias que não foram utilizadas, desde que não ultrapassado o montante de 10% do valor total utilizado especificamente na rubrica de despesas com transportes e hospedagens" (PC n° 0600240-67, de minha relatoria, julgada em 28.11.2023). 13. Nesse contexto, deve ser afastada a glosa no valor de R$8.676,17 (oito mil, seiscentos e setenta e seis reais e dezessete centavos), relativa a essas rubricas nas despesas gerais e da política feminina, por serem diminutos os gastos com encargos por cancelamento de voos e de diárias não utilizadas.14. O pagamento de juros, multas e encargos em decorrência de atraso no pagamento tampouco está amparado pelo art. 17, § 2º, da Res.-TSE nº 23.546/2017 (art. 44 da Lei nº 9.096/95), razão pela qual vedada a utilização de recursos do Fundo Partidário para tal finalidade (PC nº 0601682-39, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 11.5.2022; PC nº 298-95, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJe de 9.5.2019; e PC nº 0601754-26, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 3.5.2022).15. A irregularidade das despesas com transporte foi parcialmente afastada, julgando-se regulares gastos no valor de R$ 15.611,56 (quinze mil, seiscentos e onze reais e cinquenta e seis centavos), visto que apresentada documentação que atesta a execução e o vínculo com as atividades partidárias. Mantém-se, contudo, a irregularidade do dispêndio de R$ 5.780,36 (cinco mil, setecentos e oitenta reais e trinta e seis centavos) em virtude da ausência de detalhamento das corridas e dos beneficiários (PC nº 0600866-52, Rel. Min. Carlos Horbach, DJe de 26.6.2023, e PC nº 0600226-83, Rel. Min. Sérgio Banhos, DJe de 20.4.2023).16. A descrição genérica do serviço - "despesa com evento R$ 450,00" - inviabilizou relacionar o gasto às atividades partidárias, a teor do disposto nos arts. 44, V, da Lei nº 9.096/95 e 18 da Res.-TSE nº 23.546/2017. Da mesma forma, as despesas com locações de bens e equipamentos no total de R$1.200,00 (um mil e duzentos reais), em razão da generalidade dos documentos apresentados. (PC nº 0600385-60, Rel. Min. Raul Araújo Filho, DJe de 24.10.2022, e PC nº 245-80, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, DJe de 12.3.2021).17. São regulares as despesas referentes a serviços de publicidade no valor de R$793.800,00 (setecentos e noventa e três mil e oitocentos reais), diante do farto conjunto documental que comprova a execução material dos serviços e seu vínculo com as atividades partidárias, em conformidade com os arts. 44 da Lei nº 9.096/95 e 35, II e § 2º, da Res.-TSE nº 23.546/2017.18. Afasta-se parcialmente a irregularidade relativa a despesas com serviços gráficos no valor de R$14.740,14 (quatorze mil, setecentos e quarenta reais e quatorze centavos), uma vez que foram atestadas por documentos fiscais cujo detalhamento elenca aquisição de material condizente com atividades partidárias. Remanesce irregular, contudo, o dispêndio de R$11.555,00 (onze mil, quinhentos e cinquenta e cinco reais), diante da falta de documentação fiscal idônea ou de descrição pormenorizada do serviço ou do material, em afronta ao disposto nos arts. 44, V, da Lei nº 9.096/95 e 18 da Res.-TSE nº 23.546/2017.19. Mantida a irregularidade do gasto com Kalunga Comércio e Indústria Gráfica Ltda, no valor de R$ 178,20 (cento e setenta e oito reais e vinte centavos) em razão da impossibilidade de análise da nota fiscal, dada a precariedade da impressão (PC nº 169-22, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 2.2.2021).20. Este Tribunal tem reiterado, por seguidos exercícios financeiros - PC nº 0601855-63, Rel. Min. Edson Fachin, DJe de 10.5.2022; PC nº 173-59, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 26.3.2021; e PC nº 294-58, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 31.5.2019 -, que despesas administrativas como pagamento de pessoal, aluguéis e serviços de telefonia desvirtuam o propósito legal de mitigar a sub-representatividade feminina na política, visto serem gastos ordinários, ainda que relacionados às sedes ou aos órgãos voltados ao incentivo das mulheres na política.21. Quanto à contratação de segurança para proteção de candidatas, dirigentes e filiadas, bem como a inclusão dessa despesa no cômputo do incentivo à participação feminina na política, esta Corte consignou, nesta assentada, que, considerando que a Lei n° 14.192, de 4.8.2021, incluiu o inciso X no art. 15 da Lei 9.096/95, com intuito de exigir que os estatutos partidários passem a conter normas sobre prevenção, repressão e combate à violência política contra a mulher e tendo em vista que no caso vertente há comprovação efetiva de dispêndio com a segurança de candidata, deve-se inserir tal despesa nessa rubrica específica, sempre com a perspectiva de que não haja desvio da verba para fins de contratações outras, como cabos eleitorais.22. Dessa forma, reputa-se regular a despesa com profissional autônomo para segurança de candidata no valor de R$8.000,00 (oito mil reais).23. No caso dos autos, o diretório nacional do PSOL cumpriu a obrigação legal de destinação mínima de 5% do Fundo Partidário, recebido em 2018, para fomento da participação das mulheres na política (art. 44, V, da Lei nº 9.096/95, com a redação da Lei nº 13.165/2015). 24. O conjunto de irregularidades alcança R$943.571,93 (novecentos e quarenta e três mil, quinhentos e setenta e um reais e noventa e três centavos), valor equivalente a 5,80% dos recursos recebidos do Fundo Partidário pela legenda em 2018. O percentual e o quantitativo considerados irregulares se mostraram relativamente baixos no contexto geral das contas e, não havendo indícios de má-fé ou óbices relevantes à fiscalização em sua totalidade, atraem a incidência dos comandos da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovação das contas com ressalvas, nos termos da jurisprudência do TSE.25. Determina-se a devolução ao Erário do valor de R$891.598,93 (oitocentos e noventa e um mil, quinhentos e noventa e oito reais e noventa e três centavos), atualizado e com recursos próprios. Precedentes.26. O recolhimento do aludido montante mediante desconto no futuro repasse das cotas do Fundo Partidário poderá ser admitido na fase de cumprimento de sentença, etapa processual adequada para o exame de medidas satisfativas ao julgado. Nessa esteira, confiram-se os recentes julgados: ED-PC nº 0600395-07 e ED-PC nº 0600423-72, Rel. Min. Raul Araújo, julgados em 13.6.2023 e 15.6.2023, respectivamente. Prestação de Contas nº060024067, Acórdão, Relator(a) Min. André Ramos Tavares, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 26/02/2024.
AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE SEGUIMENTO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. DESAPROVAÇÃO. JUNTADA DE DOCUMENTOS APÓS O PARECER CONCLUSIVO. ALEGAÇÕES FINAIS. INADMISSIBILIDADE. PRÉVIA CONCESSÃO DE OPORTUNIDADE PARA APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS. PRECLUSÃO. FALHA FORMAL. NÃO CARACTERIZAÇÃO. ACÓRDÃO REGIONAL. PREMISSAS FÁTICAS. AUSÊNCIA DE DOCUMENTO NOVO, JUSTO MOTIVO OU CIRCUNSTÂNCIA RELEVANTE. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. NÃO DEMONSTRAÇÃO. MULTA. REDUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. VERBETES SUMULARES 24 E 30 DO TSE. INCIDÊNCIA. SÍNTESE DO CASO. 1. Trata-se de agravo regimental interposto pelo Diretório Estadual do PSDB em face de decisão monocrática por meio da qual foi negado seguimento a agravo em recurso especial e, por conseguinte, mantido o acórdão regional que desaprovou as contas do agravante, referentes ao exercício financeiro de 2016, bem como determinou o recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$10.822,86, alusiva a verbas de fontes vedadas, do valor de R$15.009,74, atinente a recursos de origem não identificada, e do montante de R$463.654,51, referente a recursos do Fundo Partidário aplicados irregularmente, acrescido de multa de 10% da quantia apontada como irregular, nos termos do art. 37 da Lei 9.096/95, com a redação dada pela Lei 13.165/2015. ANÁLISE DO AGRAVO REGIMENTAL. Inadmissibilidade da juntada de documentos após o parecer conclusivo2. Deve ser rejeitada a alegação de que a juntada tardia de documentos, ocorrida após o parecer conclusivo e com as razões finais, deveria ser admitida, em caráter excepcional, com base no disposto no § 11 do art. 37 da Lei 9.096/95, pois tal dispositivo legal se aplica somente nos casos em que o prestador das contas não teve oportunidade anterior de apresentar documentos a respeito das irregularidades constatadas. Precedentes. Não caracterização de hipótese excepcional que autorize a juntada tardia de documentos3. O Tribunal a quo registrou que a documentação juntada pelo agravante com as razões finais não se enquadra na definição de documentos novos e que o partido foi intimado para sanar as irregularidades detectadas nas contas e permaneceu silente. Ademais, o acórdão regional não contém elemento indicativo de que tenha sido comprovada a eventual existência de justo motivo ou circunstância relevante para a apresentação extemporânea de documentação. Incide, portanto, o verbete sumular 24 do TSE. Insubsistência do argumento de que a juntada tardia de documentos seria irregularidade formal. 4. É improcedente a alegação de que a juntada tardia de documentos seria irregularidade meramente formal e não se poderia sobrepor à verdade material, pois se depreende do acórdão recorrido que o partido prestador das contas foi intimado para sanar as irregularidades constatadas e perdeu a oportunidade concedida, operando-se a preclusão. Incidência do verbete sumular 30 do TSE5. Não prospera a pretensão recursal de rejeitar a incidência do verbete sumular 30 do TSE, pois tal enunciado é fundamento para afastar ambas as hipóteses de cabimento do apelo nobre. Ademais, o acórdão regional está em harmonia com a jurisprudência deste Tribunal Superior ao assentar a ocorrência de preclusão para a juntada de documentos após a apresentação do parecer conclusivo da unidade técnica a respeito das contas. Ausência de demonstração de dissídio jurisprudencial6. Não foi realizado o cotejo analítico entre os acórdãos supostamente divergentes e, de todo modo, não se demonstrou a existência de semelhança fática entre os julgados confrontados, incidindo, ademais, a orientação de que não cabe recurso especial com base em dissídio jurisprudencial quando a sua verificação depender de reexame de fatos e provas (REspe 155-12, rel. Min. Luciana Lóssio, DJE de 17.6.2016).Impossibilidade de redução do valor da multa7. Não assiste razão ao agravante no ponto em que pleiteia a redução do valor da multa aplicada, pois a Corte de origem assentou que as irregularidades correspondem a aproximadamente 21% do total das receitas arrecadadas pelo partido no exercício de 2016, no montante de R$2.248.538,22, e aplicou os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para fixar a sanção pecuniária no patamar intermediário de 10% da quantia apontada como irregular, considerando as circunstâncias do caso concreto, as quais evidenciam diversas falhas de natureza grave, constatadas nas contas, notadamente a aplicação irregular de dinheiro do Fundo Partidário, o recebimento de recursos de origem não identificada e de fonte vedada, bem como a ausência de apresentação de extratos bancários completos, em valor que não pode ser considerado irrisório, em termos absolutos ou percentuais. CONCLUSÃO. Agravo regimental a que se nega provimento. Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial Eleitoral nº25315, Acórdão, Relator(a) Min. Floriano De Azevedo Marques, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 21/11/2023.
AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO REGIONAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. DESAPROVAÇÃO E DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE VALORES AO ERÁRIO. INDEFERIMENTO DE PROVA TESTEMUNHAL PARA COMPROVAÇÃO DE DESPESAS E RECONHECIMENTO DA PRECLUSÃO EM RELAÇÃO A DOCUMENTOS APRESENTADOS SOMENTE EM ALEGAÇÕES FINAIS, APESAR DA OPORTUNIDADE DE JUNTÁ-LOS ANTERIORMENTE. JULGADO DE ACORDO COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE SUPERIOR. ALEGAÇÕES DE QUE DESPESAS FORAM DEVIDAMENTE COMPROVADAS. ÓBICE DO ENUNCIADO SUMULAR Nº 24 DO TSE. ASSUNÇÃO DE DÍVIDAS DE CAMPANHA DE 2014. APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS NAS CONTAS DOS EXERCÍCIOS FINANCEIROS SEGUINTES ATÉ SUA INTEGRAL QUITAÇÃO. PRECEDENTE. EXIGÊNCIA CONFORME O ENTENDIMENTO DO TSE. AGRAVO INTERNO QUE NÃO APRESENTA ARGUMENTOS APTOS A COMBATER OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. NEGADO PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO. 1. Prestação de contas do exercício financeiro de 2016 de diretório estadual de partido político desaprovada pela Corte local. A decisão atacada deu parcial provimento ao recurso especial do ora agravante e deu provimento ao outro apelo nobre interposto, apenas para aplicar o previsto no art. 2º da EC nº 117/2022, a fim de que a quantia que o partido não aplicou no programa de participação feminina na política seja atualizada e aplicada nas candidaturas femininas nas eleições subsequentes ao trânsito em julgado desta decisão. 2. Este Tribunal já assentou que, para a comprovação da regularidade das despesas em processos de prestação de contas, em que a lei exige a apresentação de documentos fiscais, a prova testemunhal não se presta a esse objetivo. Precedente. 3. Para o TSE, o disposto no art. 37, § 11, da Lei dos Partidos Políticos só se aplica às hipóteses em que o prestador de contas não teve oportunidade anterior de apresentar documentos e, no caso, o partido pretendeu juntar documentação em alegações finais. Todavia, conforme consignado na decisão agravada, o acórdão regional que julgou os primeiros embargos de declaração opostos assentou expressamente que, no parecer da unidade técnica, emitido antes da apresentação das alegações finais, inexistiam novos apontamentos que justificassem a juntada de documentos naquela fase processual, quando se operou a preclusão para esse intento, de acordo com o entendimento deste Tribunal.4. A alegação apresentada pelo partido no presente agravo interno, de que o acórdão regional deixou claro que houve o pagamento das despesas, porém exigiu maiores detalhes da natureza do serviço, o que, segundo compreende a grei, extrapola o previsto no art. 44, I, da Lei nº 9.096/1995, não afasta o fundamento da decisão agravada - que consignou, no ponto, a incidência do Enunciado Sumular nº 27 do TSE -, tampouco procede. Isso porque, havendo contratação de serviços autônomos, deve-se demonstrar se eles têm vinculação com a atividade partidária, sob pena de as despesas deles advindas serem consideradas não comprovadas. Precedente.5. A decisão agravada assentou que, no aresto questionado, não há a descrição da nota fiscal com serviços de publicidade e, ainda que conste no relatório do voto que julgou os embargos de declaração a descrição trazida pelo então embargante, ela não foi endossada pela Corte local. Não é certo afirmar, como quer o ora agravante, que, "[...] quando transcritos e não negados pelo próprio Acórdão, viabilizam o exame da descrição dos serviços e a valoração do conteúdo para se atestar a efetividade da despesa" (ID 158635144, fl. 18), pois esta Corte Superior, em recurso especial, só pode revalorar fatos admitidos pelo acórdão recorrido, o que não ocorreu na espécie. 6. Em relação às despesas que somam R$84.314,76, "[...] voltados para valorizar a participação das mulheres na política [...]" (ID 158635144, fl. 21), questionadas neste agravo interno, o acórdão regional consignou claramente que o partido utilizou os recursos em finalidade diversa da prevista no art. 44, V, da Lei nº 9.096/1995. Assim, conclusão em sentido contrário demandaria o reexame de fatos e provas, o que não é permitido em recurso especial, nos termos do Enunciado Sumular nº 24 do TSE. 7. A decisão agravada asseverou que "[...] a exigência da Corte local de o partido apresentar os documentos necessários à assunção de dívida de candidatos, ainda que formalizada anteriormente, encontra respaldo no entendimento deste Tribunal"; no entanto, em nenhum momento exigiu que fossem apresentados os pagamentos das parcelas das dívidas, como aduz o ora agravante. A alegação do partido, portanto, destoa do fundamento da decisão agravada e não merece acolhida. 8. Deve ser mantida a decisão agravada, ante a inexistência de argumentos aptos a modificá-la. 9. Negado provimento ao agravo interno. Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral nº12453, Acórdão, Relator(a) Min. Raul Araujo Filho, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 09/05/2023.
Diante disso, com vistas a inibir a inidônea iniciativa da defesa dois primeiros acionados, no sentido de reabrir a instrução processual que já foi formalmente encerrada, determino a exclusão dos documentos novos, através de ferramenta própria do Sistema PJE.
2.1.2 Descabida renovação de preliminares já apreciadas
Nas alegações finais ofertadas pela defesa dos promovidos JOSÉ BRAGA BARROZO e FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO foram suscitadas as preliminares seguintes: a) garantia da ampla defesa aos acusados; b) celeridade processual com obstrução ao contraditório; c) possibilidade de rediscussão de temas por ausência de preclusão; d) aplicação subsidiária do CPC/2015 ao processo eleitoral; e) quebra do sigilo bancário, fiscal e financeiro dos promovidos Leandro, Edneudo e Braga; f) sigilo telemático de Daniel Claudino de Sousa (“Da30”); g) indeferimento de oitiva de quatro depoentes arrolados pela defesa; h) indeferimento de diligências requeridas pela defesa ao final da audiência instrutória.
Inicialmente, é oportuno consignar que foi garantido a todos os acionados os direitos constitucionais ao contraditório e à ampla defesa, entretanto, tais postulados constitucionais não podem ser admitidos como se a defesa pudesse usurpar, a seu talante exclusiva, o ofício jurisdicional daquele que é legal e constitucionalmente incumbido de presidir as ações de natureza eleitoral. Data maxima venia, asseverar que os promovidos JOSÉ BRAGA BARROZO e FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO foram privados do direito ao contraditório e ampla defesa não passa de um sofisma, eis que: a) foram previamente citados para que pudessem ter conhecimento de todas as imputações que lhes foram lançadas; b) tiveram o direito à defesa técnica por meio de advogados por si escolhidos; c) tiveram oportunidade de ofertar peça contestatória dentro do prazo fixado pela Lei Complementar nº 64/90; d) tiveram a oportunidade de arrolar testemunhas até o limite legal de 06 (seis); e) tiveram oportunidade de acostar todos os documentos que entendessem necessários a robustecer suas teses defensivas; f) tiveram oportunidade de apresentar suas testemunhas em juízo, tal como preconizado pelo art. 22, inciso V da LC nº 64/90; g) tiveram oportunidade de requerer diligências; h) terão oportunidade de conhecer as razões (fáticas e jurídicas) que concorreram no livre convencimento do juízo de primeiro grau; i) terão oportunidade de se valer do duplo grau de jurisdição, através de recurso, caso entendam cabível e oportuno.
Na verdade, os argumentos iniciais de afronta ao contraditório e à ampla defesa se destinam tão somente a tangenciar os limites impostos pelo princípio da preclusão, mediante a inidônea tentativa de mascarar questões legais, todas já apreciadas pelo juízo de primeiro grau, como se as mesmas tivessem feição constitucional. Com efeito, no momento em que alguma das partes suscita questão preliminar, ou questão prejudicial ao mérito, e há pronunciamento judicial acerca do tema (quer acolhendo, quer rejeitando), se opera a preclusão consumativa. Obviamente isto não impede que a parte que se sentir inconformada esteja impedida de questionar novamente as matérias, mas somente lhe é lícito fazê-lo em sede de recurso dirigido à instância superior, pois do contrário se estaria exigindo do juízo monocrático o ônus de voltar a decidir matéria já examinada. De fato, a atividade do julgador se converteria em autêntica “Tarefa de Sísifo”1.
Destarte, e apenas para inibir eventual interposição futura de embargos de declaração por parte da defesa dos promovidos JOSÉ BRAGA BARROZO e FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO, ainda que sob a invocação do art. 489, §1º, IV do CPC/2015, este juízo explicita doravante, de forma objetiva, os motivos pelos quais as questões preliminares não merece acolhida:
a) Garantia da ampla defesa aos acusados:
O garantismo processual conferido aos acusados em geral não tem o condão de transferir a presidência do processo à parte, tampouco a seu patrono. Conforme já esclarecido acima, a garantia de ampla defesa se caracteriza pelos postulados seguintes: 1º) ter conhecimento da acusação, 2º) poder deduzir alegações contra a acusação, 3º) poder acompanhar a prova produzida e poder produzir provas, 4º) ter defesa técnica por meio de advogado, 5º) poder recorrer da decisão desfavorável.
Destaque-se que desde os primórdios desta AIJE foram conferidos a todos os cinco promovidos os postulados do princípio de garantia da amplitude de defesa, eis que: 1º) foram previamente citados para que pudessem ter conhecimento de todas as imputações que lhes foram lançadas; 2º) tiveram o direito à defesa técnica por meio de advogados por si escolhidos; 3º) tiveram oportunidade de ofertar peça contestatória dentro do prazo fixado pela Lei Complementar nº 64/90; 4º) tiveram a oportunidade de arrolar testemunhas até o limite legal de 06 (seis); 5º) tiveram oportunidade de acostar todos os documentos que entendessem necessários a robustecer suas teses defensivas; 6º) tiveram oportunidade de apresentar suas testemunhas em juízo, tal como preconizado pelo art. 22, inciso V da LC nº 64/90; 7º) tiveram oportunidade de requerer diligências; 8º) terão oportunidade de conhecer as razões (fáticas e jurídicas) que concorreram no livre convencimento do juízo de primeiro grau; 9º) terão oportunidade de se valer do duplo grau de jurisdição, através de recurso, caso entendam cabível e oportuno.
b) Celeridade processual com obstrução ao contraditório:
A celeridade imposta aos feitos eleitorais não deriva da vontade do magistrado, mas sim do princípio constitucional da razoável duração do processo (CF/88, art. 5º, LXXVIII). Tal norma constitucional tutela, além do direito de ação ou de acesso ao poder judiciário, prestação jurisdicional dentro de um prazo razoável, com eficiência, celeridade e tempestividade. Relembre-se que foi a Emenda Constitucional nº 45/2004, que explicitou o princípio no inciso LXXVIII, do artigo 5º, da CF/88. De fato, a inclusão, pelo legislador constituinte derivado, do princípio da duração razoável do processo, tem como escopo positivar a necessidade da prestação jurisdicional de forma eficaz e eficiente.
É ainda oportuno aludir que, segundo autorizadas vozes doutrinárias, a delonga da conclusão do processo pode violar direitos fundamentais e pode igualmente culminar com a configuração excessiva do processo, o que acaba por inquinar de ilegitimidade o direto de punir, na medida em que a aplicação da sanção se afasta do objetivo perquirido pelo Estado.
Cabe ainda trazer à colação o disposto no art. 94 da Lei 9.504/97, segundo o qual “os feitos eleitorais, no período entre o registro das candidaturas até cinco dias após a realização do segundo turno das eleições, terão prioridade para a participação do Ministério Público e dos Juízes de todas as Justiças e instâncias, ressalvados os processos de habeas corpus e mandado de segurança”.
Destarte, e considerando que a presente AIJE diz respeito a fatos acontecidos durante a campanha eleitoral de 2024, resta forçoso admitir que também por esta razão se impõe prioridade de tramitação deste feito, sem que isso importe em ofensa ao contraditório e ampla defesa, as quais somente teriam existido se fosse negado aos promovidos os direitos seguintes: 1º) ter conhecimento da acusação, 2º) poder deduzir alegações contra a acusação, 3º) poder acompanhar a prova produzida e poder produzir provas, 4º) ter defesa técnica por meio de advogado, 5º) poder recorrer da decisão desfavorável.
c) Possibilidade de rediscussão de temas por ausência de preclusão:
O instituto da preclusão consiste na perda da oportunidade de praticar determinado ato processual, e isso se opera por três motivos distintos: 1º) inação da parte durante o prazo fixado em lei para a realização do ato (preclusão temporal); 2º) realização do ato antes do término do prazo fixado em lei (preclusão consumativa); 3º) realização de conduta que se revela contrária ao interesse em praticar o ato processual (preclusão lógica).
No caso dos autos se verifica a ocorrência de preclusão consumativa em relação a todos os temas preliminares outrora suscitados pela defesa de JOSÉ BRAGA BARROZO e FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO, eis que foram arguidos através de peças contestatórias ofertadas em 27.01.2025 (Id. 124580430 e Id. 124580412), através de petição intermediária formalizada em 09.04.2024 (Id. 124580646), através de recurso embargos de declaração interposto em 10.04.2024 (Id. 124851562), através de questão de ordem suscitada no início da audiência instrutória una (Id. 124863493). Sucede que todas as questões preliminares foram examinadas por este juízo, conforme se pode observar nas decisões adiante transcritas:
c.1) Decisão saneatória, de 01.04.2025 (Id. 124803864), in verbis:
“Inicialmente, sobre a preliminar suscitada por FRANCISCO LEANDRO FARIAS DE MESQUITA acerca da nulidade do Relatório Técnico Nº 007/2024, alegando que o documento "sustenta-se em informações oriundas de uma denúncia anônima e tem como objeto uma suposta viagem de dois servidores públicos da Prefeitura de Santa Quitéria ao Rio de Janeiro", observo que as informações de inteligência da polícia civil foram corroboradas pela empresa aérea GOL que confirmou a viagem de volta (Rio de Janeiro x Fortaleza) dos reús, dois dias após terem chegado no veículo apurado. Ou seja, após a obtenção da informação pelo Departamento de Polícia Judiciária do Interior Norte (SEINT/DPJIN) foram empreendidas diligências que confirmam o trajeto percorrido pelo veículo citado na denúncia anônima somado a confirmação da Companhia Aérea GOL sobre a viagem de volta dos réus. Ademais, há informação de que o veículo utilizado no trajeto de ida dos servidores (Fortaleza x Rio de Janeiro) foi encontrado na casa de traficante, líder do Comando Vermelho. Destarte, REJEITO a preliminar de nulidade do Relatório Técnico Nº 007/2024. No tocante à alegação de ilegitimidade passiva, suscitada por JOSÉ BRAGA BARROZO, então prefeito e candidato à reeleição, e consequente indeferimento da petição inicial, observo que a exordial logrou narrar os fatos supostamente praticados pelos investigados, assim como os benefícios teoricamente obtidos por meio de práticas ilícitas. Narra o autor que os servidores Francisco Edneudo de Lima Ferreira e Francisco Leandro Farias de Mesquita, ora requeridos, lotados em cargos comissionados e no gabinete da Prefeitura Municipal, procederam a entrega de um automóvel, deixado diretamente na residência do Sr. Anastácio Pereira Paiva, apontado como líder da organização criminosa atuante nesta cidade. Ainda, tem-se que o elemento prova é questão de mérito, razão pela qual também REJEITO esta alegação. Ademais, sobre o requerimento de juntada do inteiro teor das conversas extraídas e/ou ainda contidas nos telefones celulares de posse ou propriedade de DANIEL, vulgo DA30, em sua integralidade, bem como das demais realizadas nos processos criminais ou inquéritos mencionados, entendo ser inviável e desnecessário promover a transcrição de todas as conversas encontradas no aparelho, sendo imprescindível que se relate aquilo que interessa ao esclarecimento dos fatos investigados, não logrando o investigado comprovar qualquer prejuízo ao contraditório e ampla defesa. Destaco que promover a juntada na íntegra dos arquivos encontrados no aparelho celular não se mostra compatível com o rito processual da AIJE, podendo causar embaraço processual. Portanto, INDEFIRO tal pleito. Ainda, quanto ao requerimento para que sejam colacionados aos autos os laudos, perícias e demais boletins e documentos policiais constantes no Processo nº 0600473-94.2020.6.06.0054, a fim de que se tenham elementos que demonstrem a insatisfação do crime organizado para com o ex-prefeito, Sr. TOMÁS, observo que o réu faz pedido genérico de juntada de provas, sem especificar quais são as provas constantes daqueles autos e que, de fato, interessariam à sua defesa. Acrescente-se que os documentos constantes da AIJE nº 0600473-94.2020.6.06.0054 são públicos e os réus possuem amplo acesso às provas ali contidas, de modo que já poderiam ter instruído suas defesas com os documentos que reputassem pertinentes. Esclareço que a Decisão (ID. 124580907) já determinou o sigilo de alguns documentos (Ids. 124580450, 124580451, 124580453, 124580454) anexados à contestação deste investigado para preservar os dados pessoais de terceiros estranhos à lide. O sigilo foi devidamente registrado pelo Cartório Eleitoral. Sobre as alegações levantadas por FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO no sentido de que os fatos imputados e descritos na inicial são dirigidos unicamente ao candidato à reeleição, José Braga Barrozo, não podendo atingir o demandado, então candidato à vice, entendo que há litisconsórcio passivo necessário, nos termos da Súmula nº 38 do Tribunal Superior Eleitoral. Em demandas que visem à cassação de registro, diploma ou mandato, a cassação refere-se à toda a chapa majoritária, de modo que o réu Francisco Gardel Mesquita Ribeiro também será atingido com a possível procedência desta ação. Portanto, não há que se falar em ilegitimidade de Francisco Gardel Mesquita Ribeiro para figurar no polo passivo. Por fim, atento ao teor da Certidão ID. 124654927, aduzindo que em 03/02/2025 decorreu o prazo legal para apresentação de defesa sem nenhuma manifestação de KYLVIA MARIA DE LIMA OLIVEIRA e FRANCISCO EDNEUDO DE LIMA FERREIRA, decreto a revelia dos mesmos, esclarecendo que, nos termos do artigo 345, inciso II, do CPC, a revelia não produz seus efeitos plenos quando o litígio versar sobre direitos indisponíveis, como ocorre no presente caso, dada a natureza da demanda e os interesses públicos tutelados. Assim, deixo de aplicar a automática presunção de veracidade dos fatos alegados na inicial. Asseguro aos réus o direito de intervir no processo em qualquer fase, recebendo-o no estado em que se encontrar, nos termos do artigo 346 do CPC/2015. E ressalto que, para os mesmos, os prazos fluirão da data de publicação desta decisão no órgão oficial, conforme prevê o art. 346, parágrafo único, do CPC/2015”.
c.2) Decisão de 09.04.2025, que apreciou o pedido de adiamento da audiência de instrução (Id. 124846333), in verbis:
“Quanto à juntada do Boletim de Ocorrência nº 553-832/2025, não vejo óbice legal, seja porque tal documento se refere a um dos promovidos destes autos, seja porque noticia circunstâncias fáticas que dizem respeito à sua alegada apresentação espontânea na Delegacia Regional de Sobral. Relativamente ao compartilhamento de provas produzidas no Inquérito Policial nº 0600503-90.2024.6.06.0054, saliento que não cabe à parte transferir seu ônus probatório ao juízo. Demais disso, eventuais provas já produzidas na aludida ação penal podem ser coligidas aos autos pela própria defesa, desde que digam respeito a fatos relevantes articulados na petição inicial do MPE. Destarte, INDEFIRO a pretendida requisição de documentos. Finalmente, quanto à pretendida redesignação da audiência instrutória agendada nestes autos, cumpre ponderar que: a) Os patronos dos promovidos desta AIJE ficaram devidamente intimados da audiência instrutória em 04.04.2025, através do DJ do TRE-CE de 04.04.2025, às páginas 185/189 (Id. 124836159), ao passo que a Pauta de Julgamento nº 30/2025, do egrégio TRE-CE somente foi publicada em 08.04.2025, conforme demonstrado documentalmente pelo nobre causídico peticionante; b) Os prints de tela trazidos aos autos que indicam solicitação de sustentação oral NÃO comprovam a data em que foram formulados, contudo, por imperativo lógico foram formulados somente após 08.04.2025, quando o patrono do acionado JOSÉ BRAGA BARROZO já se encontrava devidamente intimado sobre a audiência instrutória desta AIJE; c) Havendo eventual conflito de datas, dispõe a legislação processual que deve ter prevalência a intimação realizada em data anterior, e no caso em exame se trata da intimação emitida por este juízo da 54ª Zona Eleitoral; d) No instrumento procuratório que acompanha a contestação ofertada em nome do promovido JOSÉ BRAGA BARROZO figuram dois patronos, quais sejam o Dr. RAIMUNDO AUGUSTO FERNANDES NETO, OAB/CE nº 6615, e o Dr. WALDIR XAVIER DE LIMA FILHO, OAB/CE nº 10.400, razão por que a eventual participação do primeiro causídico em sustentação oral junto ao egrégio TRE-CE não impede que o promovido se faça representar na audiência instrutória pelo segundo patrono. Destarte, ante os motivos supra, INDEFIRO o pedido de adiamento da audiência instrutória já designada para o dia 14.04.2025, às 13:30hs. Advirto ainda que caso se verifique a ausência de ambos os patronos do promovido JOSÉ BRAGA BARROZO na aludida audiência, isto importará no encerramento de sua prova, nos moldes do art. 362, §2º do CPC/2015”.
c.3) Decisão que apreciou e denegou os aclaratórios interpostos pela defesa dos dois primeiros acionados, em 13.04.2025 (Id. 124856762), in verbis:
“Preliminarmente, cumpre observar que a decisão interlocutória embargada foi proferida por este juízo em 09.04.2025 (quarta-feira), e os aclaratórios do promovido JOSÉ BRAGA BARROZO foram manejados no dia imediatamente seguinte. Portanto, o recurso é tempestivo e merece ser conhecido. Quanto ao mérito, contudo, o recurso não merece acolhimento pelas razões seguintes: a) Poder-se-ia falar em omissão no decisório caso este juízo não tivesse apreciado algum dos pedidos nela formulados, mas isso não se verifica no caso em exame, pois o embargante formulou três pedidos, e todos eles foram apreciados, contudo, somente o primeiro foi acolhido, ao passo que os demais foram rejeitados; b) É pacífico o entendimento cristalizado na jurisprudência brasileira, no sentido de que o julgador não está obrigado a responder a todas as questões e teses jurídicas levantadas pela parte se, da análise que fez dos autos, encontrou razões suficientes para formar a sua convicção; c) Não corresponde à verdade a alegativa de que, através do Sistema SIMBA, o Ministério Público Eleitoral já teve acesso a dados decorrentes de movimentações financeiras dos investigados José Braga Barrozo, Francisco Leandro Farias de Mesquita e Francisco Edneudo de Lima Ferreira, pois a mera existência do Pedido de Cooperação Técnica 028-MPCE-000596-21 não tem o condão de viabilizar o acesso do órgão ministerial a tais dados, sem que isso tenha sido expressamente deferido por este juízo eleitoral; d) O próprio embargante reconheceu, ainda que por via oblíqua, o caráter falacioso de seu argumento de que a disponibilização antecipada de determinadas provas ao MPE importaria em violação aos postulados da paridade de armas, do contraditório, e da ampla defesa, tanto assim que rogou pela rejeição de tal pleito ministerial, e assim procedeu ainda na petição de 09.04.2025, que rogava pelo adiamento da audiência instrutória; e) O embargante não necessita de quebra de sigilo bancário para deter conhecimento sobre sua própria movimentação financeira, e quanto aos dados obtidos a partir da quebra dos sigilos bancário, fiscal e financeiro de quaisquer outros acionados, serão disponibilizados nos autos para todas as partes ainda durante a instrução processual, que obviamente NÃO se confunde com o momento da colheita da prova oral; f) Poder-se-ia falar em violação ao contraditório, à ampla defesa, ou à paridade de armas, caso fosse concedido ao MPE o direito de acostar qualquer outro meio de prova após o encerramento da instrução; g) Inexiste qualquer dispositivo legal, seja no Código Eleitoral, seja no CPC/2015, dispondo que a prova oral somente poderá ser coletada após serem juntados aos autos todos os demais meios de prova disponíveis, e quanto a isso é imperativo salientar que há muitas décadas que a legislação brasileira se afastou do sistema da “prova tarifada”, razão por que inexiste hierarquia entre os meios de prova, e tampouco a prova oral pode ser concebida como sendo de 2ª categoria. É oportuno frisar que não cabe ao juízo a ingente tarefa de demover qualquer um dos patronos judiciais dos acionados de suas convicções pessoais quanto ao acolhimento ou desacolhimento de seus eventuais pleitos, eis que o juízo é regido pelo princípio da livre convicção motivada, e com base em tal preceito cabe ao juízo apreciar PEDIDOS, e não necessariamente todas as dezenas de argumentos possíveis que tenham sido invocados em defesa daqueles PEDIDOS. Aliás, saliente-se que quem escreve para convencer é o advogado. O juiz escreve apenas para explicar as razões do seu convencimento. Relembre-se que o recurso de embargos de declaração tem por finalidade precípua aclarar ou integrar qualquer “decisum” judicial de padeça de vício de omissão, obscuridade, contradição ou erros materiais. De início, observa-se que a matéria debatida não padece da mácula mencionada, como exige o artigo 1.022, inciso II do Código de Processo Civil e artigo 48 da Lei nº 9.099/95. Inexiste qualquer omissão na decisão embargada, eis que foram efetivamente apreciados todos os três pedidos consignados no petitório de 09.04.2025. Por óbvio que o desacolhimento de aluma tese fática ou jurídica suscitada por alguma das partes jamais poderia configurar omissão, seja porque a decisão interlocutória ora adversada não representa extensão argumentativa dos petitórios de quaisquer das partes. Buscam as partes, através da exordial e da contestação, convencer o juízo sobre a prevalência de suas teses, mas o juízo não é regido pelos interesses parciais do promovente ou dos promovidos. Muito ao contrário, o julgador é regido pelo princípio da livre convicção motivada. Na verdade, o ponto invocado nos aclaratórios não passa de sofisma voltado a demonstrar a inconformação do promovido JOSÉ BRAGA BARROZO diante da decisão que manteve inalterada a data da audiência de instrução. Com efeito, os embargos declaratórios não se prestam ao reexame de matéria já decidida à luz dos fundamentos jurídicos invocados, nem fica o juiz obrigado a responder a todas as alegações das partes quando já encontrou motivo suficiente para fundar a decisão, de modo que, ausentes quaisquer dos vícios do art. 1012 do CPC/2015, resulta forçoso rejeitar os aclaratórios. Com efeito, a ocorrência de omissão exige que o juízo deixe de apreciar algum dos pedidos, sejam eles formulados pela parte autora ou pela parte acionada, sendo de todo inexigível que o órgão julgador se dedique a abordar e rebater cada frase ou argumento que reputa descabido ou impertinente, sob pena de que cada decisão interlocutória se convertesse em autêntico tratado jurídico, com inescapável prejuízo aos princípios da celeridade e da razoável duração do processo. Por outro lado, a contradição precisa ser necessariamente endógena, pois tal qual as petições das partes, as decisões judiciais, as sentenças também devem se apresentar como silogismos perfeitos. Assim, ambas as peças devem ostentar três partes: a) premissa maior, b) premissa menor, c) conclusão. Nas decisões judiciais (interlocutórias, sentenças ou acórdãos) a premissa maior é representada pelos fatos relevantes da causa, ao passo que a premissa menor é a fundamentação jurídica, e a conclusão reside no dispositivo. Assim, pode-se afirmar a ocorrência de contradição diante de eventual descompasso entre os fatos (premissa maior) e os fundamentos jurídicos (premissa menor), ou entre a premissa menor e a conclusão (dispositivo do decisório). Com efeito, somente se pode admitir a ocorrência de contradição se ela for ENDÓGENA, vale dizer, se ela for interna às partes do próprio silogismo. Daí resulta inafastável que inexiste contradição entre argumentos da petição e fundamentação do decisório, notadamente porque este não funciona como extensão argumentativa das petições formuladas pelos advogados. Em verdade, as partes submetem seus silogismos particulares (e parciais) ao escrutínio judicial, e este se manifesta através de um silogismo imparcial no qual o julgador elenca os fatos relevantes da causa, afere a incidência do fato concreto à norma, e daí extrai suas conclusões fáticas e jurídicas. Portanto, a decisão se expõe e se manifesta sob a forma de silogismo, para que possa ser submetida à crítica dialética da parte derrotada. Finalmente, o erro material é aquele perceptível a qualquer pessoa, e que normalmente se refere a dados do processo que tenham sido equivocadamente postos. Exemplificativamente, tem-se um erro material quando o juiz troca o nome de uma das partes, ou notícia no relatório de seu decisório fatos que não guardem qualquer relação com a narrativa fática contida na petição inicial e na contestação. Contudo, efetivamente este não é o caso dos autos, especialmente porque a manutenção de data designada para colheita da prova oral de: a) prévio exaurimento da fase postulatória; b) arrolamento tempestivo de testemunhas, na exordial e nas peças contestatórias; c) disposição legal expressa da LC nº 64/90. Demais disso, no decisório embargado restaram consignados fundamentos jurídicos suficiente pelos quais este juízo acolheu apenas um e rejeitou os outros dois pedidos formulados pelo promovido JOSÉ BRAGA BARROZO. De fato, o que se observa é o inconformismo do aludido embargante diante dos fundamentos do decisum, mas, sobretudo, por ter sido frustrada uma postulação de cariz aparentemente protelatório. Demais disso, é firme a jurisprudência do colendo STF quanto à inadmissibilidade da reapreciação do julgado, em sede de embargos de declaração (…). Vale ressaltar que os embargos de declaração tendem a sanar obscuridade, contradição, dúvida ou omissão do julgado, consoante previsão do artigo 1022 do CPC/2015. Há obscuridade ou dúvida quando equívoca, ambígua ou ininteligível a decisão; contradição quando alguma das suas proposições é inconciliável, no todo ou em parte, com outra. A omissão revela-se na falta de apreciação de questão a que se teria de dar solução, pois influente no julgamento. Não verifico a presença de qualquer dessas hipóteses no julgado embargado. Todavia, no caso em exame, tais vícios são ausentes, e ante as razões ora consignadas resulta claro que o verdadeiro desiderato dos aclaratórios é insistir no pleito de adiamento da audiência instrutória. E nesse pormenor cumpre sinalizar que a parte embargante pode até discordar das razões jurídicas consignadas no decisório, mas obviamente não pode taxá-lo de omisso. Aliás, não se pode tolerar sofismas travestidos do argumento de que houve contradição, omissão, obscuridade ou ambiguidade no julgado. Nesse sentido, jurisprudências do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (…). Percebe-se que a parte não pretende de fato demonstrar a existência dos requisitos necessários para acolhimento dos embargos de declaração, mas sim, demonstrar o seu inconformismo com o insucesso processual, diante da decisão que manteve inalterada a data da audiência instrutória. Ressalta-se ainda que, no que diz respeito à análise de todas as questões suscitadas, o próprio Superior Tribunal de Justiça já vem se manifestando pela desnecessidade de se manifestar sobre todos os fatos, quando a decisão já se encontra suficientemente fundamentada. Nesse sentido: “O julgador possui o dever de enfrentar apenas as questões capazes de infirmar (enfraquecer) a conclusão adotada na decisão recorrida. Assim, mesmo após a vigência do CPC/2015, não cabem embargos de declaração contra a decisão que não se pronunciou sobre determinado argumento que era incapaz de infirmar a conclusão adotada”. STJ. 1a Seção. EDcl no MS 21.315-DF, Rel. Min. Diva Malerbi (Desembargadora convocada do TRF da 3a Região), julgado em 8/6/2016 (Info 585). Desse modo, evidencia-se que a pretensão do embargante é adiar a audiência instrutória, situação que se contrapõe à Súmula nº 18 do egrégio TJCE, segundo a qual “são indevidos embargos de declaração que têm por única finalidade o reexame da controvérsia jurídica já apreciada”. Diante do exposto, em consonância com a legislação pertinente à matéria, CONHEÇO dos embargos declaratórios, mas para NEGAR-LHES PROVIMENTO, mantendo inalterado o decisório embargado. Finalmente, observo que no mesmo dia 10.04.2025, o MPE requereu a juntada de acordo de colaboração premiada celebrado no bojo de Ação Penal Eleitoral nº 0600556-71.2024.6.06.0054, e que diz respeito a fatos relevantes ao deslinde desta AIJE, bem assim de outros documentos produzidos no âmbito da referida ação penal, isto por força de compartilhamento da prova, tal como previamente autorizado pela douta relatoria. Observo que o aludido acordo de colaboração premiada já foi homologado pela douta relatoria da ação penal que tramita perante o egrégio TRE/CE, isto ainda em 02.02.2025, de modo que se tem por robustecida a presença dos requisitos legais da regularidade, legalidade e voluntariedade. Bem por isso, DEFIRO a juntada dos documentos ofertados pelo MPE, e determino que seja disponibilizado o acessos dos mesmos aos patronos de todos os acionados, com a advertência de que devem manter o sigilo funcional sobre o conteúdo dos mesmos, sob pena de atração de responsabilidade civil e criminal. Aguarde-se a audiência instrutória já designada para ter lugar em 14.04.2025”.
c.4) Decisão sobre a questão de ordem suscitada na audiência una, em 14.04.2025 (Id. 124863500), in verbis:
“Aberta a Audiência de Instrução, na forma da Lei, foi arguida questão de ordem pela defesa dos investigados José Braga Barrozo e Francisco Gardel Mesquita Ribeiro, os quais alegaram que não tiveram acesso aos dados referentes as quebras dos sigilos bancários e telefônicos dos investigados, bem como informaram que não tiveram tempo de analisar os documentos juntados pelo MPE, aos 10.04.2025, que sua disponibilização só foi concedida poucas horas antes deste ato instrutório, e finalizaram pugnando novamente pela redesignação da audiência instrutória. Em seguida, o MM Juiz Eleitoral ponderou que: a) inexistiam documentos outros além daqueles que foram objeto do compartilhamento de prova que havia sido deferido pelo nobre relator da Ação Penal Originária que tramita perante o egrégio TRE/CE; b) todos os documentos novos repousavam nos autos desde 10.04.2025, mesma data em que os patronos dos dois primeiros acionados haviam interposto recurso de embargos de declaração; c) o acervo de documentos novos era módico, tanto assim que o próprio juízo conseguira examiná-lo integralmente em menos de 30 (trinta) minutos, ainda na manhã que antecedeu a audiência. Destarte, por tais motivos o MM Juiz Eleitoral INDEFERIU a 3ª tentativa de adiamento da audiência instrutória. Ponderou ainda o MM Juiz Eleitoral que apenas se fosse estritamente necessário seria designada nova data para realização de outra audiência, sobretudo por dicção expressa do art. 22, V da LC nº 64/90”.
Aliás, cumpre consignar que os documentos anexados na petição do MPE de 10.04.2025 se tornaram acessíveis aos patronos dos acionados JOSÉ BRAGA BARROZO, FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO às 10:12hs do dia 14.04.2025, consoante revela extrato do Sistema PJE emitido pelo chefe do cartório eleitoral da 54ª ZE. Portanto, o aludido acesso se deu em momento anterior à audiência instrutória una, a qual somente teve início às 13:30hs daquele dia. Demais disso, conforme salientado pessoalmente pelo magistrado subscritor logo no início da multicitada audiência, “o acervo de documentos novos era módico, tanto assim que o próprio juízo conseguira examiná-lo integralmente em menos de 30 (trinta) minutos, ainda na manhã que antecedeu a audiência”.
d) Aplicação subsidiária do CPC/2015 ao processo eleitoral:
Em momento algum este juízo negou a aplicação subsidiária do CPC/2015 ao processo eleitoral, contudo, talvez os nobres patronos da defesa detenham uma interpretação equivocada acerca do léxico da palavra “subsidiária”. Com efeito, entende-se por princípio da subsidiariedade, a aplicação subsidiária ou residual de certas leis a hipóteses que não sejam objeto de proteção de outra norma. Ou seja, determinada norma é aplicada quando outra, que proteja o bem jurídico de maneira mais incisiva, não puder ser aplicada por disposição expressa. No caso específico desta AIJE é possível que o argumento tenha sido manejado em relação ao pedido de designação de nova audiência para oitiva dos quatro depoentes faltosos que foram arrolados nas contestações de JOSÉ BRAGA BARROZO e FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO. Contudo, nesse pormenor foram explicitadas pelo juízo as razões pelas quais foram indeferidas tais oitivas, senão vejamos:
“Em sequência, o MM Juiz Eleitoral INDEFERIU a designação de nova audiência para ouvir as testemunhas Luzia Raquel Andrade da Silva, Oseias Montenegro Barbosa, Denis Anderson da Rocha Bezerra e José Jeová Souto Mota, e assim o fez pelos motivos seguintes: a) a defesa dos acionados José Braga Barrozo e Francisco Gardel Mesquita Ribeiro trouxe aos autos 07 (sete) ofícios notificatórios supostamente recebidos por testemunhas por si arroladas, dentre as quais 05 (cinco) se fizeram presentes, contudo, os 02 (dois) ofícios pretensamente recebidos por JOSÉ JEOVÁ SOUZA MOTA e DENIS ANDERSON DA ROCHA BEZERRA continham apenas a data de recebimento e assinaturas ilegíveis, razão por que seria impossível atestar que tais assinaturas efetivamente haviam partido das aludidas testemunhas; b) a defesa poderia ter provado de forma consistente que as assinaturas haviam partido do punho dos respectivos destinatários, e para tanto poderiam ter submetido aqueles documentos a reconhecimento de firma em cartório, ou mesmo poderiam ter optado pela via da notificação extrajudicial, com diligência realizada por serventuário a quem é conferida fé pública por lei; c) no caso específico da testemunha JOSÉ JEOVÁ SOUZA MOTA, por se tratar de deputado estadual, goza da prerrogativa constitucional (CF/88, art. 53, §6º) de se recusar a depor sobre informações recebidas ou prestadas em razão do exercício do mandato, nem sobre as pessoas que lhes confiaram ou deles receberam informações; d) os parlamentares, para preservar sua liberdade de atuação assim como a independência do Parlamento, acham-se desobrigados do dever de prestar depoimento em juízo, relativamente às informações recebidas ou prestadas em razão do exercício do mandato; e) como consectário natural dessa prerrogativa constitucional, mesmo no âmbito do processo penal, resta legalmente impossível que o juiz aplique contra o parlamentar qualquer uma das sanções previstas nos arts. 218 e 219 do CPP, tais como condução coercitiva e multa, e por muito maior razão seria legalmente inadmissível a condução de um parlamentar para ser ouvido numa AIJE, cuja natureza é extrapenal; f) relativamente às testemunhas Luzia Raquel Andrade da Silva e Oseias Montenegro Barbosa, a defesa sequer se deu ao trabalho de comprovar que as mesmas teriam sido previamente convocadas a participar da audiência instrutória, e por isso mesmo não restava devidamente demonstrada a alegada recusa injustificada de ambas; g) especificamente quanto à testemunha Luzia Raquel Andrade da Silva, ainda que a mesma tivesse comparecido, seria recusada pelo juízo por se trata de testemunha suspeita, nos moldes do art. 447, §3º, inciso II do CPC/2015, eis que por determinação do Juízo Eleitoral da 54ª Zona, não apenas foi cumprido mandado de busca e apreensão na residência da dita senhora, como ainda foi ela afastada das funções de funcionária terceirizada da Delegacia Regional de Santa Quitéria, ante os ponderáveis indícios de que estaria repassando informações policiais sigilosas a um réu foragido, que integra a facção Comando Vermelho”.
e) Quebra do sigilo bancário, fiscal e financeiro dos promovidos Leandro, Edneudo e Braga:
Inicialmente, quanto a este tópico, cumpre frisar que o promovido JOSÉ BRAGA BARROZO é o titular de seus próprios sigilos bancário, fiscal e financeiro, e por isso mesmo não necessitava de qualquer determinação judicial para se valer das informações bancárias, fiscais e financeiras sobre sua própria pessoa. Por consequência, caso entendesse oportuno poderia ter trazido aos autos seus extratos bancários relativos ao período da campanha eleitoral, sua declaração de imposto de renda, ou quaisquer outros documentos de sua titularidade e que estivessem protegidos por lei.
Quanto aos sigilos bancário, fiscal e financeiro de outros dois acionados, este juízo deferiu ainda em 30.12.2024, e por isso mesmo foram requisitadas informações junto ao Sisbajud e Infojud, as quais foram anexadas aos autos por meio de certidão de 15.01.2025 (Id. 124532614). Precisamente por isso foram anexadas aos autos declarações de ajuste anual de IRPF 2024-2023 de JOSÉ BRAGA BARROZO e FRANCISCO LEANDRO FARIAS DE MESQUITA, assim como foi igualmente anexado extrato do Infojud que indicou a ausência de declarações de imposto de renda de FRANCISCO EDNEUDO DE LIMA FERREIRA, relativas ao exercício 2024-2023. E posteriormente, por certidão de 24.01.2025, foi coligido aos autos extrato do Sisbajud que apontou os relacionamentos bancários dos acionados JOSÉ BRAGA BARROZO, FRANCISCO LEANDRO FARIAS DE MESQUITA e FRANCISCO EDNEUDO DE LIMA FERREIRA (Id. 124574184).
Tais documentos demonstram que houve efetiva quebra de sigilos fiscal, financeiro e bancário, ainda que este último não tenha resultado na juntada de extratos bancários relativos às 08 (oito) contas mantidas por Francisco Leandro Farias de Mesquita, às 16 (dezesseis) contas mantidas por Francisco Edneudo de Lima Ferreira, e às 03 (três) contas mantidas por José Braga Barrozo. Conforme já salientado, este último não precisava de determinação judicial para trazer aos autos os extratos de suas próprias contas, e poderia tê-lo feito para demonstrar a ausência de depósitos seus em favor das contas dos demais acionados, ou em proveito de Daniel Claudino de Sousa, ou de qualquer outro membro faccionado do Comando Vermelho.
f) Sigilo telemático de Daniel Claudino de Sousa (“Da30”):
Acerca da quebra do sigilo telemático do indivíduo conhecido como “Da30”, este juízo já apreciou a matéria através de decisório de 01.04.2025 (Id. 124878720), in verbis:
“Ademais, sobre o requerimento de juntada do inteiro teor das conversas extraídas e/ou ainda contidas nos telefones celulares de posse ou propriedade de DANIEL, vulgo DA30, em sua integralidade, bem como das demais realizadas nos processos criminais ou inquéritos mencionados, entendo ser inviável e desnecessário promover a transcrição de todas as conversas encontradas no aparelho, sendo imprescindível que se relate aquilo que interessa ao esclarecimento dos fatos investigados, não logrando o investigado comprovar qualquer prejuízo ao contraditório e ampla defesa. Destaco que promover a juntada na íntegra dos arquivos encontrados no aparelho celular não se mostra compatível com o rito processual da AIJE, podendo causar embaraço processual. Portanto, INDEFIRO tal pleito”.
g) Indeferimento de oitiva de quatro depoentes arrolados pela defesa:
Quanto às razões que ensejaram o indeferimento dos quatro depoentes faltosos, este juízo RATIFICA tudo quanto já exposto na preliminar do item “d”, e que se encontra devidamente consignado na respectiva ata da audiência instrutória una de 14.04.2025. Demais disso, caso tivesse havido alguma teratologia nos fundamentos jurídicos invocados por este juízo, naturalmente que os habilidosos patronos da defesa poderiam ter buscado guarida na instância superior, inclusive através de ação mandamental.
Não o fizeram por perceberem a solidez e consistência das razões pelas quais este juízo rechaçou a manobra nitidamente protelatória outrora utilizada, e que se tornou tanto mais evidente na medida em que foi arrolado para servir como testemunha um deputado estadual que goza da prerrogativa constitucional (CF/88, art. 53, §6º) de se recusar a depor sobre informações recebidas ou prestadas em razão do exercício do mandato, nem sobre as pessoas que lhes confiaram ou deles receberam informações.
De fato, este juízo salientou que os parlamentares, para preservar sua liberdade de atuação assim como a independência do Parlamento, acham-se desobrigados do dever de prestar depoimento em juízo, relativamente às informações recebidas ou prestadas em razão do exercício do mandato.
Destarte, como consectário natural dessa prerrogativa constitucional, mesmo no âmbito do processo penal, resta legalmente impossível que o juiz aplique contra o parlamentar qualquer uma das sanções previstas nos arts. 218 e 219 do CPP, tais como condução coercitiva e multa, e por muito maior razão seria legalmente inadmissível a condução de um parlamentar para ser ouvido numa AIJE, cuja natureza é extrapenal.
h) Indeferimento de diligências requeridas pela defesa ao final da audiência instrutória:
Todas as diligências pretendidas pelos patronos da defesa de JOSÉ BRAGA BARROZO e FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO restaram consignadas na ata da audiência una realizada em 14.04.2025 (Id. 124863500), e por decisão de 01.05.2025 foram todas apreciadas e denegadas, senão vejamos:
“Dispõe o art. 5°, §1º da LC nº 64/90 que “as testemunhas do impugnante e do impugnado serão ouvidas em uma só assentada”, e consoante o § 2° do mesmo dispositivo, “nos 5 (cinco) dias subsequentes, o Juiz, ou o Relator, procederá a todas as diligências que determinar, de ofício ou a requerimento das partes”. Contudo, é necessário ponderar que somente devem ser deferidas diligências que sejam efetivamente necessárias ao deslinde da causa. Aliás, quanto a isso, cumpre ponderar que até mesmo no âmbito do processo penal é recomendado ao juízo a rejeição de diligências inúteis ou protelatórias. Quanto ao ponto, se mostra consolidada a jurisprudência do STJ, senão vejamos: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PEDIDO INDENIZATÓRIO. CONTRATO DE DEPÓSITO. CACAU. MAGISTRADO. DESTINATÁRIO FINAL DA PROVA. INDEFERIMENTO. PROVAS INÚTEIS OU PROTELATÓRIAS. REEXAME DE FATOS E PROVAS. INVIABILIDADE. SÚMULA Nº 7 DO STJ. CONTRATO AGRÍCOLA. SECA. PRAGA. IMPREVISIBILIDADE. NÃO CARACTERIZAÇÃO. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. O magistrado é o destinatário final das provas, cabendo a ele aferir a conveniência e necessidade, de modo que devem ser indeferidas as diligências inúteis ou meramente protelatórias, nos termos da parte final do art. 370 do NCPC.(…) PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PRONÚNCIA. INDEFERIMENTO MOTIVADO DE PROVA. AUSÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA. ALEGADA NULIDADE POR OFENSA AO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. NÃO OCORRÊNCIA. VIOLAÇÃO DO ART. 155 DO CPP. NÃO CONFIGURADA. PROVAS TESTEMUNHAIS PRODUZIDAS EM JUÍZO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A jurisprudência desta Corte Superior é firme no sentido de que cabe ao juiz, como destinatário final das provas, avaliar e deferir a produção de provas que considerar necessária à formação do seu convencimento, de modo que pode entender pelo indeferimento das diligências inúteis ou meramente protelatórias. (…). No mesmo sentido se encontra cristalizada a jurisprudência do Colendo TSE, acerca de diligências inúteis, senão vejamos: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO ORDINÁRIO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2022. AIJE. GOVERNADOR. VICE-GOVERNADOR. CANDIDATOS ELEITOS. ABUSO DO PODER POLÍTICO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. UTILIZAÇÃO INDEVIDA. PROGRAMA SOCIAL. NÃO PROVIMENTO DO RECURSO. SUPOSTO VÍCIO. CONTRADIÇÃO. INEXISTÊNCIA. REJEIÇÃO. (…) Na análise da questão preliminar suscitada pelo recorrente, foi peremptoriamente rechaçada a ocorrência de nulidade decorrente de cerceamento no exercício do direito de defesa. Assentou-se a possibilidade de indeferimento, por decisão fundamentada, de diligências inúteis ou protelatórias, quando já formada a convicção sobre o mérito da controvérsia a partir do conjunto probatório que guarnece os autos, na linha, inclusive, do que preconiza a jurisprudência deste Tribunal Superior, orientada pela necessária celeridade que se deve imprimir à dinâmica dos feitos eleitorais. (…). ELEIÇÕES 2022. RECURSO ORDINÁRIO. AIJE. GOVERNADOR. VICE-GOVERNADOR. ABUSO DO PODER POLÍTICO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. CANDIDATOS ELEITOS. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. POSSIBILIDADE. NECESSIDADE. DECISÃO FUNDAMENTADA. AUSÊNCIA DE VÍCIO FORMAL. RECURSO IMPROVIDO. (…) 2. Na linha da jurisprudência do TSE, é possível o julgamento antecipado da lide, inclusive em feito sujeito ao rito do art. 22 da LC nº 64/1990, desde que devidamente fundamentada e os elementos constantes dos autos sejam suficientes para o exame da controvérsia. 3. Essa compreensão encontra apoio no art. 370, parágrafo único, do CPC, cuja redação afirma que o juiz poderá indeferir, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias, desde que já tenha formado sua convicção sobre o mérito da controvérsia. No caso em exame, este juízo percebe pouca ou nenhuma utilidade nas diligências solicitadas pela defesa dos dois primeiros acionados, isto pelas razões seguintes: a) A quebra de sigilo bancário não foi produzida, quer logo após o recebimento formal da petição inicial, quer em momento anterior à colheita da prova oral, e segundo se depreende da manifestação do MPE ao final da audiência, este evidenciou desistência tácita daquele pleito; b) A oitiva de Luciano Maia, Daniel Claudino, Francisco Edneudo e Francisco Leandro não acrescentaria informações relevantes ao processo, eis que: b.1) Luciano Maia já foi ouvido pela Polícia Federal e negou qualquer envolvimento nos fatos descritos na exordial do MPE; b.2) Daniel Claudino já prestou depoimento em sede de acordo de colaboração premiada; b.3) Francisco Edneudo e Francisco Leandro figuram ambos como promovidos nesta AIJE e por isso mesmo não podem ser ouvidos como testemunhas; c) Quanto à pretendida remessa de ofício requisitório à Delegacia de Polícia Civil de Santa Quitéria para juntar boletins de ocorrência seria inócua, pois segundo as duas testemunhas do rol ministerial, ambos delegados, os eleitores por eles ouvidos de maneira informal, normalmente moradores de residências que tiveram seus muros com pichações veiculando ameaças do Comando Vermelho demonstraram medo de formalizar denúncias, razão por que resulta clara a inexistência de registros formais desses fatos. Isto posto, ante os fatos e fundamentos jurídicos acima explicitados, INDEFIRO as diligências requestadas pelos nobres patronos da defesa, e com arrimo no art. 22, X da LC nº 64/90, declaro o encerramento da instrução processual, e concedo às partes o prazo comum de 02 (dois) dias para que ofertem suas alegações finais escritas”.
Isto posto, antes as razões fáticas e jurídicas acima explicitadas, NÃO CONHEÇO das circunstâncias preliminares indevidamente “requentadas” pela defesa dos dois primeiros acionados.
2.2 Do mérito
2.2.1 Síntese das imputações do MPE e das teses defensivas
Quanto ao mérito desta AIJE, é oportuno sintetizar as imputações feitas pelo MPE, bem como os argumentos de defesa apresentados pelos patronos de três dos cinco acionados, notadamente porque KYLVIA MARIA DE LIMA OLIVEIRA e FRANCISCO EDNEUDO DE LIMA FERREIRA se mantiveram silentes após serem citados, e por isso foi decretada a revelia de ambos, nos termos do art. 345, inciso II, do CPC/2015.
a) A petição inicial do MPE asseverou: a.1) ocorrência de pichações veiculando ameaças contra eleitores de Tomás Figueiredo durante a campanha eleitoral de 2024; a.2) ocorrência de ameaças a eleitores de Tomás Figueiredo, através de mensagens telefônicas e telemáticas; a.3) esvaziamento dos atos de campanha do multicitado candidato Tomás Figueiredo, por meio das ameaças de agressões físicas e danos aos veículos de seus eventuais apoiadores; a.4) ocorrência de ligação com ameaça de que o cartório eleitoral da 54ª Zona viesse a ser incendiado; a.5) descoberta de mensagens telemáticas em que criminosos faccionados do Comando Vermelho orientavam os executores das pichações para que omitissem o nome do candidato BRAGA, a fim de ocultar que estavam empenhados em favorecê-lo no pleito majoritário de Santa Quitéria; a.6) ocorrência de compra de veículo de luxo em Fortaleza, e subsequente transporte do mesmo até a capital fluminense, para ser entregue dentro da Favela da Rocinha ao criminoso conhecido como “Paulinho Maluco”, que seria um dos líderes do Comando Vermelho, natural de Santa Quitéria, e que teria ordenado a viagem de Daniel Claudino (Da30) até Santa Quitéria para coordenar as ações criminosas voltadas a prejudicar a candidatura de Tomás Figueiredo e favorecer a candidatura de José Braga Barrozo; a.7) constatação de financiamento espúrio da campanha da então candidata KYLVIA MARIA DE LIMA OLIVEIRA pelo faccionado Daniel Claudino (Da30).
b) A contestação de JOSÉ BRAGA BARROZO alegou: b.1) ausência de participação do contestante em quaisquer atos de coação de eleitores durante a campanha eleitoral de 2024; b.2) existência de prévia animosidade entre “Paulinho Maluco” (também conhecido como 12) e o candidato Tomás Figueiredo”; b.3) fragilidade do acervo probatório; b.4) o cadáver encontrado durante a campanha eleitoral não se refere ao município de Santa Quitéria, mas a evento criminoso ocorrido em Varjota; b.5) inexistência de vínculo político entre o contestante BRAGA e a então candidata KYLVIA; b.6) ausência de efetiva repercussão das pichações veiculando ameaças no resultado do pleito eleitoral de Santa Quitéria.
c) A contestação de FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO alegou: c.1) ausência de qualquer referência ao nome do contestante nas ações que teriam caracterizado abuso do poder econômico ou político em Santa Quitéria, durante a campanha eleitoral de 2024; c.2) inocorrência de ação ou omissão do contestante para favorecer a chapa majoritária por sia composta durante o pleito de 2024.
d) A contestação de FRANCISCO LEANDRO FARIAS DE MESQUITA alegou: d.1) ausência de comprovação de conduta ilícita, pois a mera alusão a uma viagem do contestante ao Rio de Janeiro, ainda que ocupasse cargo comissionado na Prefeitura de Santa Quitéria, não é suficiente para caracterizar abuso de poder político ou econômico, tampouco qualquer tipo de conluio com organização criminosa; d.2) nulidade do Relatório Técnico nº 007/2024, emitido pelo Departamento de Polícia Judiciária do Interior Norte; d.3) legalidade da nomeação e do exercício funcional do contestante junto à Prefeitura de Santa Quitéria; d.4) inexistência de gravidade suficiente das ações atribuídas ao contestante para configurar abuso de poder político ou econômico; d.5) necessidade de aplicação do princípio da responsabilidade subjetiva.
2.2.2 Do acervo probatório
A presente AIJE foi deflagrada em 18.12.2024, e nela foram produzidas provas documentais e provas orais, consistentes estas na colheita de 10 (dez) depoimentos, na audiência una de 14.04.2025, dos quais 04 (quatro) foram ouvidos como testemunhas, e 06 (seis) foram ouvidos como meros declarantes.
A propósito do valor probatório do depoimento prestado por testemunhas, cumpre invocar as lúcidas lições do respeitado jurista Ionilton Pereira do Vale, in verbis:
“O valor probatório do depoimento testemunhal é relativo, embora certos autores entendam que é a prova por excelência no processo penal. Registre-se que no direito brasileiro não vigora o brocardo testis unus, testis nullus, assim o depoimento de uma só testemunha é válido para a condenação do acusado, desde que coerente com outras provas, como a pericial, por exemplo. Por outro lado, cumpre recordar que não raras vezes as ações penais são propostas a partir de inquéritos policiais, e nestes foram ouvidas outras testemunhas, cujos depoimentos nem sempre podem ser confirmados em juízo, seja por falecimento superveniente da testemunha ou da vítima, seja porque não foram elas localizadas durante a instrução criminal. Nesse caso, o juiz pode agregar às provas judicializadas, aquelas que foram produzidas na esfera inquisitorial, mesmo porque ambas as partes tiveram a oportunidade de rebater ou impugnar seus conteúdos”2.
E se o valor probatório da prova testemunhal já pode ser reputado relativo, cautela redobrada deverá ter o magistrado ao apreciar o depoimento de meros declarantes. Quanto ao ponto, Ionilton Vale adverte:
“Após a qualificação da testemunha, pode eventualmente haver a contradita, que é a impugnação ao depoimento que está prestes a ser colhido, e isto se dá quando haja suspeita de parcialidade da testemunha, por força de parentesco, amizade íntima, interesse na causa, falsa identidade ou impossibilidade de depor por força do art. 207 do Código de Processo Penal, em razão da função, ofício, profissão ou, ministério. Com a contradita, surgem para o juiz dois caminhos: acolher ou rejeitar a contradita. Na primeira hipótese, o juiz não aceita a contradita. Nesse caso, a testemunha depõe normalmente, após a fórmula “aos costumes nada disse”, trazendo o objeto concreto de seu depoimento. A contradita é faculdade das partes, podendo fazer constar no termo de audiência, os motivos da contradita, concedendo o juiz, a palavra oral, para que indique a parte os motivos pelos quais formulou a contradita. Em eventual recurso, as partes podem levar ao tribunal o conhecimento da eventual irregularidade. No segundo caso, o juiz aceita a contradita. Surgem, então, dois caminhos para o juiz. O primeiro deles consistirá na exclusão do depoimento. A exclusão só se dará nos casos do art. 207 do CPP, por força do art. 214 do mesmo diploma, segundo o qual antes de iniciado o depoimento as partes poderão contraditar a testemunha ou arguir circunstâncias ou defeitos, que a tornem suspeita de parcialidade, ou indigna de fé. O juiz fará consignar a contradita ou arguição e a resposta da testemunha, mas só excluirá a testemunha ou não lhe deferirá compromissos nos casos previstos nos arts. 207 e 208 do CPP, ou seja, a exclusão só se dará nos casos enumerados no art. 207. O outro caminho é o não deferimento do compromisso, caso a contradita recaia em algumas das pessoas enumeradas no art. 208 do CPP, ou seja, aos doentes e deficientes mentais e aos menores de 14 (quatorze) anos, ou às pessoas a que se refere o art. 206 do CPP, tais como o ascendente ou descendente, o afim em linha reta, o cônjuge, ainda que desquitado, o irmão e o pai, a mãe, ou o filho adotivo do acusado”3.
Posição muito semelhante é defendida por Humberto Theodoro Júnior, no âmbito do processo civil, de aplicação subsidiária aos feitos eleitorais, senão vejamos:
“Deplorada por muitos, dada a notória falibilidade humana, e pelo mau uso que não poucos inescrupulosos fazem do testemunho, a verdade é que o processo não pode prescindir do concurso das testemunhas para solucionar a grande maioria dos litígios que são deduzidos em juízo. Daí ver Bentham nas testemunhas “os olhos e ouvidos da Justiça”. Por isso mesmo, para o nosso Código “a prova testemunhal é sempre admissível, não dispondo a lei de modo diverso” (art. 400). (…) Dentro do sistema do livre convencimento motivado (art. 131), a prova testemunhal não é mais nem menos importante do que os outros meios probatórios, a não ser naqueles casos em que a lei exija a forma solene para reconhecer eficácia ao ato jurídico. Nas hipóteses comuns, o valor probante das testemunhas será aferido livremente por meio do cotejo com as alegações das partes e com os documentos, perícias e mais elementos do processo”4.
O renomado jurista paulista adverte, contudo, sobre o mitigado valor probatório que deve ser conferido aos depoimentos prestados pelos meros declarantes, senão vejamos:
“Qualquer pessoa, desde que não seja considerada, pela lei, incapaz, impedida ou suspeita, pode ser chamada a depor como testemunha. Até as impedidas ou suspeitas, porém, poderão ser ouvidas pelo juiz, “sendo estritamente necessário”. Mas seus depoimentos serão prestados independente de compromisso (art. 415) e o juiz lhes atribuirá o valor que possam merecer (art. 405, §4º)”5.
Tais ponderações se mostram necessárias, aprioristicamente, porque nem todos os 10 (dez) depoentes ouvidos na audiência instrutória una de 14.04.2025 merecem a mesma credibilidade, nomeadamente no caso dos 06 (seis) declarantes, que em algum momento revelaram versões tendenciosas, em maior ou menor grau, e cujas fragilidades serão devidamente explicitadas na fundamentação desta sentença, no momento oportuno.
2.2.3 Da análise das imputações ministeriais
a) Ocorrência de pichações veiculando ameaças contra eleitores de Tomás Figueiredo durante a campanha eleitoral de 2024:
As diversas pichações veiculando ameaças contra eleitores e apoiadores do então candidato Tomás Figueiredo foram objeto de apuração do Procedimento Preparatório Eleitoral nº 06.2024.00002512-6, instaurado em 26.08.2024, e no bojo do qual foram colhidas declarações do candidato prejudicado, e anexadas não menos que 16 (dezesseis) fotografias de locais distintos onde foram grafadas as ameaças, com conteúdos variados, tais como: “Se apoia o Tomás vai entrar no problema com a tropa do Paulinho Maluco”, ou “Fora Tomás 15. VCV”, ou “Sair nois vem e bota fogo em tudo”, ou “Vai entrar no problema. Fora Tomás”, ou “Quem apoia o Tomás vai arruma problema com a tropa vai entrar na bala. Ass. Paulinho Maluco”, ou “Quem apoia o Thomas vai entrar no problema com a tropa”, ou “Bala no 15” (Id. 124520260 e Id. 124520668).
O procedimento apuratório acima aludido também foi instruído com prints de tela de mensagens de aplicativo originárias de usuário identificado como “Bala num Tomas”, e através do qual foi ameaçado um eleitor que possuía um estabelecimento comercial no Bairro Piracicaba, e que foi perquirido se estava atuando como cabo eleitoral de Tomás Figueiredo. Foi também anexada fotografia evidenciando marcas de tiros contra o portão da residência do Sr. José Mendonça, eleitor de Santa Quitéria, e residente na Rua Maria Catunda, 565, Bairro Piracicaba.
No mesmo sentido, o procedimento investigatório foi instruído com um segundo print de tela em que o criminoso, após postar suas ameaças, veio a apagá-las, mantendo intactas apenas duas delas, com os dizeres “Recado tá dado ok?” e “Boa sorte”. Além disso, o criminoso autor dessa segunda ameaça enviou um vídeo no qual aparece o eleitor intimidado, o qual é xingado como “cabo eleitoral de merda”.
Numa terceira mensagem anexada ao procedimento investigatório o criminoso se dirige a um outro eleitor identificado com Sr. Cícero, e o qual foi destinatário de mensagem nada amistosa com o seguinte teor: “Lhe avisa seu Cícero, nessa política nois vai foca em cima dos cabos eleitorais do tomas Figueiredo, se o senhor não quiser nenhum problema com o crime da cidade o senhor fica de boa, sem ser cabo eleitoral de tomas ok”. E numa quarta mensagem, a eleitora ameaçada é identificada com Carlo Ionara, moradora da COHAB, cuja residência seria vizinha à casa do indivíduo “Marcão do esporte”.
O mesmo procedimento investigatório contempla termo de declarações prestadas pelo chefe do cartório eleitoral da 54ª Zona, ouvido em 04.12.2024, e que relatou ter tomado conhecimento que logo no início da campanha de 2024, em meados de agosto, tomou conhecimento que diversos eleitores vinham ligando para o cartório eleitoral e informavam estarem recebendo ameaças e coações por meio de ligações telefônicas e telemáticas anônimas, de indivíduos que diziam ser integrantes da facção criminosa Comando Vermelho, com a ordem de que não votassem no candidato Tomás Figueiredo, sob pena de serem expulsos da cidade. Relatou ainda que: a) o candidato prejudicado compareceu ao cartório eleitoral, acompanhado de sua esposa, Dra. Cândida, e de seu advogado, Dr. Breno Paiva, para informar sobre as pichações contendo ameaças contra sua pessoa e contra seus eleitores e apoiadores; b) o próprio cartório eleitoral foi alvo de uma ligação telefônica anônima, ocorrida em 18.09.2024, realizada a partir do terminal telefônico (88) 988.2633, atendida pela funcionária Iranilda, a qual ficou muito nervosa após escutar a ameaça de que o cartório eleitoral seria atacado e os servidores seriam assassinados caso não parassem com as decisões contrárias “aos irmãos”; c) houve uma segunda ligação telefônica anônima na qual o criminoso desafiava só servidor a “botar a cara na rua”; ante a gravidade das ameaças contra a própria justiça eleitoral o fato foi informado à Polícia Federal e ao Ministério Público, de modo que o acesso ao cartório eleitoral passou a ser vigiado 24hs por dia; d) não teve conhecimento sobre quem seriam os responsáveis pelas pichações, sabendo apenas que eram pessoas ligadas ao Comando Vermelho; e) após evento de campanha do candidato Tomás Figueiredo, realizado em 28.09.2024, chegaram ao cartório eleitoral novas informações de eleitores e apoiadores de Tomás, relatando terem sofrido ameaças por terem participado daquele evento, e na reta final da campanha os eleitores de Tomás vinha recebendo ordens de desocupação de suas residências, sob pena de levarem “bala na cara”; f) o clima de tensão coletiva ocasionou o envio de reforço de policiamento para Santa Quitéria; g) ante a abrangência das ameaças não tem dúvida de que o então candidato Tomás Figueiredo foi prejudicado em sua campanha.
A exordial do MPE foi igualmente instruída com 03 (três) relatórios técnicos emitidos pelo Departamento de Inteligência da Polícia Civil do Ceará, e cujos conteúdos serão adiante sintetizados, sendo oportuno destacar que os três relatórios aludem a diversas mensagens que dizem respeito às duas primeiras imputações consignadas na peça exordial do Ministério Público Eleitoral, quais sejam as pichações veiculando ameaças contra eleitores e apoiadores do então candidato Tomás Figueiredo, as ordens para que fossem expulsos de Santa Quitéria eleitores que se manifestassem nas redes sociais em prol da candidatura de Tomás Figueiredo, e as ordens de destruição de veículos com adesivos do aludido candidato, bem como a prática de atentados contra estabelecimentos comerciais que abrigassem eleitores durante os eventos de campanha de Tomás Figueiredo:
a.1) Relatório Técnico nº 234/2024/DIP/DGPC – 11/11/2024 (Id. 124520322), gerado a partir da extração de dados de um dos aparelhos celulares (iPhone XR, IMEI 1 357366098102217, IMEI 2 57366098416435) utilizado pelo criminoso faccionado Daniel Claudino de Sousa, conhecido como “Da30”, o qual revelou que: a) foram identificados 1.038 (um mil e trinta e oito) chats no celular em análise; b) o usuário do aparelho vinha adotando o hábito de apagar as mensagens ameaçadoras para não deixar rastros dos crimes cometidos, e orientava seus parceiros do crime a fazerem o mesmo; c) um dos terminais identificados na agenda do aparelho do indivíduo “Da30” pertencia à então candidata KYLVIA MARIA DE OLIVEIRA LIMA, a qual postulava um cargo de vereadora em Santa Quitéria; d) “Da30” mantinha articulação permanente com outros criminosos com vistas a tentar fortalecer a candidatura de Kylvia; e) um dos comparsas foi identificado como PL TRAPIÁ, o qual se tratava de PEDRO LUCAS DE SOUSA PEREIRA; e) em conversa datada de 31.07.2024 a então candidata Kylvia expressa seu reconhecimento pelo apoio recebido de “Da30”, e naquele mesmo dia visitou a residência dos pais do criminoso, ocasião em que demonstra ter conhecimento sobre o acesso dele a armas, bem com de sua condição de liderança na facção criminosa; f) em ligação feita em 01.08.2024 “Da30” confirma seus esforços em prol de atrair eleitores para Kylvia; g) em diálogo realizado em 30.07.2024 Kylvia é apontada como candidata do Comando Vermelho; h) em áudio remetido naquela mesma data, o criminoso “Da30” orienta seu comparsa PL TRAPIÁ a compartilhar a logomarca da campanha de Kylvia e pedir votos em favor da mesma; i) em conversa realizada em 16.09.2024 “o criminoso “Da30”- orienta seu interlocutor a adiar ataque contra seus rivais porque estava na expectativa de receber fuzis encaminhados por outro marginal identificado pela alcunha de “Dazarea”, e que seriam utilizados em investida a ser feita contra rivais residentes nos bairros Pedreiras e Ararinha; j) em outro áudio enviado em 16.09.2024 “Da30” se reporta a uma investida a ser feita em Varjota para matar rivais; k) em 28.07.2024 “Da30” mantém contato com o também faccionado Francisco Girvando Ferreira de Oliveira, conhecido pelas alcunhas de “Rikelme” e “Argentino”, e pede autorização para que o então candidato “Zé do Povo” fizesse visitas de cunho eleitoral na região de Trapiá, em Santa Quitéria, e pede que Rikelme obtenha apoio de Nenzinho da boate à candidatura de Kylvia, sob pena de que a boate dele fosse fechada pelo crime; l) em 30.07.2024 o criminoso “Da30” enviou foto da então candidata Kylvia por ocasião de uma visita por ela realizada a eleitores do Distrito de Trapiá; m) em conversa de 19.07.2024 Rikelme pediu a “Da30” que enviasse a contabilidade do tráfico de drogas na região, e informa uma chave pix em nome de KAIKY VICTOR FELIX CARDOSO, para através dela receber recursos de origem criminosa, e em resposta “Da30” informa os valores cobrados, bem como oferece pelos menos três fuzis distintos, todos identificados fotograficamente; m) em diálogo de 31.07.2024 Rikelme indaga “Da30” sobre as bancas de jogos em Varjota, e evidencia a atuação da facção criminosa em Santa Quitéria, Varjota e Ubajara; n) em diálogo de 08.12.2023 “Da30” recebe fotos de carregadores de armas diversas, e outros acessórios, os quais deveriam ser entregues na Rua São Clemente, nº 98, lojas 2 e 3; o) na mesma data ocorre envio de fotos de mais fuzis de calibre 7.62, os quais deveriam ser pagos através de pix para JADER GERALDO DE OLIVEIRA; p) seguem mensagens de oferta de uma metralhadora possivelmente feita em impressora 3D, bem como fuzil do modelo AK 47, com capacidade de disparar 50 e 100 tiros por minuto; q) em mensagens trocadas entre os dias 09 e 14.12.2024 “Da30” colhe informações do interlocutor identificado como “Carregadores” sobre o código de rastreio de armas já enviadas; r) em 29.06.2024 “Da30” troca mensagem com um interlocutor identificado como “Indio” e combinam ações para matar um rival de outra facção, mas este informa que está sem arma e pede que Vanessa seja escalada para levar uma arma até ele.
a.2) Relatório Técnico nº 235/2024/DIP/DGPC – 11/11/2024 (Id. 124520323), gerado a partir da extração de dados de outro aparelho celular (REALME NOTE 50, IMEI 1 865846072729106, IMEI 2 865846072719114 e terminar +5521986375953) utilizado pelo criminoso faccionado Daniel Claudino de Sousa, conhecido como “Da30”, o qual revelou que: a) há 878 (oitocentos e setenta e oito) chats, com diálogos mantidos com FP BRAVO e KAYKE RK, o qual havia ajustado com “Da30” encontro no Leblon; b) envio de maços de dinheiro contados por máquina, e que evidenciam importe aproximado de R$150.000,00 (cento e cinquenta mil reais); c) em 21.08.2024 KAYKE RK e “Da30” trocam mensagem e aquele se gaba que estaria muito bem, só “matando alemão” e ganhando dinheiro; d) em mensagem trocada em 12.09.2024 KAYKE RK informa sua chave pix para possível recebimento de dinheiro, e assim resta identificado seu nome civil (KAYKE VICTOR FELIZ CARDOSO), o qual também faz uso de outro terminal telefônico cadastrado em nome de FRANCISCO NADILSON BRITO VICENTE; e) em 05.08.2024 “Da30” comenta com um interlocutor, posteriormente identificado como sendo Nadilson, que o “chefe” tinha tirado tomo mundo da Varjora, e que assumira o comando daquela cidade; f) em diálogos travados a partir de 17.09.2024, com interlocutora que possivelmente fosse sua namorada, resulta claro que “Da30” teria deixado o Rio de Janeiro com destino a Santa Quitéria, de ônibus, e no dia seguinte já estava passando pelo estado da Bahia; g) pelo teor dos diálogos “Da30” revela sua hierarquia dentro do Comando Vermelho, na condição de conselheiro; h) em troca de mensagens realizada em 31.08.2024 com interlocutora identificada apenas como Maria, o criminoso “Da30” informa que responderia a um processo na seara eleitoral, e em novas mensagens trocadas em 11.09.2024 o mesmo elemento informa que seguiria ao Ceará para resolver assuntos pessoais; i) em 12.09.2024 a interlocutora Maria é identificada como MARIA FERNANDA FERNANDES DE SOUSA, a partir de sua chave pix, a qual seria usada pelo criminoso “Da30” para suas transações financeiras com dinheiro espúrio, eis que só dispunha de R$4.000,00 (quatro mil reais) em espécie; j) em 19.09.2024 Maria Fernanda recebe notícias de que “Da30” teria chegado ao Ceará, e já estava saindo para matar, mas não detalha quem seria sua vítima; k) foi identificado o terminal telefônico nº +558899921221, salvo com a identificação de SO FRETE 12, e cujo interlocutor seria ANASTÁCIO PAIVA PEREIRA, conhecido pelas alcunhas de “12”, “DAZAREA”, “Paizão” ou “Paulinho Maluco”, liderança do Comando Vermelho com atuação em Santa Quitéria, Hidrolândia, Varjota, Reriutaba, Ipu, Ipueiras e Guaraciaba do Norte, e que teria sido alvo de uma operação policial realizada pelo BOPE na Favela da Rocinha; l) em troca de mensagens realizada entre “12” e “Da30” no dia 19.09.2024, o primeiro ordena que todos os comparsas que acompanham “Da30” deveriam descer em Ipu, mas deveriam agir em Ararinha e Pedreiras (bairros de Varjota), a partir de 20.09.2024, quando então “12” dá orientações acerca das armas a serem utilizadas (1 fuzil, 2 pistolas, 1 espingarda calibre 12, munições e 2 granadas), mas recomenda cuidado a seus comandados para que não sejam descobertos; m) em mensagens trocadas em 25.09.2024 o criminoso “Da30” avisa que está em Santa Quitéria, envia um vídeo de uma arma, mas informa não ter as munições necessárias, ao que “12” responde que enviaria as munições; n) em mensagens trocadas em 30.09.2024 o criminoso “Da30” avisa que o “Magrão” foi baleado, e é indagado por “12” onde estariam os inimigos, bem como ordena que seus subordinados regressassem para Ararinhas a fim de expulsar os rivais criminosos, e em resposta “Da30” pede que seja enviada uma canoa para que possam fugir por água; o) em mensagens de 02.10.2024 o criminoso “Da30” informa que prosseguirá nos confrontos no bairro de Ararinhas e menciona que os criminosos rivais estariam sendo ajudados por Moésio, o qual deveria ser morto, mas pondera que nova investida só deveria ocorrer após passar a política, pois a cidade estaria mais tranquila; p) foi identificado nesse segundo aparelho o contato de Kylvia de Lima (terminal nº 5588996121482), candidata a vereadora em Santa Quitéria, e que troca diversas mensagens com o criminoso “Da30”, nas quais: p.1) solicita orientações sobre manuseio de arma; p.2) manifesta o desejo de acompanhar “Da30” até a Favela da Rocinha para conhecer homens solteiros; p.3) informa sobre a atuação de um tal Raimundo, escalado para ajudar na campanha de Kylvia; p.4) é cientificada que um indivíduo identificado como RUGAL GUINHA tinha recebido recomendação de “Da30” no sentido de que Kylvia tinha que ganhar de qualquer jeito; q) em mensagens trocadas em 08.08.2024 Kylvia pergunta a “Da30” sobre a percepção do chefe dele sobre as vendas (de drogas), sendo solicitada a pesquisar o nome de um indivíduo para saber se o mesmo realmente estava foragido, e demonstra ter conhecimento sobre a hierarquia da facção criminosa; r) em mensagens trocadas em 21.10.2024 “Da30”: r.1) envia áudio de uma eleitora de Santa Quitéria, segundo a qual seu voto seria de confiança, e informa a KYLVIA que estava comprando votos para ela na localidade Trapiá, que já teria gasto em favor da campanha dela mais do que o próprio BRAGA; r.2) reclama não ter recebido dinheiro do “chefe”, mas que outros comparsas já teria recebido o dinheiro deles; s) foi identificado o terminal telefônico nº 88993497333, salvo como JP TARUGA, o qual é cadastrado com chave pix em nome de JPG SERVICE BRASIL, com CNPJ nº 20.652.967/0001-65, e cujo titular foi identificado como sendo JOÃO PAULO LIRA CAVALCANTE, o qual é professor efetivo do município de Santa Quitéria, sem antecedentes criminais; t) em diálogo mantido entre JP TARUGA e “Da30”, este: t.1) informa sobre seu apoio à campanha de Kylvia e que as áreas sobre seu comando votariam nela; t.2) comenta sobre a venda de drogas, inclusive que cocaína estaria em falta; t.3) em mensagem de 12.09.2024 “Da30” informa que vai voltar ao Ceará para tomar o domínio do tráfico em Varjota; t.4) dias depois, já em Hidrolândia, “Da30” convida JP TARUGA para ir ao encontro dele, e que levasse também dois indivíduos, um dos quais o mensageiro do “12”, salientando que seria pago por esse serviço; t.5) logo em seguida JP TARUGA informa já ter recebido o valor de R$100,00 (cem reais), via pix realizado a partir da conta de MARIA FERNANDA FERNANDES DE SOUSA (namorada do “Da30”); u) há troca de mensagens com o terminal nº 558899113289, salvo como BEBEL, vinculado a uma chave pix registrada em nome de DALILA CARLA RODRIGUES DA SILVA, a qual é funcionária da Prefeitura de Santa Quitéria, lotada no Hospital Municipal, mas que se identificou como servidora da Secretaria de Cultura, no boletim de ocorrência policial nº 546-525/2024, sendo ainda irmã de ROMÁRIO RODRIGUES DOS SANTOS, que responde por homicídio em Sobral; v) em mensagens trocadas com “Da30” a partir de 08.08.2024 há indicação que DALILA: v.1) recebe pagamentos e os repassa ao “Da30”, tendo recebido valores das pessoas de Vinícius, de ALISSON SOUSA SOARES; v.2) é orientada a ocultar cocaína pertencente ao RIKELME (em 21.08.2024); v.3) pede permissão para postar um vídeo na qual ela e um homem aparecem numa moto (em 30.08.2024); v.4) é orientada por “Da30” a identificar um carro de som que estava num evento de campanha de Tomás Figueiredo, mas em resposta a mesma diz já saber que se trata de MARCOS CURTYSOM; w) foi identificado o terminal nº 558899661090, pertencente a ÍTALO RAMON SEVERO XEREZ, o qual troca mensagens com “Da30” nas quais: w.1) este envia prints de tela nos quais é identificado pela própria KYLVIA como sendo seu cabo eleitoral preferido; w.2) comenta a intenção de manter relações sexuais com a referida candidata, caso ela “desse mole”; w.3) é informado por Ítalo que Kylvia “dá mole até demais”; w.4) em mensagens trocadas em 03.08.2024 “Da30” informa sobre seu propósito de comprar um quilo de cocaína, e Ítalo pondera que a droga pode ser misturada e se transformar em três quilos; w.5) “Da30” combina que mandaria um de seus comparsas ao encontro de Ítalo para pegar a maconha, a qual aparece em fotografia enviada por Ítalo; w.6) “Da30” recomenda não apenas que seja retirado da droga o adesivo do “99” e colocasse o adesivo dele, como ainda que a droga seja pesada, e logo em seguida recebe fotografia da droga sendo pesada numa balança de precisão; w.7) em diálogo travado em 11.08.2024 o criminoso “Da30” informa que seguiria ao Ceará, mas não desejava que soubessem disso, pois pretendia recrutar comparsas para seguirem ao Paraná, pois lá havia um “papo de 30 milhões”, e indaga se Ítalo o acompanharia na empreitada; w.8) em 16.08.2024 o criminoso “Da30” envia foto da casa onde estaria morando na Rocinha, bem próximo à casa de Rikelme, relata sobre sua proximidade com este e com o criminoso “12”, alega ter expulsado uma das meninas do Rikelme porque a mesma estaria bagunçando na região, e teria obtido a concordância posterior de Rikelme; w.9) em 20.08.2024 “Da30” informa que Ibiapina e Mano Roger também estariam na Rocinha; w.10) em 22.08.2024 envia vídeo de um fuzil a ser entregue ao criminoso “12” e salienta que o Cigano teria comprado um fuzil banhado a ouro pela quantia de R$170.000,00 (cento e setenta mil reais); w.11) indagado por Ítalo, “Da30” informa que um fuzil AK47 custaria algo entre R$110.000,00 (cento e dez mil reais) e R$125.000,00 (cento e vinte e cinco mil reais); w.12) “Da30” orienta sobre como deveriam ocorrer as intimações aos eleitores e apoiadores de Tomás Figueiredo e ordena a pichação do muro de uma padaria em Santa Quitéria.
a.3) Relatório Técnico nº 249/2024/DIP/DGPC – 11/12/2024 (Id. 124520326), gerado a partir da extração de dados de outro aparelho celular (REALME NOTE 50, IMEI 1 865846072729106, IMEI 2 865846072719114 e terminar +5521986375953) utilizado pelo criminoso faccionado Daniel Claudino de Sousa, conhecido como “Da30”, o qual revelou que: a) foram identificados 878 (oitocentos e setenta e oito) chats, com diálogos mantidos entre o criminoso “Da30” e interlocutores variados, mas com foco nas tratativas realizadas dentro de três grupos específicos de Whatsapp, denominados “Jogadores natos”, Jogadores nato” e “Partido dos trabalhadores 13 PT”, e com especial atenção às conversas travadas no período de 23 de julho a 02 de outubro de 2024, b) os diálogos seguem detalhados dentro do espectro de cada um dos três grupos, senão vejamos:
b) 1º Grupo “Jogadores natos” foi criado em 13.04.2024, às 17:12hs, por usuário não identificado, sendo composto por 16 (dezesseis) integrantes, com destaque para algumas mensagens adiante detalhadas: b.1) em 02.08.2024 Rikelme pergunta pelos meninos que roubam os quais seriam necessários para atuar em situação não especificada; b.2) em 02.08.2024 Açogueiro 2L incita os participantes do grupo a irem atrás dos objetivos do Comando Vermelho, inclusive com execução de inimigos; b.3) diversos membros do grupo trocavam informações sobre localização de viaturas e policiais que faziam rondas em Santa Quitéria; b.4) em 03.08.2024 Rikelme afirma que a época das eleições seria favorável aos que entendem de conversão, e que isto favoreceria também as “banquinhas”, pois seriam uma boa fonte de renda; b.5) o usuário ADRIANO JB comentou que um candidato costumava pegar dinheiro com ele; b.6) ainda em 03.08.2024 Rikelme adverte aos demais sobre o início das atividades políticas; b.7) em 13.08.2024 Rikelme recomenda que a “boca” (de fumo) fosse abastecida com a melhor mercadoria, e na sequência aparece uma foto borrada que indica certo objeto sendo pesado em balança de precisão; b.8) em 15.08.2024 Rikelme ameaça aqueles que estivessem em grupos políticos de candidatos não apoiados por ele, adverte que havia infiltrados naqueles grupos, alerta que todos que não seguissem sua orientação seriam excluídos das ações do tráfico e teriam que viver de política, e ameaça atirar contra paredões de som e vidros de carros; b.9) em 16.08.2024 o usuário TAYSON relata sua preferência pela candidata Kylvia, informa que estaria preparando material de propaganda para ser postado nos perfis de Instagram dos demais membros do grupo, e salienta que “nossa família” (Comando Vermelho) precisava de um representante na Câmara Municipal de Santa Quitéria; b.10) logo em seguida, Rikelme informa que os candidatos apoiados pela facção seriam Kylvia Lima, Gabriel Filho e “BG para Prefeito”(José Braga Barrozo); b.11) em 16.08.2024 Rikelme pede que intensifiquem as publicações nas redes sociais para conseguir o apoio dos viciados em drogas, informa que drogas seriam usadas para comprar votos desses viciados, sendo sua ideia prontamente apoiada pelo criminoso “Da30” e também por TAYSON, o qual sugere que essa compra de votos ocorresse nos três dias anteriores ao pleito eleitoral; b.12) naquele mesmo dia, por volta das 18:48hs, Rikelme posta foto da propaganda eleitoral de Kylvia e recomenda esforço “pra eleger os nossos”; b.13) em 19.08.2024 Rikelme ordena que todas as casas que tivessem fotos do candidato Tomás, concorrente de José Braga Barrozo, fossem pichadas e que carros com adesivos do Tomás tivessem seus vidros e retrovisores quebrados, mas recomenda que não fosse colocado o nome de Braguinha nas pichações; b.14) naquele mesmo dia, ao giro das 17:54hs, Rikelme compartilha um texto contendo ameaças de morte a serem veiculadas em Independência, contra todos aqueles que “não fechassem com a tropa do Paulinho Maluco”; b.15) em 22.08.2024 Rikelme envia cartaz de um evento de campanha de Tomás Figueiredo a se realizar dois dias depois (em 24.08.2024, às 19hs), e volta a recomendar depredação de veículos que estivessem com adesivos de campanha dele, bem como depredação de bares que abrissem ou sediassem concentrações políticas de Tomás; b.16) em 24.08.2024 Rikelme informa ter sido autorizado pelo “Paizão” e recomenda pichações em todos os bairros de Santa Quitéria, com advertência de que as pessoas que apoiassem Tomás teriam problema com a “tropa do Paulinho Maluco”; b.17) em 25.08.2024 o usuário MENINO REI indaga quem teria “balinha de 10”, pois estaria “zerado” de maconha, e em resposta o usuário ADRIANO afirma dispor da droga; b.18) em 26.08.2024 Rikelme volta a cobrar pichações e vandalismo aos que manifestassem apoio ao candidato Tomás; b.19) em 28.08.2024 Rikelme encaminha mensagem de um mapa com possíveis áreas de atuação do Comando Vermelho dentro do Estado do Ceará, e por volta das 17:55hs do mesmo dia envia imagens dom adesivos que seriam usados para embalar suas drogas; b.20) em 02.09.2024, Rikelme informa que “o chefe amanheceu doido por problema”, e que queria todos os bairros de Santa Quitéria pichados até a noite daquele mesmo dia, além do que compartilha uma mensagem que teria recebido de “Paulinho Maluco” (também conhecido por 12); b.21) ainda no dia 02.09.2024, ao giro das 22:14hs, o usuário DISNEY compartilha 04 (quatro) fotos contendo as pichações exigidas por Rikelme; b.22) em 04.09.2024 o usuário ADRIANO JB compartilha dois vídeos contendo pichações de ameaça contra eleitores de Tomás, as quais teriam sido feitas provavelmente no Bairro Flores, e adverte que o Hotel Santo Expedito estaria lotado de policiais, inclusive do setor de inteligência policial; b.23) em 06.09.2024 Rikelme reclama do fechamento das “bocas de fumo” em virtude da grande quantidade de policiais em Santa Quitéria; b.24) em 07.09.2024 o usuário MENINO REI compartilha uma foto de um indivíduo segurando um cigarro de maconha; b.25) em 09.09.2024, após comentar que policiais estariam eliminando as pichações contendo ameaças a eleitores de Tomás Figueiredo, informa que também teriam apagado seu vulgo; b.26) em 14.09.2024 Rikelme compartilha imagem que estaria sendo indevidamente utilizada para aplicar golpes em nome de “Paulinho Maluco”; b.27) em 15.09.2024 o usuário MENINO REI remove Rikelme do grupo e adiciona MIRELLA SANTOS que cumprimento todos com a saudação “Fé tropa”, gerando a natural inferência que MIRELLA SANTOS fosse o novo nome de usuário que passaria a ser utilizado por Rikelme; b.27) em 17.09.2024 após comentarem sobre uma grande operação da Polícia Civil em Santa Quitéria, MIRELLA SANTOS (Rikelme) encaminha um print de uma postagem no Instagram e pede que os demais identificassem as pessoas que estavam parabenizando a ação policial, e logo em seguida o criminoso “Da30” não apenas compartilha foto de alguns policiais que participaram da operação reunidos num restaurante, como expressa seu desejo de ter uma granada para soltar no meio daquele grupo de policiais; b.28) em 18.09.2024 MIRELLA SANTOS (Rikelme) compartilha foto de tela de um dispositivo eletrônico contendo o número de um processo (0266760-62.2024.8.06.0001), com a indicação de que se tratava de um pedido de prisão preventiva protocolado na Comarca de Fortaleza, possivelmente na vara das ORCRIM; b.29) em 21.09.2024 MIRELLA SANTOS (Rikelme) pergunta quem teria maconha, e o usuário ALTERADO informa positivamente; b.30) naquele mesmo dia 21.09.2024 o usuário MENINO REI informa que o grupo de whatsapp seria encerrado e reiniciado posteriormente, e logo em seguida começa a remover todos os usuários;
c) 2º Grupo “Jogadores natos” foi criado em 21.09.2024, às 18:39hs, por usuário não identificado, sendo composto por 12 (doze) integrantes, com destaque para algumas mensagens adiante detalhadas: c.1) em 21.09.2024 o usuário PL SQ adiciona vários membros, dentre os quais SAMANTHA DIAS 99 e informa que “Paizão” estaria no grupo, gerando a inferência que aquele usuário seria RIKELME, pois em conversa com o criminoso “Da30” o usuário “PL Macarau” pede o contato de “Vandi” (um dos apelidos de Rikelme), e em resposta “Da30” envia o contato de Samantha; c.2) em diálogo com “Da30”, Rikelme envia sua foto no barbeiro, e em diálogos subsequentes daquele mesmo dia pede que TALISON seja adicionado, e logo adiante salva o contato como “Fubica”; c.3) em 22.09.2024 GUINHA pergunta se Rikelme estaria no grupo e ALTERADO informa positivamente, além do que Rikelme compartilha uma foto que aparenta ser de uma televisão; c.4) em 27.09.2024 o usuário EVANDRO DO DENDÊ pede aos demais que evitem tratá-lo por FB, e horas de depois indaga aos demais usuários se alguém teria maconha; c.5) em 28.09.2024 Rikelme volta a recomendar aos membros do grupo que compartilhassem mensagens de ameaça aos eleitores de Tomás Figueiredo; c.6) na mesma data, Rikelme revela sua preocupação diante de uma nova operação policial a ser realizada em Santa Quitéria, e que só teria sido vazada graças a um “pessoal de dentro” (informante da facção criminosa infiltrada dentro da própria delegacia, possivelmente a pessoa de LUZIA RAQUEL ANDRADE DE SILVA, a qual foi alvo de mandado de busca e apreensão ordenada por este juízo eleitoral, em 26.03.2025, no bojo do Proc. nº 0600012-49.2025.6.06.0054); c.7) em 29.09.2024 Rikelme recomenda que seja expulsa de Santa Quitéria uma mulher identificada como Geovana, e salienta que a ordem teria partido de “Paulinho Maluco”; c.8) naquele mesmo dia, o usuário 2L avisa que havia pessoas circulando por Santa Quitéria com camisas do “15” (número eleitoral do candidato Tomás), Rikelme ordena que os eleitores com tal vestimenta fossem agredidos, e ordena que os mesmos fossem expulsos da cidade; c.8) no mesmo dia 29.09.2024 Rikelme diz que Lázaro estaria na “mão dos vermes” (expressão atribuída à polícia, pelas facções criminosas), e logo adiante remove o usuário 2L, de modo a reforçar as evidências de que Lázaro, “2L” e “Açougueiro” seriam a mesma pessoa; c.9) ato contínuo, Rikelme passa a remover os demais usuários e assinala que era hora de criar um novo grupo;
d) Grupo “Partido dos Trabalhadores 13 PT” foi criado em 29.09.2024, às 06:02hs, por usuário identificado pela alcunha de FAIXA ROSA, sendo composto por 08 (oito) integrantes, com destaque para algumas mensagens adiante detalhadas: d.1) em 29.09.2024 o usuário EVANDRO DO DENDÊ envia mensagem contendo a imagem de uma lauda do Proc. nº 0266760-62.2024.8.06.0001 contendo referências aos nomes de “Vandi” (Rikelme) e “Fubica” (também conhecido como FB ou Taylon, alcunhas usadas por FRANCISCO IVANILSON MORAIS DOS SANTOS); d.2) naquele mesmo dia 29.09.2024, às 17:36hs, Rikelme compartilha um vídeo em que ele próprio passa a ser tatuado com uma imagem de mulher com maquiagem de palhaço, e às 18:22hs adverte que era chegado o momento de deflagrar o “Plano B”, consistente em efetuar disparos de armas de fogo contra portas de algumas residências de Santa Quitéria; d.3) às 18:38hs do dia 29.09.2024 Rikelme relaciona eleitores de Tomás Figueiredo que deveriam ser expulsos da cidade, e em resposta o criminoso “Da30” informa que já havia ordenado a familiares de Geovana que ela estava expulsa, e que ela atenderia a ordem; d.4) às 18:45hs do mesmo dia 29.09.2024, no contexto dos diálogos sobre expulsão de eleitores, o criminoso “Da30” compartilha um áudio com a frase “Ô meu Desu do céu, tô doido pra pegar alguém, mano”; d.5) às 19:05h do mesmo dia 29.09.2024, o criminoso “Da30” ordena a realização de disparos na casa do Dr. Gatinais, e Rikelme complementa que por ordem do chefe (12 ou “Paulinho Maluco”) aos eleitores de Tomás deveriam ser destinados tiro, porrada e bomba; d.6) em resposta a Rikelme, o criminoso “Da30” lamenta não estar em Santa Quitéria para poder tomar parte na bagaceira e tocar fogo em tudo; d.7) em 30.09.2024 o criminoso “Da30” pede ajuda aos membros do grupo para socorrer um indivíduo que teria sido baleado quando chegava em Santa Quitéria, mas Rikelme pede para conversarem no privado, e na converse privada surge a informação que o marginal ferido seria “Magrão”, baleado numa troca de tiros com criminosos rivais, na localidade Ararinhas, em Varjota; d.8) em 01.10.2024 Rikelme compartilha imagens de novas pichações realizadas em Santa Quitéria, inclusive em lugares cujas pichações pretéritas tinham sido apagadas; d.9) às 21:42hs do mesmo dia 01.10.2024 o usuário EVANDRO DO DENDÊ compartilha uma imagem contendo uma lista dos integrantes do Comando Vermelho em Santa Quitéria, lamenta porque seu nome aparecia em todas as investigações, e dez minutos mais tarde Rikelme perquire quem seriam os eleitores de Tomás Figueiredo, para que fosse localizada a pessoa de WESLEY, da Piracicaba, pois tinha contas a ajustar com ele; d.10) às 21:55hs do mesmo dia 01.10.2024 Rikelme envia print de uma matéria do jornal O POVO sobre um esquema de transporte de fuzis e drogas do Rio de Janeiro ao Ceará, que teria sido desarticulado pela polícia civil, compartilha uma lista de nomes, e diz a TAYSON que aquela seria outra investigação na qual ele fora apontado como chefe do grupo criminoso; d.11) em 02.10.2024 o criminoso “Da30” compartilha um vídeo em que aparecem eleitoras de TOMÁS, e diz que seriam outras que teriam que sair da cidade, e logo adiante, através de áudio, afirma que ligou para várias pessoas para que saíssem da cidade e que elas haviam saído; d.12) na sequência, o criminoso “Da30” comentou uma mensagem de FAIXA ROSA, em que este afirmava que uma das mulheres já teria recebido uma ligação e continuava duvidando da ordem; d.13) A última interação relevante do grupo ocorreu no dia 04.10.2024, às 10:49hs, quando EVANDRO DO DENDÊ comunica aos demais que não enviassem mensagens para a vereadora, provavelmente KYLVIA, pois a polícia havia levado o celular dela, afirmando ainda que ele iria sair do grupo, pois temia que a polícia aparecesse em sua casa.
Diante do conteúdo dos três relatórios técnicos, resultam óbvios os contextos fáticos em torno dos quais foram estabelecidos os diálogos telemáticos do criminoso “Da30”: a) eliminação de rivais em Varjota, para que o Comando Vermelho assumisse o controle do tráfico de drogas naquele município; b) aquisição de armas e munições necessários às ações de confronto; c) coação e intimidação de eleitores de Santa Quitéria que demonstrassem inclinação a votar no então candidato Tomás Figueiredo, seja por meio de pichações em vários pontos da cidade de Santa Quitéria, seja através de ligações e mensagens telemáticas veiculando ameaças a eleitores; d) ocultação do favorecimento da campanha de JOSÉ BRAGA BARROZO; e) compra de votos em favor da então candidata Kylvia Lima.
Destarte, considerando que no 1º aparelho telefônico foram identificados 1.038 (um mil e trinta e oito) chats de diálogos, e no 2º aparelho foram identificados mais 878 (oitocentos e setenta e oito) chats, a única utilidade da transcrição de todos eles seria prolongar quase indefinidamente a fase instrutória desta AIJE, e por razões óbvias que tal manobra protelatória não poderia frutificar perante este juízo.
É oportuno aludir que a realização de pichações contendo ameaças contra eleitores e apoiadores de Tomás Figueiredo também foram assinaladas na prova oral colhida por ocasião da audiência instrutória una de 14.04.2025, senão vejamos:
Testemunha Marcos Aurélio Elias de França: Estou como diretor do interior norte; desde 2020 nós tivemos esses problemas, principalmente na cidade de Santa Quitéria; nós tivemos esse problema na eleição de Santa Quitéria, em que o comando vermelho fez pichações e ameaças; eu fui demandado pela gestão, pela polícia civil, para poder instaurar um processo de investigação e tentar identificar quem estava fazendo quais seriam os interesses dessas ameaças e do tumulto dentro do processo eleitoral; naquele ano nós não conseguimos êxito, não conseguimos identificar os responsáveis, apenas sabíamos que eram pessoas ligadas ao comando vermelho e era atribuído ao a um traficante conhecido por “Paulinho Maluco”, ou de alcunha 12; quando foi agora, nessa última eleição, na eleição passada, durante a campanha nós começamos a nos deparar com o mesmo problema, só que de uma forma mais incisiva, de uma forma mais ameaçadora; tivemos casos em que é pessoas foram expulsas das casas, inúmeros imóveis pichados, sempre com ameaça, direcionada a um determinado candidato; as ameaças eram direcionadas ao candidato Thomaz; esse candidato procurou a gestão, chegou a mim essa demanda e eu designei equipes para ir para o local e a inteligência, ao se debruçar sobre a situação e tentar, de alguma forma, identificar os responsáveis por essas ameaças, conseguimos identificar o áudio e telefone de um elemento que estaria vindo do Rio de Janeiro com a missão de tentar tumultuar o processo eleitoral em Santa Quitéria; nós conseguimos evoluir na identificação, conseguimos qualificar que essa pessoa é o Daniel; não recordo o nome dele completo, mas era o Daniel, de apelido Daniel Claudino, conhecido como “Da30; nós chegamos a pegar alguns áudios dele que ele passou para as pessoas ameaçarem e chegou ao nosso conhecimento e nós conseguimos a evoluir, num trabalho de inteligência, e conseguimos identificar esse rapaz, inclusive nós conseguimos identificar e localizar que ele estaria hospedado dentro no mesmo hotel em que ficava o promotor e o juiz da comarca; então de posse dessas informações, uma equipe nossa foi até esse referido hotel, e conseguimos localizá-lo no mesmo; ele foi autuado em flagrante por ORCRIM e apreendido o aparelho celular dele; na audiência de custódia ele foi posto em liberdade porque o próprio Ministério público entendeu, naquele momento, que não havia elementos para mantê-lo no cárcere; por isso ele foi posto em liberdade, mas as informações foram evoluindo dentro das extrações telefônicas, e indicaram que ele iria tumultuar o processo eleitoral; nós fornecemos elementos ao Ministério Público para que representasse pela prisão preventiva dele, o que foi decretada pela então juíza eleitoral na época; então, no dia seguinte, foi decretada a preventiva dele, e o Daniel foi preso novamente, quando ainda estava em Santa Quitéria; depois da prisão o mesmo demonstrou interesse em colaborar, demonstrou interesse em falar tudo o que sabia; ele estava irresignado com a organização criminosa porque ele se sentiu abandonado ou traído porque não foi honrado com ele o que, em tese foi acertado, e ele resolveu colaborar; foi aí então que o GAECO, junto comigo mesmo, eu participei de todos os processos de colaboração premiada; O Daniel narrou o detalhe de como se deu a missão dele, saindo do Rio de Janeiro para Santa Quitéria, a data que saiu; que as funções dele seria, no primeiro momento, tumultuar a campanha de um do Tomás; depois tomar a cidade de Varjota da facção GDE; essas seriam as missões dele; então ele disse detalhes, ele informou na colaboração premiada, onde cada uma dessas lideranças do comando vermelho moravam dentro de da favela da Rocinha, no Rio de Janeiro; ele disse que ele ia receber trezentos e poucos mil reais nessa função de tumultuar o processo, e para evitar que o candidato Tomás fosse eleito (…).
Testemunha Francisco José Martins da Silva: Na qualidade de delegado da delegacia de crime institucionais, que apura os ilícios eleitorais, fui designado para fazer a diligência, inicialmente, de averiguação da plausibilidade da notícia do crime; nós chegamos a Santa Quitéria e estivemos nos bairros, fotografamos, tentamos entrevistar algumas pessoas, nas proximidades dos locais, das pichações, mas na quase totalidade elas não queriam dar nenhuma depoimento, muito receosos, estava um clima com muito receio devido às ameaças em quem votasse no candidato Tomaz; naquela primeira abordagem a gente circulou nos bairros, eram três bairros em que tinha a incidência maior dessas pichações, Flores, Pereiros, e um outro lá; tinha essa tensão de alguns eleitores recebendo ameaças por telefone; isso foi a primeira situação, e depois foi instaurado o procedimento e a gente passou a acompanhar também algumas diligências e que a polícia civil também estava fazendo, porque envolvia facções; quando foi preso o “Da30”, com ele foi encontrado um aparelho celular em que tinha muitas mensagens, troca de mensagens desses grupo especificando como seria a atuação; indicando pessoas que deveriam se retirar da cidade, caso não mudassem o voto, ameaçando comerciantes de que não podiam abrir em determinados eventos da campanha do candidato Tomás; havia uma série de ameaças e não era coisa de mera retórica; a gente via que se concatenava muito, porque um dizia uma coisa e no outro diálogo lá na frente, outro já tinha dito, já completando a lógica da situação; sobre ameaças ao cartório eleitoral de Santa Quitéria, tivemos notícia, fizemos diligências e a gente começou a circular nos diretórios e procurar pessoas que nos falassem sobre isso; que então soubemos de uma ligação na qual a pessoa ameaçava tocar fogo no prédio do cartório; foi acionada também a polícia militar e foi feito um aparato ao prédio do cartório, com uma certa vigilância, pois estava um clima muito tenso; depois foi feita uma averiguação por conta dos relatórios de inteligência da polícia civil e verificado que esse telefonema partiu da área de um dos presídios em que havia um integrante do comando vermelho; tudo indica que aquelas ameaças vinham do comando deles lá dentro do presídio (…).
Testemunha THIAGO TEIXEIRA SOARES BRITO: Sou policial militar de carreira, mas antes de ingressar na PM eu fui filiado ao PSB, mas lá no estado do Piauí, pois sou piauiense de origem; aí me desfilei antes entrar na polícia; não sou eleitor de Santa Quitéria; meu domicílio eleitoral é no Piauí; não aderi a qualquer candidatura em Santa Quitéria, até porque eu não posso; não prestei serviços particulares a qualquer dos acionados; trabalho na unidade policial de Santa Quitéria desde 29 de julho de 2018; acompanhei o período da campanha eleitoral; cheguei a ver pichações em fachadas de residências com a sigla CV de comando vermelho, veiculando ameaças contra a candidatura do então candidato a prefeito Tomás Figueiredo; não sei precisar em quantos bairros, mas em vários deles tinha pichações; no âmbito da minha profissão nunca recebi ocorrência de ameaça contra eleitores do Tomás; ouvi comentários nesse sentido, mas ninguém chegou pra mim e disse “eu fui ameaçado”; ouvi dizer que na cidade estava tendo ameaças por telefone; foi ventilada na cidade uma informação de ameaças contra o cartório eleitoral de Santa Quitéria, que o cartório seria incendiado (…).
Declarante Tomás Antônio Albuquerque de Paula Pessoa: o fenômeno das eleições de 2020 e repetiu em 2024, pois estavam se sentindo à vontade, e assim foram para cima e atropelaram com a violência, utilizando funcionários de prefeitura, como a Sra. Bruna, secretária-executiva e de confiança do prefeito, que andava pintando as paredes das casas na cidade; nessa eleição que passou agora, inclusive pintou a casa da Sra. Lúcia Lira na Rua Delmiro Gouveia; a própria facção dizia que o Sr. Gabriel, candidato a vereador, também era das facções e, coincidentemente, apareceram infiltrados para nos apoiar, tais como Luciano Maia e Michel; quando nós descobrimos, esses infiltrados voltaram a apoiar o candidato Braga; o Luciano Maia queria que eu conversasse com a Sra. Luzia, conhecida na cidade de Santa Fé, mas recusei, pois nós temos uma história política de 50 ou 60 anos; começamos a campanha de 2024, e no final de agosto fiz um evento, mas não consegui pregar minha propaganda nos carros; até hoje minha propaganda está guardada, pois não tive condições de realizar minha campanha livremente; se eu fosse num bar, se eu fosse fazer uma visita a uma pessoa, principalmente no bairro dos Pereiros, os eleitores diziam: “Dr. Tomás, nós vamos votar no senhor, mas pelo amor de Deus, vai embora”; a minha esposa ainda visitou alguns alguns bairros, mas era uma perseguição; eu saía de Santa Quitéria, ia para o distrito, em viagem longa, e quando lá chegava logo em seguida apareciam pessoas para intimidar os eleitores, e muitas dessas pessoas eram pessoas estavam a serviço da prefeitura; eu cheguei a um ponto que eles me cercaram de uma maneira tal que você olhava para um lado, para o outro, e dizia assim: “vou ter que desistir da eleição”; nós vimos uma prefeitura com uma administração desastrosa; o prefeito tinha sido afastado pelo PROCAP por desvio de verbas e malversação pública por dez meses; o prefeito estava totalmente desgastado, aí a vice-prefeita assumiu, passou o período de dez meses, tiveram desavença, ela saiu candidata; aí eu tive que enfrentar dois candidatos, mas quando nós colocamos a nossa candidatura era confortável, tinha pesquisa, tinha tudo; havia uma revolta do povo; eu acho que quem mais sofreu foi o povo de Santa Quitéria; tinha pichações com ameaças em todos os bairros; havia pichações na Piracicaba, nos Pereiros, no Flores, na COHAB, no Mendes Pimentel, na entrada da cidade, no Distrito de Lisieux, que é onde reside o Prefeito José Braga e a família dele; querem demonstrar que o Sr. Braga seria uma pessoa pacífica, um homem que foi do Banco do Brasil, mas o histórico dele é muito ruim, porque lá no Distrito de Lisieux, onde ele nasceu, e onde ele mantém casa, tem um posto com homens armados, como Ismael, Andrews, Rodrigo Tatuapic; são pessoas que ele usa dentro do distrito que é conhecido pela população; no período eleitoral, em 2019, tanto ele como o vice-prefeito foram pegos pela PRE, armados costumeiramente; foram levados a Canindé e lá o irmão assumiu a arma como sendo dele; outro fato que se nota muito é o caso de um policial que estava de serviço em Fortaleza, mas veio a Santa Quitéria para ser acompanhante da mulher do prefeito, e foram todos presos; o policial tinha duas pistolas na mão; nessa eleição foi a mesma coisa; alguns policiais que ficavam de folga, que era de conhecimento do Sr. Arlindo, ele convocava esses policiais para prestar serviço; então nós passamos duas eleições que Santa Quitéria não teve paz (…).
Declarante ARILDSON DE SOUSA LOUREIRO: (…) Sou eleitor de Santa Quitéria há 4 anos, mais ou menos, mas resido aqui há 8 anos; vi as pichações nos muros de Santa Quitéria com siglas do comando vermelho, contra a candidatura do Tomás; Santa Quitéria tem cerca de 9 bairros, mas não sei em quantos deles havia pichações; sobre ameaças por meio de mensagens em aplicativos, só sei por ouvir dizer; não identifiquei qualquer pessoa que tenha recebido essas mensagens; por ouvir dizer eu soube de uma ligação ameaçando de incendiar o prédio do cartório eleitoral (…).
Declarante DOUGLAS WILLIAN DE ARAÚJO LIRA: Sou advogado, mas exerço mandato de vereador pelo PP; em 2024 o PP coligou na majoritária com o PSB e outros partidos que não lembro agora; o Braga é do PSB e o Gardel era do PP; moro em Santa Quitéria há 14 anos, aproximadamente, entre 12 e 14 anos; recordo das pichações nos muros veiculando ameaças em desfavor da candidatura de Tomás Figueiredo; eu via pichações do tipo “Tomás Fora”, coisas desse tipo; acredito que Santa Quitéria tenha 10 ou 12 bairros; eu me recordo muito bem de uns 3 bairros que tinham essas pichações contra a candidatura do Tomás (…).
É ainda oportuno aludir ao trecho de outra testemunha que, embora tenha prestado o compromisso legal de dizer a verdade, demonstrou “memória seletiva”, pois se declarou incapaz de recordar dos conteúdos ameaçadores veiculados nas pichações feitas em diversos bairros de Santa Quitéria, entre os meses de julho e setembro de 2024, mas contraditoriamente aludiu a um suposto entrevero ocorrido em 2010, envolvendo Tomás Figueiredo e o criminoso conhecido pela alcunha de “12”. Destaque-se que a alusão a este suposto entrevero foi feita como forma de tentar demonstrar que o verdadeiro propósito dos faccionados do Comando Vermelho não seria o de favorecer o então candidato JOSÉ BRAGA BARROZO, mas sim o de prejudicar o candidato Tomás em função da suposta inimizade figadal. Em verdade, a versão apresentada pela testemunha RAIMUNDO NONATO PINTO BORGES se mostrou absolutamente tendenciosa, e por isso mesmo indigna de credibilidade. Confira-se, pois:
Testemunha RAIMUNDO NONATO PINTO BORGES: Sou eleitor de Santa Quitéria, mas não sou filiado a partido político e nunca fui; não trabalhei em favor de qualquer candidatura nas eleições de 2024; sobre as pichações com ameaças nas fachadas das residências com a sigla do comando vermelho, ouvi apenas falar pela cidade, mas não vi as pichações porque foram apagadas na mesma hora; todas foram apagadas rapidinho; não soube quem mandou fazer aquelas pichações; não lembra qual o teor das pichações porque já faz muito tempo; mesmo sendo fatos acontecidos entre julho e setembro de 2024 não recorda do conteúdo das pichações; desconhece se no período da campanha eleitoral houve ligação telefônica para o cartório eleitoral prometendo de matar funcionário ou prometendo de incendiar o cartório eleitoral; soube por comentários sobre a prisão do Prefeito Braga, mas não sabe qual foi o motivo; não teve interesse em saber o motivo da prisão dele, mesmo se tratando do prefeito da cidade; soube que a Kilvia também foi presa; ela foi candidata a vereador; não procurei saber o motivo da prisão dela porque antes minha ligação era muito próxima, então não procurei; não sei qual justiça (comum ou eleitoral) mandou prender a Kylvia; desconheço se o comando vermelho estava apoiando alguma candidatura; não tive notícia de que eleitores estivessem sendo intimidados, pois me ausento muito da cidade, eu não tive conhecimento; não sei se durante a propaganda eleitoral algum candidato foi impedido de fazer comício, ou que os eleitores estivessem com medo de ser vistos ao lado de algum candidato; acho que tudo correu normalmente na eleição; estou com 48 anos e sempre morei aqui (em Santa Quitéria) direto; moro no Bairro dos Pereiros; trabalho com saneamento básico de esgoto; já ouvi falar na família do 12, pois ele é aqui de Santa Quitéria; conheço a mãe e o pai dele, mas faz muito tempo que os vi, uns 16 anos; eles são do bairro Piracicaba; conheço o Tomás Figueiredo, trabalhei 8 anos com ele, na administração dele; soube de uma inimizade entre o Tomás e o 12 porque a cidade comenta; soube que ele precisou da prefeitura, foi atrás do prefeito que na época era o Tomás, e o Tomás chegou a dar um empurrão nele; daí nasceu a desamizade em 2010 ou 2011; só soube desse fato do empurrão por comentários do pessoal da cidade; essa inimizade já existia na eleição de 2020; não li o teor das pichações nos muros de Santa Quitéria (…).
Dentre os declarantes ouvidos em juízo, o emprego à “falácia da ignorância” se mostrou ainda mais evidente, e apenas a título de exemplo merece ser reproduzido certo trecho do tendencioso depoimento de ANTÔNIO ROBSON CHAVES MUNIZ, in verbis:
Declarante ANTÔNIO ROBSON CHAVES MUNIZ: Ocupo cargo comissionado na Prefeitura de Santa Quitéria desde 18 de outubro do ano passado; sou eleitor em Santa Quitéria desde os 16 anos de idade; fui filiado ao PSL ou PSDB, mas faz muito tempo; nunca pedi desfiliação; trabalhei na campanha do José Braga; durante a campanha eleitoral de 2024 vi pichações, mas não que dissesse vote em fulano ou coisa desse tipo, mas também não sei de quem pichou; que nas pichações dizia que quem fosse contra seria penalizado, mas não sei quem era o candidato alvo das pichações porque elas foram apagadas pela polícia; a única pichação que vi foi nos Pereiros; não lembro ao certo qual era o conteúdo daquela pichação; não vi pichações contra a candidatura do Tomás Figueiredo; não sei se as pichações eram contra o candidato Tomás, ou a favor do candidato Braga (…).
Adotando o mesmo fenômeno da “memória seletiva”, seguiram os declarantes JOSÉ ROBERTO CARLOS CAVALCANTE e BRUNA DE SOUSA PEREIRA, senão vejamos:
Declarante JOSÉ ROBERTO CARLOS CAVALCANTE: Sou administrador de empresa de formação, mas estou empresário; sou filiado ao MDB de Alcântaras; trabalhei na campanha de 2024 em favor da candidatura do Braguinha; que mudei para Santa Quitéria recentemente; mudei para Santa Quitéria só no final de 2024; tenho uma gráfica e fui procurado no decorrer da campanha para fazer um material de propaganda para campanha do Braguinha; já trabalhei em várias outras campanhas; que percebeu dificuldades na campanha dele e ofereceu seus serviços, pois já tinha experiência em campanhas eleitorais; foi por isso que entrei na campanha do Braguinha; cheguei a ver pichações nos muros de Santa Quitéria contendo a sigla do comando vermelho e contendo ameaças contra quem apoiasse o candidato Tomás, mas eram coisas simples, tipo “não vote no Tomás” (…).
Declarante BRUNA DE SOUSA PEREIRA: Sou assistente social e trabalho na prefeitura municipal de Santa Quitéria; sou servidora comissionada; trabalhei na prefeitura em 2011, na gestão do Fabiano Lobo, que foi de 2014 a 2016; aí trabalhei de 2020 a 2021; retornei em 2024 e agora em 2025; não sou filiada a partido político; trabalhei na campanha de 2024, em favor da candidatura do Braga, como militante; em 20204 apoiei o candidato José Braga Barrozo; moro em Santa Quitéria e minha família toda é daqui, aí teve um período que eu que eu fui morar em outra cidade, mas foi pouco tempo, eu tinha uns 10 anos e quando voltei eu tinha 17 anos; não sei em quantos bairros apareceram as pichações do comando vermelho contra o Tomás; não vi as pichações com os meus próprios olhos, só tive notícia disso em mídias sociais; não sei se as pichações eram contra outros candidatos além do Tomás; não sei se as pichações foram apagadas; não sei se todas as pichações já foram eliminadas; não ouvi notícia de ameaça de incendiar o cartório eleitoral durante a campanha de 2024 (…).
Conclusivamente, inobstante a alegada postura desatenta dos declarantes acima aludidos não tem o condão de desconstituir as evidências mais do que concretas de que diversos bairros de Santa Quitéria foram inundados com pichações que veiculavam ameaças efetivas contra a integridade física de eleitores e apoiadores do então candidato Tomás Figueiredo. Na verdade, a tibieza manifestada nas respostas de tais declarantes quanto a fatos notórios ocorridos num município cuja população é pouco superior a 40.000 (quarenta mil) habitantes, contabilizando zona urbana e rural, serviu apenas para revelar a pouca credibilidade atribuível a seus respectivos depoimentos.
b) Ocorrência de ameaças a eleitores de Tomás Figueiredo, através de mensagens telefônicas e telemáticas:
Quanto à segunda imputação ministerial, esta também restou consolidada não apenas em trechos bastante elucidativos dos três relatórios técnicos produzidos pelo Departamento de Inteligência da Polícia Civil do Ceará, como igualmente por meio da prova oral coletada por este juízo, e ainda por meio de arquivos de áudio que foram anexados à exordial (Id. 124520666).
No âmbito dos relatórios técnicos, merecem destaque os trechos seguintes:
a.1) Relatório Técnico nº 234/2024/DIP/DGPC – 11/11/2024 (Id. 124520322), gerado a partir da extração de dados de um dos aparelhos celulares (iPhone XR, IMEI 1 357366098102217, IMEI 2 57366098416435) utilizado pelo criminoso faccionado Daniel Claudino de Sousa, conhecido como “Da30”, o qual revelou que: (…) b) o usuário do aparelho vinha adotando o hábito de apagar as mensagens ameaçadoras para não deixar rastros dos crimes cometidos, e orientava seus parceiros do crime a fazerem o mesmo; c) um dos terminais identificados na agenda do aparelho do indivíduo “Da30” pertencia à então candidata KYLVIA MARIA DE OLIVEIRA LIMA, a qual postulava um cargo de vereadora em Santa Quitéria; d) “Da30” mantinha articulação permanente com outros criminosos com vistas a tentar fortalecer a candidatura de Kylvia; e) um dos comparsas foi identificado como PL TRAPIÁ, o qual se tratava de PEDRO LUCAS DE SOUSA PEREIRA; e) em conversa datada de 31.07.2024 a então candidata Kylvia expressa seu reconhecimento pelo apoio recebido de “Da30”, e naquele mesmo dia visitou a residência dos pais do criminoso, ocasião em que demonstra ter conhecimento sobre o acesso dele a armas, bem com de sua condição de liderança na facção criminosa; f) em ligação feita em 01.08.2024 “Da30” confirma seus esforços em prol de atrair eleitores para Kylvia; g) em diálogo realizado em 30.07.2024 Kylvia é apontada como candidata do Comando Vermelho; h) em áudio remetido naquela mesma data, o criminoso “Da30” orienta seu comparsa PL TRAPIÁ a compartilhar a logomarca da campanha de Kylvia e pedir votos em favor da mesma; (…) k) em 28.07.2024 “Da30” mantém contato com o também faccionado Francisco Girvando Ferreira de Oliveira, conhecido pelas alcunhas de “Rikelme” e “Argentino”, e pede autorização para que o então candidato “Zé do Povo” fizesse visitas de cunho eleitoral na região de Trapiá, em Santa Quitéria, e pede que Rikelme obtenha apoio de Nenzinho da boate à candidatura de Kylvia, sob pena de que a boate dele fosse fechada pelo crime (...);
a.2) Relatório Técnico nº 235/2024/DIP/DGPC – 11/11/2024 (Id. 124520323), gerado a partir da extração de dados de outro aparelho celular (REALME NOTE 50, IMEI 1 865846072729106, IMEI 2 865846072719114 e terminar +5521986375953) utilizado pelo criminoso faccionado Daniel Claudino de Sousa, conhecido como “Da30”, o qual revelou que: (…) f) em diálogos travados a partir de 17.09.2024, com interlocutora que possivelmente fosse sua namorada, resulta claro que “Da30” teria deixado o Rio de Janeiro com destino a Santa Quitéria, de ônibus, e no dia seguinte já estava passando pelo estado da Bahia; g) pelo teor dos diálogos “Da30” revela sua hierarquia dentro do Comando Vermelho, na condição de conselheiro; h) em troca de mensagens realizada em 31.08.2024 com interlocutora identificada apenas como Maria, o criminoso “Da30” informa que responderia a um processo na seara eleitoral, e em novas mensagens trocadas em 11.09.2024 o mesmo elemento informa que seguiria ao Ceará para resolver assuntos pessoais; i) em 12.09.2024 a interlocutora Maria é identificada como MARIA FERNANDA FERNANDES DE SOUSA, a partir de sua chave pix, a qual seria usada pelo criminoso “Da30” para suas transações financeiras com dinheiro espúrio, eis que só dispunha de R$4.000,00 (quatro mil reais) em espécie; j) em 19.09.2024 Maria Fernanda recebe notícias de que “Da30” teria chegado ao Ceará, e já estava saindo para matar, mas não detalha quem seria sua vítima; k) foi identificado o terminal telefônico nº +558899921221, salvo com a identificação de SO FRETE 12, e cujo interlocutor seria ANASTÁCIO PAIVA PEREIRA, conhecido pelas alcunhas de “12”, “DAZAREA”, “Paizão” ou “Paulinho Maluco”, liderança do Comando Vermelho com atuação em Santa Quitéria, Hidrolândia, Varjota, Reriutaba, Ipu, Ipueiras e Guaraciaba do Norte, e que teria sido alvo de uma operação policial realizada pelo BOPE na Favela da Rocinha; l) em troca de mensagens realizada entre “12” e “Da30” no dia 19.09.2024, o primeiro ordena que todos os comparsas que acompanham “Da30” deveriam descer em Ipu, mas deveriam agir em Ararinha e Pedreiras (bairros de Varjota), a partir de 20.09.2024, quando então “12” dá orientações acerca das armas a serem utilizadas (1 fuzil, 2 pistolas, 1 espingarda calibre 12, munições e 2 granadas), mas recomenda cuidado a seus comandados para que não sejam descobertos; m) em mensagens trocadas em 25.09.2024 o criminoso “Da30” avisa que está em Santa Quitéria, envia um vídeo de uma arma, mas informa não ter as munições necessárias, ao que “12” responde que enviaria as munições; n) em mensagens trocadas em 30.09.2024 o criminoso “Da30” avisa que o “Magrão” foi baleado, e é indagado por “12” onde estariam os inimigos, bem como ordena que seus subordinados regressassem para Ararinhas a fim de expulsar os rivais criminosos, e em resposta “Da30” pede que seja enviada uma canoa para que possam fugir por água; o) em mensagens de 02.10.2024 o criminoso “Da30” informa que prosseguirá nos confrontos no bairro de Ararinhas e menciona que os criminosos rivais estariam sendo ajudados por Moésio, o qual deveria ser morto, mas pondera que nova investida só deveria ocorrer após passar a política, pois a cidade estaria mais tranquila; p) foi identificado nesse segundo aparelho o contato de Kylvia de Lima (terminal nº 5588996121482), candidata a vereadora em Santa Quitéria, e que troca diversas mensagens com o criminoso “Da30”, nas quais: p.1) solicita orientações sobre manuseio de arma; p.2) manifesta o desejo de acompanhar “Da30” até a Favela da Rocinha para conhecer homens solteiros; p.3) informa sobre a atuação de um tal Raimundo, escalado para ajudar na campanha de Kylvia; p.4) é cientificada que um indivíduo identificado como RUGAL GUINHA tinha recebido recomendação de “Da30” no sentido de que Kylvia tinha que ganhar de qualquer jeito; q) em mensagens trocadas em 08.08.2024 Kylvia pergunta a “Da30” sobre a percepção do chefe dele sobre as vendas (de drogas), sendo solicitada a pesquisar o nome de um indivíduo para saber se o mesmo realmente estava foragido, e demonstra ter conhecimento sobre a hierarquia da facção criminosa; r) em mensagens trocadas em 21.10.2024 “Da30”: r.1) envia áudio de uma eleitora de Santa Quitéria, segundo a qual seu voto seria de confiança, e informa a KYLVIA que estava comprando votos para ela na localidade Trapiá, que já teria gasto em favor da campanha dela mais do que o próprio BRAGA; r.2) reclama não ter recebido dinheiro do “chefe”, mas que outros comparsas já teriam recebido o dinheiro deles (…) t) em diálogo mantido entre JP TARUGA e “Da30”, este: t.1) informa sobre seu apoio à campanha de Kylvia e que as áreas sobre seu comando votariam nela (…) u) há troca de mensagens com o terminal nº 558899113289, salvo como BEBEL, vinculado a uma chave pix registrada em nome de DALILA CARLA RODRIGUES DA SILVA, a qual é funcionária da Prefeitura de Santa Quitéria, lotada no Hospital Municipal, mas que se identificou como servidora da Secretaria de Cultura, no boletim de ocorrência policial nº 546-525/2024, sendo ainda irmã de ROMÁRIO RODRIGUES DOS SANTOS, que responde por homicídio em Sobral; v) em mensagens trocadas com “Da30” a partir de 08.08.2024 há indicação que DALILA: v.1) recebe pagamentos e os repassa ao “Da30”, tendo recebido valores das pessoas de Vinícius, de ALISSON SOUSA SOARES; v.2) é orientada a ocultar cocaína pertencente ao RIKELME (em 21.08.2024); v.3) pede permissão para postar um vídeo na qual ela e um homem aparecem numa moto (em 30.08.2024); v.4) é orientada por “Da30” a identificar um carro de som que estava num evento de campanha de Tomás Figueiredo, mas em resposta a mesma diz já saber que se trata de MARCOS CURTYSOM; w) foi identificado o terminal nº 558899661090, pertencente a ÍTALO RAMON SEVERO XEREZ, o qual troca mensagens com “Da30” nas quais: w.1) este envia prints de tela nos quais é identificado pela própria KYLVIA como sendo seu cabo eleitoral preferido; w.2) comenta a intenção de manter relações sexuais com a referida candidata, caso ela “desse mole”; w.3) é informado por Ítalo que Kylvia “dá mole até demais” (…) w.12) “Da30” orienta sobre como deveriam ocorrer as intimações aos eleitores e apoiadores de Tomás Figueiredo e ordena a pichação do muro de uma padaria em Santa Quitéria.
a.3) Relatório Técnico nº 249/2024/DIP/DGPC – 11/12/2024 (Id. 124520326), gerado a partir da extração de dados de outro aparelho celular (REALME NOTE 50, IMEI 1 865846072729106, IMEI 2 865846072719114 e terminar +5521986375953) utilizado pelo criminoso faccionado Daniel Claudino de Sousa, conhecido como “Da30”, o qual revelou que: a) foram identificados 878 (oitocentos e setenta e oito) chats, com diálogos mantidos entre o criminoso “Da30” e interlocutores variados, mas com foco nas tratativas realizadas dentro de três grupos específicos de Whatsapp, denominados “Jogadores natos”, Jogadores nato” e “Partido dos trabalhadores 13 PT”, e com especial atenção às conversas travadas no período de 23 de julho a 02 de outubro de 2024, b) os diálogos seguem detalhados dentro do espectro de cada um dos três grupos, senão vejamos:
b) 1º Grupo “Jogadores natos” foi criado em 13.04.2024, às 17:12hs, por usuário não identificado, sendo composto por 16 (dezesseis) integrantes, com destaque para algumas mensagens adiante detalhadas: (…) b.4) em 03.08.2024 Rikelme afirma que a época das eleições seria favorável aos que entendem de conversão, e que isto favoreceria também as “banquinhas”, pois seriam uma boa fonte de renda; b.5) o usuário ADRIANO JB comentou que um candidato costumava pegar dinheiro com ele; b.6) ainda em 03.08.2024 Rikelme adverte aos demais sobre o início das atividades políticas; (…) b.8) em 15.08.2024 Rikelme ameaça aqueles que estivessem em grupos políticos de candidatos não apoiados por ele, adverte que havia infiltrados naqueles grupos, alerta que todos que não seguissem sua orientação seriam excluídos das ações do tráfico e teriam que viver de política, e ameaça atirar contra paredões de som e vidros de carros; b.9) em 16.08.2024 o usuário TAYSON relata sua preferência pela candidata Kylvia, informa que estaria preparando material de propaganda para ser postado nos perfis de Instagram dos demais membros do grupo, e salienta que “nossa família” (Comando Vermelho) precisava de um representante na Câmara Municipal de Santa Quitéria; b.10) logo em seguida, Rikelme informa que os candidatos apoiados pela facção seriam Kylvia Lima, Gabriel Filho e “BG para Prefeito”(José Braga Barrozo); b.11) em 16.08.2024 Rikelme pede que intensifiquem as publicações nas redes sociais para conseguir o apoio dos viciados em drogas, informa que drogas seriam usadas para comprar votos desses viciados, sendo sua ideia prontamente apoiada pelo criminoso “Da30” e também por TAYSON, o qual sugere que essa compra de votos ocorresse nos três dias anteriores ao pleito eleitoral; b.12) naquele mesmo dia, por volta das 18:48hs, Rikelme posta foto da propaganda eleitoral de Kylvia e recomenda esforço “pra eleger os nossos”; b.13) em 19.08.2024 Rikelme ordena que todas as casas que tivessem fotos do candidato Tomás, concorrente de José Braga Barrozo, fossem pichadas e que carros com adesivos do Tomás tivessem seus vidros e retrovisores quebrados, mas recomenda que não fosse colocado o nome de Braguinha nas pichações; b.14) naquele mesmo dia, ao giro das 17:54hs, Rikelme compartilha um texto contendo ameaças de morte a serem veiculadas em Independência, contra todos aqueles que “não fechassem com a tropa do Paulinho Maluco”; b.15) em 22.08.2024 Rikelme envia cartaz de um evento de campanha de Tomás Figueiredo a se realizar dois dias depois (em 24.08.2024, às 19hs), e volta a recomendar depredação de veículos que estivessem com adesivos de campanha dele, bem como depredação de bares que abrissem ou sediassem concentrações políticas de Tomás; b.16) em 24.08.2024 Rikelme informa ter sido autorizado pelo “Paizão” e recomenda pichações em todos os bairros de Santa Quitéria, com advertência de que as pessoas que apoiassem Tomás teriam problema com a “tropa do Paulinho Maluco”; (…) b.18) em 26.08.2024 Rikelme volta a cobrar pichações e vandalismo aos que manifestassem apoio ao candidato Tomás; b.19) em 28.08.2024 Rikelme encaminha mensagem de um mapa com possíveis áreas de atuação do Comando Vermelho dentro do Estado do Ceará, e por volta das 17:55hs do mesmo dia envia imagens dom adesivos que seriam usados para embalar suas drogas; b.20) em 02.09.2024, Rikelme informa que “o chefe amanheceu doido por problema”, e que queria todos os bairros de Santa Quitéria pichados até a noite daquele mesmo dia, além do que compartilha uma mensagem que teria recebido de “Paulinho Maluco” (também conhecido por 12); b.21) ainda no dia 02.09.2024, ao giro das 22:14hs, o usuário DISNEY compartilha 04 (quatro) fotos contendo as pichações exigidas por Rikelme; b.22) em 04.09.2024 o usuário ADRIANO JB compartilha dois vídeos contendo pichações de ameaça contra eleitores de Tomás, as quais teriam sido feitas provavelmente no Bairro Flores, e adverte que o Hotel Santo Expedito estaria lotado de policiais, inclusive do setor de inteligência policial; b.23) em 06.09.2024 Rikelme reclama do fechamento das “bocas de fumo” em virtude da grande quantidade de policiais em Santa Quitéria; (…) b.25) em 09.09.2024, após comentar que policiais estariam eliminando as pichações contendo ameaças a eleitores de Tomás Figueiredo, informa que também teriam apagado seu vulgo; (…) b.27) em 17.09.2024 após comentarem sobre uma grande operação da Polícia Civil em Santa Quitéria, MIRELLA SANTOS (Rikelme) encaminha um print de uma postagem no Instagram e pede que os demais identificassem as pessoas que estavam parabenizando a ação policial, e logo em seguida o criminoso “Da30” não apenas compartilha foto de alguns policiais que participaram da operação reunidos num restaurante, como expressa seu desejo de ter uma granada para soltar no meio daquele grupo de policiais; b.28) em 18.09.2024 MIRELLA SANTOS (Rikelme) compartilha foto de tela de um dispositivo eletrônico contendo o número de um processo (0266760-62.2024.8.06.0001), com a indicação de que se tratava de um pedido de prisão preventiva protocolado na Comarca de Fortaleza, possivelmente na vara das ORCRIM;
c) 2º Grupo “Jogadores natos” foi criado em 21.09.2024, às 18:39hs, por usuário não identificado, sendo composto por 12 (doze) integrantes, com destaque para algumas mensagens adiante detalhadas: (…) c.5) em 28.09.2024 Rikelme volta a recomendar aos membros do grupo que compartilhassem mensagens de ameaça aos eleitores de Tomás Figueiredo; c.6) na mesma data, Rikelme revela sua preocupação diante de uma nova operação policial a ser realizada em Santa Quitéria, e que só teria sido vazada graças a um “pessoal de dentro” (informante da facção criminosa infiltrada dentro da própria delegacia, possivelmente a pessoa de LUZIA RAQUEL ANDRADE DE SILVA, a qual foi alvo de mandado de busca e apreensão ordenada por este juízo eleitoral, em 26.03.2025, no bojo do Proc. nº 0600012-49.2025.6.06.0054); c.7) em 29.09.2024 Rikelme recomenda que seja expulsa de Santa Quitéria uma mulher identificada como Geovana, e salienta que a ordem teria partido de “Paulinho Maluco”; c.8) naquele mesmo dia, o usuário 2L avisa que havia pessoas circulando por Santa Quitéria com camisas do “15” (número eleitoral do candidato Tomás), Rikelme ordena que os eleitores com tal vestimenta fossem agredidos, e ordena que os mesmos fossem expulsos da cidade(…);
d) Grupo “Partido dos Trabalhadores 13 PT” foi criado em 29.09.2024, às 06:02hs, por usuário identificado pela alcunha de FAIXA ROSA, sendo composto por 08 (oito) integrantes, com destaque para algumas mensagens adiante detalhadas: (…) d.2) naquele mesmo dia 29.09.2024, às 17:36hs, Rikelme compartilha um vídeo em que ele próprio passa a ser tatuado com uma imagem de mulher com maquiagem de palhaço, e às 18:22hs adverte que era chegado o momento de deflagrar o “Plano B”, consistente em efetuar disparos de armas de fogo contra portas de algumas residências de Santa Quitéria; d.3) às 18:38hs do dia 29.09.2024 Rikelme relaciona eleitores de Tomás Figueiredo que deveriam ser expulsos da cidade, e em resposta o criminoso “Da30” informa que já havia ordenado a familiares de Geovana que ela estava expulsa, e que ela atenderia a ordem; d.4) às 18:45hs do mesmo dia 29.09.2024, no contexto dos diálogos sobre expulsão de eleitores, o criminoso “Da30” compartilha um áudio com a frase “Ô meu Deus do céu, tô doido pra pegar alguém, mano”; d.5) às 19:05h do mesmo dia 29.09.2024, o criminoso “Da30” ordena a realização de disparos na casa do Dr. Gatinais, e Rikelme complementar que por ordem do chefe (12 ou “Paulinho Maluco”) aos eleitores de Tomás deveriam ser destinados tiro, porrada e bomba; d.6) em resposta a Rikelme, o criminoso “Da30” lamenta não estar em Santa Quitéria para poder tomar parte na bagaceira e tocar fogo em tudo; (…) d.8) em 01.10.2024 Rikelme compartilha imagens de novas pichações realizadas em Santa Quitéria, inclusive em lugares cujas pichações pretéritas tinham sido apagadas; d.9) às 21:42hs do mesmo dia 01.10.2024 o usuário EVANDRO DO DENDÊ compartilha uma imagem contendo uma lista dos integrantes do Comando Vermelho em Santa Quitéria, lamenta porque seu nome aparecia em todas as investigações, e dez minutos mais tarde Rikelme perquire quem seriam os eleitores de Tomás Figueiredo, para que fosse localizada a pessoa de WESLEY, da Piracicaba, pois tinha contas a ajustar com ele; (…) d.11) em 02.10.2024 o criminoso “Da30” compartilha um vídeo em que aparecem eleitoras de TOMÁS, e diz que seriam outras que teriam que sair da cidade, e logo adiante, através de áudio, afirma que ligou para várias pessoas para que saíssem da cidade e que elas haviam saído; d.12) na sequência, o criminoso “Da30” comentou uma mensagem de FAIXA ROSA, em que este afirmava que uma das mulheres já teria recebido uma ligação e continuava duvidando da ordem; d.13) A última interação relevante do grupo ocorreu no dia 04.10.2024, às 10:49hs, quando EVANDRO DO DENDÊ comunica aos demais que não enviassem mensagens para a vereadora, provavelmente KYLVIA, pois a polícia havia levado o celular dela, afirmando ainda que ele iria sair do grupo, pois temia que a polícia aparecesse em sua casa.
Cumpre observar que a prova oral coletada por este juízo, por ocasião da audiência una de 14.04.2025, robusteceu a imputação ministerial sobre intimidação e expulsões de eleitores e apoiadores do então candidato Tomás Figueiredo, senão vejamos:
Testemunha Marcos Aurélio Elias de França: (…) nós tivemos esse problema na eleição de Santa Quitéria, em que o comando vermelho fez pichações e ameaças; eu fui demandado pela gestão, pela polícia civil, para poder instaurar um processo de investigação e tentar identificar quem estava fazendo quais seriam os interesses dessas ameaças e do tumulto dentro do processo eleitoral; naquele ano nós não conseguimos êxito, não conseguimos identificar os responsáveis, apenas sabíamos que eram pessoas ligadas ao comando vermelho e era atribuído ao a um traficante conhecido por “Paulinho Maluco”, ou de alcunha 12; quando foi agora, nessa última eleição, na eleição passada, durante a campanha nós começamos a nos deparar com o mesmo problema, só que de uma forma mais incisiva, de uma forma mais ameaçadora; tivemos casos em que é pessoas foram expulsas das casas, inúmeros imóveis pichados, sempre com ameaça, direcionada a um determinado candidato; as ameaças eram direcionadas ao candidato Tomás; esse candidato procurou a gestão, chegou a mim essa demanda e eu designei equipes para ir para o local e a inteligência, ao se debruçar sobre a situação e tentar, de alguma forma, identificar os responsáveis por essas ameaças, conseguimos identificar o áudio e telefone de um elemento que estaria vindo do Rio de Janeiro com a missão de tentar tumultuar o processo eleitoral em Santa Quitéria; nós conseguimos evoluir na identificação, conseguimos qualificar que essa pessoa é o Daniel; não recordo o nome dele completo, mas era o Daniel, de apelido Daniel Claudino, conhecido como “Da30; nós chegamos a pegar alguns áudios dele que ele passou para as pessoas ameaçarem e chegou ao nosso conhecimento e nós conseguimos a evoluir, num trabalho de inteligência, e conseguimos identificar esse rapaz, inclusive nós conseguimos identificar e localizar que ele estaria hospedado dentro no mesmo hotel em que ficava o promotor e o juiz da comarca; então de posse dessas informações, uma equipe nossa foi até esse referido hotel, e conseguimos localizá-lo no mesmo; ele foi autuado em flagrante por ORCRIM e apreendido o aparelho celular dele (…);
Testemunha Francisco José Martins da Silva: (…) nós chegamos a Santa Quitéria e estivemos nos bairros, fotografamos, tentamos entrevistar algumas pessoas, nas proximidades dos locais, das pichações, mas na quase totalidade elas não queriam dar nenhuma depoimento, muito receosos, estava um clima com muito receio devido às ameaças em quem votasse no candidato Tomás; naquela primeira abordagem a gente circulou nos bairros, eram três bairros em que tinha a incidência maior dessas pichações, Flores, Pereiros, e um outro lá; tinha essa tensão de alguns eleitores recebendo ameaças por telefone; isso foi a primeira situação, e depois foi instaurado o procedimento e a gente passou a acompanhar também algumas diligências e que a polícia civil também estava fazendo, porque envolvia facções; quando foi preso o “Da30”, com ele foi encontrado um aparelho celular em que tinha muitas mensagens, troca de mensagens desses grupo especificando como seria a atuação; indicando pessoas que deveriam se retirar da cidade, caso não mudassem o voto, ameaçando comerciantes de que não podiam abrir em determinados eventos da campanha do candidato Tomás; havia uma série de ameaças e não era coisa de mera retórica; a gente via que se concatenava muito, porque um dizia uma coisa e no outro diálogo lá na frente, outro já tinha dito, já completando a lógica da situação; sobre ameaças ao cartório eleitoral de Santa Quitéria, tivemos notícia, fizemos diligências e a gente começou a circular nos diretórios e procurar pessoas que nos falassem sobre isso; que então soubemos de uma ligação na qual a pessoa ameaçava tocar fogo no prédio do cartório; foi acionada também a polícia militar e foi feito um aparato ao prédio do cartório, com uma certa vigilância, pois estava um clima muito tenso; depois foi feita uma averiguação por conta dos relatórios de inteligência da polícia civil e verificado que esse telefonema partiu da área de um dos presídios em que havia um integrante do comando vermelho; tudo indica que aquelas ameaças vinham do comando deles lá dentro do presídio (…);
Testemunha THIAGO TEIXEIRA SOARES BRITO: (…) fui filiado ao PSB, mas lá no estado do Piauí, pois sou piauiense de origem; aí me desfilei antes entrar na polícia; não sou eleitor de Santa Quitéria; meu domicílio eleitoral é no Piauí; não aderi a qualquer candidatura em Santa Quitéria, até porque eu não posso; não prestei serviços particulares a qualquer dos acionados; trabalho na unidade policial de Santa Quitéria desde 29 de julho de 2018; acompanhei o período da campanha eleitoral; cheguei a ver pichações em fachadas de residências com a sigla CV de comando vermelho, veiculando ameaças contra a candidatura do então candidato a prefeito Tomás Figueiredo; não sei precisar em quantos bairros, mas em vários deles tinha pichações; no âmbito da minha profissão nunca recebi ocorrência de ameaça contra eleitores do Tomás; ouvi comentários nesse sentido, mas ninguém chegou pra mim e disse “eu fui ameaçado”; ouvi dizer que na cidade estava tendo ameaça por telefone; foi ventilada na cidade uma informação de ameaças contra o cartório eleitoral de Santa Quitéria, que o cartório seria incendiado (…).
c) Esvaziamento dos atos de campanha do multicitado candidato Tomás Figueiredo, por meio das ameaças de agressões físicas e danos aos veículos de seus eventuais apoiadores:
Relativamente ao esvaziamento dos atos de propaganda eleitoral do então candidato Tomás Figueiredo, apesar das narrativas tendenciosas dos declarantes ouvidos, segundo os quais cada um dos quatro candidatos ao pleito majoritário adotava uma cor específica, e que os respectivos eleitores e apoiadores podiam circular livremente com roupas nas cores dos candidatos de sua preferência, essa falácia restou desconstituída, seja por meio de trechos elucidativos dos três relatórios técnicos produzidos pelo Departamento de Inteligência da Polícia Civil do Ceará, seja através da prova testemunhal idônea. Quanto aos relatórios de extração de dados dos aparelhos celulares utilizados pelo criminoso “Da30”, merecem ser destacados os trechos seguintes:
a.1) Relatório Técnico nº 234/2024/DIP/DGPC – 11/11/2024 (Id. 124520322), gerado a partir da extração de dados de um dos aparelhos celulares (iPhone XR, IMEI 1 357366098102217, IMEI 2 57366098416435) utilizado pelo criminoso faccionado Daniel Claudino de Sousa, conhecido como “Da30”, o qual revelou que: (…) k) em 28.07.2024 “Da30” mantém contato com o também faccionado Francisco Girvando Ferreira de Oliveira, conhecido pelas alcunhas de “Rikelme” e “Argentino”, e pede autorização para que o então candidato “Zé do Povo” fizesse visitas de cunho eleitoral na região de Trapiá, em Santa Quitéria, e pede que Rikelme obtenha apoio de Nenzinho da boate à candidatura de Kylvia, sob pena de que a boate dele fosse fechada pelo crime (...);
a.2) Relatório Técnico nº 235/2024/DIP/DGPC – 11/11/2024 (Id. 124520323), gerado a partir da extração de dados de outro aparelho celular (REALME NOTE 50, IMEI 1 865846072729106, IMEI 2 865846072719114 e terminar +5521986375953) utilizado pelo criminoso faccionado Daniel Claudino de Sousa, conhecido como “Da30”, o qual revelou que: (…) h) em troca de mensagens realizada em 31.08.2024 com interlocutora identificada apenas como Maria, o criminoso “Da30” informa que responderia a um processo na seara eleitoral, e em novas mensagens trocadas em 11.09.2024 o mesmo elemento informa que seguiria ao Ceará para resolver assuntos pessoais; (…) k) foi identificado o terminal telefônico nº +558899921221, salvo com a identificação de SO FRETE 12, e cujo interlocutor seria ANASTÁCIO PAIVA PEREIRA, conhecido pelas alcunhas de “12”, “DAZAREA”, “Paizão” ou “Paulinho Maluco”, liderança do Comando Vermelho com atuação em Santa Quitéria, Hidrolândia, Varjota, Reriutaba, Ipu, Ipueiras e Guaraciaba do Norte, e que teria sido alvo de uma operação policial realizada pelo BOPE na Favela da Rocinha; (…) foi identificado nesse segundo aparelho o contato de Kylvia de Lima (terminal nº 5588996121482), candidata a vereadora em Santa Quitéria, e que troca diversas mensagens com o criminoso “Da30”, nas quais: (…) p.4) é cientificada que um indivíduo identificado como RUGAL GUINHA tinha recebido recomendação de “Da30” no sentido de que Kylvia tinha que ganhar de qualquer jeito; (…) r.1) envia áudio de uma eleitora de Santa Quitéria, segundo a qual seu voto seria de confiança, e informa a KYLVIA que estava comprando votos para ela na localidade Trapiá, que já teria gasto em favor da campanha dela mais do que o próprio BRAGA; r.2) reclama não ter recebido dinheiro do “chefe”, mas que outros comparsas já teriam recebido o dinheiro deles (…) t) em diálogo mantido entre JP TARUGA e “Da30”, este: t.1) informa sobre seu apoio à campanha de Kylvia e que as áreas sobre seu comando votariam nela (…) v) em mensagens trocadas com “Da30” a partir de 08.08.2024 há indicação que DALILA (…) v.4) é orientada por “Da30” a identificar um carro de som que estava num evento de campanha de Tomás Figueiredo, mas em resposta a mesma diz já saber que se trata de MARCOS CURTYSOM; (…) w) foi identificado o terminal nº 558899661090, pertencente a ÍTALO RAMON SEVERO XEREZ, o qual troca mensagens com “Da30” nas quais: w.12) “Da30” orienta sobre como deveriam ocorrer as intimações aos eleitores e apoiadores de Tomás Figueiredo e ordena a pichação do muro de uma padaria em Santa Quitéria.
a.3) Relatório Técnico nº 249/2024/DIP/DGPC – 11/12/2024 (Id. 124520326), gerado a partir da extração de dados de outro aparelho celular (REALME NOTE 50, IMEI 1 865846072729106, IMEI 2 865846072719114 e terminar +5521986375953) utilizado pelo criminoso faccionado Daniel Claudino de Sousa, conhecido como “Da30”, o qual revelou que:
b) 1º Grupo “Jogadores natos” foi criado em 13.04.2024, às 17:12hs, por usuário não identificado, sendo composto por 16 (dezesseis) integrantes, com destaque para algumas mensagens adiante detalhadas: (…) b.6) ainda em 03.08.2024 Rikelme adverte aos demais sobre o início das atividades políticas; (…) b.8) em 15.08.2024 Rikelme ameaça aqueles que estivessem em grupos políticos de candidatos não apoiados por ele, adverte que havia infiltrados naqueles grupos, alerta que todos que não seguissem sua orientação seriam excluídos das ações do tráfico e teriam que viver de política, e ameaça atirar contra paredões de som e vidros de carros; b.9) em 16.08.2024 o usuário TAYSON relata sua preferência pela candidata Kylvia (…) e salienta que “nossa família” (Comando Vermelho) precisava de um representante na Câmara Municipal de Santa Quitéria; b.10) logo em seguida, Rikelme informa que os candidatos apoiados pela facção seriam Kylvia Lima, Gabriel Filho e “BG para Prefeito”(José Braga Barrozo); b.11) em 16.08.2024 Rikelme pede que intensifiquem as publicações nas redes sociais para conseguir o apoio dos viciados em drogas, informa que drogas seriam usadas para comprar votos desses viciados, sendo sua ideia prontamente apoiada pelo criminoso “Da30” e também por TAYSON, o qual sugere que essa compra de votos ocorresse nos três dias anteriores ao pleito eleitoral; (…) b.13) em 19.08.2024 Rikelme ordena que todas as casas que tivessem fotos do candidato Tomás, concorrente de José Braga Barrozo, fossem pichadas e que carros com adesivos do Tomás tivessem seus vidros e retrovisores quebrados, mas recomenda que não fosse colocado o nome de Braguinha nas pichações; b.14) naquele mesmo dia, ao giro das 17:54hs, Rikelme compartilha um texto contendo ameaças de morte a serem veiculadas em Independência, contra todos aqueles que “não fechassem com a tropa do Paulinho Maluco”; b.15) em 22.08.2024 Rikelme envia cartaz de um evento de campanha de Tomás Figueiredo a se realizar dois dias depois (em 24.08.2024, às 19hs), e volta a recomendar depredação de veículos que estivessem com adesivos de campanha dele, bem como depredação de bares que abrissem ou sediassem concentrações políticas de Tomás; b.16) em 24.08.2024 Rikelme informa ter sido autorizado pelo “Paizão” e recomenda pichações em todos os bairros de Santa Quitéria, com advertência de que as pessoas que apoiassem Tomás teriam problema com a “tropa do Paulinho Maluco”; (…) b.18) em 26.08.2024 Rikelme volta a cobrar pichações e vandalismo aos que manifestassem apoio ao candidato Tomás; (…) b.20) em 02.09.2024, Rikelme informa que “o chefe amanheceu doido por problema”, e que queria todos os bairros de Santa Quitéria pichados até a noite daquele mesmo dia, além do que compartilha uma mensagem que teria recebido de “Paulinho Maluco” (também conhecido por 12); b.21) ainda no dia 02.09.2024, ao giro das 22:14hs, o usuário DISNEY compartilha 04 (quatro) fotos contendo as pichações exigidas por Rikelme; b.22) em 04.09.2024 o usuário ADRIANO JB compartilha dois vídeos contendo pichações de ameaça contra eleitores de Tomás, as quais teriam sido feitas provavelmente no Bairro Flores, e adverte que o Hotel Santo Expedito estaria lotado de policiais, inclusive do setor de inteligência policial; (…) b.27) em 17.09.2024 após comentarem sobre uma grande operação da Polícia Civil em Santa Quitéria, MIRELLA SANTOS (Rikelme) encaminha um print de uma postagem no Instagram e pede que os demais identificassem as pessoas que estavam parabenizando a ação policial, e logo em seguida o criminoso “Da30” não apenas compartilha foto de alguns policiais que participaram da operação reunidos num restaurante, como expressa seu desejo de ter uma granada para soltar no meio daquele grupo de policiais (...);
c) 2º Grupo “Jogadores natos” foi criado em 21.09.2024, às 18:39hs, por usuário não identificado, sendo composto por 12 (doze) integrantes, com destaque para algumas mensagens adiante detalhadas: (…) c.5) em 28.09.2024 Rikelme volta a recomendar aos membros do grupo que compartilhassem mensagens de ameaça aos eleitores de Tomás Figueiredo; c.6) na mesma data, Rikelme revela sua preocupação diante de uma nova operação policial a ser realizada em Santa Quitéria, e que só teria sido vazada graças a um “pessoal de dentro” (informante da facção criminosa infiltrada dentro da própria delegacia, possivelmente a pessoa de LUZIA RAQUEL ANDRADE DE SILVA, a qual foi alvo de mandado de busca e apreensão ordenada por este juízo eleitoral, em 26.03.2025, no bojo do Proc. nº 0600012-49.2025.6.06.0054); c.7) em 29.09.2024 Rikelme recomenda que seja expulsa de Santa Quitéria uma mulher identificada como Geovana, e salienta que a ordem teria partido de “Paulinho Maluco”; c.8) naquele mesmo dia, o usuário 2L avisa que havia pessoas circulando por Santa Quitéria com camisas do “15” (número eleitoral do candidato Tomás), Rikelme ordena que os eleitores com tal vestimenta fossem agredidos, e ordena que os mesmos fossem expulsos da cidade(…);
d) Grupo “Partido dos Trabalhadores 13 PT” foi criado em 29.09.2024, às 06:02hs, por usuário identificado pela alcunha de FAIXA ROSA, sendo composto por 08 (oito) integrantes, com destaque para algumas mensagens adiante detalhadas: (…) d.2) naquele mesmo dia 29.09.2024, às 17:36hs, Rikelme compartilha um vídeo (…) e às 18:22hs adverte que era chegado o momento de deflagrar o “Plano B”, consistente em efetuar disparos de armas de fogo contra portas de algumas residências de Santa Quitéria; d.3) às 18:38hs do dia 29.09.2024 Rikelme relaciona eleitores de Tomás Figueiredo que deveriam ser expulsos da cidade, e em resposta o criminoso “Da30” informa que já havia ordenado a familiares de Geovana que ela estava expulsa, e que ela atenderia a ordem; d.4) às 18:45hs do mesmo dia 29.09.2024, no contexto dos diálogos sobre expulsão de eleitores, o criminoso “Da30” compartilha um áudio com a frase “Ô meu Deus do céu, tô doido pra pegar alguém, mano”; d.5) às 19:05h do mesmo dia 29.09.2024, o criminoso “Da30” ordena a realização de disparos na casa do Dr. Gatinais, e Rikelme complementar que por ordem do chefe (12 ou “Paulinho Maluco”) aos eleitores de Tomás deveriam ser destinados tiro, porrada e bomba; d.6) em resposta a Rikelme, o criminoso “Da30” lamenta não estar em Santa Quitéria para poder tomar parte na bagaceira e tocar fogo em tudo; (…) d.9) às 21:42hs do mesmo dia 01.10.2024 o usuário EVANDRO DO DENDÊ compartilha uma imagem contendo uma lista dos integrantes do Comando Vermelho em Santa Quitéria (…) e dez minutos mais tarde Rikelme perquire quem seriam os eleitores de Tomás Figueiredo, para que fosse localizada a pessoa de WESLEY, da Piracicaba, pois tinha contas a ajustar com ele; (…) d.11) em 02.10.2024 o criminoso “Da30” compartilha um vídeo em que aparecem eleitoras de TOMÁS, e diz que seriam outras que teriam que sair da cidade, e logo adiante, através de áudio, afirma que ligou para várias pessoas para que saíssem da cidade e que elas haviam saído; d.12) na sequência, o criminoso “Da30” comentou uma mensagem de FAIXA ROSA, em que este afirmava que uma das mulheres já teria recebido uma ligação e continuava duvidando da ordem; d.13) A última interação relevante do grupo ocorreu no dia 04.10.2024, às 10:49hs, quando EVANDRO DO DENDÊ comunica aos demais que não enviassem mensagens para a vereadora, provavelmente KYLVIA, pois a polícia havia levado o celular dela, afirmando ainda que ele iria sair do grupo, pois temia que a polícia aparecesse em sua casa.
É oportuno registrar trecho do relato do então candidato Tomás Figueiredo, ouvido em juízo como declarante, acerca do “modus operandi” usada pelos faccionados para esvaziar seus comícios e eventos de campanha, in verbis:
Declarante Tomás Antônio Albuquerque de Paula Pessoa: (…) eu faria um o evento dia 24 de agosto, mas a propaganda começou pelo dia 15 de agosto; eu tinha um evento de inauguração de um comitê, aí começaram a ser enviada as mensagens com ameaças; nós conseguimos fazer até um evento grande na época, mas foram fechados todos os bares e por onde a gente ia passando no lugar tinham aqueles bares que a gente deixava água, alguma coisa para que as pessoas fossem passando, e pudessem tomar uma água; todos eles recuaram, fecharam esses bares devido às ameaças; funcionava o toque de recolher para as pessoas; comerciantes foram obrigados a sair da cidade; cheguei lá no cartório eleitoral, não só no cartório eleitoral, como também no fórum ameaçado de queimar; essa história correu na cidade todinha; tinham ligado para o cartório e essas ameaças também correram nas redes sociais, de modo que toda a população do secretário tomou conhecimento desse fato; algumas motos tiveram pneus cortados, além do que avisaram para tirar propaganda eleitoral minha, ou iam queimar a moto; as pessoas não colocaram nenhuma propaganda, e tinham até medo de receber um santinho; existia tanta certeza da impunidade, porque já tinha se beneficiado uma vez, e por isso não respeitavam nada, passavam em frente da minha casa, rasgando; eu tinha uma bandeira que se colocava no meio da rua, que era dividida; eu mandava colocar a bandeira na entrada da cidade e em algumas ruas dos bairros, mas saíam derrubando minha propaganda, rasgando, levando embora, de modo que era uma situação difícil, inclusive para colocar esse material de propaganda minha; no bairro Pereiros eles ameaçavam; a ordem que eu recebi foi que eu não entraria no bairro dos Pereiros; fui para aquele bairro conseguimos levar uma quantidade de gente para fazer essa carreata, mas fomos surpreendidos no posto do Sr. Pompeu Lira Morais, pois ele fechou a luz, ficou a escuridão na entrada do bairro; a polícia veio de Crateús, e isso já era começo de setembro, e somente assim conseguimos realizar o evento de campanha (…).
A estratégia de esvaziamento dos atos de campanha eleitoral do então candidato Tomás Figueiredo restaram corroborados por prova testemunhal confiável, senão vejamos:
Testemunha Marcos Aurélio Elias de França: (…) tivemos casos em que é pessoas foram expulsas das casas, inúmeros imóveis pichados, sempre com ameaça, direcionada a um determinado candidato; as ameaças eram direcionadas ao candidato Tomás; esse candidato procurou a gestão, chegou a mim essa demanda e eu designei equipes para ir para o local e a inteligência, ao se debruçar sobre a situação e tentar, de alguma forma, identificar os responsáveis por essas ameaças, conseguimos identificar o áudio e telefone de um elemento que estaria vindo do Rio de Janeiro com a missão de tentar tumultuar o processo eleitoral em Santa Quitéria; (…) era o Daniel, de apelido Daniel Claudino, conhecido como “Da30; nós chegamos a pegar alguns áudios dele que ele passou para as pessoas ameaçarem (…) ele foi autuado em flagrante por ORCRIM e apreendido o aparelho celular dele; na audiência de custódia ele foi posto em liberdade (…) então, no dia seguinte, foi decretada a preventiva dele, e o Daniel foi preso novamente, quando ainda estava em Santa Quitéria; depois da prisão o mesmo demonstrou interesse em colaborar, demonstrou interesse em falar tudo o que sabia; ele estava irresignado com a organização criminosa porque ele se sentiu abandonado ou traído porque não foi honrado com ele o que, em tese foi acertado, e ele resolveu colaborar; foi aí então que o GAECO, junto comigo mesmo, eu participei de todos os processos de colaboração premiada; (…) ele disse que ele ia receber trezentos e poucos mil reais nessa função de tumultuar o processo, e para evitar que o candidato Tomás fosse eleito; ele deu uma informação importante, que na época a gente não sabia, mas na colaboração ele disse que o então prefeito, candidato à reeleição, tinha mandado cerca de um milhão e duzentos mil reais ou um milhão e meio de reais dentro de um veículo; (…) todas essas informações foram repassados pelo colaborador; essa informação foi repassada e foi confirmada, inclusive porque nós realizamos no dia 17 de dezembro do ano passado, nós realizamos uma operação na Rocinha e encontramos esse veículo dentro da casa do 12 (…) tem orientação de um elemento de apelido Riquelme, que é um intermediário entre o 12 e o “Da30”; ele também é uma liderança lá, e orienta o Daniel a não citar o nome do prefeito Braga nas pichações; isso tem na extração do aparelho celular dele para ele não citar. É como se tivesse orientando que, se eventual citar, poderia de alguma forma prejudicar a candidatura do Braga; a orientação era para se opor ao candidato Tomás, mas sem demonstrar preferência alguma pelo candidato José Braga Barroso; ele não poderia citar ou orientar nas pichações nenhuma menção ou elogio ou mandar votar no Braga; a orientação era atacar deliberadamente a candidatura do Tomás; sobre eleitores que tenham sido ameaçados, ameaçados de morte, ameaçados de agressão física ou expulsos de suas casas por terem demonstrado preferência pelo candidato Tomás, soubemos de muitos, inclusive pessoas apavoradas que saíram, abandonaram a cidade na véspera da eleição; sobre a reunião na justiça eleitoral com os dois candidatos para definir um cronograma, a fim de evitar que no mesmo dia ocorressem é ocorressem comícios de ambos os candidatos, eu soube que esse acordo não foi cumprido; os comícios do candidato Tomás eram esvaziados, pois as pessoas tinham medo de ir, porque estavam apavoradas com as ameaças que eram proferidas, seja através de grupo, WhatsApp, seja por meio de ameaças pessoais, inclusive havia mensagens dando conta de que era para tocar fogo em motocicletas de eleitores que tivessem adesivo do Tomás; eles estavam muito violentos; inclusive, há uma coisa que eu também reputo como grave; fotografaram a frente da casa de uma coordenadora da campanha do Tomás e mandaram uma mensagem dessa foto da casa dela; o 12, mandou mensagem perguntando se ela ainda estava trabalhando para o Tomás; em seguida o 12 disse que iria tocar fogo na casa dela; sobre alguma ameaça direcionada ao prédio do cartório eleitoral e a servidores da justiça eleitoral, tomei conhecimento que foi feita uma ligação, inclusive o pessoal do eleitoral ficou apavorado, ante as ameaças de tocar fogo no prédio do eleitoral; essa ameaça chegou por telefone, ligaram para o telefone do fórum eleitoral, ligaram e ameaçaram (…);
Testemunha Francisco José Martins da Silva: (…) soube de uma reunião feita no cartório eleitoral com a participação dos candidatos a prefeito para que o as datas de comício não coincidissem, isto para evitar confronto de eleitores, mas o acordo não foi cumprido, pois houve o esvaziamento dos comícios do candidato Tomás; a informação bem específica que saiu nessas mensagens era para que o comércio fechasse; houve realmente uma reunião com a promotora, Dra. Priscila, para que não houvesse colidência de horário e houvesse um equilíbrio também na utilização das ruas; que tinha sido marcado para um dia que não era previsto para o candidato Braga, mas aconteceu uma carreata na praça principal e estávamos presentes, com viaturas ostensivas, ficamos circulando e realmente não aconteceu nesse dia, mas houve algumas passagens de moto, e de carro com bandeira; percebi que aquele episódio era para testar a força policial, para saber se a polícia ia atuar, se o Estado ia atuar, ou se a coisa iria ficar largada; sobre uma determinação da juíza eleitoral, Dra. Anita, para que determinado comício, determinada carreata não ocorresse, eu vi nos relatórios de inteligência; na semana da votação a gente foi alocado para um outro local e um outro colega foi para Santa Quitéria; essa postura de desafio à justiça eleitoral só se deu por parte do candidato Braguinha; sobre a extração de dados do celular do Daniel Claudino, vulgo “Da30”, havia um diálogo bem patente, dizendo para fazer as pichações, mas não era para se referir ao Braga; essa orientação ou determinação teria partido do indivíduo 12, o qual era o mentor, e havia os executores locais; a mensagem vinha do Rio de Janeiro (…).
d) Ocorrência de ligação com ameaça de que o cartório eleitoral da 54ª Zona viesse a ser incendiado:
Relativamente às ameaças telefônicas direcionadas ao Cartório Eleitoral de Santa Quitéria, esta resultaram confirmadas por declarações do respectivo chefe do cartório, em sede de procedimento investigatório instaurado pelo MPE, mas também foram confirmadas por três das quatro testemunhas que prestaram o compromisso legal de dizer a verdade, por ocasião da audiência instrutória una de 14.04.2025. Confira-se, pois:
Declarações do Chefe do Cartório Eleitoral da 54ª Zona: (…) tomou conhecimento que diversos eleitores vinham ligando para o cartório eleitoral e informavam estarem recebendo ameaças e coações por meio de ligações telefônicas e telemáticas anônimas, de indivíduos que diziam ser integrantes da facção criminosa Comando Vermelho, com a ordem de que não votassem no candidato Tomás Figueiredo, sob pena de serem expulsos da cidade. Relatou ainda que: a) o candidato prejudicado compareceu ao cartório eleitoral, acompanhado de sua esposa, Dra. Cândida, e de seu advogado, Dr. Breno Paiva, para informar sobre as pichações contendo ameaças contra sua pessoa e contra seus eleitores e apoiadores; b) o próprio cartório eleitoral foi alvo de uma ligação telefônica anônima, ocorrida em 18.09.2024, realizada a partir do terminal telefônico (88) 988.2633, atendida pela funcionária Iranilda, a qual ficou muito nervosa após escutar a ameaça de que o cartório eleitoral seria atacado e os servidores seriam assassinados caso não parassem com as decisões contrárias “aos irmãos”; c) houve uma segunda ligação telefônica anônima na qual o criminoso desafiava só servidor a “botar a cara na rua”; ante a gravidade das ameaças contra a própria justiça eleitoral o fato foi informado à Polícia Federal e ao Ministério Público, de modo que o acesso ao cartório eleitoral passou a ser vigiado 24hs por dia; (…) e) após evento de campanha do candidato Tomás Figueiredo, realizado em 28.09.2024, chegaram ao cartório eleitoral novas informações de eleitores e apoiadores de Tomás, relatando terem sofrido ameaças por terem participado daquele evento, e na reta final da campanha os eleitores de Tomás vinha recebendo ordens de desocupação de suas residências, sob pena de levarem “bala na cara”; f) o clima de tensão coletiva ocasionou o envio de reforço de policiamento para Santa Quitéria; g) ante a abrangência das ameaças não tem dúvida de que o então candidato Tomás Figueiredo foi prejudicado em sua campanha;
Testemunha MARCOS AURÉLIO ELIAS DE FRANÇA: (…) sobre alguma ameaça direcionada ao prédio do cartório eleitoral e a servidores da justiça eleitoral, tomei conhecimento que foi feita uma ligação, inclusive o pessoal do eleitoral ficou apavorado, ante as ameaças de tocar fogo no prédio do eleitoral; essa ameaça chegou por telefone, ligaram para o telefone do fórum eleitoral, ligaram e ameaçaram (…);
Testemunha Francisco José Martins da Silva: (…) sobre ameaças ao cartório eleitoral de Santa Quitéria, tivemos notícia, fizemos diligências e a gente começou a circular nos diretórios e procurar pessoas que nos falassem sobre isso; que então soubemos de uma ligação na qual a pessoa ameaçava tocar fogo no prédio do cartório; foi acionada também a polícia militar e foi feito um aparato ao prédio do cartório, com uma certa vigilância, pois estava um clima muito tenso; depois foi feita uma averiguação por conta dos relatórios de inteligência da polícia civil e verificado que esse telefonema partiu da área de um dos presídios em que havia um integrante do comando vermelho; tudo indica que aquelas ameaças vinham do comando deles lá dentro do presídio (…);
Testemunha THIAGO TEIXEIRA SOARES BRITO: Sou policial militar de carreira (…) ouvi dizer que na cidade está tendo ameaça por telefone; foi ventilada na cidade uma informação de ameaças contra o cartório eleitoral de Santa Quitéria, que o cartório seria incendiado (…).
e) Descoberta de mensagens telemáticas em que criminosos faccionados do Comando Vermelho orientavam os executores das pichações para que omitissem o nome do candidato BRAGA, a fim de ocultar que estavam empenhados em favorecê-lo no pleito majoritário de Santa Quitéria:
Graças ao Relatório Técnico nº 249/2024/DIP/DGPC – 11/12/2024, produzido pelo Departamento de Inteligência da Polícia Civil do Ceará, a partir das mensagens extraídas de dois aparelhos celulares do criminoso Daniel Claudino de Sousa, vulgo “Da30”, foi possível identificar que o verdadeiro propósito da facção criminosa denominada Comando Vermelho não era só prejudicar a candidatura de Tomás Figueiredo, mas principalmente favorecer a candidatura de JOSÉ BRAGA BARROZO, tanto assim que por mais de uma vez o criminoso Rikelme orientou a seus comparsas que fossem feitas as pichações contendo as ameaças contra eleitores e apoiadores de Tomás Figueiredo, mas adotando a cautela de omitir o nome do então candidato Braguinha. Nesse pormenor, confira-se:
a.3) Relatório Técnico nº 249/2024/DIP/DGPC – 11/12/2024 (Id. 124520326), gerado a partir da extração de dados de outro aparelho celular (REALME NOTE 50, IMEI 1 865846072729106, IMEI 2 865846072719114 e terminar +5521986375953) utilizado pelo criminoso faccionado Daniel Claudino de Sousa, conhecido como “Da30”, o qual revelou que: (…) no 1º Grupo “Jogadores natos” criado em 13.04.2024, às 17:12hs, por usuário não identificado, sendo composto por 16 (dezesseis) integrantes, com destaque para algumas mensagens adiante detalhadas: (…) b.9) em 16.08.2024 o usuário TAYSON relata sua preferência pela candidata Kylvia (…) e salienta que “nossa família” (Comando Vermelho) precisava de um representante na Câmara Municipal de Santa Quitéria; b.10) logo em seguida, Rikelme informa que os candidatos apoiados pela facção seriam Kylvia Lima, Gabriel Filho e “BG para Prefeito”(José Braga Barrozo); (…) b.13) em 19.08.2024 Rikelme ordena que todas as casas que tivessem fotos do candidato Tomás, concorrente de José Braga Barrozo, fossem pichadas e que carros com adesivos do Tomás tivessem seus vidros e retrovisores quebrados, mas recomenda que não fosse colocado o nome de Braguinha nas pichações; (…) d) Grupo “Partido dos Trabalhadores 13 PT” (…) d.2) naquele mesmo dia 29.09.2024, às 17:36hs, Rikelme compartilha um vídeo (…) e às 18:22hs adverte que era chegado o momento de deflagrar o “Plano B”, consistente em efetuar disparos de armas de fogo contra portas de algumas residências de Santa Quitéria; d.3) às 18:38hs do dia 29.09.2024 Rikelme relaciona eleitores de Tomás Figueiredo que deveriam ser expulsos da cidade, e em resposta o criminoso “Da30” informa que já havia ordenado a familiares de Geovana que ela estava expulsa, e que ela atenderia a ordem; (…) d.5) às 19:05h do mesmo dia 29.09.2024, o criminoso “Da30” ordena a realização de disparos na casa do Dr. Gatinais, e Rikelme complementar que por ordem do chefe (12 ou “Paulinho Maluco”) aos eleitores de Tomás deveriam ser destinados tiro, porrada e bomba (...).
Saliente-se ainda que, pelo menos duas das quatro testemunhas compromissadas, e que foram ouvidas em juízo nesta AIJE, confirmaram essa estratégia do faccionados, senão vejamos:
Testemunha Marcos Aurélio Elias de França: (…) sobre troca de mensagens de aplicativos só ocorreu com a candidata a vereadora; tem orientação de um elemento de apelido Riquelme, que é um intermediário entre o 12 e o “Da30”; ele também é uma liderança lá, e orienta o Daniel a não citar o nome do prefeito Braga nas pichações; isso tem na extração do aparelho celular dele para ele não se dá. É como se tivesse orientando que, se eventual citar, poderia de alguma forma prejudicar a candidatura do Braga; a orientação era para se opor ao candidato Tomás, mas sem demonstrar preferência alguma pelo candidato José Braga Barroso; ele não poderia citar ou orientar nas pichações nenhuma menção ou elogio ou mandar votar no Braga (…);
Testemunha Francisco José Martins da Silva: (…) sobre uma determinação da juíza eleitoral, Dra. Anita, para que determinado comício, determinada carreata não ocorresse, eu vi nos relatórios de inteligência; na semana da votação a gente foi alocado para um outro local e um outro colega foi para Santa Quitéria; essa postura de desafio à justiça eleitoral só se deu por parte do candidato Braguinha; sobre a extração de dados do celular do Daniel Claudino, vulgo “Da30”, havia um diálogo bem patente, dizendo para fazer as pichações, mas não era para se referir ao Braga; essa orientação ou determinação teria partido do indivíduo 12, o qual era o mentor, e havia os executores locais; a mensagem vinha do Rio de Janeiro (…).
Diante de tal circunstância, resta obviamente desmontada a estratégia da defesa do promovido JOSÉ BRAGA BARROZO no sentido de tentar caracterizar que as ameaças, perseguições e expulsões de eleitores e apoiadores do então candidato Tomás Figueiredo seriam decorrência de uma suposta animosidade entre ele e o criminoso conhecido como “Paulinho Maluco” ou “12”. Pondere-se, entretanto que todos os tendenciosos declarantes ouvidos a pedido da defesa aludiram a esse factóide apenas por ouvir dizer, e a testemunhas de “memória seletiva” (RAIMUNDO NONATO PINTO BORGES) sustentou que a pretensa inimizade remontava ao ano de 2010. Sucede que o tal “Paulinho Maluco” nasceu em 1989, de modo que na data do suposto empurrão recebido tinha aproximadamente 21 (vinte e um) anos, e era apenas mais um jovem viciado.
Em paralelo, a instrução revelou que familiares de “Paulinho Maluco” permanecem residindo em Santa Quitéria, sem que se tenha qualquer notícia de animosidade entre eles e o então candidato Tomás Figueiredo, o qual relatou inclusive ter sido procurado por uma irmã do elemento “12” em busca de assistência médica após sofrer um acidente de moto, senão vejamos:
Declarante Tomás Antônio Albuquerque de Paula Pessoa: (…) eu nunca cheguei a fazer qualquer coisa contra a pessoa do 12; comentam como se o 12 tivesse alguma coisa pessoal contra mim; eu não conheço essa pessoa, mas conheço o pai dele, o seu Chico Buarque, que também tem o nome de Anastácio, trabalha no DAER, que é uma residência de estrada em Santa Quitéria, desde os anos de 1975, mais ou menos; ele é um funcionário, inclusive aposentado; nós sempre tivemos uma convivência pacífica; certa vez fui procurado pela irmã do 12; a Srta. Michelle ela tinha caído de moto e se encontrava no hospital municipal e o hospital municipal não tinha remédio e aconteceu que a mãe dela, enquanto ela, no período que ela passou hospitalizada, a mãe dela também teve um problema lá de estômago, de desidratação, e também se hospitalizou; mandaram pedir socorro na minha casa, mandaram a consulta médica e o Sr. Valter Mesquita, que depois foi de ser candidato a vereador; eu pedi a ele que fosse lá no hospital; não tenho nenhum desavença com ele (o 12), nem conheço; não lembro de Michelle trabalhou na prefeitura na minha gestão, mas a Quitéria Romária trabalhou na prefeitura, durante minha administração, ela trabalhava no pátio da prefeitura, era tipo de uma pessoa de serviços gerais que ia do banco, levava papel, trazia coisas (…).
É ainda oportuno aludir que o factóide da pretensa intriga entre o criminoso conhecido por “12” e o então candidato Tomás Figueiredo, construído a partir de boataria rarefeita, restou desmentida por duas testemunhas compromissadas, que por serem delegados de polícia, certamente teriam conseguido coletar alguma evidência da anunciada rixa, caso ela realmente tivesse existido. Quanto ao ponto, vale conferir, in verbis:
Testemunha Marcos Aurélio Elias de França: (…) a gente foi fazer o levantamento dos históricos de antecedentes e bateu a informação do colaborador; Francisco Leandro tinha envolvimento com o tráfico de drogas, no contexto de atuação do comando vermelho; sobre a alegação de que haveria um problema pessoal entre o 12 e o candidato Tomás, isso não está nos autos, foi apenas dito de forma solta, mas não conseguimos materializar essa informação; desconheço se a irmã do 12 foi funcionária da Prefeitura de Santa Quitéria (…);
Testemunha Francisco José Martins da Silva: (…) desconheço desavença pessoal entre o traficante 12 e o candidato Tomás, mas sei que uma parente, talvez uma irmã do 12 frequentava a casa do Tomás; desconheço qualquer confronto específico entre o 12 e o Tomás; soube que a irmão do 12 foi substituída por outra pessoa no período de gestação, e depois dessa licença não quiseram recolocar a pessoa na mesma função, mas isso foi uma coisa muito simples, não teve essa dimensão de animosidade; desconheço qualquer problema entre Tomás e o 12 que se referisse à eleição de 2016 (…).
f) Compra de veículo de luxo em Fortaleza, entregue na Favela da Rocinha ao “Paulinho Maluco”:
Relativamente à aquisição e entrega de um veículo de luxo, o qual veio a ser comprado numa agência de Fortaleza, conduzido até a capital fluminense pelos acionados FRANCISCO LEANDRO FARIAS DE MESQUITA e FRANCISCO EDNEUDO DE LIMA FERREIRA, e entregue dentro da Favela da Rocinha ao traficante conhecido por “Paulinho Maluco” ou “12”, os autos ostentam prova abundante nesse sentido. Com efeito, ainda na petição inicial foi acostado o Relatório Técnico nº 007/2024/SEINT/DPJIN/PCCE (Id. 124520324), segundo o qual:
a) O aludido relatório foi confeccionado com base nas informações recebidas a partir de uma denúncia anônima para o Departamento de Inteligência, informando que no dia 19/07/2024, dois funcionários públicos da Prefeitura de Santa Quitéria teriam viajado até a cidade do Rio de Janeiro/RJ para transportar um veículo para a organização criminosa Comando Vermelho e que teriam retornado no dia 21/07/2024, sendo eles Francisco Edineudo de Lima Ferreira e Francisco Leandro Farias de Mesquita, motorista do vereador Douglas Lima;
b) A viagem teria sido realizada a mando de Anastácio Pereira Paiva, vulgo "Doze", chefe da organização criminosa Comando Vermelho na região de Santa Quitéria, com o objetivo de entregar um veículo, modelo Mitsubishi Eclipse, cor branca, placa SBJ-4I74, 2023/2024, comprado no Ceará para o traficante Doze, atualmente residindo na capital fluminense, e após a entrega do veículo os dois funcionários teriam retornado de avião para o Estado do Ceará, tendo sido informado ainda que há uma forte influência do Grupo Narco Terrorista, Comando Vermelho, na cidade de Santa Quitéria, Ceará, especialmente na gestão municipal, por meio de influência na prefeitura, bem como pelos seus servidores que estariam corroborando com essa organização criminosa;
c) Com base nessas informações a equipe policial buscou aferir a congruência da denúncia anônima recebida, sendo então realizadas pesquisas pelos serviços de monitoramento veicular ficou constatado que: c.1) o aludido automóvel, nos dias 19 e 20/07/2024 realizou o deslocamento do Estado do Ceará até a Unidade Federal do Rio de Janeiro, começando a movimentação no dia 19/07/2024 aproximadamente às 11:30hs, na cidade de Fortaleza, e última passagem em território Cearense às 17:45hs do mesmo dia, na cidade de Brejo Santo, Ceará; c.2) às 18:48hs o veículo apresenta registro de passagem em Salgueiro, Pernambuco, e no dia 20/07/2024 o veículo foi registrado às 01:16hs, em Feira de Santana, Bahia; c.3) após o que teve sua imagem registrada às 04:58, em Jequié, Bahia, e às 05:55hs, em Planalto, Bahia; c.4) em continuidade, a equipe policial constatou a movimentação do veículo transpassando o Estado de Minas Gerais e chegando ao destino no Rio de Janeiro, na Duque de Caxias - BR040 em 20/07/2024 às 23:42:49; c.5) o veículo monitorado realizou o percurso de Fortaleza ao Rio de Janeiro do dia 19/07/2024, às 11:30hs, até o dia 20/07/2024, às 23:42hs, e pelas fotos extraídas dos próprios sistemas governamentais é possível analisar o deslocamento do veículo, pela BR-116 e que pelo menos no automóvel havia duas pessoas no seu interior, conforme fotografias reproduzidas no relatório técnico;
d) A Equipe policial, por meio do ofício nº 413/2024 DPJIN, oficiou às principais companhias aéreas para verificar se, no período indicado na denúncia, houve registro de passageiros com os nomes Francisco Edineudo de Lima Ferreira e Francisco Leandro Farias de Mesquita, e em resposta à solicitação, a companhia aérea Gol Linhas Aéreas disponibilizou uma lista de passageiros, informando que, no Voo 1739, com partida do Rio de Janeiro, no dia 21 de julho de 2024, às 21:40hs, e chegada prevista em Fortaleza às 00:55hs, do dia 22 de julho de 2024, os dois indivíduos embarcaram no respectivo voo, sendo ainda confirmado que Francisco Edineudo de Lima Ferreira ocupou o assento 25C e Francisco Leandro Farias de Mesquita ocupou o assento 25B no aludido Voo 1739;
e) Os indivíduos Francisco Edineudo de Lima Ferreira, portador do CPF 056.722.543-73, e Francisco Leandro Farias de Mesquita, portador do CPF 047.576.943-00, foram devidamente identificados por meio da resposta ao ofício enviado à companhia aérea Gol Linhas Aéreas, e ambos têm forte ligação com a Prefeitura de Santa Quitéria, conforme informações disponíveis no próprio site oficial da Prefeitura (https://www.santaquiteria.ce.gov.br/), eis que Francisco Edineudo de Lima Ferreira exercia a função de "Coordenador Administrativo de Gestão do Gabinete do Prefeito", enquanto Francisco Leandro Farias de Mesquita ocupava o cargo de Assessor Técnico Funcional junto ao Departamento Municipal de Trânsito (DEMUTRAN) do município de Santa Quitéria/CE;
f) Mediante pesquisas de antecedentes criminais de Francisco Leandro Farias de Mesquita, constatou-se que o mesmo responde ao Inquérito Policial da Delegacia Regional de Canindé 203/2020, por tráfico de drogas, por sua atuação como motorista responsável pelo tráfico de drogas em Santa Quitéria, em favor da facção criminosa Comando Vermelho, como se verifica no depoimento dos responsáveis pelo flagrante;
g) O acionado Francisco Leandro Farias de Mesquita também foi indiciado por tentativa de homicídio registrada no IP 546-94/2019, onde já se sondava pelas autoridades policiais o envolvimento de Leandro com a liderança local Doze, merecendo destaque um trecho do depoimento de ANTONIO GABRIEL RODRIGUES SILVA no Inquérito 432-203/2020, in verbis:
“Que é POLICIAL MILITAR lotado na BP/RAIO DE SANTA QUITÉRIA, sendo que há uma semana atrás recebeu informações de populares que os veículos COBALT CINZA, PLACA NPT-3171 e e um ONIX estariam sendo usado para TRANSPORTE ILÍCITO para transporte de drogas pela FACÇÃO DENOMINADA "COMANDO VERMELHO"; que também já recebera informações que a casa, ORIGEM do ora flagrante, sendo situada na rua POMPEU LIRA MARTINS, bairro "PEREIRA" seria utilizado para depósito de drogas; que hoje, em patrulhamento de rotina, avistou o veículo COBALT, placa NPT-3171, trafegando NORMALMENTE; que a viatura seguiu o ora INFRATOR, até a entrada da sua residência na rua POMPEU LIRA; que quando o INFRATOR percebeu que seria abordado saiu correndo para dentro de casa e guarnição correu atrás do mesmo; que o INFRATOR voltou para o primeiro andar da residência, onde ele fora INDAGADO se este teria dispensado algum material, tendo o mesmo negado; que a partir desse momento, a residência fora submetido à casa a busca; que foram encontrados em cima da guarda-roupa foram encontrados 18,4g de "MACONHA" em 22 "papelotes", 194 reais e vários embalagens para armazenamento de droga, bem como uma cápsula de munição, sendo o calibre NÃO IDENTIFICADO; que todos esses objetos estavam em cima da guarda-roupa; que o INFRATOR, indagado, disse que os OBJETOS e as drogas não seriam de sua propriedade; que a esposa do INFRATOR, a senhora ANA CAROLINA RIBEIRO RODRIGUES, estava presente na residência e acompanhou toda diligência, bem como fora comunicada da prisão do seu marido; que apenas após a diligência tomou consciência que o veículo narrado na denúncia anônima e a casa, na verdade, pertenciam a mesma pessoa, o ora infrator; que o conduziu para esta delegacia para os procedimentos legais cabíveis”.
h) O promovido Francisco Leandro Farias de Mesquita prestou seu depoimento nos autos do Inquérito Policial nº 546-94/ 2019, e na ocasião declarou o seguinte:
“É conhecido por LIU; QUE é amigo de João Deyve Soares Mesquita, vulgo Carrolinha; QUE não ver DOZE e VANDINHO faz muito tempo, nem mantém contato com eles; QUE nega ter ameaçado CARROLINHA DE MORTE, disse que CARROLINHA é seu amigo, que frequentemente CARROLINHA visita a casa da mãe do declarante e que é freguês da Lanchonete do HIGINO; QUE não conhece TALYSSON, rapaz que a época dos fatos trabalhava na lanchonete; QUE nega algum tipo de desavença com CARROLINHA E TALYSSON; QUE na época que CARROLINHA foi para Fortaleza deixou de falar com mesmo, presume ter sido esse o motivo para que CARROLINHA ter cogitado que o declarante tenha sido o autor das acusações; QUE nega ter qualquer tipo de parceria para o crime ou contato com DOZE ou VANDINHO.
i) O aludido veículo Eclipse Branco, placas SBJ4I74 está registrado em nome de RF COMÉRCIO DE VEÍCULOS LTDA, inscrita no CNPJ 086.326.030.001-18, nome fantasia AUTO SHOPPING JM, localizada Av. Sargento Hermínio Sampaio, nº 1607, Bairro Monte Castelo, em Fortaleza/CE, CEP nº 60326-500, e até a presente data não há registro de transferência e/ou intenção de venda para o veículo;
j) Com base nas informações obtidas, conclui-se que os termos apresentados na denúncia anônima são verossímeis e condizem com a realidade dos fatos apurados, eis que através da análise do trajeto realizado pelo veículo Eclipse Branco, placas SBJ4I74, foi possível confirmar que o automóvel deslocou-se do Estado do Ceará até o Estado do Rio de Janeiro, entre os dias 19/07/2024 e 20/07/2024, conforme os registros de percurso;
k) Além disso, constatou-se que o veículo transportava, no mínimo, duas pessoas em seu interior durante essa viagem, sendo ainda verificado por meio da resposta da companhia aérea Gol Linhas Aéreas, que os indivíduos Francisco Edineudo de Lima Ferreira, portador do CPF 056.722.543-73, e Francisco Leandro Farias de Mesquita, portador do CPF 047.576.943-00, embarcaram juntos no voo de retorno do Rio de Janeiro para Fortaleza, no dia 21/07/2024, com chegada em Fortaleza dia 22/07/2024;
l) Foi igualmente confirmado que ambos possuem vínculos formais com a Prefeitura de Santa Quitéria, exercendo cargos públicos relevantes na administração pública local, sendo que na época dos fatos Francisco Edineudo de Lima Ferreira ocupava a função de Coordenador Administrativo de Gestão do Gabinete do Prefeito, enquanto Francisco Leandro Farias de Mesquita atuava como Assessor Técnico Funcional no Departamento Municipal de Trânsito (DEMUTRAN);
m) Francisco Leandro Farias de Mesquita possui um histórico de atuação como motorista em atividades ilícitas, especialmente no tráfico de drogas para a organização criminosa Comando Vermelho na região de Santa Quitéria, a qual tem uma forte presença na região, além de ser suspeito de envolvimento em homicídios e de acordo com informações obtidas, mantém proximidade com a liderança local do Comando Vermelho, conhecida como Doze, e tal histórico de envolvimento como motorista em atividades criminosas reforça a possibilidade de que Leandro tenha sido o responsável pelo deslocamento do veículo Eclipse Branco;
n) Diante de todos elementos expostos, é possível concluir que a atividade suspeita do grupo e o envolvimento de funcionários públicos no deslocamento do veículo são sérias e demandam uma investigação mais aprofundada para verificar a extensão das práticas ilícitas e as responsabilidades envolvidas.
Para robustecer o envolvimento dos dois últimos acionados no recebimento do veículo de luxo em Fortaleza, transporte do mesmo à capital fluminense para ser entregue ao traficante “12”, e imediato retorno a Fortaleza, foram trazidos aos autos:
a) O ofício nº 413-2024/DPJIN/PCCE (Id. 124797218 e Id. 124797219), através da qual a empresa GOL Linhas Aéreas S/A informa o regresso dos mesmos a Fortaleza, na noite de 21.07.2024, no voo 1739;
b) A nota fiscal de compra do multicitado veículo, faturado em 03.07.2024, ao preço de R$178.000,00 (cento e setenta e oito mil reais), em nome do “laranja” ANTÔNIO VILMAR LOPES DE MORAES (Id. 124851557);
c) Mandado de busca e apreensão de documentos, cumprido na empresa RF Comércio de Veículos Ltda, situada na Av. Sgt. Hermínio, 1607, Bairro Monte Castelo, em Fortaleza/CE, que indicam que o verdadeiro preço de aquisição do veículo Eclipse foi R$225.000,00 (duzentos e vinte e cinco mil reais), sendo paga a entrada de R$100.000,00 (cem mil reais) através de 07 (sete) operações através de pix, em valores variados, e o saldo devedor de R$125.000,00 (cento e vinte e cinco mil reais), a ser pago através do resgate de 36 (trinta e seis) notas promissórias com valores individuais de R$7.000,00 (sete mil reais) (Id. 124851557);
d) Comprovantes de pagamentos feitos por meio de pix, sendo um deles de R$49.000,00 (quarenta e nove mil reais), realizado em 01.07.2024, às 16:45hs, pela acionada KYLVIA MARIA DE LIMA OLIVEIRA, através de sua conta corrente mantida no Banco Santander (Id. 124851557).
Como se a prova documental acima aludida não fosse suficientemente robusta, a mesma ainda restou corroborada por prova testemunha idônea, senão vejamos:
Testemunha Marcos Aurélio Elias de França: (…) foi decretada a preventiva dele, e o Daniel foi preso novamente, quando ainda estava em Santa Quitéria; depois da prisão o mesmo demonstrou interesse em colaborar, demonstrou interesse em falar tudo o que sabia; ele estava irresignado com a organização criminosa porque ele se sentiu abandonado ou traído porque não foi honrado com ele o que, em tese foi acertado, e ele resolveu colaborar; foi aí então que o GAECO, junto comigo mesmo, eu participei de todos os processos de colaboração premiada; O Daniel narrou o detalhe de como se deu a missão dele, saindo do Rio de Janeiro para Santa Quitéria, a data que saiu; que as funções dele seria, no primeiro momento, tumultuar a campanha de um do Tomás; depois tomar a cidade de Varjota da facção GDE; essas seriam as missões dele; então ele disse detalhes, ele informou na colaboração premiada, onde cada uma dessas lideranças do comando vermelho moravam dentro da favela da Rocinha, no Rio de Janeiro; ele disse que ele ia receber trezentos e poucos mil reais nessa função de tumultuar o processo, e para evitar que o candidato Tomás fosse eleito; ele deu uma informação importante, que na época a gente não sabia, mas na colaboração ele disse que o então prefeito, candidato à reeleição, tinha mandado cerca de um milhão e duzentos mil reais ou um milhão e meio de reais dentro de um veículo; ele deu as características do veículo, disse que tinham sido dois elementos que teriam levado esse veículo para o Rio de Janeiro; eu vi o veículo, mas não sou muito de decorar a marca; era um veículo importado, branco; na ocasião ele informou o nome de um, e que esse rapaz era funcionário, era o braço direito, era o motorista do então prefeito; com essas informações que ele passou ao trabalho de inteligência, nós conseguimos localizar fotografias do veículo em deslocamento para o Rio de Janeiro; ele falou que marcou um encontro com esses dois elementos que estavam no carro na Praça Nelson Mandela, no Rio de Janeiro; ele estava no Botafogo e encontrou com esses dois elementos na Praça Nelson Mandela; o “Da30” saiu em uma moto, subindo a Rocinha, sendo seguido por esses dois elementos no carro; quando chegaram na casa do 12, ele mesmo ajudou a desmontar a carenagem, as lanternas traseiras, ajudou a tirar o dinheiro, a contar o dinheiro; esse dinheiro foi entregue na mão do 12 e o carro também ficou lá, sendo utilizado pela esposa do 12; todas essas informações foram repassados pelo colaborador; essa informação foi repassada e foi confirmada, inclusive porque nós realizamos no dia 17 de dezembro do ano passado, nós realizamos uma operação na Rocinha e encontramos esse veículo dentro da casa do 12; depois, quando foi expedido mandado de busca e apreensão, esse traficante colocou esse veículo à venda em uma concessionária no Rio de Janeiro e esse veículo foi apreendido e se encontra nos autos lá do processo; acho que foi o GAECO do Rio de Janeiro que aprendeu esse veículo em uma concessionária lá do Rio de Janeiro (…);
Testemunha Francisco José Martins da Silva: (…) quanto ao carro entregue no Rio de Janeiro, eu tomei ciência já depois, com os relatórios; a ideia central era de que havia realmente então uma ligação com o candidato Braga porque eram os assessores deles que estavam encaminhando esse veículo lá para o Rio de Janeiro e esse veículo havia sido constatado na diligência que a polícia civil fez com o GAECO lá do Rio de Janeiro; chegaram à residência do 12 e o veículo estava lá na casa dele, mas não havia uma explicação plausível para sair daqui, bem como a questão do pagamento desse veículo; a ideia que nos fez ver que havia uma ligação muito estreita foi a presença de muitos elementos indiciários que colocavam o então prefeito e candidato dentro dessa trama; os dois assessores do Prefeito José Barroso Braga, que teriam sido encarregados de conduzir esse veículo até o Rio de Janeiro foram Francisco Ednaldo e Francisco Leandro, sendo que um deles até já tinha passagem pela polícia, já tinha sido preso em flagrante; havia notícias de uma ligação mais próxima com o pessoal do comando vermelho, e eram assessores do prefeito; não tem como não estar sabendo, não estar envolvido numa situação dessa; é muito complicado pois o valor do carro é muito expressivo, mais de R$200.000,00 (duzentos mil reais), salvo engano; foi esse conjunto de elementos, essa situação de pressões que favoreciam demasiado porque deixavam todos os eleitores do outro lado receosos de se manifestar, de dizer a quem votar, de chamar os seus parentes, seus amigos, para votar; sobre a compra do carro entregue na Rocinha, houve uma informação de um pix feito pela candidata Kilvia; parece que era um pix de R$45.000,00 (quarenta e cinco mil reais), usado para pagar parte desse carro na concessionária; ela negou tudo na época, mas depois surgiu a notícia de que ela era envolvida com o crime, com facção, e naqueles diálogos também havia menção à pessoa dela, dizendo que apoiavam ela, que tinha um gasto, coisas assim que ao entender que realmente ela estava bem envolvida nos fatos; não tomei conhecimento se havia dinheiro oculto dentro do carro entregue no Rio de Janeiro ao traficante 12; soube que foram acompanhados alguns dos trajetos do carro levado por Francisco Edneudo e Francisco Leandro ao Rio de Janeiro; depois eles voltaram de avião; eles passaram apenas dois ou três dias no Rio de Janeiro, entregaram o carro e logo no dia seguinte já retornaram, não era uma viajem de turismo, era mesmo para cumprir uma obrigação; depois eles voltaram no mesmo voo, e um detalhe também que foi bem pontuado é que a companhia menciona até os assentos (…);
Testemunha THIAGO TEIXEIRA SOARES BRITO: (…) vi através do Fantástico a notícia de que um carro de luxo teria sido transportado até o Rio de Janeiro e entregues a um dos chefes do Comando Vermelho, na favela da Rocinha; segundo a matéria os funcionários encarregados de levar o carro foram o Francisco Edneudo e o “Liu”; segundo a matéria o carro foi encontrado na favela da Rocinha, no Rio de Janeiro; foi encontrada na casa do comandante do tráfico na cidade, o 12; segundo relatos o 12 é filho de Santa Quitéria, natural daqui; só vim ter ciência sobre a atuação de Daniel Claudino quando ele foi preso (…).
Outra circunstância a ser considerada é que os autos não apontam condição financeira sólida da acionada Kylvia de Lima, mas evidenciam que dos cinco promovidos o único que ostenta potencial financeiro significativo seria José Braga Barrozo. Nesse sentido, vale referir que segundo a declaração de ajuste anual de IRPF 2024-2023 do primeiro acionado (Id. 124550930) o mesmo é proprietário de quatro imóveis, dois veículos e dinheiro em espécie, os quais totalizariam patrimônio de quase R$1.000.000,00 (um milhão de reais), entretanto, não se pode desconsiderar que dos quatro imóveis informados à Receita Federal do Brasil, pelo menos dois deles estão com valores desatualizados. Nesse sentido, vale destacar que um apartamento situado na Rua Andrade Furtado, nº 1977, Bairro Cocó, em Fortaleza/CE, se encontra informado pelo valor de apenas R$70.000,00 (setenta mil reais), quando na verdade seu valor de mercado provavelmente supera o décuplo dessa cifra.
Finalmente, cumpre aduzir que as precárias condições financeiras da então candidata Kylvia foram reveladas em diálogos telemáticos extraídos dos celulares do criminoso “Da30”, o qual chegou mesmo a destacar que ele próprio estaria gastando mais na campanha de Kylvia do que o próprio Braguinha. Destarte, as evidências apontam no sentido de que o pagamento via pix, no valor de R$49.000,00 (quarenta e nove mil reais) revela que a multicitada candidata a vereadora teria atuado como mero “laranja” do único detentor de capacidade financeira para retribuir os esforços dos faccionados do Comando Vermelho em prol de sua candidatura ao pleito majoritário de Santa Quitéria.
a.2) Relatório Técnico nº 235/2024/DIP/DGPC – 11/11/2024 (Id. 124520323), (…) revelou que: (…) p) foi identificado nesse segundo aparelho o contato de Kylvia de Lima (terminal nº 5588996121482), candidata a vereadora em Santa Quitéria, e que troca diversas mensagens com o criminoso “Da30”, nas quais: (…) p.3) informa sobre a atuação de um tal Raimundo, escalado para ajudar na campanha de Kylvia; p.4) é cientificada que um indivíduo identificado como RUGAL GUINHA tinha recebido recomendação de “Da30” no sentido de que Kylvia tinha que ganhar de qualquer jeito; (…) r) em mensagens trocadas em 21.10.2024 “Da30”: r.1) envia áudio de uma eleitora de Santa Quitéria, segundo a qual seu voto seria de confiança, e informa a KYLVIA que estava comprando votos para ela na localidade Trapiá, que já teria gasto em favor da campanha dela mais do que o próprio BRAGA (…).
Saliente-se mais que a proximidade entre os promovidos KYLVIA e BRAGA não resultava apenas do fato de pertencerem a partidos que se coligaram durante o pleito de 2024, mas também em função da notória proximidade entre Kylvia e o criminoso “Da30”, o que leva a crer que aquela funcionava como um autêntico elo de ligação entre BRAGA e o traficante “12”, líder do Comando Vermelho que tinha sob suas ordens a pessoa de “Da30”.
g) Financiamento de campanha da candidata KYLVIA MARIA DE LIMA OLIVEIRA com recursos de origem espúria:
Quanto ao financiamento de campanha de KYLVIA, as várias transcrições dos relatórios técnicos produzidos pelo Departamento de Inteligência da Polícia Civil do Estado do Ceará, inclusive e especialmente o trecho acima consignado no tópico anterior revelam que: a) Kylvia não dispunha de recursos próprios para realizar sua campanha, e aceitou de muito bom grado ser uma das candidatas do Comando Vermelho; b) o criminoso “Da30” não apenas investiu dinheiro oriundo do tráfico de drogas na campanha de Kylvia, como ainda recrutou indivíduos para apoiá-la; c) o criminoso “Da30” solicitou apoio a Rikelme para que compelisse Nenzinho da Boate a aderir à candidatura de Kylvia, sob pena de que o crime organizado fechasse a boate dele, tal como apontado no Relatório Técnico nº 234/2024/DIP/DGPC – 11/11/2024 (Id. 124520322). Por todos esses fatores, resulta induvidoso que a aludida candidata abusou do poder econômico gerado pelo tráfico de drogas perpetrado habitualmente por faccionados integrantes do Comando Vermelho, e com atuação em Santa Quitéria.
2.2.4 Da análise das teses defensivas de JOSÉ BRAGA BARROZO
a) Ausência de participação do contestante em quaisquer atos de coação de eleitores durante a campanha eleitoral de 2024:
Não merece prosperar o argumento, pois ainda que José Braga Barrozo não tenha realizado, de forma pessoal, ameças, intimidações ou expulsões de eleitores, o conjunto do acervo probatório revela que ele se valeu de terceiros, integrantes de uma facção criminosa, não apenas para “turbinar” sua própria candidatura, mas especialmente para destruir qualquer chance e de êxito de seu adversário Tomás Figueiredo.
Caso não houvesse articulação entre o candidato Braga e os executores das ações de terrorismo interno produzidas em Santa Quitéria, nas eleições de 2024, não haveria qualquer preocupação do criminoso Rikelme em advertir cotinuadamente a seus subordinados que omitissem qualquer alusão ao nome de Braguinha nas pichações contendo ameaças contra os eleitores de Tomás.
De igual forma, caso inexistisse um conluio entre Braga e os elementos faccionados que atuaram decisivamente durante o pleito eleitoral de 2024, o aludido alcaide não teria motivos para permitir, ou autorizar (senão mesmo determinar) que dois funcionários comissionados da Prefeitura de Santa Quitéria, com os quais guardava relações de proximidade, se deslocassem até Fortaleza para receber o automóvel de luxo comprado por R$225.000,00 (duzentos e vinte e cinco mil reais), para depois conduzi-lo por dois dias e entregá-lo dentro da Favela da Rocinha, ao traficante conhecido por “12”.
Demais disso, nunca é demais relembrar trecho do depoimento do Delegado de Polícia Civil, Dr. Marcos Aurélio Elias de França, o qual foi ouvido como testemunha compromissada, e relatou que a “generosidade” do Prefeito Braga para com o líder faccionado conhecido por “12” ou “Paulinho Maluco” não estava restrita à doação do veículo de luxo, e ao serviço de “delivery”, mas ainda ao significativo “recheio pecuniário” que teria seguido dentro da carenagem do Mitsubishi Eclipse, senão vejamos:
“(…) era o Daniel, de apelido Daniel Claudino, conhecido como “Da30; (…) conseguimos localizá-lo no mesmo; ele foi autuado em flagrante por ORCRIM e apreendido o aparelho celular dele; na audiência de custódia ele foi posto em liberdade (…) mas as informações foram evoluindo dentro das extrações telefônicas, e indicaram que ele iria tumultuar o processo eleitoral; (…) depois da prisão o mesmo demonstrou interesse em colaborar, demonstrou interesse em falar tudo o que sabia; ele estava irresignado com a organização criminosa porque ele se sentiu abandonado ou traído porque não foi honrado com ele o que, em tese foi acertado, e ele resolveu colaborar; (…) ele disse que ele ia receber trezentos e poucos mil reais nessa função de tumultuar o processo, e para evitar que o candidato Tomás fosse eleito; ele deu uma informação importante, que na época a gente não sabia, mas na colaboração ele disse que o então prefeito, candidato à reeleição, tinha mandado cerca de um milhão e duzentos mil reais ou um milhão e meio de reais dentro de um veículo; ele deu as características do veículo, disse que tinham sido dois elementos que teriam levado esse veículo para o Rio de Janeiro; eu vi o veículo, mas não sou muito de decorar a marca; era um veículo importado, branco; na ocasião ele informou o nome de um, e que esse rapaz era funcionário, era o braço direito, era o motorista do então prefeito; com essas informações que ele passou ao trabalho de inteligência, nós conseguimos localizar fotografias do veículo em deslocamento para o Rio de Janeiro; ele falou que marcou um encontro com esses dois elementos que estavam no carro na Praça Nelson Mandela, no Rio de Janeiro; ele estava no Botafogo e encontrou com esses dois elementos na Praça Nelson Mandela; o “Da30” saiu em uma moto, subindo a Rocinha, sendo seguido por esses dois elementos no carro; quando chegaram na casa do 12, ele mesmo ajudou a desmontar a carenagem, as lanternas traseiras, ajudou a tirar o dinheiro, a contar o dinheiro; esse dinheiro foi entregue na mão do 12 e o carro também ficou lá, sendo utilizado pela esposa do 12 (…).
Nesse cenário fático resta impossível afastar a ocorrência de abuso do poder político e do poder econômico, pois se um candidato que faz uso de “Caixa 2” já abusa do poder econômico, com muito maior razão um candidato que troca favores com o crime organizado, e que compra a adesão do crime organizado para, por meio de ameaças, intimidações e expulsões de eleitores, minar e destruir candidaturas alheias.
É certo que o candidato Braga não poderia, ele próprio, realizar tais ameaças, intimidações ou expulsões de eleitores aderentes das candidaturas rivais, inclusive ante as notícias de que o mesmo sofreu amputação de, pelo menos, um de suas pernas, e teria sua saúde supostamente fragilizada por força de um câncer. Contudo, a prevalecer o argumento da defesa nem mesmo os mandantes dos crimes mais graves poderia ser chamados à responsabilização criminal. Com efeito, o conjunto do acervo probatório bem demonstra que o Prefeito José Braga Barrozo agiu como “homem de trás”, e soube recrutar terceiros para agirem como “homens da frente”, empenhados na execução do trabalho sujo.
Finalmente, e para melhor subsunção dos fatos à norma, cumpre invocar o magistério do Joel José Cândido6 sobre o que possa caracterizar abuso do poder econômico, do poder político, e do poder de autoridade, in verbis:
“Abusos eleitorais. Conceitos – Os principais abusos que podem ensejar medidas processuais contra os respectivos infratores, inclusive impedindo ou cassando seus registros e/ou diplomas, podem ser assim conceituados, genericamente:
a) Abuso do poder econômico – É o emprego, em todo o período das campanhas eleitorais, pelos partidos políticos, coligações ou candidatos, de recursos que, mesmo oriundos de fonte lícita, pela desproporção de seus altos valores para com os objetivos a que se destinam, venham desigualar a busca pelos votos em relação aos demais partidos políticos, coligações ou candidatos.
b) Abuso do poder político – É o emprego, em todo o período das campanhas eleitorais, por quem exerce atividade político-partidária, de prática que afronte a ética, o decoro, a liberdade de voto, a moralidade para o exercício do mandato eletivo ou os bons costumes políticos que devem reinar no Estado Democrático de Direito.
c) Abuso do poder de autoridade – É a prática, em todo o período das campanhas eleitorais, por quem exerce autoridade estatal, de atos inerentes a cargos ou funções públicas que venham a favorecer, direta ou indiretamente, partido político, coligação ou candidato”.
Ainda sobre o deplorável fenômeno do abuso de poder durante o período eleitoral e seus efeitos corrosivos à democracia, merecem atenção as lições de Fávila Ribeiro7, in verbis:
“O Direito Eleitoral revela continuado propósito em garantir a vontade genuína do corpo eleitoral, através da qual pode germinar a representação política em sua autenticidade substancial. Na realidade, são definidas medidas de contenção contra qualquer tipo de poder, seja político, cultural, econômico e social. É o poder, por suas injunções compulsivas, que deve ser refreado. As pressões ostensivas promanavam outrora do poder político, em seus esgalhamentos administrativos, mas hoje se exprimem também pelas dominações privadas. Devem ser calafetados todos os flancos para obstar as nocivas investidas de qualquer tipo de poder, e não somente do poder público, pois todos compõem a realidade existencial da sociedade contemporânea, com reservas de nocividades subjacentes a demandar cautelas. (…) Foi-se observando, porém, de eleição para eleição, que recomeçavam de forma cada vez mais nociva e ousada as intromissões indébitas do poder público, exacerbando o clientelismo político, com prestações de serviços ou administração de pessoal em larga escala, ou afetação de situações vantajosas a servidores públicos com prebendas eleitorais”.
Ora, se o abuso de poder econômico já se mostrava grave quando recursos financeiros de origem lícita eram fortemente injetados durante a eleição para minar as forças morais dos eleitores, e estimular que se vendessem como se fossem mercadorias descartáveis, o que dizer de uma situação fática em que o eleitor é literalmente reduzido à condição análoga a de um escravo? O que dizer quando ponderável parcela do corpo eleitoral é forçada a aderir a um projeto político que optou por se aliar ao crime organizado? Perguntas meramente retóricas que explicitam uma hedionda situação de corrupção endêmica que não pode, e nem deve ser tolerada, seja pelo Estado, seja por homens e mulheres livres.
b) Existência de prévia animosidade entre “Paulinho Maluco” (também conhecido como 12) e o candidato Tomás Figueiredo”:
Consoante já consignado linhas atrás, o argumento de animosidade pretérita entre o criminoso “12” e o então candidato Tomás Figueiredo não passou de um factóide cuidadosamente concebido, com vistas a tentar demonstrar que os faccionados não estavam a serviço da candidatura de Braga, mas apenas operando contra a candidatura de Tomás Figueiredo.
Não houve uma única testemunha que corroborasse de maneira consistente essa espécie de “álibi invertido”. Aliás, nem mesmo os declarantes ouvidos a pedido da defesa, que em maior ou menor fração demonstraram sua tendenciosidade, foram capazes de indicar com um mínimo de precisão quando teria nascido a onírica rixa entre o temido traficante “12” e o então candidato Tomás Figueiredo.
Não foram capazes de apontar uma única pessoa que tivesse presenciado o suposto empurrão. Não foram capazes de indicar uma única testemunha que tivesse assistido alguma declaração explícita de inimizade do traficante “12” contra o candidato Tomás. Não foram capazes de apontar o local em que teria se dado a suposta agressão do candidato ao traficante.
Nesse contexto, atribuir credibilidade a essa versão não apenas importaria em dar “foros de verossimilhança” a suposta boataria rasteira, como ainda caracterizaria absoluta ingenuidade do magistrado subscritor. Portanto, não há como prosperar tal argumento.
c) Fragilidade do acervo probatório:
Alegar fragilidade do acervo probatório nada mais representa que argumento meramente retórico e vazio quando a defesa se vê cercada de provas contrárias aos interesses de seus patrocinados. Pode ainda ser uma evidência do fenômeno do “autoengano”, acerca do qual discorreu com maestria o célebre Eduardo Gianetti, festejado economista, professor e membro da Academia Brasileira de Letras. Aliás, assim aduziu o notável acadêmico, em seu livro de título idêntico, in verbis:
“Mentimos para nós mesmos o tempo todo: adiantamos o despertador para não perder a hora, acreditamos nas juras da pessoa amada, lembramos e esquecemos de acordo com nossas convicções. Para o nosso bem ou nossa ruína, o autoengano permeia grande parte das opções e julgamentos que fazemos. Corrente também no plano biológico – um vírus altera a própria estrutura química para iludir o sistema imunológico – esse fenômeno se basei na capacidade que temos de acreditar que somos aquilo que não somos”8.
Finalmente, a propósito do valor do acervo probatório, invocamos mais uma vez o autorizado magistério de Ionilton Pereira do Vale, in verbis:
“Naturalmente pensamos que o destinatário da prova é o magistrado (destinatário imediato). Este sem dúvida é o destinatário majoritário da prova, visto que em sua tarefa de subsunção do cotejo das provas, é este sujeito processual superpartes que irá aquilatar e sopesar as provas produzidas, de acordo com o ônus das partes e afinal decidir o objeto do processo. (…) Quanto ao segundo critério, vale dizer, aquele que diz respeito ao grau de certeza gerado pela prova, será ela prova plena (ou evidente) e semiplena (ou incompleta). Deste modo para a prova de certos fatos, o legislador exige apenas um juízo de verossimilhança e, para outros, impõe que a prova seja convincente prima facie. Com efeito, para a condenação penal, por exemplo, é necessário um elevado grau de certeza sobre a prova do fato e da autoria, ao passo que para a decretação da prisão preventiva, a lei se contenta com a prova (plena) da existência do fato e “indícios suficientes” de autoria”9.
d) Ausência de nexo entre o cadáver encontrado em Varjota e a campanha eleitoral de Santa Quitéria:
Eis a única tese sustentada pela defesa e que aparentemente merece acolhida, isto porque a instrução processual revelou que o cadáver encontrado em cima da parede do sangradouro do açude de Varjota pertencia a indivíduo que possivelmente integrava facção criminosa rival do Comando Vermelho. Com efeito, os relatórios técnicos produzidos pelo Departamento de Inteligência da Polícia Civil do Ceará apontaram que dentre as missões assumidas pelo criminoso “Da30” havia duas aparentemente distintas, vale dizer: a) favorecer a candidatura de Braga, ao cargo de Prefeito de Santa Quitéria, através de ameaças, intimidações e expulsões de eleitores e apoiadores de Tomás Figueiredo; b) eliminar outros criminosos de uma facção rival de Varjota, com o fito de que o Comando Vermelho assumisse o controle hegemônico do tráfico de drogas naquela cidade. Portanto, as evidências indicam que aquele homicídio não teve relação direta com o eleitorado de Santa Quitéria.
e) Inexistência de vínculo político entre o contestante BRAGA e a então candidata KYLVIA:
O argumento de ausência de vínculo político entre KYLVIA e BRAGA consiste em tese natimorta, pois esse vínculo se cristalizou na medida em que o partido político de Kylvia se coligou ao partido político de Braga. Destarte, ainda que a interação entre ambos fosse meramente institucional, mesmo assim não poderia ser negada sua existência.
Sucede que o acervo probatório revelou uma sintonia muito mais refinada entre ambos, eis que não seria razoável conclusão diversa, notadamente quando o mais dedicado cabo eleitoral de Kyvia, qual seja o traficante “Da30” chegou a afirmar que estava injetando mais dinheiro na campanha dela do que o próprio Braga. Com efeito, ainda que Braga não tivesse o mesmo empenho e a mesma generosidade financeira para com a campanha de Kylvia, não se pode minimizar a vinculação e a interação de ambos, e quanto a isso é oportuno referir fotografias de ambos juntos durante a campanha eleitoral (Id. 124520653), ainda que o declarante Douglas Lira tenha buscado esmaecer o nível de proximidade entre ambos, conforme revela certo trecho de seu depoimento, in verbis:
“(...) a foto das pessoas do PP que tiveram uma reunião com o Braga, na qual estiveram presentes pelos vereadores Douglas, Irmão Pereira, Gardel e Cesário, pelo empresário Oliveira, pelos amigos Charles e Lino Paiva, e pelo secretário institucional Raimundo Parente; eu estou nessa foto e a Kilvia também; era um momento de diálogo e construção com outros partidos; o Marcelo Magalhães é de uma família tradicional e muito respeitada; ele foi se filiar ao partido Podemos, e nós fomos prestigiar esse evento; há 5 pessoas do meu partido na dita foto; o Oliveira gosta muito de política, o Irmão Pereira também é do PP, foi candidato a vereador, e é o 1º suplente do nosso partido; o irmão Pereira, também do PP, 1º suplente do partido, vereador à época, vereador Gardel, também era vereador à época, então concorreu à vice prefeito; o Raimundo Parente está como presidente do partido (…)”.
Sucede que o mesmo declarante minou a própria credibilidade ao realizar defesa apaixonada do perfil político e da personalidade do promovido Braga, senão vejamos:
“(…) chegamos a ter certos embates, mas sempre fui um grande admirador do Braga pelo perfil dele; até que se prove o contrário ele tem uma história bonita e de muito sucesso; ele nasceu numa casa de taipa na fazenda Groaíras, foi estudar em Sobral, passou num concurso público, foi diagnosticado com câncer; ele tem uma sensibilidade absurda para ajudar o próximo; o Braga é desprovido de vaidade; para quem conhece o Braga mais de perto, sabe que ele tem um poder aquisitivo relativamente alto, mas isso não faz com que ele se ausente do município; de segunda a segunda o Braga está em Santa Quitéria; acho que 80% do comércio de Santa Quitéria votou no Braga (…)”.
Em sentido diametralmente oposto, a prova testemunhal idônea assinalou uma interação muito maior entre a então candidata a vereadora Kylvia, e o então candidato a prefeito José Braga Barrozo, senão vejamos:
Testemunha Marcos Aurélio Elias de França: (…) sobre a candidata Kylvia, soube que ela e o Prefeito Braga eram aliados, mas a relação de proximidade dele com ela eu não tive; soube por meio da delação que o prefeito e candidato a reeleição não falava diretamente com o “Da30”; em termos de hierarquia no comando vermelho, para se ter uma visão geral, nós temos o 12, depois temos o Riquelme e o “Da30”, que de alguma forma eles estavam nivelados ou lutando para o domínio de Santa Quitéria, e de Varjota, mas o “Da30” se sentiu desprestigiado, preterido em relação ao Riquelme, isto porque, segundo as palavras dele, não foi honrado o que ficou acordado com ele (…);
Testemunha Francisco José Martins da Silva: (…) houve uma informação de um pix feito pela candidata Kylvia; parece que era um pix de R$45.000,00 (quarenta e cinco mil reais), usado para pagar parte desse carro na concessionária; ela negou tudo na época, mas depois surgiu a notícia de que ela era envolvida com o crime, com facção, e naqueles diálogos também havia menção à pessoa dela, dizendo que apoiavam ela, que tinha um gasto, coisas assim que ao entender que realmente ela estava bem envolvida nos fatos (…) quanto ao carro entregue no Rio de Janeiro, eu tomei ciência já depois, com os relatórios; a ideia central era de que havia realmente então uma ligação com o candidato Braga porque eram os assessores deles que estavam encaminhando esse veículo lá para o Rio de Janeiro e esse veículo havia sido constatado na diligência que a polícia civil fez com o GAECO lá do Rio de Janeiro; chegaram à residência do 12 e o veículo estava lá na casa dele, mas não havia uma explicação plausível para sair daqui, bem como a questão do pagamento desse veículo; a ideia que nos fez ver que havia uma ligação muito estreita foi a presença de muitos elementos indiciários que colocavam o então prefeito e candidato dentro dessa trama (…)”.
Ora, na medida em que a candidata Kylvia dispunha condições financeiras precárias, mas dispunha de ligações estreitas com membros do Comando Vermelho, na medida em que o candidato Braga dispunha de potencial financeiro bastante confortável, mas não queria (ou não devia) se expor mantendo contatos diretos com “Da30”, Rikelme ou com “Paulinho Maluco”, na medida em que o próprio criminoso “Da30” reconheceu que Braga estava injetando dinheiro na campanha de Kyvia, a única conclusão lógica é que houve um ajuste de conveniências entre ambos (Kylvia e Braga), seja para que esta atuasse como uma espécie de “porta voz” dos interesses do Braga junto ao executor das ações obstrutivas de propaganda eleitoral de Tomás Figueiredo, seja para que Kylvia pudesse ser usada como “laranja” no significativo pagamento de R$49.000,00 (quarenta e nove mil reais) realizado para viabilizar a compra do veículo de luxo entregue ao “12” dentro da Favela da Rocinha. Portanto, a vinculação entre os dois candidatos não poderia ser mais evidente.
f) Ausência de efetiva repercussão das pichações veiculando ameaças no resultado do pleito eleitoral de Santa Quitéria:
Não merece ser acolhido tal argumento na medida em que o acervo probatório colhido ao longo da instrução revelou um clima de tensão e insegurança entre os eleitores de Santa Quitéria, o qual seguramente desequilibrou o resultado do pleito de 2024. Com efeito, na medida em que o voto é secreto, por disposição expressa do art. 14, §9º da CF/88 é virtualmente impossível identificar quantos eleitores votaram neste ou naquele candidato, e se o fizeram livremente, ou por coação.
Por outro lado, é impossível desprezar as evidências probatórias que demonstram a pressão exercida sobre eleitores e apoiadores de campanha do então candidato Tomás Figueiredo, especialmente num universo de apenas 33.649 (trinta e três mil, seiscentos e quarenta e nove) eleitores aptos a votar em Santa Quitéria durante o pleito de 2024, no qual se observou uma abstenção de 4.888 (quatro mil, oitocentos e oitenta e oito) eleitores, segundo o Relatório da Junta Eleitoral da 54ª Zonam publicado às 10:09hs do dia 06.10.2024.
Demais disso, num universo de 27.599 (vinte e sete mil, quinhentos e noventa e nove) votos válidos, a vantagem ilicitamente conquistada pela Chapa Majoritária “Braga/Gardel” sobre o segundo colocado Tomás Figueiredo foi de 3.186 (três mil, cento e oitenta e seis votos), o que representa número inferior à abstenção, notadamente se esta for contabilizada em conjunto com eleitores dos bairros Piracicaba e Pereiros, que foram coagidos a mudar seus votos por residirem em redutos eleitorais do então candidato Braguinha.
Ainda que não seja possível quantificar o número exato de eleitores que tenham sido expulsos de Santa Quitéria antes do dia do pleito, é necessário reconhecer que a obstrução criminosa de um único eleitor já seria apta a viciar o resultado das urnas. Com efeito, pouco importa se o criminoso usou 1 mg de arsênico ou 5 mg de arsênico para matar sua vítima10, pois em ambas as situações restará caracterizado um homicídio tentado ou consumado. De igual forma, o processo eleitoral restou envenenado a partir das diversas condutas de ameaças, coações e expulsões de eleitores, notadamente aqueles residentes em bairros como a Piracicaba e Pereiros, considerados como reduto político do acionado José Braga Barrozo.
Vale transcrever os relatos testemunhais idôneos colhidos na audiência instrutória una, e que traduzem o clima de insegurança e apreensão vivido em Santa Quitéria durante o período da propaganda eleitoral de 2024, in verbis:
Testemunha Marcos Aurélio Elias de França: (…) tem orientação de um elemento de apelido Riquelme, que é um intermediário entre o 12 e o “Da30”; ele também é uma liderança lá, e orienta o Daniel a não citar o nome do prefeito Braga nas pichações; isso tem na extração do aparelho celular dele para ele não se dá. É como se tivesse orientando que, se eventual citar, poderia de alguma forma prejudicar a candidatura do Braga; a orientação era para se opor ao candidato Tomás, mas sem demonstrar preferência alguma pelo candidato José Braga Barroso; ele não poderia citar ou orientar nas pichações nenhuma menção ou elogio ou mandar votar no Braga; a orientação era atacar deliberadamente a candidatura do Tomás; sobre eleitores que tenham sido ameaçados, ameaçados de morte, ameaçados de agressão física ou expulsos de suas casas por terem demonstrado preferência pelo candidato Tomás, soubemos de muitos, inclusive pessoas apavoradas que saíram, abandonaram a cidade na véspera da eleição; (…) os comícios do candidato Tomás eram esvaziados, pois as pessoas tinham medo de ir, porque estavam apavoradas com as ameaças que eram proferidas, seja através de grupo, WhatsApp, seja por meio de ameaças pessoais, inclusive havia mensagens dando conta de que era para tocar fogo em motocicletas de eleitores que tivessem adesivo do Tomás; eles estavam muito violentos; inclusive, há uma coisa que eu também reputo como grave; fotografaram a frente da casa de uma coordenadora da campanha do Tomás e mandaram uma mensagem dessa foto da casa dela; o 12, mandou mensagem perguntando se ela ainda estava trabalhando para o Tomás; em seguida o 12 disse que iria tocar fogo na casa dela; (…) o que aconteceu faticamente durante a campanha eleitoral de 2024 foi expulsão de moradores, que eram, em tese, eleitores do Tomás Figueiredo, e inclusive tem áudios deles, mandando as mensagens, fatos, áudios, dizendo que estavam sendo expulsos da cidade; foi o serviço de inteligência que deu ao Ministério Público Eleitoral estas informações; (…) há uma conversa que chama bem atenção, porque o Riquelme era conhecedor do calendário eleitoral, tão amiúde, tão orientado, que a partir do momento que começa a campanha ele já começou a articular, falando em comprar votos com drogas; logo quando começou o trabalho da campanha eleitoral houve várias pichações; a gente mandava pintar, depois pichavam de novo, mudava de bairro; foram dias terríveis; acho que três candidatos disputavam a Prefeitura de Santa Quitéria;
Testemunha Francisco José Martins da Silva: (…) nós chegamos a Santa Quitéria e estivemos nos bairros, fotografamos, tentamos entrevistar algumas pessoas, nas proximidades dos locais, das pichações, mas na quase totalidade elas não queriam dar nenhum depoimento, muito receosos, estava um clima com muito receio devido às ameaças em quem votasse no candidato Tomás; naquela primeira abordagem a gente circulou nos bairros, eram três bairros em que tinha a incidência maior dessas pichações, Flores, Pereiros, e um outro lá; tinha essa tensão de alguns eleitores recebendo ameaças por telefone; isso foi a primeira situação (…) quando foi preso o “Da30”, com ele foi encontrado um aparelho celular em que tinha muitas mensagens, troca de mensagens desses grupo especificando como seria a atuação; indicando pessoas que deveriam se retirar da cidade, caso não mudassem o voto, ameaçando comerciantes de que não podiam abrir em determinados eventos da campanha do candidato Tomás; havia uma série de ameaças e não era coisa de mera retórica; a gente via que se concatenava muito, porque um dizia uma coisa e no outro diálogo lá na frente, outro já tinha dito, já completando a lógica da situação (…) houve o esvaziamento dos comícios do candidato Tomás; a informação bem específica que saiu nessas mensagens era para que o comércio fechasse; (…) na eleição em Fortaleza houve apenas episódios pontuais de vandalismo, em alguns bairros, mas em Santa Quitéria a forma de ameaçar foi bem específica, e a situação da população foi que me fez ver que realmente estava havendo um direcionamento, e por isso a gente devia instaurar o procedimento para aprofundar na investigação; (…) sobre eleitores de Santa Quitéria ameaçados ou expulsos de suas casas, colheu relatos de porteiros e de frentistas, segundo os quais um parente tinha sido ameaçado; então a gente ia lá conversar, mas ninguém quis dizer nada sobre as ameaças, e nem formalizar boletim de ocorrência; sobre as pichações, estive num local próximo a uma barbearia, mas a pessoa não queria muito acordo, chegando mesmo a pedir a gente nem ficasse na frente de seu imóvel; era complicado até apagar as pichações porque o próprio morador não queria que apagasse com medo de ser responsabilizado por essa facção; que todos esses elementos pequenos foram corroborando a ideia de que houve uma situação de pânico realmente; (…);
Testemunha THIAGO TEIXEIRA SOARES BRITO: (…) Sou policial militar de carreira, mas antes de ingressar na PM eu fui filiado ao PSB, mas lá no estado do Piauí, pois sou piauiense de origem; (…) acompanhei o período da campanha eleitoral; cheguei a ver pichações em fachadas de residências com a sigla CV de comando vermelho, veiculando ameaças contra a candidatura do então candidato a prefeito Tomás Figueiredo; não sei precisar em quantos bairros, mas em vários deles tinha pichações; (…) no período da campanha eleitoral, devido às pichações, houve reforço policial; veio tropa de choque; houve reforço na questão do oficialato; na época o comandante era um major ou capitão, mas ele foi promovido rápido por promoções atrasadas dele; não sei precisar quantos policiais chegaram para reforço; o Raio teve reforço, e também teve tropa de choque, a partir de setembro ou agosto; o reforço ocorreu até as eleições; (…) o reforço policial consistiu em viaturas que chegaram de outras cidades; na reta final o exército chegou na cidade; não sei se a polícia federal também estava em Santa Quitéria; na quinta ou na quarta-feira tirei serviço em Catunda, e logo em seguida já viajei ao Piauí; a solicitação do reforço veio através das pichações que havia na cidade; segundo relatos tinha ameaças por via telefônica contra eleitores (…) na eleição de 2020 não teve tanto reforço policial como foi agora (…).
Ante o cenário fático na campanha eleitoral de 2024, em Santa Quitéria, cabe perquirir: a) Se havia um clima de normalidade, qual a razão para tanto reforço policial, inclusive com envio de tropa de choque e mais policiais do Raio? b) Se os eleitores podiam aderir livremente às candidaturas que melhor lhes aprouvesse, qual a necessidade de enviar tropas federais para Santa Quitéria? c) Se os eleitores podiam exercer livremente o direito constitucional ao voto, por que as pessoas temiam ser vistas ao lado de policiais? d) Se as pichações não tinham suficiente poder intimidatório, por que os moradores cujas fachadas foram pichadas não queriam que aquela poluição visual permanecesse intacta?
Naturalmente que tais reflexões representam perguntas meramente retóricas, pois a resposta óbvia é uma só, e foi verbalizada no depoimento do Delegado Federal Francisco José Martins da Silva: OS ELEITORES E APOIADORES DO CANDIDATO TOMÁS ESTAVAM EM PÂNICO!
Finalmente, é oportuno relembrar que a doutrina clássica distingue três elementos constitutivos do Estado: território, população e governo. Portanto, quando o governo não dispõe de poder suficiente para assegurar segurança pública aos seus cidadãos, quando o crime organizado assume o controle territorial de determinada parcela de uma pessoa jurídica de direito público interno (município ou estado da federação), quando a população é coagida a votar em “candidatos dos irmãos”, já não se pode falar autenticamente em soberania estatal, mas sim em “Estados Paralelos” em confronto de forças, em um ente estatal legítimo tentando reprimir, nem sempre com sucesso, o avanço de um narcoestado.
E para que ninguém duvide da voracidade dos membros do narcoestado instalado em solo brasileiro, é oportuno aludir que não apenas o direito ao exercício livre do voto está em causa, mas por igual ao livre exercício profissional dos advogados. Nesse sentido, é necessário referir com sentimento de pesar que no início da tarde de 05.05.2025, mais um advogado brasileiro pereceu, precisamente no Bairro Genibaú, em Fortaleza, alvejado por 04 (quatro) tiros de pistola ponto quarenta, e segundo apurações iniciais da Divisão de Homicídios da Polícia Civil do Ceará, isso se deu porque o respeitado causídico teria atuado perante o Tribunal do Júri, como patrono de um réu supostamente integrante da facção GDE, o qual veio a ser absolvido, e esse fato teria atraído a ira de lideranças da facção Comando Vermelho, gerando uma “sentença de morte” contra o advogado Sílvio Vieira da Silva, inscrito na OAB/CE sob o nº 11.147, e que até aquela data integrava o Conselho Estadual da OAB/CE11.
Portanto, argumentar que as ações de coação e intimidação realizadas em Santa Quitéria, durante o pleito eleitoral de 2024, não tiveram suficiente impacto no resultado daquele pleito não pode ser admitido como o argumento sério ou idôneo.
2.2.5 Da análise das teses defensivas de FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO
a) Inexistência de conduta abusiva pelo candidato a vice-prefeito de Santa Quitéria:
De fato, o detido exame de todas as provas produzidas no bojo desta AIJE não aponta qualquer referência ao nome de Francisco Gardel Mesquita Ribeiro, então candidato a vice-prefeito de Santa Quitéria, entretanto, não se pode olvidar que a legislação brasileira não permite a existência de uma candidatura autônoma ao cargo de vice-prefeito, pois a chapa majoritária é UNA. Precisamente por isso, os dois membros da chapa, tal como irmãos siameses, devem sempre partilhar o mesmo destino, de vitória ou de derrota. Esse é o entendimento cristalizado no âmbito da jurisprudência eleitoral brasileira, senão vejamos:
ELEIÇÕES 2016. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. VICE-PREFEITO. REGISTRO DE CANDIDATURA. INELEGIBILIDADE. ART. 1º, I, L, DA LC Nº 64/90. CONDENAÇÃO. ATO DOLOSO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. DANO AO ERÁRIO. OMISSÕES. AUSÊNCIA. EMBARGOS REJEITADOS. QUESTÃO DE ORDEM. PRINCÍPIO DA INDIVISIBILIDADE DA CHAPA MAJORITÁRIA. ART. 91 DO CÓDIGO ELEITORAL E ART. 77, § 1º, DA CF/88. SUBSTITUIÇÃO DE CANDIDATO. ART. 13, CAPUT, DA LEI DAS ELEIÇÕES. LIMITE TEMPORAL. INDEFERIMENTO TARDIO DO REGISTRO. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. CIRCUNSTÂNCIAS EXCEPCIONAIS QUE AFASTAM O DOGMA DA INDIVISIBILIDADE. PEDIDO DA QUESTÃO DE ORDEM ACOLHIDO. 1. O princípio da unicidade e indivisibilidade das chapas (cognominado também de princípio da irregistrabilidade da chapa incompleta ou insuficientemente formada) ostenta status constitucional, ex vi de seus arts. 77, § 1º, e 28. Em linha de princípio, não se admite, portanto, que apenas um nacional formalize seu registro de candidatura, a qual, juridicamente, fora concebida para ser dúplice ou plúrima (FUX, Luiz; FRAZÃO, Carlos Eduardo. Novos Paradigmas do Direito Eleitoral. Belo Horizonte: Fórum, 2016, p. 171-172). (…) Embargos de Declaração em Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 8353, Acórdão, Relator(a) Min. Herman Benjamin, Relator designado(a) Min. Luiz Fux, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 14/09/2018;
RECURSO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2020. REQUERIMENTO DE REGISTRO DE CANDIDATURA. CANDIDATO À VICE–PREFEITO QUE, EMBORA PREENCHA AS CONDIÇÕES DE ELEGIBILIDADE E NÃO POSSUA QUALQUER CAUSA DE INELEGIBILIDADE, TEVE SEU REGISTRO INDEFERIDO . TITULAR QUE SE ENQUADRA NA HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DA INELEGIBILIDADE DO ART. 1º, INCISO I, ALÍNEA L, DA LC Nº 64/90. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA UNICIDADE E INDIVISIBILIDADE DA CHAPA. 1 .A situação dos candidatos integrantes da chapa majoritária deve ser apreciada de modo particular, cabendo ao julgador analisar se cada um dos postulantes ao cargo eletivo preenche todos os requisitos exigidos pela legislação, devendo, ainda, verificar se incide, em desfavor de algum dos candidatos causa de inelegibilidade que obste o deferimento do pedido de registro de candidatura formalizado. 2. Por óbvio, se um dos integrantes da chapa for considerado inapto a participar da disputa eleitoral, haverá, por força do princípio da unicidade e indivisibilidade da chapa, insculpido no artigo 91, do Código Eleitoral, a contaminação da própria chapa majoritária. 3 . Indeferimento da candidata ao cargo de prefeito pelo juiz de 1º grau que tem como consectário lógico o comprometimento da chapa majoritária, a repercutir diretamente na esfera jurídica do seu parceiro de chapa. DESPROVIMENTO DO RECURSO (TRE-RJ - REl: 0600217-60.2020 .6.19.0032 RIO BONITO - RJ 060021760, Relator.: Claudio Luis Braga Dell Orto, Data de Julgamento: 23/11/2020, Data de Publicação: PSESS-, data 23/11/2020);
ELEIÇÕES 2024. RECURSO ELEITORAL. REQUERIMENTO DE REGISTRO DE CANDIDATURA. CARGO DE PREFEITO. INDEFERIMENTO DO REGISTRO DO CANDIDATO A VICE–PREFEITO. INDIVISIBILIDADE DA CHAPA. I. CASO EM EXAME 1. Recurso eleitoral interposto contra sentença de primeira instância que indeferiu o Requerimento de Registro de Candidatura (RRC) da candidata ao cargo de Prefeita, em decorrência do indeferimento do registro do candidato a vice, que não atendeu a todas as condições de elegibilidade. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Cada candidato da chapa majoritária deve ser avaliado individualmente, devendo ser verificado o preenchimento dos requisitos legais, ou seja, se houve o atendimento às condições de elegibilidade e se não incorreu em alguma causa de inelegibilidade a impedir o deferimento do registro de candidatura. 3. Caso um dos candidatos seja considerado inapto, toda a chapa majoritária será afetada, conforme o princípio da unicidade e indivisibilidade da chapa previsto no artigo 91 do Código Eleitoral. III. RAZÕES DE DECIDIR. 4. Não havendo notícia da substituição do candidato a vice, que não conseguiu comprovar sua filiação à federação pela qual pretende concorrer, é necessário manter o indeferimento do presente registro de candidatura, em conformidade com o princípio da unicidade da chapa. IV. DISPOSITIVO E TESE 5. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Dispositivo relevante: art. 91 do Código Eleitoral (TRE-GO - REl: 06002511720246090018 SERRANÓPOLIS - GO 060025117, Relator.: Alessandra Gontijo Do Amaral, Data de Julgamento: 09/09/2024, Data de Publicação: PSESS-402, data 09/09/2024);
ELEIÇÕES 2012. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL INTERPOSTO POR DANIEL NETTO CÂNDIDO E ÉLIO PEIXER. PREFEITO E VICE-PREFEITO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. OMISSÃO DO DECISUM REGIONAL. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ART. 275 DO CÓDIGO ELEITORAL. REENQUADRAMENTO JURÍDICO DOS FATOS. VERIFICAÇÃO DE FRAUDE NA SUBSTITUIÇÃO DE CANDIDATO EM PLEITO MAJORITÁRIO. AUSÊNCIA DA OBSERVÂNCIA DO DEVER DE AMPLA PUBLICIDADE. SUBSTITUIÇÃO OCORRIDA ÀS VÉSPERAS DA ELEIÇÃO. CONDUTA QUE ULTRAJA O PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO AO EFEITO SURPRESA DO ELEITOR E DA LIBERDADE DE ESCOLHA DOS VOTOS. POSSIBILIDADE DE APURAÇÃO DE FRAUDES DURANTE O PROCESSO ELEITORAL EM AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE). FRAUDE COMO ESPÉCIE DO GÊNERO ABUSO DE PODER. NECESSIDADE DE SE REPRIMIR, O QUANTO ANTES, PRÁTICAS QUE POSSAM AMESQUINHAR OS PRINCÍPIOS REITORES DA COMPETIÇÃO ELEITORAL. TRANSMISSIBILIDADE DE EVENTUAIS ILÍCITOS PRATICADOS POR INTEGRANTES DA CHAPA ORIGINÁRIA À NOVEL COMPOSIÇÃO. MEDIDA QUE SE IMPÕE COMO FORMA DE COIBIR A PRÁTICA DE ABUSOS ELEITORAIS E A CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO, CAPAZES DE VULNERAR A HIGIDEZ E A NORMALIDADE DO PRÉLIO ELEITORAL. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. 1. O reenquadramento jurídico dos fatos, por versar quaestio iuris, é providência cognoscível na estreita via do recurso especial eleitoral. 2. In casu, duas são as teses jurídicas postas ao exame da Corte Superior Eleitoral neste recurso especial. A primeira cinge-se em saber se a substituição da chapa Laudir/Daniel (titular e vice, respectivamente) por Daniel/Élio(titular e vice, respectivamente), às vésperas da data do pleito, qualifica-se juridicamente como fraude eleitoral, de ordem a inquinar a validade do ato. Já a segunda consiste em perquirir se é possível imputar a suposta prática de ilícito eleitoral (no caso, captação ilícita de sufrágio, ex vi do art. 41-A da Lei das Eleições), levada a efeito pelo candidato renunciante Laudir, à novel chapa composta pelo anterior candidato a vice, Daniel Netto Cândido, alçado à condição de titular, e Élio Peixer, escolhido pela Coligação como novo candidato a Vice-Prefeito. 3. A substituição às vésperas de pleito majoritário lastreia-se em juízo objetivo, i.e., o ato de substituição em si considerado, e material, i.e., o exame das circunstâncias fáticas que ensejaram a modificação da chapa- originariamente registrada na Justiça Eleitoral. 4. A ratio essendi ínsita a este regramento consiste em evitar, ou, ao menos, amainar os impactos deletérios da substituição dos candidatos em momentos próximos ao pleito (e, regra, às suas vésperas), que surpreendem negativamente os eleitores. Cuida-se, então, de garantia normativa de não surpresa do eleitor. 5. O postulado da liberdade de escolhas dos cidadãos sobressai como vetor meta normativo para a exigência de ampla publicidade da substituição em pleitos majoritários. 6. Toda fraude é uma conduta abusiva aos olhos do Direito. (…) Recurso Especial Eleitoral nº 63184, Acórdão, Relator(a) Min. Luiz Fux, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo, 05/10/2016;
ELEIÇÕES 2012. RECURSOS ESPECIAIS ELEITORAIS. AIJES. PREFEITO, VICE-PREFEITO E VEREADORES. PRELIMINARES. AFASTAMENTO. MÉRITO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ARRECADAÇÃO E GASTOS ILÍCITOS DE RECURSOS DE CAMPANHA ELEITORAL. ABUSO DO PODER ECONÔMICO. REEXAME. RECURSOS DESPROVIDOS. 1. Ações de investigação judicial eleitoral fundadas nos mesmos fatos devem ser reunidas para julgamento conjunto, a fim de evitar decisões conflitantes. 2. Não há litispendência entre ações de investigação judicial eleitoral que possuam partes e causa de pedir distintas. Na espécie, além de não haver identidade de partes, a causa de pedir da AIJE 653-10 é mais ampla que a da AIJE652-25.3. Não configura violação ao contraditório e à ampla defesa a recusa do magistrado em adiar audiência quando conclui, a partir das circunstâncias do caso e dos documentos apresentados, que o requerimento possui finalidade protelatória ou que não há justa causa para o adiamento. 4. Não afronta o art. 275 do Código Eleitoral decisão que aprecia as questões necessárias à solução da controvérsia e se pronuncia sobre todas as alegações formuladas nos declaratórios, embora em sentido contrário aos interesses dos embargantes. 5. Não é ilegal a prova obtida por meio de interceptação telefônica conduzida diretamente pelo Ministério Público. Precedentes. 6. É possível a utilização em AIJE de prova (interceptação telefônica) produzida legalmente em procedimento investigatório criminal. 7. Desnecessária, para a validade da prova, a transcrição integral de diálogos gravados durante a quebra do sigilo telefônico. Precedentes. 8. É lícita a utilização de prova emprestada de processo no qual não tenha sido parte aquele contra quem venha a ser utilizada, desde que se lhe permita o contraditório. Precedentes. 9. Reconhecidas pelo Regional, em aprofundado e detalhado exame de provas, as práticas de arrecadação e gastos ilícitos de recursos de campanha, captação ilícita de sufrágio e abuso do poder econômico (arts. 30-A e 41-A da Lei9.504/97 e 22 da LC 64/90), não há como afastá-las sem esbarrar no disposto nas Súmulas 7/STJ e 279/STF.10. Recursos especiais eleitorais desprovidos. Recurso Especial Eleitoral nº 65225, Acórdão, Relator(a) Min. João Otávio De Noronha, Relator designado(a) Min. Maria Thereza de Assis Moura, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 02/05/2016.
Por outro lado, dispõe a Súmula nº 38 do Colendo TSE que “nas ações que visem à cassação de registro, diploma ou mandato, há litisconsórcio passivo necessário entre o titular e o respectivo vice da chapa majoritária”, e também por isso resulta reforçada a conclusão de que a eventual procedência da AIJE atinge igualmente ambos os integrantes da chapa majoritária.
Saliente-se ainda que a AIJE ostenta natureza extrapenal, razão porque na aferição da culpa dos promovidos devem ser considerado os limites e as modalidades da culpa civil, a qual comporta “culpa in eligendo” e “culpa in vigilando”. Demais disso, a culpa não se circunscreve às condutas comissivas, mas também pode derivar de condutas omissivas. Portanto, no caso em exame não há como afastar a contaminação integral da chapa majoritária a partir da fraude eleitoral promovida com a ajuda de faccionados do Comando Vermelho, pois na medida em que eleitores foram coagidos, foram intimidados, foram ameaçados, foram expulsos de suas casas apenas porque pretendiam votar livremente, operou-se uma das mais perversas modalidades de abuso, e esse abuso favoreceu não apenas o então candidato José Braga Barrozo, mas igualmente seu “lugar tenente”, o então candidato a vice-prefeito Francisco Gardel Mesquita Ribeiro.
b) Inocorrência de ação ou omissão de Francisco Gardel para favorecer sua chapa majoritária no pleito de 2024:
Principiologicamente, dispõe o CCB que há responsabilidade subjetiva do agente quando este foi causador de um dano e agiu culposamente. Agir, normalmente, está ligado a uma ação voluntária, como o arremesso de uma pedra a esmo que acaba por atingir alguém sem intenção deliberada, e que mesmo assim sofre danos pessoais e/ou materiais. Com efeito, ainda que a responsabilidade civil seja bastante evidente para os casos de ação voluntária, a omissão também é relevante para a configuração do ato ilícito, tanto assim que o art. 1861 do CCB determina a existência de ato ilícito quando há ação ou omissão voluntária, que viola direito e causa dano. Na ação voluntária é mais fácil verificar a culpa do agente.
O exercício para aferição de culpa na omissão voluntária é distinto. Em razão de um dano verificado, é necessário perquirir se a pessoa poderia ou deveria ter agido para tentar evitar o resultado danoso. Cabe igualmente examinar se a omissão da pessoa foi determinante para o dano experimentado por terceiro. Quanto ao ponto, Pontes de Miranda12 adverte que “a abstenção, omissão, ou ato negativo, também pode ser causa de dano. Se o ato cuja prática teria impedido, ou, pelo menos, teria grande probabilidade de impedir o dano, foi omitido, responde o omitente”.
Sergio Cavalieri13, no mesmo sentido, afirma que a omissão “como pura atividade negativa, a rigor não pode gerar física ou materialmente o dano sofrido pelo lesado, porquanto do nada provém. Mas tem-se entendido que a omissão adquire relevância jurídica, e torna o omitente responsável, quando este tem dever jurídico de agir, de praticar um ato para impedir o resultado”14.
Considerando que a omissão pode ser conceituada como “ato ou efeito de omitir-se, de deixar de dizer ou de fazer alguma coisa”, ponderável parcela da doutrina compreende omissão como sinônimo de negligência. Nesse sentido, José de Aguiar Dias15 assim preconiza:
[...] omissão é a negligência, o esquecimento das regras de proceder, no desenvolvimento da atividade. Negligência é a omissão daquilo que razoavelmente se faz, ajustadas as condições emergentes às considerações que regem a conduta normal dos negócios humanos. É a inobservância das normas que nos ordenam operar com atenção, capacidade, solicitude e discernimento. A negligência ocorre na omissão das precauções exigidas pela salvaguarda do dever a que o agente é obrigado. Configura-se, principalmente, no fato de não advertir a terceiro do estado das coisas capaz de lhe acarretar prejuízo, de não providenciar a remoção de objeto que produza dano deixado em lugar público; na ignorância e no erro evitáveis, quando impedem o agente de conhecer o dever; isto é deixar de ouvir o que é audível, deixar de ver o que é visível.
No caso dos autos é forçoso reconhecer que o então candidato Francisco Gardel foi negligente ao esquecer quais as regras de proceder, no desenvolvimento da atividade de campanha eleitoral, ao esquecer de advertir seu parceiro de destino na chapa majoritária que uma vitória eleitoral, por meios espúrios, tem a essência de uma autêntica derrota (moral e eleitoral), ao esquecer de se posicionar perante os coordenadores de campanha, advertindo-os sobre a ilicitude ínsita em atos de descumprimento de acordos sobre os eventos de propaganda.
Restou caracterizada a negligência do então candidato Francisco Gardel na medida em que se omitiu quanto às precauções exigidas pela salvaguarda do dever a que o agente é obrigado. Ora, ao lançar seu nome em uma disputa eleitoral, o candidato revela sua expectativa de direito em compartilhar com o candidato a prefeito a chefia do poder executivo municipal, e por isso mesmo estava declarando aos eleitores, ainda que implicitamente, seu dever de absoluta sujeição aos princípios constitucionais da legalidade, moralidade, publicidade, impessoalidade e eficiência. Todavia, todo aquele que aceita de bom grado que eleitores sejam coagidos, que eleitores sejam ameaçados, que eleitores sejam expulsos de suas próprias casas, estará compactuando para a destruição da legalidade e da moralidade.
Finalmente, cumpre salientar que o então candidato Francisco Gardel podia e devia ter advertido seu companheiro de chapa majoritária que o prosseguimento daquela estratégia de captação ilícita (e criminosa) de sufrágio poderia acarretar prejuízo a ambos, na medida em que aquelas práticas desairosas que os favoreciam já importavam em claro aviltamento do direito constitucional ao livre exercício do sufrágio popular. Por tudo isso, não há como tangenciar a conclusão de que o então candidato Francisco Gardel deixou de ouvir o que era audível, e deixou de ver o que era visível durante a tumultuada campanha eleitoral de 2024, em Santa Quitéria.
2.2.6 Da análise das teses defensivas de FRANCISCO LEANDRO FARIAS DE MESQUITA
a) Ausência de comprovação de conduta ilícita do promovido Francisco Leandro:
Acolher o argumento de ausência de provas de ilicitude na conduta do promovido Francisco Leandro Farias de Mesquita representaria autêntica manifestação de cegueira deliberada, pois o acervo probatório produzido nos autos desta AIJE deixam incontroverso que: a) ele exercia um cargo comissionado na Prefeitura Municipal de Santa Quitéria; b) seus antecedentes criminais assinalavam seus vínculos com uso e tráfico de entorpecentes; c) tomou parte em atos de campanha do Prefeito Braguinha; d) esteve diretamente envolvido no recebimento do automóvel de luxo comprado em Fortaleza para que fosse presenteado ao criminoso conhecido como “Paulinho Maluco” ou “12”; e) esteve diretamente envolvido na condução de tal veículo até o Rio de Janeiro, mais precisamente até a Favela da Rocinha, para que fosse entregue ao líder do Comando Vermelho já nominado; f) jamais apresentou qualquer mínima evidência de que foi autorizado a se afastar de suas funções para realizar esse “corre”, e com isso atraiu a natural inferência de que sua desditosa missão foi previamente autorizada por suas chefias (mediata ou imediata).
Aliado a tudo isso, os autos demonstram que o promovido Francisco Leandro, vulgo “Liu” permanece foragido de Santa Quitéria pelo menos desde o dia 01.01.2025. Tal postura efetivamente não se coaduna com a alegada ilicitude de suas condutas, notadamente diante de elucidativos trechos da prova testemunhal idônea coletada durante a audiência instrutória una de 14.04.2025, senão vejamos:
Testemunha Marcos Aurélio Elias de França: (…) O Daniel narrou o detalhe de como se deu a missão dele, saindo do Rio de Janeiro para Santa Quitéria, a data que saiu; que as funções dele seria, no primeiro momento, tumultuar a campanha de um do Tomás; depois tomar a cidade de Varjota da facção GDE; essas seriam as missões dele; então ele disse detalhes, ele informou na colaboração premiada, onde cada uma dessas lideranças do comando vermelho moravam dentro da favela da Rocinha, no Rio de Janeiro; ele disse que ele ia receber trezentos e poucos mil reais nessa função de tumultuar o processo, e para evitar que o candidato Tomás fosse eleito; ele deu uma informação importante, que na época a gente não sabia, mas na colaboração ele disse que o então prefeito, candidato à reeleição, tinha mandado cerca de um milhão e duzentos mil reais ou um milhão e meio de reais dentro de um veículo; ele deu as características do veículo, disse que tinham sido dois elementos que teriam levado esse veículo para o Rio de Janeiro; eu vi o veículo, mas não sou muito de decorar a marca; era um veículo importado, branco; na ocasião ele informou o nome de um, e que esse rapaz era funcionário, era o braço direito, era o motorista do então prefeito; com essas informações que ele passou ao trabalho de inteligência, nós conseguimos localizar fotografias do veículo em deslocamento para o Rio de Janeiro; ele falou que marcou um encontro com esses dois elementos que estavam no carro na Praça Nelson Mandela, no Rio de Janeiro; ele estava no Botafogo e encontrou com esses dois elementos na Praça Nelson Mandela; o “Da30” saiu em uma moto, subindo a Rocinha, sendo seguido por esses dois elementos no carro; quando chegaram na casa do 12, ele mesmo ajudou a desmontar a carenagem, as lanternas traseiras, ajudou a tirar o dinheiro, a contar o dinheiro (…);
Testemunha Francisco José Martins da Silva: (…) quanto ao carro entregue no Rio de Janeiro, eu tomei ciência já depois, com os relatórios; a ideia central era de que havia realmente então uma ligação com o candidato Braga porque eram os assessores deles que estavam encaminhando esse veículo lá para o Rio de Janeiro e esse veículo havia sido constatado na diligência que a polícia civil fez com o GAECO lá do Rio de Janeiro; chegaram à residência do 12 e o veículo estava lá na casa dele, mas não havia uma explicação plausível para sair daqui, bem como a questão do pagamento desse veículo; a ideia que nos fez ver que havia uma ligação muito estreita foi a presença de muitos elementos indiciários que colocavam o então prefeito e candidato dentro dessa trama; os dois assessores do Prefeito José Barroso Braga, que teriam sido encarregados de conduzir esse veículo até o Rio de Janeiro foram Francisco Ednaldo e Francisco Leandro, sendo que um deles até já tinha passagem pela polícia, já tinha sido preso em flagrante; havia notícias de uma ligação mais próxima com o pessoal do comando vermelho, e eram assessores do prefeito; não tem como não estar sabendo, não estar envolvido numa situação dessa; é muito complicado pois o valor do carro é muito expressivo, mais de R$200.000,00 (duzentos mil reais), salvo engano (…);
Testemunha THIAGO TEIXEIRA SOARES BRITO: (…) vi através do Fantástico a notícia de que um carro de luxo teria sido transportado até o Rio de Janeiro e entregues a um dos chefes do Comando Vermelho, na favela da Rocinha; segundo a matéria os funcionários encarregados de levar o carro foram o Francisco Edneudo e o “Liu”; segundo a matéria o carro foi encontrado na favela da Rocinha, no Rio de Janeiro; foi encontrada na casa do comandante do tráfico na cidade, o 12; segundo relatos o 12 é filho de Santa Quitéria, natural daqui; só vim ter ciência sobre a atuação de Daniel Claudino quando ele foi preso; só após a eleição soube que ele era conhecido como “Da30”; não sei se a prisão dele foi ordenada pela justiça eleitoral ou pela justiça comum; soube da prisão de Braga e Kilvia, e estava na Câmara inclusive. Mas não sei qual a esfera da justiça que ordenou essas prisões; não sei se um dos pagamentos da entrada do Mitsubishi teria partido da candidata Kilvia; desconheço se o Edneudo ou o “Liu” já teriam sido presos; acompanhei eventos eleitorais em Santa Quitéria (…).
b) Nulidade do Relatório Técnico nº 007/2024, emitido pelo Departamento de Polícia Judiciária do Interior Norte:
Relativamente ao pleito de nulidade do Relatório Técnico nº 007/2024, se trata de preliminar já apreciada na decisão saneatória de 01.04.2025, cujos fundamentos ficam RATIFICADOS. Com efeito, observo que as informações de inteligência da polícia civil foram corroboradas pela empresa aérea GOL que confirmou a viagem de volta (Rio de Janeiro x Fortaleza) dos reús, dois dias após terem chegado no veículo apurado. Ou seja, após a obtenção da informação pelo Departamento de Polícia Judiciária do Interior Norte (SEINT/DPJIN) foram empreendidas diligências que confirmam o trajeto percorrido pelo veículo citado na denúncia anônima somado a confirmação da Companhia Aérea GOL sobre a viagem de volta dos réus. Ademais, há informação de que o veículo utilizado no trajeto de ida dos servidores (Fortaleza x Rio de Janeiro) foi encontrado na casa de traficante, líder do Comando Vermelho. Destarte, não conheço da alegada preliminar de nulidade do Relatório Técnico Nº 007/2024.
c) Legalidade da nomeação e do exercício funcional de Francisco Leandro junto à Prefeitura de Santa Quitéria:
O argumento se mostra incabível no âmbito desta AIJE, eis que em momento algum se discutiu a legalidade ou ilegalidade da nomeação do acionado Francisco Leandro. Em momento algum foi atribuído ao aludido ex-servidor comissionado alguma infração disciplinar. Na verdade, logo após a divulgação das práticas espúrias que macularam o processo eleitoral de Santa Quitéria, em 2024, terem sido divulgadas em rede nacional, no programa televisivo intitulado “Fantástico”, o chefe do poder executivo municipal tratou de exonerar os dois servidores que haviam sido escalados para entregar o automóvel de luxo a um dos líderes do Comando Vermelho, dentro de uma das mais perigosas favelas do Brasil. Essa exoneração representou uma clara iniciativa de desvinculação e distanciamento do promovido Francisco Braga em relação aos seus outrora subordinados, os quais já tinham servido ao propósito para o qual foram escalados.
Na verdade, ainda que tenham demonstrado fidelidade ao Prefeito Braguinha durante a campanha de 2024, qualquer proximidade com Francisco Edneudo ou com Francisco Leandro representaria toxidade aos interesses eleitorais de Francisco Braga, razão por que era imperativo e urgente para ele adotar uma postura de aparente desvinculação. Era preciso dar alguma aparência de isenção diante da viagem terrestre empreendida por dois de seus servidores comissionados, os quais percorreram 250Km até Fortaleza, para receber o veículo de luxo que seria ofertado de presente ao traficante “12”, e mais 2.582Km até o Rio de Janeiro, a fim de proceder a entrega daquele “presente” ao destinatário.
d) Inexistência de gravidade suficiente das ações atribuídas ao contestante para configurar abuso de poder político ou econômico:
Quanto à suposta de gravidade suficiente das condutas apuradas nesta AIJE, este juízo revigora as mesmas reflexões já consignadas na apreciação de idêntica tese, que também foi ofertada na peça de alegações finais dos acionados José Braga Barrozo e Francisco Gardel. Com efeito, mesmo que não seja possível quantificar o número de eleitores que tenham sido expulsos de Santa Quitéria antes do dia do pleito, é necessário reconhecer que a obstrução criminosa de um único eleitor já seria apta a viciar o resultado das urnas.
De fato, pouco importa se o homicida efetuou um único disparo, ou dez disparos contra o peito de sua desditosa vítima, pois em ambas as situações existirá “animus necandi” evidente. Por identidade de razões, o direito ao exercício do livre sufrágio em Santa Quitéria restou sepultado a partir de incontáveis condutas de ameaças, coações e expulsões de eleitores, notadamente aqueles residentes em bairros como a Piracicaba e Pereiros.
Demais disso, é necessário enfatizar que coações, intimidações e expulsões de eleitores são condutas essencialmente ofensivas, pois retiram a liberdade de ação e incutem o temor (ou terror) nas pessoas vitimadas. Não à toa o faccionado Rikelme recomendava a seus subordinados com frequência que não inserissem, sob qualquer hipótese, qualquer referência favorável ao nome de Braguinha nas pichações do Comando Vermelho. Por outro lado, o vultoso reforço de policiamento e de tropas federais no pleito eleitoral de Santa Quitéria assinala precisamente o oposto, qual seja que os sentimentos de pavor e intranquilidade impostos em ponderável parcela da população tinha potencial mais do que suficiente para desequilibrar a disputa eleitoral.
e) Necessidade de aplicação do princípio da responsabilidade subjetiva:
Dispõe o art. 186 do CCB que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
Ao contrário do promovido Francisco Gardel, cuja culpa restou caracterizado por seu comportamento omissivo, na modalidade de negligência, a conduta de ilícita do acionado Francisco Leandro foi COMISSIVA, pois inexistiu inércia de sua parte. Muito ao contrário, se mostrou ele deveras diligente em servir como uma espécie de “longa manus” de seu superior hierárquico José Barrozo Braga, a quem serviu fielmente nas tarefas de: a) recolher o veículo de luxo comprado em Fortaleza, por R$225.000,00 (duzentos e vinte e cinco mil reais); b) conduzir tal veículo por mais de 2.500Km até a capital fluminense; c) submeter-se ao “risco” de ingressar com tal veículo dentro da Favela da Rocinha; d) entregar o veículo de luxo ao destinatário ANASTÁCIO PEREIRA PAIVA, conhecido como “Paulinho Maluco” ou “12”, e que figura como uma das lideranças do Comando Vermelho.
Por todas estas ações de fidelidade e obediência ao Prefeito e então candidato José Braga Barrozo, o acionado Francisco Leandro fez por merecer “com louvor”, a responsabilização que lhe foi atribuída nesta AIJE.
f) Direito à presunção de inocência:
Relativamente ao princípio da presunção de inocência, pondera Edilson Mougenot Bonfim16 que a expressão não se mostra tecnicamente correta, uma vez que a palavra presunção, em sentido técnico, é o nome da operação lógico-dedutiva que liga um fato provado (um indício) a outro probando, ou seja, é o nome jurídico para descrição justamente desse liame entre ambos. No caso, o que se tem mais propriamente é a consagração de um princípio de não culpabilidade, porque o art. 5º, LVII da CF/88 não afirma presumir uma inocência, mas sim garantir que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória”. Assim, o princípio em questão alberga uma garantia constitucional, referindo-se, pois, a um “estado de inocência” ou de “não culpabilidade, o que equivale dizer que ninguém pode ser reputado culpado até que transite em julgado sentença penal condenatória.
No mesmo sentido, Simone Scheireber17 adverte que não está dito no Texto Constitucional que todo homem será presumido inocente até que seja condenado, mas sim que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Em vista disso, não se estaria consagrando propriamente o princípio da presunção da inocência, mas sim o da desconsideração prévia da culpabilidade, de aplicação mais restrita.
Contudo, entendemos válida a lição de Nestor Távora e Alex Sampaio18 segundo a qual não macula o status atribuído de princípio da presunção de inocência, pois que emanou dos ideais de um momento da nossa história que buscou, sem menosprezar garantias para a segurança social, assegurar máxima garantia às liberdades, que vinham sendo desrespeitadas no governo anterior, não se devendo perder de vista que comumente utilizamos as expressões presunção de inocência e ou não culpabilidade como sinônimas, não sendo o fato do exercício do direito de ação que levaria ao reconhecimento da perda do estado de inocência, repise-se, antes do advento da sentença condenatória transitada em julgado.
Contudo, no caso em exame, e sobretudo após o encerramento da instrução processual, não cabe a este juízo de primeiro grau presumir, nem inocências, nem culpas. Muito ao contrário, cabe ao julgador a tarefa de sopesar o acervo probatório para, a partir dele construir sua livre convicção motivada, e sedimentado nela realizar emitir seu julgamento de mérito, seu juízo de valor sobre as condutas atribuídas a cada um dos promovidos (e devidamente provadas).
Nesse contexto, este juízo é compelido a discordar da tese do nobre patrono da defesa, seja porque o acionado Francisco Leandro já não pode ostentar a expectativa de ser presumido inocente, eis que os autos desta AIJE contém cervo probatório convergente e seguro que aponta em sentido diametralmente oposto, vale dizer, que o referido acionado tomou parte, voluntariamente, em um complexo de atos voltados a intimidar, coagir e expulsar eleitores de um candidato que rivalizava com o então candidato José Braga Barrozo.
Destarte, ainda que o promovido Francisco Leandro não detivesse o “domínio integral dos fatos”, agiu com conhecimento e vontade, e aderiu a um propósito ilícito de macular o direito constitucional ao sufrágio eleitoral livre de Santa Quitéria, no ano de 2024.
g) Interpretação restritiva do art. 22 da LC nº 64/90:
Para defender seu ponto de vista quanto ao tópico supra, o dedicado patrono de defesa argumentou que “a consequência de uma condenação em sede de Ação de Investigação Judicial Eleitoral é extremamente gravosa: pode acarretar a cassação do diploma, o afastamento de agentes políticos legitimamente eleitos e a imposição de inelegibilidade pelo prazo de oito anos”. E na sequência enumerou os requisitos necessários para responsabilização de seu cliente: a) comprovação da prática de ato abusivo; b) comprovação da existência de dolo e finalidade eleitoral; c) comprovação da gravidade da conduta; d) comprovação do nexo entre o ato e o resultado do pleito.
Ora, se gravosas são as consequências jurídicas da eventual procedência de uma AIJE, é porque muito mais gravosas são as consequências de se permitir que, mediante abuso do poder econômico ou do poder político uma população seja “escravizada”, seja posta numa espécie de cativeiro, seja impedida de escolher livremente seus candidatos. Com efeito, uma vez destituída uma população de tais liberdades ter-se-á o soterramento do Estado Democrático de Direito.
Quanto aos requisitos acima enumerados, à luz do caso concreto, e notadamente das provas apuradas e explicitadas ao longo desta sentença é possível afirmar com segurança que:
a) Há prova testemunhal e pericial de que o promovido Francisco Leandro aderiu, mediante conduta comissiva, à prática de atos abusivos, consistentes em recolher um veículo de luxo em Fortaleza, guiar tal veículo até o Rio de Janeiro, entregar tal veículo a um líder do Comando Vermelho, dentro da Favela da Rocinha, e retornar a Fortaleza de avião, logo em seguida, tudo isso sem apresentar qualquer mínima evidência de que estava previamente autorizado a se afastar das funções públicas que exercia junto À Prefeitura de Santa Quitéria;
b) Hans Welzel, célebre jurista alemão, defende que o dolo não está na cabeça do réu, mas sim na cabeça do juiz, e ele tem razão, na medida em que o chamado “dolo psicológico” do réu permanece insondável ao magistrado, a quem cabe a tarefa de extrair ou descartar o dolo a partir dos indicadores externos, vale dizer, a partir das condutas executadas pelo agente, e na medida em que o promovido Francisco Leandro jamais se deu ao trabalho de demonstrar que sofreu coação, e somente por isso dirigiu um veículo de luco por mais de 2.500Km, para poder entregá-lo em segurança nas mãos de um líder do Comando Vermelho, a única inferência possível é de que o acionado assim procedeu voluntariamente, intencionalmente, dolosamente;
c) Quanto à gravidade da conduta, é suficiente dizer que, numa democracia, nada pode ser tão grave quanto negar ao eleitor a liberdade de sufragar os nomes dos candidatos que escolher, segundo seus valores pessoais, e segundo as ideias e propostas apresentadas durante os atos de campanha, e se estes atos de campanha tiverem sido ilicitamente obstruídos, ainda maior será o grau de culpabilidade daquele que contribuiu para que frutificasse o projeto espúrio;
d) Relativamente ao nexo de causalidade, entre as ações concatenadas e o resultado lesivo, este restou demonstrado na medida em que o acervo probatório demonstrou absoluta articulação entre o crime organizado e pelos menos três candidatos ao pleito eleitoral de 2024, em Santa Quitéria, precisamente os três primeiros acionados desta AIJE, e na medida em que dois deles conseguiram vitória, ainda que no bojo de uma eleição viciada, resta inafastável a constatação de que o projeto espúrio frutificou, pelo menos até que algumas condutas criminosas chegassem ao conhecimento do Ministério Público Eleitoral, e que este submetesse os elementos de prova de que dispunha perante o egrégio TRE/CE.
h) Desproporcionalidade e injustiça da sanção pretendida:
Contrariamente do que se verifica nas molduras penais do ordenamento jurídico brasileiro, as sanções estatuídas no art. 22 da LC nº 64/90 não comportam gradação judicial. Na verdade, só são admissíveis duas sanções, quais sejam a declaração de inelegibilidade e a cassação do diploma daqueles que tenham sido eleitos.
No caso dos autos, dos cinco acionados somente três foram candidatos no pleito eleitoral de 2024, e destes somente dois foram eleitos, razão por que a sanção consistente na cassação de diploma se encontra aprioristicamente descabida em relação aos promovidos Kylvia Lima, Francisco Edneudo e Francisco Leandro.
Quanto à sanção de inelegibilidade, a LC nº 64/90 não faculta ao julgador escolher o tempo do gravame, isto é, não cabe ao magistrado fixar o tempo de proscrição daqueles que eventualmente sejam condenados por atos de abuso do poder econômico ou abuso de poder político, isto porque o legislador impôs como tempo necessário e adequado para tal sanção o intervalo de 08 (oito) anos, pouco importando se o agente punido foi um ex-Presidente da República, como Sr. Fernando Collor de Mello, ou se foi um cidadão comum que se prestou a realizar serviços subalternos, mas relevantes para consolidação da fraude eleitoral. Aliás, como já destacado em aresto do Colendo TSE, a fraude é uma espécie do gênero abuso de poder, pois “toda fraude é uma conduta abusiva aos olhos do Direito” (Recurso Especial Eleitoral nº 63184, Acórdão, Relator(a) Min. Luiz Fux, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo, 05/10/2016).
III. DISPOSITIVO
Isto posto, ante os fatos e fundamentos jurídicos acima explicitados, e com esteio no art. 74 da Lei nº 9.504/97 c/c o art. 22 da Lei Complementar nº 64/90, julgo PROCEDENTES os pedidos veiculados nesta ação judicial eleitoral, para os fins de:
a) Cassar os diplomas de Prefeito e Vice-Prefeito do Município de Santa Quitéria, outrora conferidos a JOSÉ BRAGA BARROZO e FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO, por terem praticado/concorrido/se beneficiado para a prática de abuso de poder político e econômico, nos termos do artigo 22, caput e inciso XIV, da LC nº 64/90, c/c o art. 14, § 9º, da CF/88;
b) Decretar a INELEGIBILIDADE de JOSÉ BRAGA BARROZO, brasileiro, prefeito, candidato à reeleição, inscrito no CPF nº 071.150.403-20, residente e domiciliado na Rua Francisco Milton Araújo, s/n, Distrito do Lisieux ou na Rua Raimundo Carvalho Araújo, nº 14, Distrito de Lisieux, Santa Quitéria, CEP 62280-000; FRANCISCO GARDEL MESQUITA RIBEIRO, brasileiro, vereador, candidato a vice-prefeito, inscrito no CPF nº 503.090.483-20, residente e domiciliado na Rua Rocilda Braga, nº 157, Centro, em Santa Quitéria, CEP 62280-000; KYLVIA MARIA DE LIMA OLIVEIRA, brasileira, assessora jurídica, candidata a vereadora, inscrita no CPF nº 042.304.943-78, residente e domiciliada na Rua Delmiro Gouveia, nº 264, Centro, em Santa Quitéria, CEP 62280-000; FRANCISCO LEANDRO FARIAS DE MESQUITA, brasileiro, servidor público, inscrito no CPF nº 047.576.943-00, residente e domiciliado na Rua João Domingos de Mesquita, nº 58, Centro, Santa Quitéria, CEP 62280-000; e FRANCISCO EDNEUDO DE LIMA FERREIRA, brasileiro, servidor público, inscrito no CPF 056.722.543-73, residente e domiciliado na Rua Professora Ernestina Catunda, 50, Bairro Centro, CEP 62280-000, tanto para esta eleição, como para os 08 (oito) anos seguintes, pela prática de abuso de poder econômico e político, nos termos do art. 22, “caput”, XIV, da LC nº 64/90, c/c o art. 14, § 9º, da CF/88;
c) Determinar, com esteio no art. 224, §§3º e 4º, do Código Eleitoral, que após o trânsito em julgado desta sentença, seja oficiado à Presidência do egrégio TRE/CE, para a realização de novas eleições, independentemente do número de votos anulados.
Sem custas processuais ou honorários advocatícios.
P. R. I.
Santa Quitéria/CE, 07 de maio de 2025.
MAGNO GOMES DE OLIVEIRA
Juiz Eleitoral - 54ª Zona (Portaria nº 342/2025)
1 O mito de Sísifo narra a história de um rei astuto que desafiou a ordem cósmica ao enganar a Morte e Hades, resultando em sua condenação eterna a empurrar uma pedra até o topo de uma colina, apenas para vê-la rolar de volta. Esse castigo simboliza a futilidade das ações humanas quando confrontadas com forças superiores. Na vida moderna, o mito critica a repetitividade do trabalho, o vazio existencial e a busca incessante por sucesso, expondo a falta de significado em muitos aspectos da existência. Albert Camus reinterpretou a narrativa como uma metáfora do absurdo da vida, sugerindo que a verdadeira liberdade reside em aceitar a luta e encontrar realização no esforço constante, imaginando Sísifo feliz em sua tarefa sem fim". Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/filosofia/o-mito-sisifo-sua-conotacao-contemporanea.htm.
2 VALE, Ionilton Pereira do; OLIVEIRA, Magno Gomes de. Temas de Processo Penal. Vol. 5. Da prova. Dos Sujeitos Processuais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2022. p. 302.
3 VALE, Ionilton Pereira do; OLIVEIRA, Magno Gomes de. Temas de Processo Penal. Vol. 5. Da prova. Dos Sujeitos Processuais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2022. p. 299-300.
4 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. Vol. 1. Rio de Janeiro: Forense, 1014. p. 515.
5 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. Vol. 1. Rio de Janeiro: Forense, 1014. p. 517.
6 CÂNDIDO, Joel José. Direito eleitoral brasileiro. 13. ed. Bauru/SP: Edipro, 2008. p. 142.
7 RIBEIRO, Fávila. Abuso de poder no direito eleitoral. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993. p. 25-26.
8 GIANETTI, Eduardo. Autoengano. São Paulo: Companhia das Letras, 2005. p. 257.
9 VALE, Ionilton Pereira do; OLIVEIRA, Magno Gomes de. Temas de Processo Penal. Vol. 5. Da prova. Dos sujeitos processuais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2022. p. 7-8.
10 Uma dose de 1 a 2,5 mg/kg de trióxido de arsênio é potencialmente fatal. Disponível em: https://wwwn.cdc.gov/TSP/MMG/MMGDetails.aspx?mmgid=1424&toxid=3
11 Disponível em: https://g1.globo.com/ce/ceara/noticia/2025/05/05/advogado-conselheiro-da-oab-e-morto-a-tiros-em-fortaleza.ghtml
12 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado: parte especial. Tomo XXII. Direito das obrigações: obrigações e suas espécies. Fontes e espécies de obrigações. Rio de Janeiro: Borsoi, 1958. p. 193 e ss.
13 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 11ª ed. São Paulo: Atlas, 2014. p. 38 e ss.
14 No mesmo sentido, segundo Antunes Varela, “a omissão, como pura atitude negativa, não pode gerar física ou materialmente o dano sofrido pelo lesado; mas entendesse que a omissão é causa do dano, sempre que haja o dever jurídico especial de praticar um ato que, seguramente ou muito provavelmente, teria impedido a consumação desse dano. Basta pensar, quanto à responsabilidade contratual, que o comportamento faltoso do devedor se traduz mais das vezes numa omissão - em não realizar ele a prestação (de coisa ou de facto positivo) devida. A mãe ou a ama que não alimentam a criança, o professor de natação que não socorre o aluno aflito, o automobilista ou o ciclista que não acendem as luzes do veículo, apesar de a noite já ter caído podem ter causado a morte da vítima pela omissão dos atos que tinham o dever de praticar e que teriam normalmente impedido esse evento”. (ANTUNES VARELA, João de Matos. Das obrigações em geral. v. I. 10ª ed. Coimbra: Almedina, 2000. p. 529).
15 DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. v. I, 10ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 120-121.
16 BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de processo penal. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 44-45. No mesmo sentido: MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal. São Paulo: Atlas, 2006, p. 23.
17 SCHREIBER, Simone. O princípio da presunção de inocência. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 790, 1º set. 2005. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7198>.
18 TÁVORA, Nestor; SAMPAIO, Alex. Princípio da presunção da inocência. In: SCHMITT, Ricardo Augusto (Org.). Princípios penais constitucionais: direito e processo penal à luz da constituição federal. Salvador: JusPodivm, 2007b. p. 183-184, p. 67.