JUSTIÇA ELEITORAL
086ª ZONA ELEITORAL DE ALTO SANTO CE
AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (11527) Nº 0600372-19.2024.6.06.0086 / 086ª ZONA ELEITORAL DE ALTO SANTO CE
AUTOR: PARA RECONSTRUIR IRACEMA [PSB/PSD/UNIÃO] - IRACEMA - CE
Advogados do(a) AUTOR: LEONARDO ROBERTO OLIVEIRA DE VASCONCELOS - CE18185-A, LIVIA CHAVES LEITE - CE40790, CASSIO FELIPE GOES PACHECO - CE17410-A
INVESTIGADO: CELSO GOMES DA SILVA NETO, EVARISTO MAGALHAES MAIA
Advogados do(a) INVESTIGADO: ANTONIO CLETO GOMES - CE5864, JOSE ALEIXON MOREIRA DE FREITAS - RN7144
Advogados do(a) INVESTIGADO: ANTONIO CLETO GOMES - CE5864, JOSE ALEIXON MOREIRA DE FREITAS - RN7144
1. RELATÓRIO
Trata-se de AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL ajuizada pela Coligação “PARA RECONSTRUIR IRACEMA (PSB/PSD/UNIÃO) de Iracema/CE em face de CELSO GOMES DA SILVA NETO, Prefeito reeleito do referido município, e EVARISTO MAGALHÃES MAIA, Vice-Prefeito reeleito, ambos das Eleições Municipais 2024, sob o fundamento da prática de abuso de poder, por utilização indevida de meios de comunicação e conduta vedada.
Na Exordial, ID 123460756, o investigante sustenta, em síntese, que os investigados promoveram um incremento injustificado no número de servidores contratados e concursados, no ano de 2024, bem como promoveram evento festivo de dia das mães com distribuição de brindes, caracterizando a conduta como vedada e abuso de poder econômico, pois a máquina administrativa foi utilizada em prol de suas candidaturas, pugnando pelo reconhecimento da prática ilegal e por consequência a aplicação das sanções de inelegibilidade e cassação dos mandatos.
Acompanham a inicial 11 (onze) vídeos referentes ao evento do “Dia das Mães”, bem como 5 (cinco) relatórios, ID’s 123460759, 123460821, 123460822, 123460824 e 123460825, de veracidade do conteúdo anexado.
Em sede contestatória, ID 123552524, os investigados sustentam, em síntese, que não houve conduta vedada e abuso de poder por parte dos investigados, as contratações e nomeações de servidores ocorreram por determinação judicial e para suprir necessidade nas áreas da saúde, educação, limpeza urbana e motoristas de máquinas, bem como que o evento festivo do “Dias das Mães” está sendo apurado em outra ação, requerendo a improcedência do pedido.
Realizada audiência de instrução, ID 124452700, foram ouvidas as testemunhas presentes.
Em alegações finais, ID 124468175, a parte requerida ratifica os argumentos da peça contestatória, sustentando que as contratações foram justificadas pelo interesse público, fato corroborado com as testemunhas ouvidas, visto que foram implementadas melhorias no setor educacional e social do município de Iracema/CE, bem como que o evento festivo “Dia das Mães” já fora julgado improcedente por este juízo em outra ação, bem como que não houve a presença dos investigados e foi realizado pela associação cultural do município.
Nos memoriais, ID 124475351, a parte autora ratifica os argumentos descritos na inicial sustentando a contratação e nomeação de servidores em período vedado, bem como a distribuição de brindes pela administração, fatos que causaram desequilíbrio ao pleito, caracterizando conduta vedada e abuso de poder pelos investigados.
O Ministério Público Eleitoral se manifestou, ID 124494115, pela improcedência do pedido, entendendo pela não configuração abuso de poder ou de conduta vedada pelos investigados.
É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir.
2. FUNDAMENTAÇÃO
A Lei Complementar nº 64/90, em seu art. 22, disciplina a Investigação Judicial Eleitoral para a apuração de fatos que atentem contra a lisura e a normalidade do processo eleitoral, repelindo o uso indevido, desvio ou abuso de poder econômico, político ou dos meios de comunicação em benefício de candidatos e partidos. A legislação objetiva proteger o pleito eleitoral de atos que o corrompam e desvirtuem a vontade soberana do eleitor.
O abuso de poder econômico está relacionado ao mau uso dos recursos patrimoniais com o escopo de gerar vantagem eleitoral para candidato ou partido, ao passo que o abuso de poder político consiste no emprego indevido de cargo ou função pública e da máquina administrativa em favor de agente político, de modo a afetar a normalidade e a legitimidade das eleições. Em todo caso, visando alterar a autenticidade da disputa eleitoral, realizam-se ações que buscam a promoção de agentes políticos em detrimento do equilíbrio e da igualdade de oportunidades do pleito.
Ressalte-se que, para a configuração do abuso de poder, "não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam", conforme dispõe o art. 22, XVI, da LC nº 64/90.
Desse modo, não se deve perquirir a etérea e contrafática noção de "aptidão para alterar o resultado da eleição" - que será sempre vaga e dúbia -, mas sim verificar a gravidade objetiva e concreta dos fatos imputados, que não devem limitar-se a atos isolados e de pouca repercussão, necessitando apresentar magnitude suficiente para comprometer a normalidade e a legitimidade do pleito - bens jurídicos constitucionalmente tutelados (art. 14, § 9º, da CRFB/88), por meio do cerceamento da liberdade de escolha do eleitor e do desequilíbrio de forças entre os atores políticos, consoante se ilustra abaixo:
AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2018. DEPUTADO ESTADUAL. ABUSO DO PODER RELIGIOSO COMO COROLÁRIO DO ABUSO DO PODER ECONÔMICO. GRAVIDADE. PRESSUPOSTO. ART. 22, INC. XVI DA LEI COMPLEMENTAR Nº 064/1990. AUSÊNCIA DE GRAVIDADE. IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. 1. De acordo com o inciso XVI, do art. 22 da Lei Complementar nº 064/1990, incluído pela Lei Complementar nº 135/2010, nas Ações de Investigação Judicial Eleitoral por abuso de poder deverá ser analisada a gravidade das circunstâncias que o caracterizaram. 2. Sendo assim, eventual conduta ilícita não autoriza, isoladamente, o automático reconhecimento de abuso de poder. No caso, não restou caracterizada a concreta gravidade das circunstâncias, com força suficiente para interferir na liberdade do voto e desequilibrar a disputa eleitoral. Precedentes do TSE. 3. Pedidos julgados improcedentes (TRE-AP - AIJE: 060155923 MACAPÁ - AP, Relator: SUELI PEREIRA PINI, Data de Julgamento: 18/02/2019, Data de Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico - TRE/AP, Tomo 28, Data 21/02/2019, Página 3).
Em se tratando do encargo probatório aplicável à espécie, sabe-se que, conforme reza o art. 373, I, do CPC, cabe ao demandante demonstrar o fato constitutivo de sua pretensão deduzida em juízo, cabendo ao réu a comprovação de eventual fato modificativo, impeditivo ou extintivo do direito autoral na forma do art. 373, II, do CPC.
Dessa forma, considerando inclusive a repercussão das sanções eleitorais cabíveis e a tutela do voto democrático, cabe ao investigante a comprovação robusta e firme (i) da ocorrência dos fatos abusivos e de sua gravidade concreta para comprometer a lisura do pleito nos moldes acima expostos ("materialidade"), bem como (ii) da responsabilidade dos investigados, seja por participação direta no ilícito, seja por anuência ou mesmo por simples ciência do abuso potestativo ("autoria ou participação direta ou indireta"), de modo a afastar a responsabilização objetiva.
A título ilustrativo, vejam-se os seguintes julgados:
ELEIÇÕES 2018. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ORDINÁRIO. GOVERNADOR E VICE GOVERNADOR.AIJE. SUPOSTOS ILÍCITOS CONFIGURADORES DE CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO E DE CONDUTA VEDADA, BEM COMO DE ABUSO DOS PODERES POLÍTICO E ECONÔMICO E DE USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO. NÃO RECONHECIMENTO DA PRÁTICA ABUSIVA PARA FINS DE INCIDÊNCIA DO ART. 22 DA LC Nº 64/1990. AUSÊNCIA DE PROVA ROBUSTA. NÃO DEMONSTRAÇÃO DE DESEQUILÍBRIO DO PLEITO. GRAVIDADE DAS CIRCUNSTÂNCIAS NÃO COMPROVADA. FALTA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA AOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. DIALETICIDADE RECURSAL. INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO SUMULAR Nº 26 DO TSE. NEGADO PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO. (TSE, Recurso Ordinário nº 060885637, Acórdão, Relator(a) Min. Og Fernandes, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 175, Data 01/09/2020).
ELEIÇÕES 2018. RECURSOS ORDINÁRIOS. DEPUTADA ESTADUAL. SUPLÊNCIA. ABUSO DO PODER ECONÔMICO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. CONDENAÇÃO NA ORIGEM. UTILIZAÇÃO ELEITOREIRA DE PROGRAMA FILANTRÓPICO DENOMINADO DENTISTAS SEM FRONTEIRAS. AUSÊNCIA DE PROVA ROBUSTA. PROMESSA DE ENTREGA DE INSUMOS ODONTOLÓGICOS EM TROCA DE VOTOS. DIÁLOGOS NO WHATSAPP. LICITUDE.1. No caso, o MPE ajuizou representação por captação ilícita de sufrágio e AIJE por abuso do poder econômico em desfavor da recorrente, candidata ao cargo de deputada federal nas eleições de 2018, e do coordenador de campanha, devido à utilização do programa Dentista sem Fronteiras com o fim de obter votos de beneficiários do programa filantrópico Dentistas sem Fronteiras.2. O TRE/AP, em julgamento conjunto, julgou procedentes os pedidos para cassar o diploma de suplente da recorrente, aplicar-lhe multa no valor de 5.000 Ufirs, bem como impor a ambos os recorrentes a sanção de inelegibilidade pelo prazo de 8 anos, com fundamento nos arts. 41-A, da Lei das Eleições, 19 e 22, XIV, da LC nº 64/1990.3. As condutas que fundamentaram a AIJE e a representação consistiram (a) no uso do programa Dentistas sem Fronteiras com finalidade eleitoreira; (b) na promessa e entrega de insumos odontológicos a estudantes de odontologia em troca de votos; e (c) na apreensão de documentos em diligência da Polícia Federal, cujo conteúdo indica se tratar de promessa e/ou entrega de benesses a eleitores.4. Inexistem violações aos arts. 489, IV e VI, e 1.022, do CPC e 275 do CE, na medida em que os alegados vícios dizem respeito à análise valorativa que o TRE/AP realizou sobre o acervo probatório dos autos, sendo certo que o inconformismo com o julgamento de mérito não se coaduna com a via estreita dos aclaratórios. Precedentes.5. As teses recursais (violação aos arts. 14, § 9º, da CF; 22, XVI, da LC nº 64/1990; 237 do CE; e 41-A, da Lei das Eleições) cingem-se a demonstrar eventual fragilidade do acervo probatório para o fim de se comprovar a finalidade eleitoreira e o desvio de finalidade do programa Dentistas sem Fronteiras. Alegam os recorrentes que os elementos de prova não permitem concluir ter havido qualquer promessa de entrega de materiais odontológicos em troca de votos, assim como as circunstâncias não possuem gravidade suficiente para malferir a igualdade de chances no pleito.5.1. O acervo probatório dos autos é composto por (a) depoimentos testemunhais da proprietária da clínica em que realizados os atendimentos odontológicos e de estudante e voluntário no programa Dentistas Sem Fronteiras; (b) declarações colhidas nos autos do Inquérito Policial nº 0218/2018; (c) documentos e materiais decorrentes de busca e apreensão realizada pela Polícia Federal (planilhas com listas de pessoas, endereços e telefones, anotações com referência às eleições e quantitativo de gasolina, carros e cestas básicas, além de R$ 40.000.00 em espécie encontrados na casa dos recorrentes); e (d) diálogos de conversas no aplicativo WhatsApp.AIJE nº 0601730-776. Esta Corte Superior entende que o abuso do poder econômico "¿configura-se por emprego desproporcional de recursos patrimoniais, públicos ou de fonte privada, vindo a comprometer valores essenciais a eleições democráticas e isentas' (AgR-RO 8044-83, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 5.4.2018 e REspe nº 114/MG, Rel. Min. Admar Gonzaga, DJe de 25.2.2019)" (AgR-RO nº 0602518-85/PA, rel. Min. Edson Fachin, DJe de 18.3.2020)6.1. A caracterização do abuso de poder demanda a presença de provas robustas que demonstrem, indene de dúvida, a gravidade das condutas e o correlato benefício eleitoral auferido pelo(a) postulante ao cargo eletivo. Precedentes.6.2. No caso, o TRE/AP concluiu pelo abuso do poder econômico em razão das seguintes circunstâncias "1) a própria Investigada declarou que em razão do aumento da demanda foi necessário alugar uma sala para funcionamento do projeto; 2) a recepcionista da clínica declarou que o movimento dela aumentou drasticamente depois que a sala foi alugada [...]; 3) a Investigada possui elevada capacidade econômica, tendo declarado patrimônio de R$ 1.149.752,00 (um milhão, cento e quarenta e nove mil, setecentos e cinquenta e dois reais) à Justiça Eleitoral em 2020, usou recursos próprios para o programa; 4) a finalidade eleitoral do projeto é reforçada pelo fato de não ter havido continuidade dele, tudo a evidenciar a gravidade da conduta perpetrada pelos Investigados" (ID 157814838).6.3 Em relação aos documentos apreendidos em regular busca e apreensão - planilhas com listas de pessoas, endereços e telefones, anotações com referência às eleições e quantitativo de gasolina, carros e cestas básicas, além de R$ 40.000.00 encontrados na casa dos recorrentes -, o TRE/AP assentou que "[...] não se constata que essas apreensões tenham relação com o suposto uso do programa ¿Dentista Sem Fronteiras', merecendo destaque apenas o receituário com o timbre do referido projeto, apreendido no comitê de campanha da então candidata Patrícia Ferraz" (ID 157815001, fl. 25).6.4. É tênue o liame entre as ações filantrópicas e os atendimentos gratuitos com caráter eleitoreiro, mormente quando verificado o aumento do programa em ano eleitoral. Nessa hipótese, para fins de se reconhecer eventual abuso, faz-se mister prova robusta de que os serviços altruísticos visaram vincular a imagem do postulante a cargo eletivo às ações filantrópicas, a evidenciar o viés eleitoral, sob pena de criminalizar essa importante ação social em anos eleitorais.6.5. "O exercício de atividade de filantropia não configura, por si só, o abuso de poder econômico, ¿sendo imprescindível, a partir de elementos objetivos, a demonstração do caráter eleitoral da conduta para a sua configuração' (REspe nº 258-57/ES, rel. designado Min. Edson Fachin, DJe de 19.6.2020).6.6. Esta Corte Superior exige "provas robustas e incontestes para a procedência da AIJE por abuso do poder econômico e da representação eleitoral por captação ilícita de sufrágio, não sendo suficientes meros indícios ou presunções" (AgR-REspe nº 475-91/ES, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 16.9.2019).6.7. No caso, a conclusão do acórdão regional acerca do uso abusivo do programa Dentistas Sem Fronteiras lastreou-se no depoimento isolado da responsável legal da clínica alugada devido à expansão do programa filantrópico e na apreensão, no referido local, de cartões de visita da recorrente em que consta seu nome, foto, telefone e redes sociais. Não há nenhum outro elemento probatório que corrobore as suspeitas aduzidas pela referida testemunha, sendo certo que nenhum beneficiário dos atendimentos odontológicos foi ouvido em Juízo.6.8. Nesse contexto, a circunstância de ter sido verificado um aumento da demanda por atendimentos odontológicos - que motivou o aluguel de um espaço maior - e o fato de a recorrente possuir patrimônio elevado não são hábeis a retirar o caráter presuntivo das declarações prestadas pela testemunha de acusação. Também ausente o quantitativo - ainda que estimado - de beneficiários dos atendimentos odontológicos realizados no âmbito do programa Dentistas sem Fronteiras, o que impossibilita aferir o grau de extensão dos supostos benefícios advindos das condutas narradas.6.9. "[...] embora o art. 22, XVI, da LC 64/1990 tenha afastado, como elemento configurador do ilícito, a potencialidade de o fato alterar o resultado do pleito, nada impede que o julgador a utilize como aspecto secundário para aferição da gravidade" (RO-El nº 1251-75/AP, rel. designado Min. Alexandre de Moraes, julgado em 30.9.2021, DJe de 9.11.2021).6.10. Inexistente elementos probatórios que sustentem o cenário fático narrado na AIJE, é inviável a condenação pelo cogitado abuso do poder econômico.Rp nº 0601707-347. Quanto à prática da conduta prevista no art. 41-A da Lei das Eleições, a condenação decorreu da promessa de entrega de insumos odontológicos - materializada em diálogos realizados no WhatsApp - a uma estudante de odontologia que alegou possuir vinte votos.7.1. Esta Corte Superior entende que "[...] em caso de decisum judicial prévio em que se autorize expressamente a busca e apreensão [...], é lícito o acesso a dados estáticos contidos em aparelho celular, sendo despiciendo expedir novo ato para determinar a análise do conteúdo" (ED-REspe nº 324-68/MS, rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 10.10.2019, DJe de 12.12.2019).7.2. "A compra de um único voto é suficiente para configurar captação ilícita de sufrágio, pois o bem jurídico tutelado pelo art. 41-A da Lei nº 9.504/97 é a livre vontade do eleitor, sendo desnecessário aferir eventual desequilíbrio da disputa (precedentes, dentre eles, o REspe nº 462-65/SP, Rel. Min. Rosa Weber, acórdão de 19.3.2019). Cuida-se de circunstância que por si só basta para a procedência dos pedidos, independentemente do impacto na disputa" (AgR-REspe nº 189-61/PE, rel. designado Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, julgado em 26.5.2020, DJe de 10.8.2020).7.3. Na hipótese, o coordenador de campanha levou ao conhecimento da candidata pedido de materiais em troca de votos realizado por, ao menos, uma eleitora identificada - que afirmou ter "20 votos pra ela" e que poderia "repassar a lista com os nomes titulo zona e seçao de cada um pra você e posso trabalhar juntamente cm vocês em tudo q quiserem [sic]" (ID 157815001) -, tendo a recorrente anuído e concordado com a conduta.Conclusão8. Recursos ordinários eleitorais parcialmente providos tão somente para afastar a condenação pelo abuso do poder econômico, julgando, por conseguinte improcedente a AIJE nº 0601730-77. Mantida as sanções impostas na Rp nº 0601707-34. Recurso Ordinário Eleitoral nº060170734, Acórdão, Min. Raul Araujo Filho, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 17/04/2023.
O art. 73, IV, da Lei nº 9.405/97 veda a promoção de candidatos, partidos ou coligações por meio de ações de caráter social custeadas ou subvencionadas pelo poder público.
Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:
I - ceder ou usar, em benefício de candidato, partido político ou coligação, bens móveis ou imóveis pertencentes à administração direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, ressalvada a realização de convenção partidária;
II - usar materiais ou serviços, custeados pelos Governos ou Casas Legislativas, que excedam as prerrogativas consignadas nos regimentos e normas dos órgãos que integram;
III - ceder servidor público ou empregado da administração direta ou indireta federal, estadual ou municipal do Poder Executivo, ou usar de seus serviços, para comitês de campanha eleitoral de candidato, partido político ou coligação, durante o horário de expediente normal, salvo se o servidor ou empregado estiver licenciado;
IV - fazer ou permitir uso promocional em favor de candidato, partido político ou coligação, de distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeados ou subvencionados pelo Poder Público;
O artigo supracitado elenca, ainda, no inciso V, a vedação de nomeação e contratação de servidores, nos três meses que antecedem o pleito até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade dos atos, ressalvados, dentre outros, aprovados em concursos homologados até o início do prazo citado.
Art. 73, V – nomear, contratar ou de qualquer forma admitir, demitir sem justa causa, suprimir ou readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou impedir o exercício funcional e, ainda, ex officio, remover, transferir ou exonerar servidor público, na circunscrição do pleito, nos três meses que o antecedem e até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados:
a) a nomeação ou exoneração de cargos em comissão e designação ou dispensa de funções de confiança;
b) a nomeação para cargos do Poder Judiciário, do Ministério Público, dos tribunais ou conselhos de contas e dos órgãos da Presidência da República;
c) a nomeação dos aprovados em concursos públicos homologados até o início daquele prazo;
d) a nomeação ou contratação necessária à instalação ou ao funcionamento inadiável de serviços públicos essenciais, com prévia e expressa autorização do chefe do Poder Executivo;
e) a transferência ou remoção ex officio de militares, policiais civis e de agentes penitenciários;
A partir do disposto acima, depreende-se que, nos três meses que antecedem o pleito até a posse dos eleitos, é vedado a nomeação e a contratação de servidores, ressalvados se o certame foi homologado até o início do referido prazo, ou seja, constatado a contratação de servidor, no período proscrito, resta caracterizada a conduta vedada.
Ademais, o §4º do referido artigo atribui multa ao responsável pela conduta vedada, independentemente de autorização ou anuência do beneficiário do ato.
§ 4º O descumprimento do disposto neste artigo acarretará a suspensão imediata da conduta vedada, quando for o caso, e sujeitará os responsáveis a multa no valor de cinco a cem mil Ufirs.
Inicialmente, convém destacar, conforme descrito nos memoriais, ID 124468175, que a distribuição de brindes no evento festivo do “Dia das Mães” já fora analisada por este juízo eleitoral na Representação Especial n. 0600033-60.2024.6.06.0086, a qual foi julgada improcedente por não reconhecer a prática de conduta vedada. No entanto, o Tribunal Regional Eleitoral do Ceará por meio do Acórdão ID 19802385, reconheceu, por unanimidade, a prática de conduta vedada pelos investigados, dando provimento ao recurso interposto, e, por consequência, aplicou multa de R$ 20.000,00 para cada representado, decisão ainda não transitada em julgado.
Cito trechos da supracitada Decisão:
“Na situação dos autos, adianto compreender ser inegável que houve distribuição gratuita de bens na indigitada Festa do Dias das Mães, sem amparo nas ressalvas previstas na Lei.
Em análise da prova constante dos autos, que consiste em publicações em redes sociais, prints e URLs, percebe-se que o evento contou com ampla participação dos munícipes, no qual foram distribuídos diversos presentes.
No vídeo de id 19582351, no qual aparecem algumas das mães contempladas em testemunho do que receberam, verifica-se que ocorreu vasta distribuição de bens de valores relevantes, como fogões, geladeiras, ventiladores, scooter motorizada, forno elétrico, televisão, e outros.
Nesse cenário, restou comprovada a distribuição de bens, o que não foi negado pelos recorridos, – naquela Festa ocorrida aos 17/5/2024, em ano eleitoral, portanto –, de modo a configurar a conduta vedada do referido §10 do art. 73 da Lei das Eleições”.
(…)
“Diante do contexto fático da conduta praticada, no qual os recorridos ilegalmente beneficiaram-se de data comemorativa ao dia das mães, assim como da repercussão local e midiática do evento, considerando-se as particularidades do caso concreto, o valor individual de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) mostra-se condizente para satisfazer o caráter pedagógico e sancionatório exigido pela legislação.
Portanto, o recurso merece ser provido para que seja aplicada unicamente multa aos recorridos”.
Neste momento, cabe a este julgador analisar conjuntamente se a conduta vedada supracitada, atrelada ao suposto aumento no número excessivo e injustificado de servidores tem o condão capaz de configurar abuso de poder.
No que tange ao aumento no número de servidores, os autores apontam, inicialmente, que a Prefeitura Municipal de Iracema contratou, no mês de janeiro/2024, 141 servidores, e que os concursados, até agosto de 2024, aumentou em 178. Destaca, ainda, que o município extrapolou o limite de gastos com pessoal, segundo fonte do Tribunal de Contas.
Foram colacionadas as seguintes provas aos autos: 1) tabelas com os números de concursado e contratados no período de janeiro a agosto de 2024; 2) folha de pagamento do referido período; 3) tabela comparativa de concursados e contratados nos anos de 2021, 2022 e 2023; 4) tabela comparativa da remuneração total de servidores nos anos de 2021 a 2024; 5) gráficos comparativos do período de janeiro a agosto/2024 dos cargos de assistente social, motorista, merendeira e auxiliar de limpeza; 6) Edital de convocação de processo seletivo de cuidador escolar (13 de março de 2024); 7) Edital de convocação de processo seletivo de motorista escolar (31 de janeiro de 2024);
Em sede contestatória, os investigados sustentam que de janeiro a agosto de 2024 foram incorporados ao quadro da Prefeitura Municipal de Iracema/CE 137 servidores, 106 contratados, 13 concursados e 18 nomeados para cargo em comissão, os quais atenderam necessidade de serviço. Ademais, em relação ao aumento da folha salarial, foram implementadas reajustes salariais regulamentados pelas Leis ns.1021, 1022 e 1024, todas de abril de 2024, bem como desempenho profissional concedidos a funcionários da saúde, Lei ns. 1005/2023, 1017/2024, 1018/2024 e 1020/2024, todas antes do período vedado.
Em consulta ao Portal da Transparência do município de Iracema/CE, constata-se que, em janeiro de 2024, haviam 332 concursados, 141 contratados e 36 cargos comissionados, já em agosto do mesmo exercício, 510 concursados, 307 contratados e 60 com cargos comissionados, ou seja, em 6 meses foram nomeados 178 concursados, 166 contratados e 24 cargos em comissão, totalizando um incremento de 368 servidores públicos no referido período.
De fato, no primeiro semestre de 2024, houve incremento de 72,29% no número de servidores da Prefeitura de Iracema/CE, momento em que passo a analisar a justificativas apresentadas pelos investigados.
Do percentual acima exposto, percebe-se que 48,36% foram de servidores concursados nomeados para exercício do cargo, ressaltando que o certame foi homologado antes do período vedado. Desta feita, a nomeação dos servidores concursados restou respaldada pela exceção prevista na alínea “c”, V, do art. 73 da Lei das Eleições, visto que o certame ocorreu no ano de 2018.
Vencida a questão da legalidade, cabe ao julgador a análise se as nomeações, tanto de concursados, como de contratados e cargos em comissão foram aptas a interferir na legitimidade e igualdade do pleito.
Destaco que as contratações, as nomeações de servidores e os reajustes salariais apresentados pelo autor foram realizadas antes do período vedado pela norma eleitoral, três meses antes do pleito, não restando comprovado o requisito temporal.
O autor não juntou aos autos qualquer ato normativo que comprove a contratação ou a nomeação de servidores após 4 de julho, com vistas a comprovar que os investigados recaíram no período proscrito pela norma.
A imputação de que o incremento de pessoal na máquina pública ocorreu com vistas a apoiar a candidatura dos investigados, descumprindo, inclusive, a Lei de Responsabilidade Fiscal, exige comprovação de elementos robustos, aptos a caracterizar o abuso de poder político e econômico, com desvio de finalidade.
Ademais, as testemunhas foram uníssonas em afirmar que as contratações ocorreram por necessidade de serviço, ou seja, pela inauguração de escolas em tempo integral, creche e casa da mulher, bem como pela contratação de serviço pesado para limpeza de estrada, em virtude da quadra chuvosa.
A testemunha Amanda Holanda Bessa Moura, Assistente Social do de Iracema/CE, afirmou que o Conselho Municipal da Criança e do Adolescente do referido município ganhou edital de programas financiados pelo Banco Santander; que necessitou da contratação de pessoal na área da assistência social; que foram nomeados, por concurso público vigente, assistentes sociais e psicólogas para reforçarem a equipe em face da necessidade, bem como contratados servidores de processo seletivo realizado em 2022/2023, inclusive de outros municípios, ressaltando que não ocorreram no período vedado pela norma eleitoral. Informou, ainda, que foi inaugurada a Casa da Mulher, momento em que foi necessário a contratação de pessoal para execução das atividades, não sabendo informar acerca dos servidores contratados para as escolas em tempo integral e creches. Em relação ao evento do dia das mães, informou que o evento não utilizou qualquer recurso público, mas doações de empresas e de pessoas que colaboraram com a festa; que os investigados não estavam presentes e não realizaram doações; que as doações eram, muitas vezes, recolhidas por servidores da secretaria de assistência social.
A testemunha Francisco Solon Magalhães, Secretário de Infra - Estrutura e Meio Ambiente de Iracema/CE, afirmou que exerce o cargo há 12 anos; que as contratações não foram por processo seletivo, mas por aditivo em contrato e diaristas, os quais exercem função de limpeza de estradas, esgoto e prédios públicos; que não tem interferência do prefeito nas contratações; que as contratações sempre ocorreram desta forma, conforme necessidade do serviço; que o aumento de 21 contratados na secretaria ocorreu em virtude do inverno prolongado no município; que tomou conhecimento do evento do dia das mães pelas redes sociais e nas ruas; que não sabe informar exatamente o que fora distribuído.
A testemunha Paulo Cesar Guerra de Carvalho, Presidente da Associação Cultural Filhos da Terra, afirmou que, desde 2016, a associação, em parceria com a Prefeitura, realiza o evento do dia das mães; que os investigados não estiveram presentes no evento e não realizaram doação; que o evento ocorre desde 2005; que as doações em dinheiro foram realizadas na conta da associação; que não houve vinculação política com os brindes distribuídos; que as doações dos brindes eram entregues no centro do idoso; que os investigados não tem influência sobre a associação; que existe um convênio entre a gestão e a associação para cooperação logística de atividades; que a divulgação do evento nas redes sociais não fazia menção aos investigados.
Ante os depoimentos colhidos, percebe-se que tanto as nomeações dos concursados, como as contratações de temporários e cargos em comissão ocorreram por necessidade de serviço, bem como por certames de anos anteriores, exceto as contratações diretas descritas pela testemunha Francisco Solon, as quais executavam serviços pesados por não exigirem qualificação técnica, como, por exemplo, a capinagem de estradas.
Desta sorte, entendo que o aumento no número de servidores no primeiro semestre de 2024 não afetou a igualdade dos candidatos na corrida eleitoral, visto que ocorreu por necessidade de serviço, por inauguração de escolas, creches e prédio de assistência a mulher.
Nesse sentido, os Regionais Eleitorais:
RECURSOS ELEITORAIS. ELEIÇÕES 2016. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL - AIJE. ABUSO DE PODER POLÍTICO (ARTIGO 22 DA LC Nº 64/1990). CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO (ARTIGO 41-A DA LEI Nº 9.504/1997). NOMEAÇÃO DE SERVIDORES CONCURSADOS EM TROCA DEVOTOS. NÃO COMPROVAÇÃO. FRÁGIL CONJUNTO PROBATÓRIO. NÃO PROVIMENTO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.1. Trata-se de recurso eleitoral (fl. 426/510) interposto em face da sentença proferida pelo Juízo da 71ª Zona que julgou improcedentes os pedidos de cassação dos registros ou diplomas, com decretação de inelegibilidade pelo prazo de oito anos, dos representados/recorridos, por supostas condutas previstas no art. 22 da LC 64/1990 (abuso de poder político) e no art. 41-A da Lei nº 9.504/1997 (captação ilícita de sufrágio), desacolhendo a tese de que os servidores aprovados em concurso público,homologado antes do período vedado, teriam sido nomeados mediante chantagem pela troca do voto.2. É fato incontroverso que o concurso público, do qual decorreram as nomeações de que se trata, foi realizado em 2012, pelo que induvidosa a legalidade das convocações de candidatos aprovados no certame, por se amoldar o ato à exceção plasmada na norma de regência (art. 73, V, c, da Lei nº 9.504/1997), segundo o qual, no período vedado, é permitida a nomeação dos aprovados em concursos públicos homologados até o início do período de vedação. Remanesce examinar se as referidas nomeações caracterizam abuso de poder político ou captação ilícita de sufrágio.3. A imputação de que algumas pessoas concursadas foram nomeadas, mediante chantagem, em troca dos seus votos, não restou comprovada, com efeito, as declarações de eleitores em Procedimento Preparatório Eleitoral (fl. 334/335 e 345/347), prestadas sem compromisso e contraditório, violando o devido processo legal, não é prova suficiente a formar convicção e ensejar a condenação dos representados, ora recorridos. O depoimento da única testemunha ouvida em Juízo (fl. 367) nada acrescentou ou esclareceuem relação a este fato, pelo que não há prova consistente a ensejar a convicção de que houve abuso de poder político ou captação ilícita de sufrágio.4. As imputações de que vários servidores nomeados foram lotados em repartições públicas desativadas, descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal pelo prefeito e nomeações sem prévia comprovação da vacância do cargo, além de não terem sido objeto de prova nos autos, refogem ao direito eleitoral, pois não foi estabelecido liame nesse sentido. Em verdade, essas irregularidades, se existentes, dizem com o direito administrativo e a prática de possíveis atos de improbidade, que só reflexamente pode repercutir na elegibilidade dos condenados.5. A condenação por captação ilícita de sufrágio e abuso de poder político exige a comprovação dos fatos por elementos robustos de convicção, circunstância não suficientemente demonstrada nos autos em face da fragilidade do conjunto probatório. Precedentes (V.g.: TSE, Recurso Especial Eleitoral nº 38578, Acórdão, Relator(a) Min. LUCIANA CHRISTINA GUIMARÃES LÓSSIO, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 19/08/2016, Página 124)6. Recurso conhecido e não provido. Sentença mantida.Recurso Eleitoral nº14689, Acórdão, Des. ALCIDES SALDANHA LIMA_1, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 13/10/2017.
EMENTA - RECURSO ELEITORAL - AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. AIJE. ABUSO DE PODER POLÍTICO, DE AUTORIDADE E ECONÔMICO. ART. 22 DA LEI COMPLEMENTAR Nº 64/90. 1) NOMEAÇÃO DE ADVERSÁRIO POLÍTICO DURANTE O PERÍODO DE PLEITO ELEITORAL, COMO SECRETÁRIO MUNICIPAL. ABERTURA DE CRÉDITO ADICIONAL EM FAVOR DA PASTA ASSUMIDA POR ELE (OPONENTE), NO PERÍODO ELEITORAL E NA DATA DA NOMEAÇÃO DO SECRETÁRIO. COOPTAÇÃO DE APOIO POLÍTICO. CONJUNTO PROBATÓRIO HÁBIL PARA SE RECONHECER A EXISTÊNCIA DO ABUSO DE PODER POLÍTICO E ECONÔMICO. ABUSO DO PODER POLÍTICO. 2) NOMEAÇÃO DE SERVIDORES EM CARGOS PÚBLICOS, POR CONCURSO ANTERIOR E EM CARGOS EM COMISSÃO. NÃO CARACTERIZAÇÃO DA CONDUTA VEDADA NO ARTIGO 73, V DA LEI 9.504/97. RESSALVAS PREVISTAS NAS ALÍNEAS "A" e "C" DO MESMO ARTIGO. 3) FORNECIMENTO DE CESTAS BÁSICAS DE ALIMENTOS. LEI MUNICIPAL PRÉVIA AUTORIZANDO A CONCESSÃO ÀS FAMILIAS CADASTRADAS. ESTADO DE EMERGÊNCIA. CONCESSÃO À PEQUENO NÚMERO À FAMÍLIAS NÃO CADASTRADAS.EXCEPCIONALIDADE PREVISTA NO § 10° DO ARTIGO 73 DA LEI 9504/97. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PRÁTICA DE CONDUTA VEDADA. PRIMEIRO RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E PROVIDO PARCIALMENTE NA PARTE CONHECIDA. PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO, DIANTE DA ECLOSÃO DO PLEITO ELEITORAL, NO QUE SE REFERE AO INDEFERIMENTO DO REGISTRO DA CANDIDATURA E DO RECONHECIMENTODA CASSAÇÃO DO REGISTRO.SEGUNDO RECURSO NÃO CONHECIDO. PERDA DO INTERESSE DO INTERESSE RECURSAL.RECURSO ELEITORAL nº21404, Acórdão, Des. Lourival Pedro Chemim, Publicação: DJ - Diário de justiça, 24/04/2017.
Superada a análise do número de servidores, passo a analisar o evento festivo do “Dia das Mães”, reconhecida conduta vedada pelo Tribunal Regional Eleitoral do Ceara na Representação Especial 060033-60.2024.6.06.0086.
Na referida decisão, a Corte Regional entendeu que a participação da gestão municipal, por meio da Secretaria de Assistência Social, no evento, distribuindo os brindes doados por empresas e pela população, caracterizou conduta vedada, ainda que não tenha sido custeada por recursos públicos. Restou consignado, ainda, o benefício aos investigados Celso Gomes e Evaristo Magalhães, os quais, conquanto não tenham comparecido ao evento, foram diretamente beneficiados, visto que a distribuição ocorrera por servidores da referida secretaria do município.
Com isso, não cabe a este julgador analisar o critério objetivo da norma, visto que já fora constatado em segundo grau, reformando a sentença a quo, momento em que deve sopesar se a gravidade da conduta vedada foi capaz de configurar abuso de poder pelos investigados.
Com efeito, percebe-se que o evento contou com a participação massiva da população, momento em que foram distribuídos diversos brindes, inclusive de alto custo, como geladeira e televisão, no entanto não consta nos autos qualquer comprovação de vinculação eleitoral, efeito político ou menção a pré-candidatura dos investigados, como número, slogan ou nome, fatos que justificariam a finalidade eleitoral.
Conforme documentos da peça contestatória, bem como depoimento das testemunhas, o evento tornou-se tradicional no município, visto que ocorre desde 2005, inclusive com a presença de antigos gestores na entrega das benesses, fato não ocorrido no presente caso. Ademais, as testemunhas confirmaram que todos os brindes distribuídos foram doados por apoiadores do evento, empresários e sociedade civil, bem como que sua finalidade sempre foi de agradecimento as mães munícipes.
Nesse cenário, não vislumbro potencialidade lesiva capaz de afetar a isonomia do pleito, justificado pela não demonstração do caráter eleitoreiro do evento, bem como pela ausência dos investigados na festa.
Ademais, as testemunhas ouvidas afirmaram que não havia qualquer vinculação eleitoral na coleta ou entrega dos brindes, ou seja, sem qualquer contraprestação direta do voto, nem menção a qualquer candidato.
Outro não poderia ser o entendimento dos Regionais:
AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL - AIJE. ABUSO DO PODER POLÍTICO E CONDUTA VEDADA. COMPETÊNCIA RECURSAL. Sentença de improcedência. Preliminar de nulidade da sentença por julgamento citra petita afastada. Mérito. Distribuição de mochilas, kits escolares e uniformes pela Prefeitura. Programa social autorizado em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior. Descaracterizada a conduta vedada pelo artigo 73, § 10, da Lei das Eleições. Excessiva contratação de pessoal temporário. As contratações ocorreram antes dos três meses que antecederam o pleito. Decretação de alerta epidemiológico de dengue e defasagem de pessoal. Não configurada a conduta vedada pelo artigo 73, inciso V, da Lei das Eleições. Distribuição de brindes em comemoração do Dia dos Pais nas dependências da Secretaria de Esportes. Patrocínio da iniciativa privada. Não ocorrência da conduta vedada pelo artigo 73, inciso IV, da Lei das Eleições. Sentença mantida. Matéria preliminar rejeitada. Recurso desprovido.
RECURSO ELEITORAL nº060050516, Acórdão, Des. Regis De Castilho, Publicação: DJE - DJE, 06/12/2024.
DIREITO ELEITORAL. RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE). ABUSO DE PODER ECONÔMICO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. GRAVIDADE DAS CONDUTAS NÃO COMPROVADA. IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS DE CASSAÇÃO E INELEGIBILIDADE. MANUTENÇÃO DA MULTA POR PROPAGANDA ANTECIPADA. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAMERecurso Eleitoral interposto pela Coligação Renovar para Crescer (Republicanos/PP) contra sentença que, em Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), rejeitou as alegações de abuso de poder econômico e captação ilícita de sufrágio, mas condenou Orácio Paulo de Oliveira, Rosaria de Fátima Ivantes e Evaldo Carlos de Souza ao pagamento de multa de R$ 5.000,00 por propaganda eleitoral antecipada, em evento ocorrido no dia 23 de julho de 2024. A Coligação recorrente busca a reforma da decisão para obter a cassação dos registros de candidatura ou diplomas e a inelegibilidade dos representados, sob a alegação de abuso de poder econômico e captação ilícita de sufrágio, com base no art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 e no art. 41-A da Lei nº 9.504/1997. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃOHá três questões em discussão: (i) determinar se as condutas descritas configuram abuso de poder econômico; (ii) estabelecer se houve captação ilícita de sufrágio; e (iii) analisar se a condenação por propaganda eleitoral antecipada deve ser mantida. III. RAZÕES DE DECIDIRAbuso de poder econômico: A configuração do abuso de poder econômico exige a demonstração de gravidade suficiente para comprometer a normalidade e a legitimidade das eleições, conforme disposto no art. 22, inciso XVI, da Lei Complementar nº 64/1990, com as alterações da LC nº 135/2010. No presente caso, o evento relatado, ainda que tenha conotação eleitoreira, foi realizado em ambiente fechado, com número limitado de participantes, sem comprovação de utilização excessiva ou desproporcional de recursos financeiros. Não há elementos que demonstrem que o evento tenha gerado desequilíbrio na disputa eleitoral. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) estabelece que, para configurar abuso de poder, é necessária a presença de atos com gravidade suficiente para alterar a igualdade entre os concorrentes, o que não se verifica nos autos.Captação ilícita de sufrágio: Para a caracterização da captação ilícita de sufrágio, prevista no art. 41-A da Lei nº 9.504/1997, é necessário que o candidato tenha oferecido, prometido ou entregado vantagem pessoal a eleitores em troca de votos, além da demonstração de dolo específico. Embora tenha ocorrido a distribuição de brindes (camisetas e panos de prato) e a oferta de refeição durante o evento, não há provas nos autos de que tais atos foram realizados com o objetivo explícito de captar votos ou que houve condicionamento de votos em troca dessas benesses. A jurisprudência exige que o ato ilícito esteja vinculado à promessa ou oferta de vantagem pessoal em troca do voto, o que não ficou demonstrado no presente caso.Propaganda eleitoral antecipada: A sentença de primeiro grau corretamente capitulou os fatos como propaganda eleitoral antecipada, nos termos do art. 39, caput e § 6º, da Lei nº 9.504/1997, c/c art. 3º-A da Resolução TSE nº 23.610/2024. O evento realizado no dia 23 de julho de 2024, antes do início autorizado para a propaganda eleitoral (16 de agosto de 2024), envolveu a distribuição de materiais promocionais, incluindo camisetas e panos de prato com referências aos candidatos, bem como a exibição de banners com suas imagens e slogans. Tais atos, embora sem pedido explícito de votos, configuram propaganda antecipada, pois influenciam a paridade de armas entre os concorrentes, conforme entendimento consolidado na jurisprudência do TSE. Assim, a multa de R$ 5.000,00 aplicada pela prática de propaganda extemporânea deve ser mantida. IV. DISPOSITIVO E TESERecurso desprovido.
Tese de julgamento:A configuração de abuso de poder econômico requer a comprovação de condutas com gravidade suficiente para comprometer a normalidade e a legitimidade das eleições, o que não se verifica no caso concreto.A captação ilícita de sufrágio exige prova do dolo específico de oferecer ou prometer vantagem pessoal ao eleitor em troca de votos, o que não ficou demonstrado no presente caso.A propaganda eleitoral antecipada caracteriza-se pela realização de atos que antecipem a campanha eleitoral e comprometam a igualdade de oportunidades entre os candidatos, mesmo sem pedido expresso de votos.
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 14, § 9º; Lei Complementar nº 64/1990, art. 22; Lei nº 9.504/1997, arts. 39, caput e § 6º, e 41-A; Resolução TSE nº 23.610/2024, art. 3º-A.
Jurisprudência relevante citada: TSE, RO nº 2240-11, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJE de 18.12.2017; TSE, REspe nº 822-03/PR, Rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJe 04.02.2015.
RECURSO ELEITORAL nº060038782, Acórdão, Des. SANDRA REGINA DA SILVA RIBEIRO ARTIOLI, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eleitoral, 25/10/2024.
A divulgação do evento nas redes sociais do investigado Celso Gomes por si só não tem o condão de comprovar abuso de poder, visto que não foram colacionados documentos quem comprovem a repercussão das referidas postagens, a qual não pode ser presumida.
Ante a prova documental acostada, portanto, não se vislumbra substrato probatório suficientemente robusto que indique abuso de poder por parte dos investigados, mas, apenas, conduta vedada em relação ao evento do “Dia das Mães”, o qual já fora sancionado pelo segundo grau.
Desse modo, considerando que o conjunto probatório colacionado é frágil para configuração de abuso de poder econômico ou político, o indeferimento do pedido é medida que se impõe.
3. DISPOSITIVO
Isso posto, JULGO IMPROCEDENTE a pretensão deduzida na inicial, por não reconhecer abuso de poder econômico ou políticos pelos investigados, extinguindo o feito com resolução de mérito na forma do art. 487, I, do CPC.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Após o transitado em julgado, arquivem-se.
Alto Santo/CE, data da assinatura digital.
ISAAC DANTAS BEZERRA BRAGA
Juiz Eleitoral da 86ª Zona/CE
(documento assinado digitalmente na forma da Lei nº 11.419/06)