JUSTIÇA ELEITORAL
070ª ZONA ELEITORAL DE BREJO SANTO CE
AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (11527) Nº 0600502-57.2024.6.06.0070 / 070ª ZONA ELEITORAL DE BREJO SANTO CE
AUTOR: ELEICAO 2024 MARIO RODRIGO MATIAS DE SA VEREADOR, ELEICAO 2024 JOSE FRANCISCO FERREIRA VEREADOR
Advogado do(a) AUTOR: ADRIANO SOUZA BRINGEL - PE39644
Advogado do(a) AUTOR: ADRIANO SOUZA BRINGEL - PE39644
REU: ELEICAO 2024 MARIA ELOISA OLIVEIRA BEZERRA VEREADOR, ELEICAO 2024 MARILENE AURELIANO SILVA VEREADOR, ELEICAO 2024 JOAO PAULO DUM NASCIMENTO VEREADOR, ELEICAO 2024 MARIA LAILDA SILVA SOUZA VEREADOR, ELEICAO 2024 GEOVAR ALVES FREIRES VEREADOR, ELEICAO 2024 JOAQUIM SANSAO DA SILVA VEREADOR, ELEICAO 2024 JOAO EVERARDO FERREIRA BARROS VEREADOR, ELEICAO 2024 ANTONIO ALVES MONTEIRO VEREADOR, ELEICAO 2024 JOSE JUVINO NETO VEREADOR
Advogados do(a) REU: RAUL CARDOSO PINHEIRO - CE36464-A, VICENTE MAGNO VIDAL - CE23866
Advogados do(a) REU: RAUL CARDOSO PINHEIRO - CE36464-A, VICENTE MAGNO VIDAL - CE23866
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Advogados do(a) REU: RAUL CARDOSO PINHEIRO - CE36464-A, VICENTE MAGNO VIDAL - CE23866
Advogados do(a) REU: RAUL CARDOSO PINHEIRO - CE36464-A, VICENTE MAGNO VIDAL - CE23866
Trata-se de Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) por fraude à cota de gênero ajuizada por MÁRIO RODRIGO MATIAS DE SÁ e JOSÉ FRANCISCO FERREIRA, candidatos nas eleições 2024, em face de MARIA ELOISA OLIVEIRA BEZERRA, MARILENE AURELIANO SILVA, JOÃO PAULO DUM NASCIMENTO, MARIA LAILDA SILVA SOUZA, GEOVÁ ALVES FREIRE, JOAQUIM SANSÃO DA SILVA, JOÃO EVERARDO FERREIRA BARROS, ANTÔNIO ALVES MONTEIRO, JOSÉ JUVINO NETO e PARTIDO DOS TRABALHADORES DE PENAFORTE.
Narra a inicial (ID 124258228), em síntese, que as candidaturas de MARILENE AURELIANO SILVA e MARIA ELOISA OLIVEIRA BEZERRA, tiveram o objetivo exclusivo de atender à regra prevista no art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/97 (Lei das Eleições), caracterizando fraude à cota de gênero.
Argumentam os autores que as referidas candidatas não realizaram qualquer ato de campanha, não buscaram votos, não participaram de eventos políticos, obtiveram quantidades de votos inexpressivos, tiveram prestação de contas padronizada e com movimentação financeira irrelevante, além de sequer divulgarem suas candidaturas.
Relatam que “para se ter uma ideia da falta de comprometimento eleitoral e o intuito das referidas candidatas e do diretório do Partido dos Trabalhadores de Penaforte/CE em APENAS fraudar as normas da Lei Complementar 64/90, INEXISTE, seja lá qual for o meio de comunicação, publicação com fito de angariar votos para as mesmas e/ou divulgar seus respectivos projetos e números de campanha. Outro fato ponderoso, é que em meados do dia 28 de agosto de 2024, foi publicado nas redes sociais Instagram Dr. Rafael_ferreira, atual prefeito e candidato a reeleição, uma postagem com o tema: “TIME DO POVO”, onde mostra uma montagem fotográfica de todos os candidatos da coligação “O PROGRESSO CONTINUA. O POVO PODE MAIS”, formada pelos partidos PT e MDB”, com exceção das candidatas Marilene e Maria Eloisa.”
Acrescem que “ faltando somente 5 (cinco) dias para o término do prazo para apresentação da lista com todos os candidatos a vereadores do Partido dos Trabalhadores de Penaforte/CE, constando uma suposta candidata com nome ADRIANA, e que por razões desconhecidas, a mesma não veio a efetivar o seu pedido de registro de candidatura. Sendo que diante de sua desistência, as candidatas MARILENE AURELIANO SILVA e MARIA ELOISA OLIVEIRA BEZERRA, sem qualquer pretensão de concorrer ao cargo de vereador, SUPOSTAMENTE, doaram seus respectivos nomes para atingir o percentual mínimo de registro de candidaturas femininas.”
Ressaltam que, inclusive, “o 1º Autor fazia parte da mesma coligação partidária das mesmas, e desconhecia o registro de candidatura das referidas candidatas fictícias”.
Argumenta que, em relação a candidata Marilene, em “análise da prestação conta apresentada pela fictícia candidata, verifica-se que a mesma recebeu a título de doação de campanha eleitoral duas transferências bancarias via PIX para a sua conta de campanha, onde, ESTRANHAMENTE, as doações foram feitas por SUIANE M. M. NASCIMENTO, sendo uma no valor de R$1.000,00 (mil reais) no dia 11/10/2024 às 12:41h, e outra no valor de R$200,00 (duzentos reais) na mesma data às 12:53h. (comprovantes em anexo. doc. 08).
Ressalta, ainda, que “a doadora de campanha SUIANE NASCIMENTO é cunhada do candidato eleito JOÃO PAULO DUM NASCIMENTO”, que por sua vez é “esposo da presidenta do Diretório Municipal do Partido dos Trabalhadores de Penaforte.”
Em relação, ainda, a candidata Maria Eloisa, afirma que o comprovante de residência apresentado para registro não corresponde a verdade, eis que, em um município de pouco mais de 9 mil habitantes, “ninguém conhece a mesma como residente na cidade” e que, no endereço indicado, sequer existe qualquer propaganda de seu número de urna, existindo, porém, um adesivo do concorrente da mesma coligação, o Sr. João Paulo do Crediário, configurando a hipótese de “promoção de candidatura de terceiro, um dos requisitos caracterizadores da fraude a cota de gênero, segundo entendimento do Tribunal Superior Eleitoral em sua Súmula 73”.
Ademais, aduz que a candidata em questão, Maria Eloisa, informou perfil de instagram em seu registro de candidatura, só que tal perfil é uma conta privada, o que vai de encontro também com “quem pretende, de boa-fé, participar ativamente de uma campanha eleitoral, usando-a como meio de divulgação e propagações de informações de projetos e dados de campanha eleitoral” e mesmo acessando tal conta, nota-se que inexistem “postagem de cunho político, MAS apenas publicações pessoais realizadas entre 25 de fevereiro e 26 de julho de 2023.”
Alegam que findado o período de campanha eleitoral, as candidatas MARILENE AURELIANO SILVA e MARIA ELOISA OLIVEIRA BEZERRA obtiveram apenas 6 (seis) e 10 (dez) votos, respectivamente.
Em resumo, alega a parte autora que ambas as candidatas, quais sejam, MARIA ELOISA OLIVEIRA BEZERRA e MARILENE AURELIANO SILVA, tiveram votação inexpressiva, prestação de contas padronizada e com movimentação financeira irrelevante, e não praticaram atos efetivos de campanha, além de sequer divulgarem suas candidaturas.
Instruíram a inicial com documentos e fotos retiradas das residências das candidatas, além de prints de conversas no whatsapp/instragram.
Citados, os requeridos, em contestação única, não arguiram preliminares nem juntaram documentos. Restringiram-se a rebater as argumentações dos autores, afirmando que houve gastos de campanha com prestação de contas à Justiça Eleitoral; que foram praticados atos próprios de campanha, porém sem a realização de eventos, entrega de material de campanha ou uso de outros meios, afirmando que a campanha de ambas as candidatas fora feita ao "corpo a corpo"; que a votação de 06 e 10 votos não foi inexpressiva, dado o tamanho do município de Penaforte; e que não houve padronização financeira, sendo regulares os gastos de campanha.
As partes apresentaram alegações finais e a Representante do Ministério Público manifestou-se pela procedência da ação, com a devida aplicação das sanções cabíveis ao caso. No entanto, este juízo com intuito de evitar alegação de nulidades, converteu o julgamento em diligências, deferindo os requerimentos anteriormente apresentados, inclusive com a realização de audiência de instrução e julgamento.
Durante a audiência judicial foram ouvidas MARILENE AURELIANO SILVA e MARIA ELOISA OLIVEIRA BEZERRA, acompanhada dos seus respectivos advogados. Também foram acostados aos autos os extratos bancários das contas de titularidade de SUIANE MARIA MENDES DO NASCIMENTO e de MARIA ELOISA OLIVEIRA BEZERRA.
Novamente em sede de alegações finais, a parte requerida pugnou pela improcedência da ação, afirmando que "a Justiça Eleitoral, ao deferir os registros e DRaps, já reconheceu a regularidade formal e material das candidaturas. A movimentação financeira das campanhas foi regular, com despesas compatíveis e declaradas perante a Justiça Eleitoral."
Já a parte autora e o MPE, em sede de novas alegações e parecer, pugnaram pela procedência da ação, haja vista restar suficientemente provada a fraude contra a cota de gênero perpetrada, merecendo pois a aplicação da sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos oito anos subsequentes à eleição em que se verificaram os abusos, bem como a invalidação de todas as candidaturas elencadas no Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários – DRAP, apresentado no RCand nº 0600239-25.2024.6.06.0070, pela Federação FE BRASIL, formada por PCdoB, PT e PV, cassando, consequentemente, o registro de candidatura de todos os representados e o diploma/mandato dos candidatos eleitos.
É o relatório. Decido.
II - FUNDAMENTOS
Como visto, o cerne da questão reside na verificação da existência de fraude à cota de gênero prevista no art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/97, a partir do registro das candidaturas de MARIA ELOISA DE OLIVEIRA BEZERRA E MARILENE AURELIANO SILVA, como mera forma de cumprimento formal do percentual mínimo de 30% de candidaturas femininas, sem efetiva intenção de participar do pleito eleitoral.
Através do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários – DRAP, apresentado no RCand nº 0600239-25.2024.6.06.0070, a Federação FE BRASIL, formada por PCdoB, PT e PV, apresentou a candidatura de nove pessoas ao cargo de vereados do município de Penaforte, nas eleições de 2024, sendo seis do sexo masculino e três do sexo feminino, cumprindo, assim, com a exigência legal do mínimo de 30% de candidatura do sexo feminino, motivo pelo qual o DRAP foi deferido.
Contudo, pelo que dos autos consta, sobretudo sopesando as provas coligidas ao processo e produzidas em juízo, as candidatas MARIA ELOISA OLIVEIRA BEZERRA e MARILENE AURELIANO SILVA não concorreram, de fato, na Eleição 2024, posto que restou, comprovado que não fizeram atos de campanha de suas candidaturas, de nenhuma forma, seja por comícios, passeatas, entrega de santinhos, adesivos, ou mesmo em redes sociais, de modo que não buscaram os votos dos eleitores, tratando-se deveras de candidaturas fictícias, ou seja, candidaturas apresentadas apenas para preencher a cota de gênero e, com isso, possibilitar a participação da federação e dos demais candidatos que a integraram, prática perniciosa e conhecida na política nacional, que é ilegal e vem, paulatinamente, de maneira louvável, sendo combatida pelo Poder Judiciário, posto que fere os princípios democráticos.
Tal prática, frise-se, fez com que, de fato, a Federação em questão, no pleito para vereadores do Município de Penaforte, eleições 2024, tivesse, pelo princípio da verdade real, concorrido apenas com uma candidata do sexo feminino, face 06 do sexo masculino, ou seja, desrespeitando a cota mínima de 30% de cada sexo.
A análise para configuração da fraude exige a avaliação de elementos concretos e robustos que demonstrem, de maneira inequívoca, a inexistência de empenho real por parte das candidatas, evidenciando seu uso apenas para preencherem a cota legal.
Nesse sentido, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por meio da Súmula nº 73, estabeleceu critérios objetivos que devem ser considerados na análise de casos similares, quais sejam: "(1) votação zerada ou inexpressiva; (2) prestação de contas zerada, padronizada ou ausência de movimentação financeira relevante; e (3) ausência de atos efetivos de campanhas, divulgação ou promoção da candidatura de terceiros".
Passo, assim, à análise dos elementos constantes nos autos, cotejando-os com os fundamentos jurídicos aplicáveis.
1. Da votação inexpressiva:
Conforme destacado nos autos, MARILENE AURELIANO SILVA E MARIA ELOISA DE OLIVEIRA BEZERRA obtiveram apenas 6 votos e 10 votos, respectivamente, número extremamente reduzido, que, à luz do entendimento jurisprudencial do TSE, caracteriza votação inexpressiva.
Ora, presumindo-se que um desses 6 e 10 votos, tenha sido das respectivas candidatas, tem-se que nenhuma das duas conseguiu angariar sequer uma dezena de votos em um município onde houve mais de 7.700 votos válidos para vereador.
Ademais, sabido que as próprias famílias do interior do Estado possuem um número de membros maior que este, o que deixa ainda mais clara e evidente a inexpressividade dos votos obtidos pelas rés, configurando um dos pressupostos para fraude à cota de gênero.
Nesse ponto, como bem apontado pelo parecer ministerial, a jurisprudência do TSE já reconheceu a configuração de fraude em casos onde candidatas fictícias obtiveram votação inexpressiva, especialmente quando acompanhada de outros indícios claros de irregularidades (TSE - ARESPE: 0600285-66, Angical-BA, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 28/02/2023).
2. Da prestação de contas zerada, padronizada ou ausência de movimentação financeira relevante:
A análise do processo de prestação de contas de campanha demonstra que os gastos declarados pelas candidatas investigadas Marilene e Maria Eloisa se limitaram ao montante de R$ 1.200,00, destinado à confecção de material gráfico, mais especificamente santinhos supostamente adquiridos em uma gráfica localizada em Salgueiro -PE, contrato de prestação de serviço de contador e de advogado. Esse valor, considerado modesto no contexto de campanhas eleitorais, foi a única despesa registrada.
Apesar da alegação da defesa de que as movimentações financeiras de campanha das candidatas MARILENE AURELIANO SILVA e MARIA ELOISA OLIVEIRA BEZERRA, se deram “de forma simples e de acordo com a realidade econômica do município, bem como não consta nem uma irregularidade nas prestações de contas”, o fato é que algumas movimentações relevantes não se comprovaram diante dos recursos financeiros empregados durante a campanha eleitoral.
Conforme se verifica das respectivas prestações de contas junto a esta Justiça Eleitoral, no ato de registro de candidatura das candidatas, MARILENE AURELIANO SILVA declarou possuir recursos no valor de R$8.000,00 (oito mil reais), enquanto MARIA ELOISA OLIVEIRA BEZERRA declarou o valor de R$6.000,00 (seis mil reais).
Analisando os gastos referentes a produção de materiais gráficos das respectivas candidatas, cada uma, “investiu” um valor de R$400,00 (quatrocentos reais) com material gráfico para divulgação de suas respectivas candidaturas.
Destaque-se que , mais uma vez estranhamente, as produções gráficas se deram tão somente cinco dias antes do pleito, inexistindo nos autos qualquer prova de que, de fato, houvesse atraso por parte da gráfica, pois como sabido e se fosse do interesse das candidatas, haveria como responsabilizar a gráfica pelos danos gerados pelo atraso que alegaram haver existido.
Em sede de audiência, gize-se, as candidatas afirmaram, inicialmente, que não haviam recebido doações de campanhas e, posteriormente, contradizendo-se afirmaram ter recebido doação de campanha, porém não recordando o valor, sendo dito pela ré Marilene que nem mesmo conhecia a pessoa de Suiane Mendes Nascimento, única doadora, a qual lhe doou a quantia de R$1.200,00 (mil e duzentos reais), alegando que a mesma fez doação ao partido e que este foi quem lhe repassou.
Tal afirmativa, inclusive, reverbera duvidosa vez que, conforme ofício juntado no ID124628975, a suposta doadora de campanha da candidata MARILENE AURELIANO SILVA, a srª. Suiane Mendes Nascimento (cunhada de João Paulo Dum Nascimento, esposo da presidente do diretório do partido dos trabalhadores em Penaforte, também réu neste processo e candidato eleito), recebeu de um “terceiro” dois depósitos, sendo um de R$200,00 (duzentos reais), e outro de R$1.000,00 (mil reais), todos no dia 11 de outubro de 2024, colhendo-se também do referido extrato financeiro que no mesmo dia (11/10/2024) ocorreram, coincidentemente, as duas transferências bancárias para a conta de campanha da candidata MARILENE AURELIANO, o que corrobora para a tese de ocorrência de fraude de doações de campanha eleitoral.
No que tange à ré Maria Eloisa Oliveira Bezerra (ID124627704 – vídeo T2 005), esta, em audiência, afirmou que não recebeu doação de campanha e ainda não soube responder como efetuou o pagamento dos gastos de campanha que foram declarados a esta Justiça Eleitoral. Aduziu não saber onde fora confeccionado o material gráfico, não se recordando se contratou profissional de advocacia, bem como não sabendo sequer o valor pago.
Ora, diante dos extratos bancários constantes no ID124629101, constata-se que a candidata ré em questão recebeu em sua conta pessoal, no dia 17/10/2024, um valor de R$1.200,00 (mil e duzentos reais) de terceiro. Porém, neste mesmo dia transferiu, exatamente, a mesma quantia para sua conta de campanha. Sucessivamente, a candidata ré, Maria Eloisa, efetuou três tranferências via PIX nos valores de R$500,00 (quinhentos reais), R$300,00 (trezentos reais) e R$400,00 (quatrocentos reais), o que somam, coincidentemente, a quantia de R$1.200,00 (mil e duzentos reais).
Essa cronologia, somada à concentração das movimentações financeiras em uma única data, levanta questionamentos acerca da autenticidade das campanhas em questão. Tal padrão sugere uma movimentação financeira ajustada exclusivamente para atender aos requisitos formais de uma prestação de contas.
Tais fatos demonstram que houve a contratação de serviços gráficos, advocatícios e de contabilidade, porém, como as rés não se recordaram com precisão de terem contratado os referidos serviços, afirmando, no ID124627718 (vídeo T2 006), por exemplo, não terem ido a gráfica, bem como não terem requisitado a terceiros a contratação de confecção de materiais gráficos, não saberem explicar onde ficaria a gráfica contratada, vê-se que as notas fiscais e a prestação de contas foram feitas tão somente pro forma, assim como fictícias são as candidaturas das rés.
Destarte, também por tais prismas, não restam dúvidas que as candidatas MARILENE AURELIANO SILVA e MARIA ELOISA OLIVEIRA BEZERRA, registraram suas candidaturas, tão somente para atender preceitos constantes na Legislação Eleitoral, ou seja, os 30% (trinta por cento) das vagas destinadas as candidatas do gênero feminino, acrescendo-se que a candidata ré Maria Eloisa é, ainda, sobrinha da presidente do PT de Penaforte/CE (afirmação no ID124627723 – vídeo T2 007), MARIA ELIANE CAMPOS OLIVEIRA, a qual possuía relevante interesse particular no deferimento do DRAP, por razões obvias, inclusive, no que tange ao candidato João Paulo Dum Nascimento.
Com efeito, a caracterização de candidatura fictícia decorre da análise do conjunto das circunstâncias fáticas do caso concreto, devendo ser consideradas não só as provas contundentes, mas também o conjunto de indícios que demonstrem a ausência de intenção e efetiva participação da disputa eleitoral.
Embora a defesa tenha argumentado que os valores declarados estão em conformidade com a média dos gastos dos vereadores no município de Penaforte, a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, no ED–REspEl 0600550–38.2020.6.06.0011/CE, é cristalina ao afirmar que:
"[...] o fato de candidaturas masculinas apresentarem contextos semelhantes não tem o condão de, isoladamente, afastar de imediato as evidências da prática de fraude ao sistema de cotas de gênero. É necessário o cotejo com outros elementos convincentes da veracidade das candidaturas, inexistentes na espécie".
O parecer ministerial sintetiza os indícios de fraude detalhados acima: "Como se vê das doações, contratações e gastos com a campanha das candidatas MARIA ELOISA OLIVEIRA BEZERRA e MARILENE AURELIANO SILVA, ambas receberam o mesmo valor de doação e tiveram os mesmos gastos durante a campanha, exatamente os mesmos. Assim, além de observar que as doações foram feitas, uma pela própria candidata e outra pela cunhada de outro candidato, vê-se que a identidade de doações e gastos não foi mera coincidência, mas ato programado para manter a fraude de cota de gênero, gerando receita e despesa para aprovação das contas de campanha. A existência da despesa com material de campanha e a inexistência de juntada desse material deixa mais claro ainda que tal "encomenda" se deu apenas para constar da prestação de contas e não para fazer campanha, que não foi feita, como já dito acima."
Esses elementos configuram uma movimentação artificial, típica de candidaturas fictícias. Portanto, os elementos apresentados apontam para uma ausência de esforço efetivo na campanha eleitoral das candidatas, reforçando a tese de que suas candidaturas não atenderam aos padrões mínimos exigidos pela legislação para a configuração de uma participação genuína no pleito.
A Súmula nº 73 do TSE reforça que a ausência de movimentação financeira significativa pode ser indicativa de fraude, especialmente quando associada a outros indícios de ficticidade.
3. Da ausência de atos efetivos de campanha, divulgação ou promoção da candidatura de terceiros:
Outro aspecto que merece destaque é a completa inexistência de atos efetivos de campanha.
As provas trazidas aos autos pela defesa limitaram-se as afirmações das rés, sendo dito pela requerida Marilene, em síntese, ter firmado os contratos apresentados. Não ter recebido doação de campanha, tendo recebido valores do partido, mas que não se recordava quando. Disse, ainda, que recebeu uma doação de Suiane, mas que ela doou ao partido e o partido resolveu doar para si. Apesar disso, afirmou que não conhece Suiane. Disse que fez material gráfico, mas não se recordava a gráfica, nem o local em que ficava. Disse que teve acesso aos adesivos no final da campanha, pois houve um atraso. Disse que tem 5 irmãos. Informou que sua campanha foi porta a porta, mas que tinha pouco tempo. Não participou das convenções porque não tinha tempo, já que seu mercado fechava tarde. Confirmou que não participou de grupo de whatsapp da coligação. Disse que teve um gasto de campanha de R$ 1.200,00. Disse que é filiada ao PT há 22 anos. Sobre a falta de adesivos em sua casa, disse que pregou, mas outras pessoas arrancavam. Disse que é casada e que seus pais são vivos. Dois do seu irmão moram em Guarulhos. Disse que tem um mercadinho de bairro há uns 6 seis anos. Disse que não foi aos comícios do Dr. Rafael, porque não tinha tempo. Também afirmou que não subiu em palanque para pedir voto. Disse que somente saía a noite para pedir voto. Disse que não teve apoio da família. Disse que não queria misturar política com vida pessoal, por isso não pediu voto por meio das redes sociais. Disse que seus pais são idosos e que só votariam se quisessem e que não queria obrigá-los a votar.
Já a requerida Maria Eloisa Oliveira Bezerra, afirmou que não tinha causa própria durante as eleições. Disse não ter recebido doação de campanha, não sabendo responder como pagou pelo material gráfico da sua campanha. Disse que pagou R$ 1.200,00 de material gráfico, em seguida retificou e afirmou que pagou R$ 400,00 pelo material. Não soube informar qual a gráfica responsável pelo material. Disse que não pediu a alguém para solicitar o material. Disse que foi o partido quem entregou o material. Sobre Eliane Campos, disse que é sua tia, irmã da sua mãe. Disse que é filiada ao PT desde 2023. Confirmou que sua tia exerce função de direção do partido, mas não se recorda qual. Também confirmou ter exercido função no partido, mas não soube informar qual. Disse que tirou 10 votos. Sobre seu pai e mãe afirmou que eles não votavam em Penaforte, só sua irmã. Disse que não sabe em quem sua irmã votou. Disse que não informou o instagram para a Justiça Eleitoral. Afirmou que não fez postagens políticas no seu instagram. Disse que sua campanha foi porta em porta. Sobre as fotos do santinho, disse que foi o fotografo Felipe Teixeira o responsável. Disse que no mesmo dia ele também tirou foto de Marilene. Igualmente confirmou a autenticidade das assinaturas apostas nos contratos.
Ora, é cediço que a internet é um dos meios mais baratos e com maior poder de alcance a ser utilizado nas estratégias de propaganda eleitoral. No entanto, estranhamente e sem apresentar qualquer justificativa plausível, as rés negaram ter feito uso de qualquer campanha digital.
Além disso, a alegação da defesa de que houve poucos recursos para realização da campanha, desenvolvendo-se da maneira menos custosa que foi corpo a corpo, não prospera, porquanto, sabido que a divulgação e o pedido de votos por meio de redes sociais, desde que informadas à Justiça Eleitoral, é gratuita e poderia ser feita pelas próprias candidatas em seus perfis, mesmo pela candidata Marilene, a qual a todo momento sempre dizia não haver tempo para “pedir voto”, só o fazendo a noite, as vezes, quando fechava o seu “mercadinho”.
Ocorre que as rés sequer juntaram um post, stories, publicação, status, vídeo, foto, texto, nada que tivesse sido publicado com pedido de voto, sequer arrolaram um eleitor que tenha recebido uma dessas visitas “corpo a corpo” das candidatas. Não há juntada pelos réus de um vídeo de comício, reunião, passeata, carreata, nada onde houvesse o pedido de voto para as candidatas MARIA ELOISA OLIVEIRA BEZERRA e MARILENE AURELIANO SILVA, seja por elas ou pelos candidatos da chapa majoritária. Aliás, o candidato a prefeito sequer as menciona quando publica seus candidatos a vereador por Penaforte, como se vê da publicação juntada pelos autores.
Outrossim, há nos autos fotos das residências das candidatas, onde sequer há qualquer menção as suas candidaturas, comprovando que não houve pedido algum de voto ou realização de qualquer ato de campanha por parte delas.
Ressalte-se que, mais uma vez estranhamente, a defesa que teve oportunidade de juntar aos autos, inclusive quando da contestação, onde alegou não haver “sobrado” material algum, postulou, sem qualquer justificativa para a preclusão, em sede de “requerimento de diligências decorrentes da instrução”, a juntada de um exemplar de santinho da candidata Marilene, a qual indagada se em algum outro momento lhe foi solicitada uma cópia para compor esta ação, a mesma preferiu se manter em silêncio (ID124624914 – T1 006), concluindo-se que o documento poderia ter sido produzido tão somente para aquela juntada, sem tempo hábil a realização de qualquer perícia haja vista o célere rito atribuído a AIJE.
Acresce-se que também há contradição entre o que foi alegado em contestação e os depoimentos pessoais das demandadas candidatas quanto a participação das mesmas em atos “internos” da federação, como as convenções partidárias, bem como apresentaram todos os documentos exigidos em Lei para o regular registro de candidatura, sendo que ambas foram categóricas em afirmar que não participaram das convenções e nem de qualquer outro evento partidário, Marilene, inclusive, afirmando constantemente ausência de tempo para tanto.
Neste aspecto, esclarece-se que o fato de ter o registro de candidatura deferido não é o suficiente para afastar a incidência da fraude a cota de gênero ainda mais porque a intenção em disputar o pleito deve ser manifestada no curso da campanha, sendo insuficiente a presença de elementos indiciários no período que antecede a realização das convenções partidárias, especialmente quando não confirmados por quaisquer provas da prática de atos de campanha após o registo efetivo da candidatura, se fosse o caso.
Neste sentido, a ausência de atos concretos de campanha é elemento reconhecido pela jurisprudência como indício inequívoco de ficticidade da candidatura (TSE - REsp nº 851-18, Rel. Min. Sérgio Banhos, DJE 28/10/2020).
Outro ponto que merece realce é o fato de que em audiência, a Srª MARIA ELOISA OLIVEIRA BEZERRA (ID124627741 – Vídeo T2 008) confirmou que em sua residência existia um adesivo de campanha do candidato a vereador JOÃO PAULO DO CREDIÁRIO (esposo de sua tia), porém na fotografia da residência da mesma não há qualquer material gráfico referente a sua própria candidatura. Destarte, resta caracterizado que a referida candidata fictícia fez alusão, sim, a candidatura de terceiro.
No que tange à concorrência dos demais requeridos na fraude, sobretudo, o réu João Paulo, tem-se que a afirmativa feita pela ré Marilene tanto rechaça a tese da defesa em que a prova relativa ao adesivo de campanha do candidato a vereador, “João Paulo do crediário”, se deu fora do período eleitoral, eis que se deu antes do pleito eleitoral realizado no dia 06 de outubro de 2024, quanto denotada que houve favorecimento direto ao mesmo, levando a crer que este concorreu diretamente para fraude eleitoral apurada nesta AIJE.
Quanto à sanção a ser imposta, a configuração de fraude à cota de gênero, como demonstrada nos autos, implica consequências severas, sendo indissociável de todos os integrantes da chapa, titulares ou suplentes, que concorreram para a obtenção do quociente partidário.
Não há violação ao objetivo da norma, mesmo que resulte na cassação de mandato de uma mulher eleita, pois o propósito é garantir a efetiva representatividade feminina, e não o benefício isolado de uma candidata.
A legislação eleitoral não prevê ressalvas que afastem as sanções em casos de fraude comprovada. Assim, todos os votos do partido são anulados, os mandatos dos eleitos são cassados, e os envolvidos na fraude tornam-se inelegíveis.
Embora severa, tal sanção reflete a intenção legislativa de assegurar o cumprimento das cotas de gênero e fortalecer a participação feminina, conforme reiterado em precedentes do Tribunal Superior Eleitoral:
1. Preliminares. (...) 2. Mérito. 2.1. Ocorrência de fraude às cotas de gênero verificada na espécie a partir de candidaturas femininas fictícias, como denotam a ausência de movimentação financeira na prestação de contas da pretensa candidata, a votação zerada, a realização de campanha para o marido com postagens em redes sociais sem menção à própria candidatura, a insubsistência lógica das teses defensivas etc. 2.2. O reexame do conjunto fático-probatório delineado no acórdão regional encontra óbice na Súmula nº 24/TSE. 2.3. Há a necessidade de cassação da inteireza da chapa, ainda que a fraude tenha se limitado a algumas candidatas, uma vez que a glosa parcial acabaria por tornar o risco consistente no lançamento de candidaturas laranjas rentável sob o ponto de vista objetivo, pois não haveria prejuízo para partidos, coligações e candidatos que viessem a ser eleitos e posteriormente descobertos pelo ato. 2.4. Com a ressalva à compreensão que tenho em casos nos quais inválida mais da metade dos votos de determinada eleição, a constatação de fraude à cota de gênero, com a cassação da inteireza da coligação, encontra consequência afeta ao descarte dos votos entregues à grei, de modo que é imperiosa a necessidade de retotalização dos quocientes eleitoral e partidário, como feito na espécie. 2.5. Negativa de provimento aos agravos internos. (TSE - Recurso Especial Eleitoral nº 162, Acórdão, Relator(a) Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 127, Data 29/06/2020, Página 49/59)
Esse entendimento repercute em outros regionais, cita-se como exemplo trecho de julgado do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná:
“(…) 9. A atribuição da inelegibilidade é entendida, sempre, como personalíssima, o que significa que somente aqueles que, na forma da lei, hajam contribuído para a prática do ato ilícito é que serão destinatários dessa gravíssima sanção. Precedentes. 10. Seria absurdo entender que as mulheres, destinatárias das medidas afirmativas e marcadamente o elo fraco na fraude à cota de gênero, seriam as únicas ou as principais culpadas pelo ilícito eleitoral. Obviamente, para que uma mulher se preste ao papel de lançar–se ficticiamente candidata, é necessário que haja, no mínimo, um dirigente partidário ou um outro candidato que a conduziu a isso. Entendimento distinto permite que os reais mentores da fraude continuem impunes. 11. Nesse contexto, ao impor aos convencionais o nome da ex–nora de um dos seus maiores puxadores de votos, mesmo havendo outras mulheres interessadas em concorrer pelo partido e que estavam presentes à convenção, o mínimo que se pode dizer da atuação do presidente da grei é que anuiu com a fraude, já claramente em curso – mesmo porque, como plenamente comprovado nos autos, ela já estava compartilhando nas redes sociais material de pré–campanha de ex–sogro – devendo ser por ela responsabilizado. 12. Por sua vez, a participação do candidato e ex–sogro da candidata "laranja" é manifesta, decorrente da proximidade familiar ainda existente, mesmo após o divórcio de seu filho com a candidata. Ao "concorrer" ao mesmo cargo que sua ex–nora, sabendo que esta na verdade estava engajada na sua eleição e não na própria, a anuência está fartamente caracterizada, atraindo a responsabilidade. Precedentes. (...)”. (TRE-PR RE Nº 0600832–11.2020.6.16.0072 – PARANAVAÍ – PARANÁ)
Posto isto, entendo que a sanção de inelegibilidade deve ser aplicada apenas a MARIA ELOISA OLIVEIRA BEZERRA, MARILENE AURELIANO SILVA, além de JOÃO PAULO DUM NASCIMENTO, com base nos princípios da responsabilidade subjetiva e da proporcionalidade, uma vez que suas participações direta na fraude à cota de gênero foram comprovadas.
Em relação ao demais réus, não há nos autos elementos suficientes para justificar a imposição dessa sanção, posto não se verificar prova robusta de participação direta na organização ou execução da candidatura fictícia, sendo insuficientes alegações genéricas de responsabilidade partidária.
III - DISPOSITIVO
Ante o exposto, em consonância com o parecer ministerial, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a presente AIJE, reconhecendo a fraude à cota de gênero pelas candidaturas fictícias de MARIA ELOISA OLIVEIRA BEZERRA e MARILENE AURELIANO SILVA, com a cassação do DRAP da Federação Fé Brasil, formada por PCdoB, PT e PV,- DRAP, apresentado no RCand nº 0600239-25.2024.6.06.0070, nulidade dos votos e recontagem dos quocientes eleitoral e partidário e, por conseguinte, cassação do registro de candidatura de todos os representados e o diploma/mandato dos candidatos eleitos.
DECRETO a inelegibilidade somente das candidatas MARIA ELOISA OLIVEIRA BEZERRA e MARILENE AURELIANO SILVA, bem como do candidato JOÃO PAULO DUM NASCIMENTO pelo período de 8 (oito) anos, a contar da data das eleições de 2024, nos termos do art. 22, XIV, da LC nº 64/90.
Publique-se. Intimem-se as partes. Dê ciência ao MPE.
Brejo Santo, datado e assinado eletronicamente.
SAMARA COSTA MAIA
Juíza Eleitoral da 70a Zona