PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO AMAZONAS
036ª ZONA ELEITORAL DE TABATINGA AM
PROCESSO Nº: 0600246-76.2024.6.04.0036
CLASSE: REGISTRO DE CANDIDATURA (11532)
ASSUNTO: [Impugnação ao Registro de Candidatura, Registro de Candidatura - RRC - Candidato, Cargo - Vice-Prefeito, Eleições - Eleição Majoritária]
REQUERENTE: MARLEM RIGLISON SILVA FERREIRA
REQUERENTE: COLIGAÇÃO A ORDEM É AVANÇAR [REPUBLICANOS/PSD/MDB/PP/MOBILIZA] - TABATINGA - AM
REQUERENTE: COMISSAO PROVISORIA MUNICIPAL PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO
REQUERENTE: PARTIDO DA MOBILIZACAO NACIONAL - PMN
REQUERENTE: COMISSAO PROVISORIA MUNICIPAL PARTIDO PROGRESSISTA
REQUERENTE: P S D
REQUERENTE: PARTIDO REPUBLICANO BRASILEIRO-PRB
IMPUGNANTE: 22 - PARTIDO LIBERAL - TABATINGA - AM - MUNICIPAL
ADVOGADO: CAROLINA AUGUSTA MARTINS - OAB/AM9989
ADVOGADO: HUGO FERNANDES LEVY NETO - OAB/AM4366
ADVOGADO: ROBERT MERRILL YORK JR - OAB/AM4416
ADVOGADO: VICTOR HUGO TRINDADE SIMOES - OAB/AM9286
IMPUGNANTE: COLIGAÇÃO TABATINGA, A MUDANÇA CHEGOU
ADVOGADO: BRUNO DA CUNHA MOREIRA - OAB/AM17721
ADVOGADO: LUCAS ALBERTO DE ALENCAR BRANDAO - OAB/AM12555
ADVOGADO: ALCEMIR PESSOA FIGLIUOLO NETO - OAB/AM13248
ADVOGADO: AYRTON DE SENA GENTIL NETO - OAB/AM12521
ADVOGADO: LUCIANO ARAUJO TAVARES - OAB/AM12512
IMPUGNANTE: PROMOTOR ELEITORAL DO ESTADO DO AMAZONAS
IMPUGNADO: MARLEM RIGLISON SILVA FERREIRA
ADVOGADO: TERESA CRISTINA CORREA DE PAULA NUNES - OAB/AM4976-A
ADVOGADO: ALEXANDRE PENA DE CARVALHO - OAB/AM4208-A
ADVOGADO: SIMONE ROSADO MAIA MENDES - OAB/PI4550
ADVOGADO: ANA CLARA MOREIRA GUILHERME - OAB/AM15914
ADVOGADO: CLOTILDE MIRANDA MONTEIRO DE CASTRO - OAB/AM8888-A
ADVOGADO: CARLOS EDGAR TAVARES DE OLIVEIRA - OAB/AM5910-A
ADVOGADO: BRENDA DE JESUS MONTENEGRO - OAB/AM12868
ADVOGADO: MATEUS DUARTE SILVA COSTA - OAB/AM16690
ADVOGADO: YURI DANTAS BARROSO - OAB/AM4237-A
ADVOGADO: AMANDA DOS SANTOS NEVES GORTARI - OAB/AM17302
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SENTENÇA
Vistos, etc.
Trata-se de pedido de Registro de Candidatura para o Cargo de Vice-Prefeito formulado por MARLEM RIGLISON SILVA FERREIRA, visando a participação nas Eleições de 2024, conforme previsto no Código Eleitoral e Resolução TSE n. 23.609/2019, no Município de TABATINGA/AM.
Publicado o edital, houve qualquer impugnação pelos legitimados: Ministério Público Eleitoral, Id. 122415034, Partido Liberal, Id. 122418698, Coligação Tabatinga, a mudança chegou, Id. 122421489.
O impugnado foi citado, Id. 122425976, para querendo, CONTESTAR, no prazo de 7 (sete) dias, a (s) impugnações apresentada (s) ao pedido de registro de sua candidatura, ao cargo de vice-prefeito, nos termos do art. 4º da Lei Complementar nº 64/90, c/c o art. 41 da Resolução TSE nº 23.609/2019.
Contestações apresentadas, Ids. 122475761 a 122475900, Ids. 122475903 a 122475909, Ids. 122476088 a 122476095.
Despachado nos autos Id. 122479864.
Manifestação do MPE, Id. 122490798.
Decisão Interlocutória de mérito, Id. 122504514, determinando a juntada da certidão de trânsito em julgado do acórdão dos autos do processo de Tomada de Contas Especial (TC 012.107/2018-2) julgado pelo Tribunal de Contas da União e a pauta de audiência de instrução.
Petição da coligação TABATINGA, A MUDANÇA CHEGOU, Id. 122517686, requerendo a realização de teste de DNA para verificar a paternidade do impugnado.
Petição de defesa do impugnado, Id. 519374, requerendo: 1. O chamamento do feito à ordem, com a anulação da decisão que ordenou a intimação das partes para requerer novas provas não pleiteadas na exordial e na defesa, bem como todos os atos que dela decorrerem; 2. A extração dos autos, do documento juntado pelo Ministério Público Eleitoral em sua manifestação posterior à petição inicial. 3. O indeferimento do pedido de produção probatória da Coligação Tabatinga, a Mudança Chegou, posto que, além de preclusa a oportunidade, trata-se de pedido incabível para o rito da AIRC, mormente o suposto pai, não faça parte da relação processual e não seja obrigado a comparecer.
Manifestação do MPE, ID. 122524013, requerendo a juntada aos autos o documento já requerido (certidão de trânsito em julgado do acórdão dos autos do processo de Tomada de Contas Especial (TC 012.107/2018-2) julgado pelo Tribunal de Contas da União), conforme determinado pelo Douto Magistrado em decisão (ID 122504514), bem como aguarda a realização da audiência instrutória aprazada para o dia 10/9/2024 às 9h30min.
Certidão, ID. 122541947 a 122541948, juntada do documento requerido pelo MPE.
Audiência realizada em 10 de setembro de 2024, Id. 122574977, Ids. 122575668 a 122575675.
Juntada, Id. 122575677, de decisão prolatada no Mandado de Segurança nº 0600236-43.2024.6.04.0000.
Manifestação do ministério Público Eleitoral, ID. 122565776, no mérito, com amparo no art. 1º, I, alínea g, da Lei Complementar nº 64/9, FAVORÁVEL à decretação da inelegibilidade do candidato MARLEM RIGLISON SILVA FERREIRA e o indeferimento do registro de candidatura deste, com esteio nas Contas julgadas irregulares pelo TCU (Processo TCU TC 012.107/2018-2), com imputação de débitos - Acórdão 13.420/2020 – TCU – 1ª Câmara. Trânsito em julgado em 4/9/2021. E, na oportunidade, manifesta-se pela improcedência das impugnações calcadas na inelegibilidade reflexa, nos termos da fundamentação alhures exposta.
Petição da defesa do impugnado, ID. 122700100, requerendo: 1. O acatamento da preliminar de ilegitimidade ativa do Partido Liberal, por não poder agir sozinho já estando coligado, extinguindo a sua respectiva impugnação sem resolução do mérito; 2. No mérito, sejam julgadas improcedentes as impugnações ao registro de candidatura e, consequentemente, deferido o registro do candidato impugnado.
Informação do cartório eleitoral, Id. 122759616, informando a situação dos requisitos e as condições de elegibilidade do impugnado.
É o relatório. Decido.
I. PRELIMINARES E PREJUDICIAIS DE MÉRITO
A Defesa do candidato Marlem Ferreira suscita a preliminar de ilegitimidade do Partido Liberal para apresentar impugnação de forma isolada (evento 122418695), uma vez que integra coligação já registrada junto à Justiça Eleitoral (evento 122475903).
De fato, de acordo com o disposto no artigo 6º, §1º, da Lei nº 9.504/1997, a coligação funcionará como um só partido no relacionamento com a Justiça Eleitoral. Ademais, consoante o disposto no §4º do mesmo dispositivo legal, o partido político coligado somente possui legitimidade para atuar de forma isolada no processo eleitoral quando questionar a validade da própria coligação.
Importante ressaltar que os fundamentos da sua impugnação foram integralmente apresentados pela Coligação “Tabatinga, a Mudança Chegou”, de sorte que serão necessariamente apreciadas por este juízo.
Sobre a referida preliminar, assim decidem os tribunais pátrios:
DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2024. RECURSO ELEITORAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. ILEGITIMIDADE ATIVA DE PARTIDO COLIGADO PARA IMPUGNAR CANDIDATURA MAJORITÁRIA DE FORMA ISOLADA. NEGO PROVIMENTO AO RECURSO [...] III. RAZÕES DE DECIDIRO artigo 4º, §4º e §5º, da Resolução TSE nº 23.609/2019 e o artigo 6º, §4º, da Lei nº 9.504/1997 dispõem que o partido coligado não tem legitimidade para atuar isoladamente no processo eleitoral majoritário, salvo se questionar a validade da própria coligação. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral é pacífica ao afirmar que o partido coligado não possui legitimidade para, isoladamente, impugnar o registro de candidatura em eleições majoritárias, conforme precedentes do TSE.O Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo já se manifestou em decisões anteriores no mesmo sentido, aplicando o entendimento de que a ilegitimidade ativa do partido coligado para atuar de forma isolada é motivo para extinção do processo sem resolução do mérito [...] Tese de julgamento: O partido coligado em eleição majoritária não possui legitimidade ativa para, isoladamente, propor impugnação de registros de candidatura, salvo nos casos de questionamento da validade da coligação. A ilegitimidade ativa do partido coligado constitui fundamento para a extinção do processo sem julgamento do mérito. Dispositivos relevantes citados: Resolução TSE nº 23.609/2019, art. 4º, §§ 4º e 5º; Lei nº 9.504/1997, art. 6º, § 4º; CPC, art. 485, VI.Jurisprudência relevante citada: TSE, RE nº 060026170, Rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 16.09.2021; TSE, RE nº 060001430, Rel. Min. Sérgio Silveira Banhos, j. 07.06.2021;TRE-ES, RE nº 06001117120206080043, Rel. Juíza Heloísa Cariello, j. 17.12.2021. [TRE/ES. RECURSO ELEITORAL nº060012236, Acórdão, Des. Alceu Mauricio Junior, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 09/09/2024.].
ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE REGISTRO DE CANDIDATURA. PREFEITO. CAUSA DE INELEGIBILIDADE DO ART. 14, §7º, DA CF/88. CANDIDATO EM UNIÃO ESTÁVEL COM FILHA DO ENTÃO CHEFE DO EXECUTIVO LOCAL NO EXERCÍCIO DE SEGUNDO MANDATO. QUESTÃO PRELIMINAR: IMPUGNAÇÕES AO RRC PROPOSTAS POR COLIGAÇÃO E POR PARTIDO POLÍTICO ISOLADO. PARTIDO POLÍTICO INTEGRANTE DA COLIGAÇÃO IMPUGNANTE. APLICAÇÃO DA REGRA PREVISTA NO ART. ART. 6º, § 4º, LEI Nº 9.504/1997. ILEGITIMIDADE "AD CAUSAM" DA AGREMIAÇÃO PARTIDÁRIA. ILEGITIMIDADE NÃO ARGUIDA EM PRIMEIRO GRAU DE JURISDIÇÃO. APROVEITAMENTO DOS ATOS PROCESSUAIS E PROVAS COLACIONADAS AOS AUTOS. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA COMUNHÃO DAS PROVAS. RECURSO ELEITORAL DO PARTIDO POLÍTICO ISOLADO NÃO CONHECIDO. CONHECIMENTO DO APELO QUANTO À COLIGAÇÃO LEGITIMADA. 1. Uma vez que a legislação eleitoral e o entendimento pacífico da jurisprudência dão conta que o partido político não tem legitimidade para atuar isoladamente no pleito eletivo para o qual tenha firmado coligação na respectiva circunscrição, sendo esta a condição jurídica do Recorrente PARTIDO LIBERAL (PL), resta inadmissível o conhecimento do seu apelo perante este Tribunal (art. 6º, § 4º, Lei nº 9.504/1997) [...] 12. Desprovimento do recurso eleitoral conhecido. [TRE/MA. RECURSO ELEITORAL EM ACAO DE IMPUGNACAO DE MANDATO ELETIVO nº060019710, Acórdão, Des. Anna Graziella Santana Neiva Costa, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 18/08/2022.].
Pelo exposto, entendo por acolher a preliminar de ilegitimidade ativa do Partido Liberal para propor impugnação de candidato em eleição majoritária, uma vez que integrante de coligação já registrada na Justiça Eleitoral, de modo que extingo o feito sem resolução do mérito em relação ao referido impugnante, com fulcro nos artigos 6º, §§1º e 4º, da Lei 9.504/1997, artigo 4º, §4º, da Resolução/TSE nº 23.609/2019, c/c o artigo 485, VI, do Código de Processo Civil.
II. MÉRITO
II.I. DA SUPOSTA INELEGIBILIDADE REFLEXA
Consoante os fundamentos da impugnação veiculada pela coligação “Tabatinga, a mudança chegou” (evento 122475761), o candidato Marlem Riglison Silva Ferreira seria filho do atual prefeito de Tabatinga, o senhor Saul Nunes Bemerguy, e, por essa razão, estaria inapto a se candidatar ao cargo de vice-prefeito nas eleições de 2024 em razão do disposto no artigo 14, §7º, da Constituição Republicana de 1988, visto que o atual Chefe do Executivo estaria em seu segundo mandato.
Ocorre que a parte impugnante trouxe como única prova das alegações uma reportagem veiculada pelo portal “CM7 Brasil” que, sem qualquer lastro probatório, afirma que o candidato seria filho do atual prefeito. Ademais, embora tenha tido a oportunidade por mais de uma vez para arrolar testemunhas, deixou de trazê-las na audiência realizada no dia 10 de setembro de 2024.
Enfatize-se que este juízo indeferiu o pedido para obrigar o candidato a realizar exame de DNA por total descabimento e violação a garantias constitucionais, mormente por se tratar o estado de filiação de um direito personalíssimo, consoante os fundamentos expostos na referida audiência (eventos 122575668 e seguintes).
Desse modo, a parte impugnante não cumpriu com o seu ônus de provar o alegado, em atenção ao disposto no artigo 373, I, do Código de Processo Civil.
Ao revés, o candidato Marlem Ferreira, além de colacionar aos autos fotografias ao longo de sua vida na companhia de seu genitor, o qual claramente não seria o senhor Saul Bemerguy (eventos 122475871 e seguintes), junta o seu registro civil de nascimento (evento 122475871), documento público e de presumida veracidade, o que não fora contraditado pelo impugnante.
Sobre esse ponto, acerca da necessidade de se comprovar a relação de parentesco prevista no artigo 14, §7º, da Carta Política de 1988, assim entendem as cortes eleitorais do país:
RECURSO ELEITORAL. REQUERIMENTO DE REGISTRO DE CANDIDATURA. ELEIÇÕES 2020. PREFEITO. IMPUGNAÇÃO DE REGISTRO. INELEGIBILIDADE REFLEXA. VÍNCULO PARENTAL COM O ATUAL PREFEITO MUNICIPAL. IRMÃO DE CRIAÇÃO. RELAÇÃO SÓCIO-AFETIVA DE 2ºGRAU.ART. 14, §7º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ACERVO PROBATÓRIO. PROVAS DOCUMENTAIS. FOTOGRAFIAS, CÓPIAS DE RG, CERTIDÃO DE CASAMENTO, CERTIDÃO DE BATISMO. COMPROVAÇÃO DA FILIAÇÃO BIOLÓGICA E CONSTÂNCIA NA CRIAÇÃO, AINDA QUE TENHA RECEBIDO AUXÍLIOEDUCACIONAL.PERFEITAMENTE CABÍVEL DENTRO DO SEIO FAMILIAR. ALEGAÇÃO DE TER O CANDIDATO SIDO CRIADO PELA AVÓ. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PERDA DO VÍNCULO COM OS PAIS BIOLÓGICOS. DEPOIMENTO DE TESTEMUNHAS. COMPROVAÇÃO DO VÍNCULO TIO-SOBRINHO COM O ATUAL PREFEITO.AUSÊNCIA DE PROVAS INCONTESTES ACERCA DO GRAU DE PARENTESCO DE 2º GRAU, CAPAZ DE ATRAIR A INELEGIBILIDADE REFLEXA REGRADA NO ART. 14, §7º, DA CF. RECURSO CONHECIDO E, NO MÉRITO, DESPROVIDO.1- A inelegibilidade reflexa, nos termos do que prevê o §7º do art. 14, da Constituição Federal, visa a impedir que o cônjuge e os parentes consangüíneos ou afins, até o segundo grau, de detentor de mandato no Poder Executivo, fiquem impossibilitados de candidatar-se no território de jurisdição do titular, impedindo, assim, a continuidade no poder de um mesmo grupo familiar.2- Na esteira do entendimento sedimentado no Tribunal Superior Eleitoral, tal normativo é estendido também ao parentesco sócio-afetivo, para fins de caracterização da inelegibilidade reflexa. 3- À míngua de provas capazes de constatar o vínculo de irmãos resultante de relação sócio-afetiva, não cabe aplicação da inelegibilidade reflexa do art. 14, §7º, da CF.4. Recurso conhecido e, no mérito, desprovido. [TRE/MA. ACAO DE IMPUGNACAO DE REGISTRO DE CANDIDATO nº060011084, Acórdão, Des. José Gonçalo De Sousa Filho, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 01/12/2020.].
ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE REGISTRO DE CANDIDATURA. PREFEITO. CAUSA DE INELEGIBILIDADE DO ART. 14, §7º, DA CF/88. CANDIDATO EM UNIÃO ESTÁVEL COM FILHA DO ENTÃO CHEFE DO EXECUTIVO LOCAL NO EXERCÍCIO DE SEGUNDO MANDATO [...] 6. Impende registrar que a união estável é causa de inelegibilidade do art. 14, § 7º da CF/88, consoante jurisprudência pacífica do TSE, segundo a qual "(...) A união estável atrai a incidência da inelegibilidade prevista no art. 14, § 7º, da CF/1988." (Recurso Especial Eleitoral nº 20143, Acórdão, Relator(a) Min. Rosa Weber, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 10/11/2016) [...] 8. Isto compendiado, para efeito de um eventual provimento do pedido do Impugnante, ora Recorrente, as provas necessitam indicar, com segurança e robustez, que, entre o período do segundo mandato do ex-gestor municipal (Sr. IOMAR SALVADOR MELO MARTINS), portanto, entre os anos de 2017 e 2020, o Recorrido LUÍS FERNANDO ABREU CUTRIM e a Sra. PETRA SAMANTHA MARTINS CUTRIM, filha do primeiro, mantiveram um relacionamento caracterizado como união estável. 9. O conjunto probatório, apesar de ter sido amplo no sentido da quantidade de elementos produzidos, não se mostrou seguro quanto à existência do fato constitutivo do direito do autor da demanda. 10. Por tudo que produzido, após o divórcio do casal, ocorrido no mês de janeiro do ano de 2016, não restou comprovada a continuidade da relação, especialmente a descrita como elemento de causa de inelegibilidade decorrente de parentesco (art. 14, § 7º, da CF/1988). 11. Assim, não configurada a união estável suscitada, infere-se que o Recorrido não incide na inelegibilidade reflexa prevista no art. 14, §7º, da CF/88. 12. Desprovimento do recurso eleitoral conhecido. [TRE/MA. RECURSO ELEITORAL EM ACAO DE IMPUGNACAO DE MANDATO ELETIVO nº060019710, Acórdão, Des. Anna Graziella Santana Neiva Costa, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 18/08/2022.].
Por fim, quanto ao caráter objetivo das provas referentes à inelegibilidade reflexa, a qual se comprovaria meramente com documentos, assim caminha a jurisprudência eleitoral:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO CONTRA EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA. INELEGIBILIDADE REFLEXA. PARENTESCO COM EX-PREFEITO. DESNECESSIDADE DE PROVA TESTEMUNHAL. NÃO OCORRÊNCIA DE CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. 1. A produção de prova testemunhal somente é possível nas lides em que se examina questões subjetivas. 2. A inelegibilidade reflexa (parentesco com Chefe do Poder Executivo) é questão objetiva, cuja prova é toda documental, dispensando, assim, a oitiva de testemunhas. 3. Para a configuração da inelegibilidade reflexa não é necessário que o Chefe do Poder Executivo tenha utilizado de seu cargo em favor de candidato parente seu. Daí porque dispensada é a oitiva de testemunha. 4. Não há cerceamento do direito de defesa quando a prova indeferida em nada será útil para o deslinde da causa. 5. Agravo Regimental desprovido. (TRE-GO - AGREG: 5 GO, Relator: ILMA VITORIO ROCHA, Data de Julgamento: 04/03/2009, Data de Publicação: DJ - Diário de justiça, Volume 019, Tomo 01, Data 13/03/2009, Página 01)
Ante o exposto, não havendo provas da relação de parentesco entre o senhor Marlem Riglison Ferreira e Saul Nunes Bemerguy e, portanto, da inelegibilidade prevista no artigo 14, §7º, da Magna Carta, entendo que o pleito não merece prosperar.
II.II. DA SUPOSTA INELEGIBILIDADE EM RAZÃO DA REJEIÇÃO DE CONTAS
De acordo com o disposto no artigo 1º, I, g, da Lei Complementar nº 64/1990, são inelegíveis para qualquer cargo:
Os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição [STF – RE nº 848.826/DF – Pleno – j. 10/8/2016].
Assim, embora nem todos os julgamentos de contas irregulares possam ser considerados insanáveis, consoante exige o dispositivo legal supracitado, destaco que no Acórdão nº 13420/2020, emanado pela Primeira Câmara do Tribunal de Contas da União, nos autos da Tomada de Contas Especial nº 012.107/2018-2, com trânsito em julgado em 04/9/2021, concluiu-se pela exclusiva responsabilidade do senhor Marlem Riglison pela omissão de não prestação de contas, afastando, inclusive, a responsabilidade do então Prefeito de Tabatinga, senhor Saul Bemerguy, senão vejamos os fundamentos do referido Decisum:
15. Transcorrido o prazo regimental fixado e mantendo-se inertes os aludidos responsáveis, impõe-se que sejam considerados revéis, dando-se prosseguimento ao processo, de acordo com o art. 12, § 3º, da Lei 8.443/1992.
16. O ex-prefeito e o ex-secretário municipal de saúde foram ouvidos em decorrência da seguinte irregularidade (ofícios de citação às peças 28 e 36):
Irregularidade: Não comprovação da boa e regular aplicação dos recursos repassados pelo Fundo Nacional de Saúde, na modalidade fundo a fundo, ao Município de Tabatinga/AM, nos exercícios de 2011 e 2012 em face da não apresentação de comprovação das despesas realizadas com recursos destinados ao Bloco de Atenção Básica - Incentivo aos Povos Indígenas;
Valor histórico: R$ 2.329.927,27;
Conduta: Deixar de comprovar a boa e regular aplicação dos recursos repassados pelo Fundo Nacional de Saúde ao município de Tabatinga/AM, destinados ao Bloco de Atenção Básica - Incentivo aos Povos Indígenas quando deveria ter apresentado a documentação comprobatória das despesas realizadas;
Dispositivos violados: Parágrafo único, do artigo 70 da Constituição Federal de 1988; Artigo 66 do Decreto n° 93.872/1986; Artigo 26 da Lei n° 10.180/2001 e Artigos 62 e 63 da Lei n° 4.320/1964.
17. Ressalte-se que a irregularidade tratada nesta TCE se refere à falta de documentação comprobatória das despesas, conforme descrito nas Constatações nº 479873 e nº 479877 do Relatório Complementar de Auditoria nº 12996 do Denasus (peça 14, p. 8-10 e p. 11-12).
18. Na seara do Direito Financeiro, é cediço que cabe aos gestores demonstrar, por meio da documentação exigida na legislação de regência, a boa e regular aplicação dos recursos públicos federais geridos, em obediência ao disposto nos arts. 70, parágrafo único, da Constituição Federal, 93 do Decreto-Lei nº 200/1967 e 66 e 145 do Decreto nº 93.872/1986.
19. A regularidade do pagamento com recursos públicos somente é assegurada com a observância dos procedimentos prévios de liquidação e empenho da despesa fixados nos arts. 60 a 64 da Lei 4.320/1964 e demais normas regentes.
20. Ante esse arcabouço normativo, os gestores dos recursos arguidos deveriam comprovar que os pagamentos foram precedidos do devido atesto, liquidação e empenho, em respeito à legislação pátria, com respaldo em documentos hábeis a comprovar a despesa (notas fiscais, planilhas, relação de pagamentos efetuados etc.).
21. Contudo, desde já convém registrar que se discorda das responsabilizações efetuadas pelo Denasus, pelo Tomador de Contas Especial e pela Secex-TCE, em instrução preliminar, que alcançaram o ex-prefeito de Tabatinga/AM, Sr. Saul Nunes Bemerguy. De forma diversa, posiciona-se pelo afastamento da responsabilidade do ex-prefeito e pela imputação exclusiva da responsabilidade pelo dano ao erário ao secretário municipal de saúde à época, Sr. Marlem Riglison Silva Ferreira (gestão 2/1/2009 a 4/4/2012).
22. Essa proposta decorre do art. 9º, caput e inciso III, da Lei 8.080/1990, o qual dispõe que é da competência dos secretários municipais de saúde a gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) na esfera municipal.
23. Os prefeitos, todavia, podem vir a responder por irregularidades na aplicação de recursos do Sistema Único de Saúde (SUS) caso delas participem ativamente. No caso em tela, contudo, cumpre destacar que não foram identificados nos autos indícios de que o ex-prefeito tenha concorrido para o acometimento das irregularidades apontadas, inexistindo informações nos relatórios de auditoria (peças 12-15), no relatório do tomador de contas especial (peça 18) e em instrução preliminar da Secex-TCE (peça 23) de que ele tenha participado direta ou indiretamente da gestão dos recursos arguidos.
24. Dessa forma, e considerando-se ainda que as normas em referência conferem embasamento à responsabilização do ex-secretário municipal de saúde por irregularidades na aplicação de recursos do SUS transferidos ao município, entende-se que o Sr. Saul Nunes Bemerguy deve ser afastado da relação processual.
25. Por outro lado, a responsabilização do ex-secretário municipal de saúde, como gestor do Fundo Municipal de Saúde, é compatível com o entendimento firmado pelo TCU no item 9.3.3 do Acórdão 1072/2017-TCU-Plenário, de relatoria do Ministro Bruno Dantas, segundo o qual o dano ao erário deve ser restituído ao FNS pelos gestores:
9.3.3. tratando-se de débito decorrente de dano ao erário propriamente dito, cabe ao gestor responsável pela irregularidade a obrigação de devolver os recursos, visto que, nessas situações, não há evidências de que eles tenham sido aplicados em prol de alguma finalidade pública, devendo a recomposição ser feita ao Fundo Nacional de Saúde, em respeito ao disposto no art. 2º, inciso VII, do Decreto 3.964/2001 combinado com o art. 33, § 4º, da Lei 8.080/1990.
Portanto, verifica-se que a condenação não se baseou em meras irregularidades formais na prestação de contas, mas na efetiva e deliberada não comprovação da utilização dos valores decorrentes do Fundo Nacional de Saúde. Destaque-se que o senhor Marlem Ferreira, apesar de notificado naquele procedimento, não se manifestou nos autos, sendo declarado revel. Por essa razão, fora condenado nos seguintes termos:
c) com fundamento nos arts. 1º, inciso I, 16, inciso III, alíneas 'b' e 'c', e § 2º da Lei 8.443/1992 c/c os arts. 19 e 23, inciso III, da mesma Lei, e com arts. 1º, inciso I, 209, incisos II e III, e § 5º, 210 e 214, inciso III, do Regimento Interno, que sejam julgadas irregulares as contas do Sr. Marlem Riglison Silva Ferreira, na condição de secretário de saúde e gestor do Fundo Municipal de Saúde de Tabatinga/AM no período de 2/1/2009 a 4/4/2012, e condená-lo ao pagamento das quantias a seguir especificadas, com a fixação do prazo de quinze dias, a contar das notificações, para comprovar, perante o Tribunal (art. 214, inciso III, alínea 'a', do Regimento Interno), o recolhimento das dívidas aos cofres do Fundo Nacional de Saúde, atualizadas monetariamente e acrescidas dos juros de mora, calculados a partir das datas discriminadas, até a data dos recolhimentos, na forma prevista na legislação em vigor, abatendo-se, na oportunidade, os valores já ressarcidos. [Disponível em: <https://pesquisa.apps.tcu.gov.br/documento/acordao-completo/1210720182.PROC/%2520%2520/DTRELEVANCIA%2520desc%252C%2520NUMACORDAOINT%2520desc/1>. Acesso em: 15 de setembro de 2024.].
Ora, pela leitura da r. Decisão proferida pelo Tribunal de Contas da União, o senhor Marlem Ferreira, enquanto Secretário Municipal de Saúde, não comprovou a utilização de vultosos valores, não se podendo considerar tal omissão como mera irregularidade formal, mas sim como clarividente dano ao erário. Desse modo, resta claro que o candidato não se incumbiu deliberadamente de seu dever de prestar contas, considerado pela jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral como irregularidade insanável e configuradora de ato de improbidade administrativa. Nessa quadra:
ELEIÇÕES 2022. RECURSO ORDINÁRIO ELEITORAL. REGISTRO DE CANDIDATURA INDEFERIDO NA ORIGEM. PRELIMINAR DE INTEMPESTIVIDADE REFLEXA DO RECURSO ORDINÁRIO EM RAZÃO DO NÃO CONHECIMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. REJEIÇÃO. PRELIMINAR DE NULIDADE DO ACÓRDÃO POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. REJEIÇÃO. CANDIDATO AO CARGO DE DEPUTADO ESTADUAL. REJEIÇÃO DE CONTAS RELATIVAS AO EXERCÍCIO DO CARGO DE DIRETOR-PRESIDENTE DO INSTITUTO DE DESENVOLVIMENTO RURAL DO AMAPÁ. AL. G DO INC. I DO ART. 1º DA LEI COMPLEMENTAR N. 64/1990. INELEGIBILIDADE CARACTERIZADA. RECURSO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.1. A ausência de conhecimento dos embargos de declaração na origem, por fundamento diverso da intempestividade, não conduz à intempestividade reflexa do recurso ordinário subsequente.2. A divergência entre a fundamentação do julgado e as teses defendidas pela parte não importa em ofensa ao § 1º do art. 489 do Código de Processo Civil.3. Não se declara nulidade processual sem demonstração de prejuízo, conforme previsto no art. 219 do Código Eleitoral e estabelecido na jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral.4. A incidência da inelegibilidade da al. g do inc. I do art. 1º da Lei Complementar n. 64/1990 exige a presença concomitante dos requisitos: exercício de cargo ou função pública; rejeição de contas pela prática de irregularidades de natureza insanável, configuradoras de ato doloso de improbidade administrativa; irrecorribilidade da decisão de rejeição das contas e ausência de suspensão ou anulação judicial do pronunciamento de desaprovação das contas.5. A alteração da Lei de Improbidade Administrativa pela Lei n. 14.230/2021 promoveu a superação da jurisprudência sobre a suficiência do dolo genérica para a caracterização da inelegibilidade prevista na al. g do inc. I do art. 1º da Lei Complementar n. 64/1990.6. A aplicação da nova Lei de Improbidade Administrativa às causas eleitorais em curso decorre da tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo n. 843.989/PR (tema 1.199 da repercussão geral).7. Configura ato doloso de improbidade administrativa previsto no art. 10 da Lei n. 8.429/1992, com as alterações conferidas pela Lei n. 14.230/2021, a deliberada omissão do dever de prestar de contas se apurada irregularidade grave que seria encoberta pela ausência de prestação.8. Preenchidos os requisitos para a incidência da alínea g, impõe-se o indeferimento do registro de candidatura pelo período de duração da inelegibilidade.9. Preliminares de intempestividade reflexa do recurso ordinário, de nulidade do acórdão por ausência de fundamentação e de intimação do Ministério Público rejeitadas.10. Recurso a que se nega provimento. TSE. Recurso Ordinário Eleitoral nº060042434, Acórdão, Min. Cármen Lúcia, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 19/12/2022.
REGISTRO DE CANDIDATURA. DEPUTADO FEDERAL. INELEGIBILIDADE. RECONHECIMENTO DA CAUSA DE INELEGIBILIDADE DESCRITA NO ART. 1º, I, g, DA LEI COMPLEMENTAR 64/90. 1. A mera juntada de despacho exarado em processo que tramita na Corte de Contas, no qual foi determinada a remessa do feito à Presidência do referido tribunal, é insuficiente, no caso, para demonstrar a suspensão da causa de inelegibilidade ou a retirada do respectivo suporte fático. Não incidência do art. 11, § 10, da Lei 9.504/97. 2. Eventual discussão a respeito da responsabilidade ou não do recorrente, assim como acerca de o dever de prestar contas ser do estado ou do município, constitui matéria que deveria ter sido arguida no processo de prestação de contas perante o Tribunal de Contas do Estado. No caso, ficou expresso no acórdão do Tribunal de Contas que o recorrente era um dos responsáveis pela apresentação das contas. 3. De acordo com a jurisprudência desta Corte Superior, "a omissão do dever de prestar contas, prevista no art. 11, VI, da Lei nº 8.429/92, constitui falha insanável que configura ato doloso de improbidade administrativa, apta a atrair a incidência da inelegibilidade do art. 1º, I, g, da LC nº 64/90. Precedentes: AgR-REspe nº 88-56/AP, Rel. Min. Herman Benjamin, PSESS em 4.10.2016; REspe nº 24-37/AM, Rel. Min. Dias Toffoli, em 29.11.2012; e AgR-REspe nº 101-62/RJ, Rel. Min. Arnaldo Versiani, em 6.11.2012" (AgR-REspe 190-78, rel. Min. Luiz Fux, DJE de 1º.3.2018). 4. Embora os responsáveis pela apresentação da prestação de contas tenham sido notificados por duas vezes, permaneceram inertes, o que evidencia a assunção do risco de não atender aos preceitos legais, elemento concreto que denota a presença do dolo genérico Agravo regimental a que se nega provimento. [TSE. Agravo Regimental em Recurso Ordinário nº060237478, Acórdão, Min. Admar Gonzaga, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 20/11/2018.].
Portanto, verifica-se que o candidato deixou dolosamente de prestar contas ao Tribunal de Contas da União, sendo inclusive considerado revel nos autos do processo de Tomada de Contas Especial nº 012.107/2018-2. Assim, consoante o entendimento consolidado do Tribunal Superior Eleitoral, como já demonstrado, a ausência de prestação de contas consiste em irregularidade insanável a ensejar a aplicação do disposto no artigo 1º, I, g, da Lei Complementar nº 64/1990. Sobre o tema:
De modo geral, segundo a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, entre outras situações, constituem irregularidades insanáveis e configuradoras de ato de improbidade administrativa [...] (x) não cumprir o deve de prestar contas (TSE – REspe nº 2.437/AM – PSS 29-11-2012; AgR-REspe nº 64.060/SP – Dje, t. 114, 19-6-2013, p. 99); [...] [GOMES, josé Jairo. Direito Eleitoral. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2021. p. 300-301)].
Destaco uma vez mais que o candidato não fora condenado apenas ao recolhimento de multa por ausência de formalidades na prestação de contas, mas sim lhe fora imputada a restituição ao erário pelos danos causados em razão da sua omissão em não prestar as contas referentes à utilização dos recursos federais recebidos durante a sua gestão como Secretário de Saúde, demonstrando, portanto, claro ato doloso de improbidade administrativa, tipificado no artigo 10, caput, c/c o artigo 11, VI, da Lei nº 8.429/1992.
Não obstante, para o fim da inelegibilidade ora examinada, não se exige dolo específico, mas apenas genérico, que se caracteriza quando o administrador assume os riscos de não atender aos comandos constitucionais e legais que pautam os gastos públicos, como, por exemplo, o dever de prestar contas. Nessa quadra:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECEBIMENTO COMO AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2020. VEREADOR. REGISTRO DE CANDIDATURA. INELEGIBILIDADE. REJEIÇÃO DE CONTAS PÚBLICAS. ART. 1º, I, G, DA LC 64/90. LICITAÇÃO. FRAUDE. SUPERFATURAMENTO. IRREGULARIDADE INSANÁVEL. ATO DOLOSO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. NEGATIVA DE PROVIMENTO.1. Embargos interpostos contra decisum monocrático e com pretensão infringente são recebidos como agravo interno. Precedentes.2. No decisum agravado, proferido pelo douto Ministro Luis Felipe Salomão, manteve-se aresto unânime do TRE/MA, que indeferiu o registro de candidatura do agravante ao cargo de vereador de Caxias/MA nas Eleições 2020 com base na inelegibilidade do art. 1º, I, g, da LC 64/90 (rejeição de contas públicas).3. Ausência de interesse recursal do agravante quanto à inelegibilidade do art. 1º, I, e, da LC 64/90, relativamente à existência de condenação criminal, porquanto afastada pela própria Corte de origem.4. Rejeitadas as preliminares de a) omissão no aresto a quo (o tema relativo à suposta prescrição das contas foi apreciado); b) cerceamento de defesa (descabe produzir prova oral na espécie); c) ilegitimidade ativa da legenda impugnante (não mais há coligações em pleitos proporcionais); d) inépcia da inicial (a emenda ocorreu antes da citação).5. Consoante o art. 1º, I, g, da LC 64/90, são inelegíveis "os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes [...]".6. Conforme a moldura fática do aresto a quo, o agravante teve contas públicas rejeitadas pelo Tribunal de Contas da União, com imputação de débito, relativas ao cargo de prefeito, por irregularidades identificadas em convênios firmados com diferentes órgãos do Governo Federal, sobretudo na gestão de recursos do SUS, consubstanciadas em: a) direcionamento da licitação; b) superfaturamento dos preços dos postos de saúde; c) obra realizada somente após dois anos da emissão das notas fiscais; d) o fiscal do município era o representante da empresa que realizou a empreitada.7. A fraude em licitação e o superfaturamento de preços, com prejuízo ao erário, constituem, via de regra, falhas insanáveis configuradoras de ato doloso de improbidade administrativa. Precedentes.8. Para o fim da inelegibilidade da alínea g, não se exige dolo específico, mas apenas genérico, que se caracteriza quando o administrador assume os riscos de não atender aos comandos constitucionais e legais que pautam os gastos públicos. Precedentes.9. É despicienda a menção expressa, pela Corte de Contas, acerca da prática de atos de improbidade, bastando que essa circunstância possa ser extraída do inteiro teor do decisum em que rejeitado o ajuste contábil. Precedentes.10. "[...] Nos processos de registro de candidatura, não compete à Justiça Eleitoral adentrar, a fim de modificar seus fundamentos - e declarar a alegada prescrição quinquenal -, no mérito decisório da decisão do órgão competente para o julgamento das contas, o qual poderá se valer das medidas cabíveis para anulação ou suspensão do ato administrativo, a serem apreciadas pelos órgãos competentes" (AgR-REspEl 0600729-71/SE, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJE de 5/3/2021).11. Agravo interno a que se nega provimento. Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral nº060056432, Acórdão, Min. Benedito Gonçalves, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 09/03/2022.
Forte em tais fundamentos, com fundamento no artigo 1º, I, g, da Lei Complementar nº 64/1990, julgo procedente a impugnação apresentada pelo Ministério Público e, por corolário, com fulcro no artigo 11, III, da Resolução/TSE nº 23.609/2019, indefiro o registro de candidatura do senhor Marlem Riglison Silva Ferreira para concorrer ao cargo de vice-prefeito de Tabatinga nas eleições municipais de 2024.
Indefiro a impugnação veiculada pela coligação “Tabatinga, a mudança chegou”, em razão da ausência de provas da configuração da inelegibilidade prevista no artigo 14, §7º, da Constituição da República.
Quanto à impugnação suscitada pelo Partido Liberal, julgo extinto o feito sem resolução do mérito, com fulcro nos artigos 6º, §§1º e 4º, da Lei 9.504/1997, artigo 4º, §4º, da Resolução/TSE nº 23.609/2019, c/c o artigo 485, VI, do Código de Processo Civil.
Publique-se esta decisão no Mural Eletrônico e comunique-se o Ministério Público Eleitoral, por expediente no PJe, nos termos do artigo 58, § 1º, da Resolução TSE nº 23.609/2019.
Em caso de interposição de recurso, intime-se a parte contrária para apresentação de contrarrazões, no prazo de 03 (três) dias. Após, sem necessidade de nova conclusão, remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal Regional Eleitoral.
Publique-se. Registre-se eletronicamente. Intime-se. Cumpra-se.
Ao se certificar o trânsito em julgado, proceda-se ao arquivamento e baixa definitiva dos autos.
Tabatinga/AM, 15 de setembro de 2024.
Edson Rosas Neto
Juiz Eleitoral