JUSTIÇA ELEITORAL
033ª ZONA ELEITORAL DE CANINDÉ CE
REPRESENTAÇÃO (11541) Nº 0600070-52.2024.6.06.0033 / 033ª ZONA ELEITORAL DE CANINDÉ CE
REPRESENTANTE: PSB PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO COMISSAO PROVISORIA MUNICIPAL DE CANINDE
Advogados do(a) REPRESENTANTE: THIAGO DIAS DE MEDEIROS - CE42049, DANIEL ALMEIDA QUEZADO FERNANDES - CE20624, MARCIO JORIO FERNANDES ANDRE - CE41424, ANA CAROLINA FILGUEIRAS RIOS - CE20990, JOSE EDUARDO GOYANA BENTO - CE42451
REPRESENTADO: JOSE KLEDEON VIANA PAULINO, MARIA DO ROZARIO ARAUJO PEDROSA XIMENES
Advogado do(a) REPRESENTADO: JOSE VANDERLEI MARQUES VERAS - CE22795
Advogado do(a) REPRESENTADO: CARLOS CELSO CASTRO MONTEIRO - CE10566-A
Trata-se de representação por propaganda antecipada, com pedido de liminar, ajuizada pelo Partido Socialista Brasileiro – PSB do município de Canindé-CE, em desfavor de JOSÉ KLEDEON VIANA PAULINO, pré-candidato ao cargo de prefeito do município e de MARIA DO ROZÁRIO PEDROSA XIMENES, atual prefeita.
De início, aduz que já tramita o processo nº 0600060-08.2024.6.06.0033 no qual “foi concedida Tutela Antecipada de Urgência para retirada da mesma Propaganda Extemporânea dos registros do Instagran do Pretenso Candidato Kledeon Paulino o representado JOSÉ KLEDEON VIANA PAULINO”, entretanto, “não foi apreciado junto a representação do Ministério Público a Propaganda Antecipada também realizada pela atual Prefeita Maria do Rozário”.
Neste contexto, cita que no dia 18/05/2024 “a Prefeita do Município divulgou em sua página do Instagram um vídeo que é tido como propaganda extemporânea”. Ao descrever o link do vídeo apontado como ilícito, cita que “o pretenso candidato já usa o slogan: “CANINDÉ DO LADO CERTO”, demonstrando ser o candidato da atual Prefeita de Canindé, inclusive marcando-a em diversas publicações, storys e postagens nas redes sociais”.
Sustenta que há “de forma ostensiva e límpida, a manifestação de vontade da atual municipalidade em presunção de largar na frente no pleito eleitoral vindouro, abusando de forma aberta do seu poder político e da máquina pública para promoção do seu candidato nas eleições majoritárias do município do Canindé/CE”.
URL: https://www.instagram.com/reel/C7Igh84OWax/?igsh=ajZrMTJ1bm5yZ29k
Acosta “prints” de supostas publicações em contas do Instagram do pré-candidato JOSÉ KLEDEON VIANA PAULINO e da prefeita MARIA DO ROZÁRIO PEDROSA XIMENES, requerendo, em sede liminar:
a) a imediata retirada do conteúdo presente no Instagram da representada no link acima citado;
b) aplicação dos dispositivos do art. 57-C, § 2º e 57-I da Lei nº 9.504/1997 c/c Art. 17, §§ 1º-A e 1º-B da Resolução Nº 23.608/2019, junto as páginas dos Instagran’s dos Representados: https://www.instagram.com/kledeonpaulino?igsh=d3QwczQ2cDhsMmIz - INSTAGRAN KLEDEON PAULINO e https://www.instagram.com/rozarioximenesoficial?igsh=MWJxbHNsOGxoZXVqbA== INSTAGRAN ROZÁRIO XIMENES;
c) que seja proibido o uso do slogan: CANINDÉ DO LADO CERTO ou suas abreviações no período de campanha, de forma a manter a isonomia, paridade de armas e lisura do pleito eleitoral.
No mérito, requer seja julgada totalmente procedente a presente representação para condenar os representados ao pagamento de multa no valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), nos termos do art. 36, §3º, da Lei nº 9.504/1997.
Conclusos os autos para análise do pedido liminar, este juízo deferiu o pedido antecipatório (ID. 122335902) determinando a retirada imediata do link https://www.instagram.com/reel/C7Igh84OWax/?igsh=ajZrMTJ1bm5yZ29k.
Os representados apresentaram defesa (ID. 122357876 e ID. 122361065) alegando, preliminarmente, ausência de interesse de agir e cumprimento da medida liminar. No mérito, sustentam não estar configurada a propaganda eleitoral antecipada, pois não teria havido pedido explícito de voto. Pedem ao final a total improcedência da representação.
Com vista dos autos o Ministério Público Eleitoral opina “pelo deferimento, em parte, do pedido de tutela formulado pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), determinando-se a retirada imediata da postagem também realizada pela Prefeita Maria do Rozário em suas redes sociais” (ID. 122372459).
É o relatório. Fundamento e decido.
Na pauta do mundo contemporâneo, há um compromisso de suma importância desta Justiça especializada: garantir que o processo eleitoral transcorra de modo regular, observadas as balizas constitucionais, para que as candidaturas efetivamente legítimas sejam as escolhidas nas eleições.
Tal aspiração é ainda mais importante nos tempos atuais, em que as mídias sociais multiplicaram a velocidade da comunicação. Qualquer informação publicizada na internet toma grandiosas proporções, cuja repercussão pode desequilibrar a paridade de armas no processo eleitoral que se avizinha.
Nesse sentido, a intervenção da Justiça Eleitoral, até pela importância das mídias sociais nestas eleições, deve ser firme e precisa. É saber estabelecer o contraponto entre o direito à liberdade de expressão, consagrado na Constituição Federal de 1988, e o direito também constitucional à isonomia em todos os aspectos humanos e jurídicos, dentre eles, a participação justa e equânime num processo eleitoral.
Isto porque, o direito à liberdade de expressão e à livre manifestação de pensamento é inerente à própria democracia, não sendo razoável a censura ao cidadão, proibindo-o de se manifestar em qualquer ambiente, seja virtual ou real, sobre as suas ideias.
Entretanto, embora a liberdade de expressão constitua garantia fundamental de estatura constitucional, imperioso destacar que sua proteção possui limites (art. 5º, inciso IV, da CF).
A Lei 9.504/97 e as Resoluções TSE nº 23.610/2019 e nº 23.738/2024 estabelecem que a realização de propaganda eleitoral somente é permitida a partir do dia 16 de agosto do corrente ano, restando claro que as postagens objeto deste processo foram produzidas em período em que a propaganda eleitoral é vedada.
O art. 36-A da Lei das Eleições registra os atos que não configuram propaganda eleitoral antecipada, sendo permitidos aos pré-candidatos desde que não envolvam pedido explícito de voto. Assim, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos, além de outros atos elencados em referido artigo, podem ter cobertura dos meios de comunicação social, inclusive via internet, sem que se caracterize propaganda irregular, desde que respeitados os parâmetros traçados pelos arts. 36 e 36-A da Lei das Eleições e pelos precedentes do TSE.
O Tribunal Superior Eleitoral, em interpretação ao artigo 36–A da Lei nº 9.504/97, definiu diretrizes para caracterização de propaganda eleitoral antecipada tida por irregular: i) a presença de pedido explícito de voto; ii) a utilização de formas proscritas durante o período oficial de propaganda; ou iii) a violação ao princípio da igualdade de oportunidades entre os candidatos. (AgR–AI 9–24, Relator Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto).
Ademais, nos termos do artigo 3-A da Resolução TSE 23.610/2019, com a recente redação dada pela Resolução TSE n. 23.732/2024:
Art. 3º-A. Considera-se propaganda antecipada passível de multa aquela divulgada extemporaneamente cuja mensagem contenha pedido explícito de voto, ou que veicule conteúdo eleitoral em local vedado ou por meio, forma ou instrumento proscrito no período de campanha.
Parágrafo único. O pedido explícito de voto não se limita ao uso da locução "vote em", podendo ser inferido de termos e expressões que transmitam o mesmo conteúdo. (grifei)
A jurisprudência atual afirma que o espírito da lei deve ser levado em consideração por ocasião da análise das mensagens divulgadas. Nessa linha de compreensão, vem considerando que a utilização de "palavras mágicas", como "vote em mim", "vote contra", "apoie", "derrote", "eleja", ou outras expressões assemelhadas, têm o condão de traduzir o pedido explícito de voto.
Cabe lembrar que em junho de 2018 (acórdãos AgReg 9-24/SP e RESPE 4.346/BA), Luiz Fux assim argumentou: "Considero válida a proscrição de 'expressões semanticamente similares ao pedido explícito do voto', porquanto certamente compreendidas pelo espírito da norma."
A questão foi didaticamente esclarecida no julgamento do AgR-Al n° 9-24.20 1 6.6.26.02421SP, Relator: Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, julgado em 26 de junho de 2018, nos seguintes termos:
[...] O teor e demais elementos extrínsecos da mensagem, o que pode ser extraído do uso de nomes, slogans e expressões, do nome e do número do partido, de símbolos, de cores e de outros elementos identificadores de pré-candidatura. Nesse ponto, deve-se atentar para o uso de expressões semanticamente similares ao pedido explícito de voto, palavras que remetam à captação de voto para possível candidato, e não à promoção ou à propagação de uma ideia qualquer, tais como: "eleja", "apoie", "digite na urna", "Fulano para tal cargo", "Beltrano é o melhor para tal local (circunscrição da eleição)", "em xxyy (ano da eleição) é/vai dar/apoie Fulano", entre outras expressões. Assim, o requisito referente ao pedido explícito de voto, a que se refere o caput do art. 36-A da Lei 9.504/97, poderá ser inferido não apenas de mensagem direta ("vote em", "peço o seu voto"), mas também de contexto conceitual explícito que não deixe dúvida razoável acerca da intenção de captar voto. (Grifei)
No caso dos autos, de início, acolho a preliminar de ausência de interesse de agir levantada por JOSÉ KLEDEON VIANA PAULINO. Isso porque, em relação a este representado já tramita, pelos mesmos fatos, a representação nº 0600060-08.2024.6.06.0033 julgada procedente com aplicação de multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), de modo que entendo deva ser extinta a presente representação em face do mesmo, caracterizada perda do objeto e ausência de interesse processual superveniente, nos termos do art. 485, VI, do Código de Processo Civil.
Ademais, quanto a preliminar arguida por MARIA DO ROZÁRIO PEDROSA XIMENES, em que pese ter sido cumprida a decisão que determinou a retirada do vídeo do perfil da representada, tal fato não inviabiliza a análise do mérito.
No mérito, entendo que a divulgação realizada pela representada MARIA DO ROZÁRIO PEDROSA XIMENES, nos termos da publicação conjunta com Kledeon Paulino, extrapola os limites permitidos para a pré-campanha, configurando, assim, propaganda eleitoral antecipada.
Observa-se que a utilização do “slogan” “Canindé do Lado Certo” de forma conjunta com o emprego de verbos, como “pavimentamos”, “reformamos”, “construímos”, “recuperamos” e “asfaltamos”, atesta a clara intenção do representado em se incluir no mérito dos feitos da administração anterior, de modo que vislumbro associação direta das postagens veiculadas à atual gestão municipal, em clara tentativa de captar a simpatia e o voto do eleitorado, por meio de artifício para que não fique caracterizado pedido explícito de voto.
Nesse sentido, colaciono precedente do TRE-PE:
“(...)”
5. A divulgação do slogan de campanha "Nosso compromisso continua" nas redes sociais em arte, aparentemente profissional, com a foto dos candidatos a prefeito e vice-prefeito apertando as mãos, na qual consta, além do número de campanha (11), os apelidos dos candidatos e os cargos aos quais concorreram, com a utilização do recurso hashtag, permite o rastreamento das publicações nas redes e revela que os beneficiários da publicidade não só tiveram o prévio conhecimento da divulgação antecipada do slogan de campanha, como também estimularam os seus apoiadores a compartilhá-los nas redes sociais. 6. Não há outra interpretação a ser dada. Houve propaganda eleitoral extemporânea com nítido e prévio conhecimento dos pré-candidatos, beneficiários do ato, de modo que o bem jurídico tutelado pela norma foi violado. 7. Improvimento do Recurso Eleitoral nº 0600342-17, para manter a sentença incólume. 8. Provimento Parcial do Recurso Eleitoral nº 0600371-67, para manter a sentença que julgou procedente a representação, mas com redução das multas impostas. (TRE-PE - REL: 060018735 EXÚ - PE 060018735, Relator: IASMINA ROCHA, Data de Julgamento: 13/05/2022, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 99, Data 24/05/2022, Página 10-37)
Frisa-se, após extensa análise do conjunto das publicações, que há clara intenção do representado em incidir na opinião pública com objetivo de angariar votos. Não resta, assim, outra interpretação a ser dada senão que houve propaganda eleitoral extemporânea corroborada pela representada, que promoveu a divulgação dos fatos em sua rede social.
A jurisprudência eleitoral, ao se debruçar sobre o tema em caso semelhante, manifestou-se de igual forma:
RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO POR PROPAGANDA ELEITORAL EXTEMPORÂNEA. DIVULGAÇÃO EM REDE SOCIAL DE VÍDEOS E PUBLICAÇÕES. PEDIDO EXPLICITO DE VOTOS. CARATER DISSIMULADO. DESPROVIMENTO DO RECURSO.I. Necessário esclarecer que o pedido explícito de votos pode ocorrer por meio de expressões semanticamente similares (palavras mágicas), em afronta à norma proibitiva do art. 36-A, caput da Lei nº 9.507/97. Precedentes deste TRE/RJ e TSE.II. Na tarefa de caracterização do pedido explícito de voto, não se pode olvidar a condição do autor das mensagens, quando se descola da posição de cidadão ou, como no caso dos autos, de presidente da associação de moradores do bairro, e claramente assume o papel de précandidato.III. A análise do material carreado aos autos evidencia que a conduta do recorrente se enquadra no conceito mais atual de propaganda eleitoral antecipada, uma vez que, além da menção à sua pré-candidatura, o recorrente utilizou-se de expressões semanticamente similares (palavras mágicas) para pedir votos aos munícipes, em afronta à legislação vigente.IV. Ainda, conforme demonstrado pelo órgão ministerial, "o recorrente, na condição de Presidente da Associação de Moradores do Bairro de Jardim Marileia, concedeu entrevista ao canal "TVOstras", que foi compartilhada em seu endereço na rede social Facebook (Id. 13137009), oportunidade em que divulgou melhorias realizadas na municipalidade e destacou a sua participação para o êxito das obras, com nítido intuito de promoção pessoal", o que viola o princípio da igualdade de oportunidades entre os candidatos, pois que dissemina ser, o recorrente, o responsável por obras públicas da municipalidade, beneficiando-se em detrimento dos demais précandidatos.V. O uso de termos e expressões que denotam ser o recorrente capaz de atender demandas levadas pelos cidadãos igualmente contrariam os princípios fundamentais da propaganda eleitoral, visto que não se caracteriza como mera promoção pessoal.VI. Resta evidenciado que a divulgação de vídeo, enaltecendo qualidades pessoais do recorrente, bem como de publicações, contendo propaganda e pedido expresso de voto, ainda que de forma dissimulada, denotam o nítido intuito de captação de votos, em período vedado.VII. Desprovimento do recurso. (RECURSO ELEITORAL nº060037632, Acórdão, Des. Ricardo Alberto Pereira, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 22/10/2020)
Registra-se, ainda, a explícita ofensa à paridade de armas, tão protegida quando se trata de matéria relativa à propaganda eleitoral. Por tais razões, houve a antecipação dos atos de campanha eleitoral, com referências a palavras mágicas, equivalentes semânticos a pedido de voto, como a menção a continuidade do governo municipal na vertente adequada.
A utilização do slogan implica diretamente que há um "lado errado", induzindo o eleitor a acreditar que a escolha correta é votar no pré-candidato, configurando-se pedido de voto. Tal prática é vedada pela legislação eleitoral, uma vez que antecipa o período de propaganda eleitoral, desequilibrando a igualdade de condições entre os concorrentes e ultrapassando os limites da mera exaltação de qualidades pessoais.
Assim, por estar configurada propaganda eleitoral antecipada, tendo a representada veiculado vídeo em suas redes sociais, com fulcro no artigo 36, caput e § 3º, c/c o artigo 39, § 8º, da Lei n.º 9.504/97, e na forma do artigo 96 da Lei n.º 9.504/97 e art. 3º e seguintes da Resolução TSE n.º 23.608/19, julgo parcialmente PROCEDENTE a presente representação em face de MARIA DO ROZÁRIO PEDROSA XIMENES e aplico a multa em seu valor mínimo de 5.000,00 (cinco mil reais).
Quanto ao pedido de suspensão de acesso a todo conteúdo veiculado nas páginas da rede social Instagram, retirando do ar os perfis dos representados, entendo ser indevida tal medida; de outro modo esta justiça especializada estaria tolhendo garantia fundamental - liberdade de expressão - para censurar o cidadão. É livre a manifestação do pensamento, além de ser inerente à própria democracia, não sendo razoável proibir o cidadão de manifestar suas ideias em qualquer ambiente.
Publique-se. Intime-se. Ciência ao MPE.
Nos termos do art. 22 da Resolução TSE nº 23.608/2019, eventual recurso deverá ser interposto no prazo de 1 (um) dia. Caso oferecido, intime-se a parte contrária para contrarrazões no mesmo prazo.
Canindé/CE, data da assinatura eletrônica.
JUIZ ELEITORAL DA 33ª ZONA